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Dupla filiação partidária.

Um estudo sobre a aplicação do parágrafo único da Lei dos Partidos Políticos (Lei nº 9.096/95)

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Agenda 27/05/2009 às 00:00

ESTUDO DE CASO

Em complementação ao estudo bibliográfico exposto ao longo de todo o artigo foi realizada uma pesquisa de campo, na qual foram analisados os processos de registro de candidaturas às eleições municipais de 2004, no município de Mossoró, no interior do Estado do Rio Grande do Norte.

Cinco AIRCs foram impetradas sob a alegação de duplicidade de filiações, conforme será relatado a seguir:

a) Processo nº 970/2004

Espécie: Registro de candidatura

Requerente: Antônio Jales de Miranda

O requerente teve seu pedido de registro de candidatura impugnado por AIRC impetrada pela Coligação Mossoró Melhor, com fundamento na CF, art. 14, §3º, inciso V, c/c LPP, arts. 21 e 22, parágrafo único, uma vez que se filiara ao Partido Verde – PV no dia 1º/09/2003 e somente se desfiliara do Partido do Movimento Democrático Brasileiro - PMDB no dia 26/09/2005, o que configuraria a dupla filiação. O requerente teve seu pedido de registro indeferido em primeira instância com base nos dispositivos referidos.

EMENTA: Requerimento de registro de candidatura a vereador. Coligação Avança Mossoró. Impugnado pela Coligação Mossoró Melhor. Filiação Partidária Dúplice (PMDB e PV). Contestação opportuno tempore. Negativa de filiação a destempo. O Parquet Eleitoral opina pela procedência da impugnatória e o indeferimento do registro da candidatura do impugnado. Procedência da Actio Impugnatória. Denegação do registro do impugnado.

(Sentença em 02/08/2004, Juiz Eleitoral: Francisco de Assis Amorim – 34ª Zona – Mossoró-RN)

b) Processo nº 1009/2004

Espécie: Registro de candidatura

Requerente: Agostinho Tavares da Silva Junior

O requerente teve seu pedido de registro de candidatura impugnado por AIRC impetrada pela Coligação Mossoró Melhor, com fundamento na CF, art. 14, §3º, inciso V, c/c LPP, arts. 21 e 22, parágrafo único, uma vez que se filiara ao Partido da Frente Liberal no dia 29/09/2003, quando era filiado ao Partido do Movimento Democrático Brasileiro - PMDB desde o dia 10/11/2003, o que configuraria a dupla filiação. O requerente provou que já havia sido candidato a vereador nas eleições municipais de 2000 por um terceiro partido (Partido Polar Brasileiro – PPB), sem ter recebido nenhum tipo de impugnação. Acrescentou ainda pedido de desfiliação ao PPB no dia 29/09/2003. O candidato teve seu pedido de registro deferido em primeira instância, não tendo o Juiz Eleitoral reconhecido a existência de dupla filiação.

EMENTA: Requerimento de registro de candidatura a vereador. Coligação Força do Povo. Impugnação. Coligação Mossoró Melhor. Argüição: duplicidade de filiação (PMDB e PFL). Contestação opportuno tempore. O Parquet Eleitoral opina pela improcedência da impugnatória e o deferimento do registro da candidatura do impugnado. Registro do impugnado que se defere.

(Sentença em 10/08/2004,Juiz Eleitoral: Francisco de Assis Amorim – 34ª Zona – Mossoró-RN)

c) Processo nº 1049/2004

Espécie: Registro de candidatura

Requerente: Nicodemus Fernandes Lima

O requerente teve seu pedido de registro de candidatura impugnado por AIRC impetrada pela Coligação Mossoró Melhor, com fundamento na CF, art. 14, §3º, inciso V, c/c LPP, arts. 21 e 22, parágrafo único, uma vez que se filiara ao Partido Social Liberal no dia 02/08/2001, quando era filiado ao Partido do Movimento Democrático Brasileiro - PMDB desde o dia 11/04/1995, o que configuraria a dupla filiação. O requerente provou que já havia sido candidato a vereador nas eleições municipais de 1996 e 2000 por um terceiro partido (Partido da Social Democracia Brasileira - PSDB), sem ter recebido nenhum tipo de impugnação. Acrescentou ainda pedido de desfiliação ao PSDB no dia 18/05/2001. O candidato teve seu pedido de registro deferido em primeira instância, não tendo o Juiz Eleitoral reconhecido a existência de dupla filiação.

EMENTA: Requerimento de registro de candidatura a vereador. Coligação Unidos para Vencer. Impugnação. Coligação Mossoró Melhor. Argüição: duplicidade de filiação (PMDB e PSL). Contestação tempestiva. O Parquet Eleitoral opina pela improcedência da impugnatória e o deferimento do registro da candidatura do impugnado. Registro do impugnado que se defere.

