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Penhora de bens gravados com alienação fiduciária em execução trabalhista

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Agenda 10/01/2009 às 00:00

6. Conclusão

Em síntese, a aventada impenhorabilidade do bem gravado com alienação fiduciária tem por fundamento principal a constatação de que, por força de lei, o devedor fiduciante não tem a propriedade do bem, mas apenas a sua posse direta, assumindo a condição de depositário, e, por isso, na hipótese de inadimplemento, o bem deverá ser alienado pelo credor fiduciário para satisfazer o crédito e as despesas com cobrança.

Porém, como visto, não há como aceitar sempre esse posicionamento, esmagadoramente majoritário nos tribunais e em expressiva doutrina, notadamente quando se trata de execução de crédito trabalhista, tendo em conta a existência de direitos do fiduciante sobre o bem, passíveis de penhora, além da possibilidade de expropriação judicial do mesmo, desde que os direitos do credor fiduciário sejam mantidos intactos.

Com efeito, mesmo sustentando a tese da penhorabilidade do bem nessa condição, ainda que de forma limitada, pelos motivos antes apontados, parece fora de dúvida que os atos judiciais de apreensão, para satisfazer créditos trabalhistas, não podem prejudicar os direitos do credor fiduciário.

A constrição deve se limitar aos direitos incidentes sobre o bem de posse direta do devedor fiduciante, e apenas se cumpridas por este todas as obrigações cujo adimplemento é assegurado pelo bem, pode-se falar em sua expropriação pela Justiça do Trabalho, transferindo-o a um terceiro (arrematante) ou ao próprio exeqüente trabalhista (adjudicação).

É possível, ainda, admitir-se a expropriação do próprio bem em questão em hasta pública, pela Justiça do Trabalho, desde que sejam transferidas ao adquirente do mesmo as obrigações que eram do devedor fiduciante, que acompanham o bem, sub-rogando-se aquele nos direitos e obrigações originariamente deste último.

Portanto, é razoável entender que o próprio bem seja alienado judicialmente em execução trabalhista, desde que os direitos do credor fiduciário sejam preservados, de modo que o adquirente se sub-rogue nos direitos e obrigações do devedor fiduciante.

Outra hipótese é a da expropriação judicial do bem, no âmbito trabalhista, entregando-se ao credor fiduciário o produto do leilão, fazendo-se a retenção unicamente da quantia remanescente, depois de satisfeito o crédito fiduciário e as despesas correspondentes, como diz a lei, que seria aproveitada para satisfazer o credor trabalhista, pois, cuida-se de saldo que no caso de inadimplemento das obrigações assumidas pelo fiduciante junto ao fiduciário a ele seria restituído.

O que se pretende demonstrar é que não existe a chamada impenhorabilidade do bem gravado com alienação fiduciária. O que existe é a impossibilidade da pura e simples expropriação em execução trabalhista como se fosse um bem qualquer, livre e desembaraçado.

Tanto os direitos incidentes sobre o bem (uso, gozo, posse etc.), como as parcelas já pagas pelo devedor fiduciante (que serão restituídas a este, no que sobejar), se houver alienação judicial ou extrajudicial, pelo credor fiduciário, podem ser objeto de penhora trabalhista. Nada impede que, nesse caso, a expropriação seja promovida pela Justiça do Trabalho, em execução de crédito trabalhista, desde que ao credor fiduciário seja entregue o que lhe é de direito.

Saliente-se que em caso de dívida vencida e não paga pelo devedor fiduciante, o art. 1.368, do CC, independentemente da vontade do credor fiduciário, permite que um terceiro pague a dívida, caso em que sub-rogará de pleno direito no crédito e na propriedade fiduciária.

Resumindo todo o exposto:

1. Prevalece em doutrina e nos tribunais o entendimento de que o bem gravado com alienação fiduciária é impenhorável;

2. Não existe confronto entre crédito trabalhista e crédito de outra natureza, de modo que se mostra inadequada a invocação do princípio da preferência do primeiro;

3. O bem com esse gravame não consta de norma legal como absolutamente impenhorável;

4. Os bens futuros do devedor (em semelhança à penhora de créditos futuros), ainda que gravados com alienação fiduciária, mesmo que inexistente a propriedade plena no momento da constrição judicial, mas em estado de potência, podem ser objeto de penhora, que somente será completada e produzirá todos os efeitos que lhe são próprios (efetivação) se cumpridas as obrigações do devedor em relação ao credor fiduciário;

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5. Não há impossibilidade de penhora, mas sim, de expropriação judicial imediata do bem, portanto, momentânea;

6. A constrição pode recair sobre o bem, desde que postergada a alienação judicial (atos expropriatórios) para depois de adimplida as obrigações do devedor fiduciante;

7. É possível, em tese, a constrição e a expropriação judicial do bem, assumindo o adquirente as obrigações e passando a ser titular dos mesmos direitos que o devedor fiduciante originário (sub-rogação);

8. É possível a expropriação do bem, pela Justiça do Trabalho, desde que primeiro seja satisfeito o fiduciário até o limite do seu crédito (obrigações principais e despesas sob responsabilidade do fiduciante), ficando a quantia remanescente (saldo) à disposição do crédito trabalhista em execução;

9. É possível a penhora dos direitos sobre o bem, a exemplo da posse, uso e gozo (situação talvez inócua, pois, dificilmente alguém se interessaria por esses direitos, e, ainda, seria motivo para o inadimplemento das obrigações do devedor fiduciante);

10. É possível a penhora do saldo positivo (diferença entre o valor pago, se maior, e o débito existente, se menor) que remanescer ao devedor fiduciante, em caso de alienação do bem pelo credor fiduciário;

11. Os direitos do credor fiduciário (que detém a propriedade resolúvel e a posse indireta do bem) devem ser preservados, porque garantidos pela lei.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ABELHA, Marcelo. Manual de execução civil. Rio de Janeiro: Forense universitária, 2006.

ALMEIDA, Ísis de. Manual de direito processual do trabalho. 2º v. São Paulo: LTr, 1985.

ASSIS, Araken de. Manual da Execução. 11ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.

COQUEIJO COSTA, Carlos T. Direito processual do trabalho. 3ª Ed. Rio de Janeiro: Forense, 1978.

COUCE DE MENEZES, Cláudio Armando. Teoria geral do processo e a execução trabalhista. São Paulo: LTr, 2003.

DINAMARCO, Cândido Rangel. Fundamentos do processo civil moderno. V. II. Tomo II. 5ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2002.

DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. V. IV. São Paulo: Malheiros editores, 2004.

DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 8ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2002.

GOMES, Orlando. Alienação fiduciária em garantia. 3ª ed., rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1972.

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. Processo de execução e cumprimento da sentença. Processo cautelar e tutela de urgência. V. II. 40ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006.

OLIVEIRA, Francisco Antônio de. A execução na Justiça do Trabalho. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1989.

OLIVEIRA, Francisco Antônio de. Manual de penhora: enfoques trabalhistas e jurisprudência. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.

SANTOS, Ernane Fidélis. Manual de direito processual civil. V. IV. São Paulo: Saraiva.