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(Sentença em 09/08/2004,Juiz Eleitoral: Francisco de Assis Amorim – 34ª Zona – Mossoró-RN)

d) Processo nº 1052/2004

Espécie: Registro de candidatura

Requerente: Francisco de Assis Andrade

O requerente teve seu pedido de registro de candidatura impugnado por AIRC impetrada pela Coligação Mossoró Melhor, com fundamento na CF, art. 14, §3º, inciso V, c/c LPP, arts. 21 e 22, parágrafo único, uma vez que se filiara ao Partido Social Liberal – PSL no dia 21/06/2004, quando era filiado ao Partido Progressista - PP desde o dia 29/09/1999, o que configuraria a dupla filiação. O requerente provou ter pedido a desfiliação do Partido Progressista Brasileiro – PPB, um dos partidos que originou o atual PP, no dia 03/08/2000. O candidato teve seu pedido de registro deferido em primeira instância, não tendo o Juiz Eleitoral reconhecido a existência de dupla filiação.

EMENTA: Requerimento de registro de candidatura a vereador. Coligação Unidos para Vencer. Impugnação. Coligação Mossoró Melhor. Argüição: duplicidade de filiação (PP e PSL). Contestação tempestiva. O Parquet Eleitoral opina pela improcedência da impugnatória e o deferimento do registro da candidatura do impugnado. Deferimento do registro da candidatura.

(Sentença em 10/08/2004,Juiz Eleitoral: Francisco de Assis Amorim – 34ª Zona – Mossoró-RN)

e) Processo nº 1004/2004 – 34ª ZE

RE nº 4609/2004 – Tribunal Regional Eleitoral-RN

RESPE nº 23.401/2004/TSE

Espécie: Registro de candidatura

Requerente: Gilvanda Peixoto Costa

Este é o caso mais notório, tendo se estendido até mesmo depois da apuração e divulgação dos resultados, o que gerou bastante controvérsia nos meios políticos da cidade de Mossoró.

O requerente teve seu pedido de registro de candidatura impugnado por AIRC impetrada pela Coligação Mossoró Melhor, com fundamento na CF, art. 14, §3º, inciso V, c/c LPP, arts. 21 e 22, parágrafo único, uma vez que se filiara ao Partido da Frente Liberal – PFL no dia 25/09/2003, quando era filiado ao Partido do Movimento Democrático Brasileiro desde o dia 21/02/1992, o que configuraria a dupla filiação. O requerente alegou que era filiada ao Partido Progressista – PP desde 1999, motivo pelo qual, sendo verdadeira a não desfiliação ao PMDB, seria esta a filiação a ser anulada juntamente com a do PMDB, e não a do PFL que é bem mais recente. O candidato teve seu pedido de registro negado em primeira instância pelo Juiz Eleitoral em 13/08/2004, conforme ementa a seguir:

EMENTA: Requerimento de registro de candidatura. Cargo de vereador. Coligação Força do Povo. Impugnação. Coligação Mossoró Melhor. Argüição: duplicidade de filiação (PMDB, PP e PFL). Contestação in opportuno tempore. O Ministério Público Eleitoral opina pela procedência da actio impugnatória e o indeferimento do registro da candidatura do impugnado. Tríplice filiação. Procedência parcial da impugnação. Indeferimento do registro de candidatura.

(Sentença em 13/08/2004,Juiz Eleitoral: Francisco de Assis Amorim – 34ª Zona – Mossoró-RN)

Inconformada com a decisão a candidata recorreu ao Tribunal Regional Eleitoral que conheceu o recurso e lhe deu provimento, reformando a sentença do Juiz singular e deferindo o registro da candidata.

EMENTA: RECURSO ELEITORAL – INDEFERIMENTO DE REGISTRO DE CANDIDATURA – DUPLICIDADE DE FILIAÇÃO NÃO-CONFIGURADA – DESFILIAÇÃO PARTIDÁRIA COMUNICADA AO JUIZ ELEITORAL – PERMANÊNCIA DO NOME NA LISTA REMETIDA À JUSTIÇA ELEITORAL – CONHECIMENTO E PROVIMENTO DO RECURSO.

(Acórdão nº 4.609, de 30.08.2004, rel. Juiz Ibanez Monteiro da Silva)

A decisão do Regional foi recorrida tendo sido negado seu seguimento pelo relator Ministro Carlos Eduardo Caputo Bastos do TSE, em 08/10/2004, sendo ainda interposto Agravo de Regimento, também negado em 13/10/2004, tendo transitado em julgado em 16/10/2004, treze dias após a data das eleições e da divulgação dos resultados.