Notas

, n.1, pp. 1-2, apud Dinamarco, in Fundamentos do..., v. II, p. 1274.
  • DINIZ, Maria Helena. Código Civil Anotado. 8ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 836.
  • GOMES, Orlando. Alienação fiduciária em garantia.
  • SANTOS, Ernane Fidélis. Manual de direito processual civil. V. IV. São Paulo: Saraiva, p. 250.
  • DINAMARCO, Cândido Rangel. Fundamentos do processo civil moderno. V. II. 5ª ed. São Paulo: Malheiros editores, 2002.
  • THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil: processo de execução e cumprimento de sentença, processo cautelar e tutela de urgência, v. II, 40ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006.
  • COUCE DE MENEZES, Cláudio Armando. Teoria geral do processo e a execução trabalhista. São Paulo: LTr, 2003, p. 171-172.
  • COQUEIJO COSTA, Carlos T. Direito processual do trabalho. 3ª Ed. Rio de Janeiro: Forense, 1978.
  • Leciona Marcelo Abelha: Tem-se que a penhora é um ato executivo instrumental (preparatório) da execução por expropriação, e, por meio dela, apreende (m)-se bem (ns) do executado, com ou contra a sua vontade, guardando-o (s) para a expropriação final que irá satisfazer o crédito exeqüendo. A penhora é, na execução por expropriação, o ato executivo que torna concreta a responsabilidade executiva, na medida em que individualiza o (s) bem (ns) que será (ão) expropriado (s) para a satisfação do crédito (Manual de execução civil. Rio de Janeiro: Forense universitária, 2006, p. 309.
  • SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. V. 3. 10ª ed. São Paulo: Saraiva, 1989, p. 292.
  • LIEBMAN, apud SANTOS, Moacyr Amaral, op. cit., p. 292.
  • Afirma Theodoro Júnior: A penhora é um ato de afetação, porque sua imediata conseqüência, de ordem prática e jurídica, é sujeitar os bens por ela alcançados aos fins da execução, colocando-os à disposição do órgão judicial para, ‘à custa e mediante sacrifício desses bens, realizar o objetivo da execução’, que é a função pública de ‘dar satisfação ao credor’ (Curso de direito processual civil. Processo de execução e cumprimento da sentença. Processo cautelar e tutela de urgência. V. II. 40ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 272.
  • Assim, igualmente, dessume-se dos arts. 298 e 312, do Código Civil de 2002.
  • Dispõe o art. 121, do CC de 2002: Considera-se condição a cláusula que, derivando exclusivamente da vontade das partes, subordina o efeito do negócio jurídico a evento futuro e incerto. O art. 127, diz: Se for resolutiva a condição, enquanto esta se não realizar, vigorará o negócio jurídico, podendo exercer-se desde a conclusão deste o direito por ele estabelecido. O art. 125, por sua vez: Subordinando-se a eficácia do negócio jurídico à condição suspensiva, enquanto esta se não verificar, não se terá adquirido o direito, a que ele visa.
  • ALMEIDA, Ísis de. Manual de direito processual do trabalho. 2º v. São Paulo: LTr, 1985, p. 291.
  • DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. V. IV. São Paulo: Malheiros editores, 2004, p. 329.
  • Merecem reprodução os dispositivos desses diplomas legais, que têm relação direta com o tema objeto de estudo: Art. 8º, par. único, da CLT: Parágrafo único: O direito comum será fonte subsidiária do direito do trabalho, naquilo em que não for incompatível com os princípios fundamentais deste. Art. 889, da CLT: Aos trâmites e incidentes do processo da execução são aplicáveis, naquilo em que não contravierem ao presente Título, os preceitos que regem o processo dos executivos fiscais para a cobrança judicial da dívida ativa da Fazenda Pública Federal (ou seja, Lei 6830/80). Art. 1º, da Lei 6.830/80: A execução judicial para cobrança da Dívida Ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e respectivas autarquias será regida por esta Lei e, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil. Art. 4º, § 4º, da Lei 6.830/1980: § 4º: Aplica-se à Dívida Ativa da Fazenda Pública de natureza não tributária o disposto nos artigos 186 e 188 a 192 do Código Tributário Nacional. Art. 30, da Lei 6.830/80: Sem prejuízo dos privilégios especiais sobre determinados bens, que sejam previstos em lei, responde pelo pagamento da Divida Ativa da Fazenda Pública a totalidade dos bens e das rendas, de qualquer origem ou natureza, do sujeito passivo, seu espólio ou sua massa, inclusive os gravados por ônus real ou cláusula de inalienabilidade ou impenhorabilidade, seja qual for a data da constituição do ônus ou da cláusula, excetuados unicamente os bens e rendas que a lei declara absolutamente impenhoráveis. Art. 186, do Código Tributário Nacional: O crédito tributário prefere a qualquer outro, seja qual for sua natureza ou o tempo de sua constituição, ressalvados os créditos decorrentes da legislação do trabalho ou do acidente de trabalho (redação dada pela LCP nº 118, de 2005). (Destaquei). Art. 649, do Código de Processo Civil: São absolutamente impenhoráveis: I - os bens inalienáveis e os declarados, por ato voluntário, não sujeitos à execução; II - os móveis, pertences e utilidades domésticas que guarnecem a residência do executado, salvo os de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns correspondentes a um médio padrão de vida (redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006); III - os vestuários, bem como os pertences de uso pessoal do executado, salvo se de elevado valor (redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006); IV - os vencimentos, subsídios, soldos, salários, remunerações, proventos de aposentadoria, pensões, pecúlios e montepios; as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, observado o disposto no § 3º deste artigo (redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006); V - os livros, as máquinas, as ferramentas, os utensílios, os instrumentos ou outros bens móveis necessários ou úteis ao exercício de qualquer profissão (redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006); VI - o seguro de vida (redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006); VII - os materiais necessários para obras em andamento, salvo se essas forem penhoradas (redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006); VIII - a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família (redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006);IX - os recursos públicos recebidos por instituições privadas para aplicação compulsória em educação, saúde ou assistência social (redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006); X - até o limite de 40 (quarenta) salários mínimos, a quantia depositada em caderneta de poupança (redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006); § 1º A impenhorabilidade não é oponível à cobrança do crédito concedido para a aquisição do próprio bem (incluído pela Lei nº 11.382, de 2006). § 2º O disposto no inciso IV do caput deste artigo não se aplica no caso de penhora para pagamento de prestação alimentícia (incluído pela Lei nº 11.382, de 2006). § 3º (VETADO). (incluído pela Lei nº 11.382, de 2006).
  • Op. cit., p. 187-188.
  • OLIVEIRA, Francisco Antônio de. A execução na Justiça do Trabalho. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1989, p. 220-221.
  • Manual de Penhora: Enfoques trabalhistas e jurisprudência. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 112.
  • DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. V. IV. São Paulo: Malheiros editores, 2004.
  • Disponível em: www.conjur.com.br. Acesso em: 11 maio.2005.
  • Recurso Especial 910207. Disponível em http://www.stj.gov.br. Acesso em: 07 maio.2008.
  • Sobre o autor
    Mauro Vasni Paroski

    Juiz titular da 7a. Vara do Trabalho de Londrina - PR. Especialista e Mestre em Direito pela Universidade Estadual de Londrina - PR. Doutorando em Direitos Sociais na Universidad de Castilla-La Mancha - ESPANHA.

    Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

    PAROSKI, Mauro Vasni. Penhora de bens gravados com alienação fiduciária em execução trabalhista. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2019, 10 jan. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12184. Acesso em: 15 nov. 2024.

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