Apesar de ter sido mantida como candidata e diplomada como vereadora ao final de todo o processo, a requerente passou toda a campanha na incerteza de ser ou não realmente candidata, uma vez que havia o indeferimento em primeira instância. Um outro aspecto a ser considerado é que, pelo entendimento do TSE, como a candidata tinha seu registro de candidatura negado em primeira instância ela não teria seus votos considerados válidos inicialmente, somente sendo computados após o trânsito em julgado da lide. Tal entendimento gerou intensa apreensão, uma vez que haveria alteração no quadro de vereadores inicialmente proclamados eleitos.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Apesar de ser relativamente nova, pouco mais de dez anos, a Lei dos Partidos Políticos (Lei nº 9.096/95) já orientou a conduta dos Partidos ao longo de cinco eleições (municipais de 1996, 2000 e 2004; gerais de 1998 e 2002), o que, no entanto, não significa que seja devidamente conhecida e observada pelos partidos e potenciais candidatos, especialmente no que diz respeito às formas de filiação e desfiliação, sendo comuns casos de impugnações de registros de candidaturas por duplicidade de filiações, com enquadramento no parágrafo único, art. 22 da LPP.

A alegação de ausência de elegibilidade por falta de devida filiação partidária, conforme exigência do art. 14, §3º, inciso V da Constituição Federal, considerando que o envolvido em dupla filiação terá ambas consideradas nulas para todos os efeitos, tem sido bastante freqüente, especialmente nas eleições municipais, em que a quantidade de candidatos é bem maior em todo o país, levando candidatos a terem seus pedidos de registros negados, conforme mostrado no relato do Processo 970/2004, ou mesmo impondo aos mesmos conviverem com a incerteza da candidatura por uma campanha inteira, conforme mostrado no relato do RESPE 23.401/2004.

Cabe por fim ressaltar a displicência, ou mesmo descaso, com que partidos e potenciais candidatos tratam a questão da disciplina e fidelidade partidária, vigendo um verdadeiro caos de transferências e mudanças partidárias em vésperas do encerramento do prazo final, sempre ocorrendo com desrespeito ou inobservância à legislação pátria.

Não será pleno o Estado Democrático de Direito, com fundamento no Pluralismo Político enquanto persistirem tais práticas, que devem ser coibidas pela legislação e pela Justiça Eleitoral, que não podem se abster de interferir em nome da autonomia partidária.


REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: texto promulgado em 5 de outubro de 1988, com as alterações adotadas pelas Emendas Constitucionais nº 1/92 a 42/2003 e pelas Emendas Constitucionais de Revisão nº 1 a 6/94. Brasília: Senado Federal/SET, 2004. 436p.

BRASIL. Lei Complementar nº 64, de 18 de maio de 1990. Lei das inelegibilidades. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LCP/Lcp64.htm>. Acesso em: 21 nov. 2005.

BRASIL. Lei nº 5.682, de 21 de julho de 1971. Antiga Lei Orgânica dos partidos políticos. Disponível em: < http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=199015>. Acesso em: 21 nov. 2005.

BRASIL. Lei nº 9.096, de 19 de setembro de 1995. Lei dos partidos políticos. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9096.htm>. Acesso em: 21 nov. 2005.

BRASIL. Lei nº 9.504, de 30 de setembro de 1997. Lei das eleições. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9504.htm>. Acesso em: 21 nov. 2005.

BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Código Eleitoral anotado e legislação complementar. 6.ed. Brasília: TSE/SDI, 2004. 400p.

BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Filiação partidária: jurisprudência do TSE - temas selecionados. Brasília: TSE/SDI, 2005. 60p.

CÂNDIDO, Joel J. Direito Eleitoral Brasileiro. 11.ed. Bauru,SP: Edipro, 2005. 608p.

CASTRO, Edson de Resende. Teoria e prática do Direito Eleitoral. Belo Horizonte: Mandamentos, 2004. 470p.

MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. 16.ed. São Paulo: Atlas, 2004. 863p.

PINTO, Djalma. Direito Eleitoral. 3.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000.

RAMAYANA, Marcos. Direito Eleitoral. 3.ed. Niterói, RJ: Impetus, 2005. 591p.

Sobre o autor
Francisco Márcio de Oliveira

Especialista em Direito Eleitoral pela UNISUL/LFG. Bacharel em Direito pela UERN Professor de Direito Eleitoral da Faculdade de Ciências e Tecnologia Mater Christi Servidor do TRE-RN

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLIVEIRA, Francisco Márcio. Dupla filiação partidária.: Um estudo sobre a aplicação do parágrafo único da Lei dos Partidos Políticos (Lei nº 9.096/95). Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2156, 27 mai. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12822. Acesso em: 18 nov. 2024.

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