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Aquisição da nacionalidade originária e a EC nº 54/2007

Agenda 15/07/2009 às 00:00

Cada Estado é independente para definir quem são seus nacionais e os demais que serão os estrangeiros.

Nacionalidade pode ser entendida como o vínculo jurídico-político de Direito Público interno que torna a pessoa um dos elementos componentes da dimensão do Estado.

A nacionalidade pode ser primária (de origem ou originária) ou secundária (adquirida). No Brasil temos um sistema híbrido de aquisição de nacionalidade originária, com base nos critérios do jus sanguinis e do jus solis, respectivamente pelos laços de sangue e pelo vínculo territorial.

De acordo com a Constituição Federal, são brasileiros natos:

a)Critério do ius solis – os nascidos na República Federativa do Brasil, ainda que de pais estrangeiros, desde que estes não estejam a serviço de seu país.

b)Critério do ius sanguinis combinado com critério funcional – os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira (não importa se nato ou naturalizado), desde que qualquer deles esteja a serviço da República Federativa do Brasil.

c)Critério do ius sanguinis – os nascidos no estrangeiro de pai brasileiro ou de mãe brasileira, desde que sejam registrados em repartição brasileira competente ou venham a residir na República Federativa do Brasil e optem, em qualquer tempo, depois de atingida a maioridade, pela nacionalidade brasileira.

Observa-se que há duas alternativas para aquisição da nacionalidade com base na última hipótese, constante do art. 12, I "c", da CF/88: registro em repartição brasileira competente ou vir o nascido no estrangeiro residir no Brasil e optar, depois de atingida a maioridade, pela nacionalidade brasileira.

Com base no que foi dito acima, quando lavrado o nascimento pela autoridade brasileira no exterior, possuirá tal ato a mesma eficácia jurídica como se ocorresse no Brasil, assegurada a aquisição originária da nacionalidade brasileira.


Evolução constitucional e situação vigente:

Na Constituição de 1.946:

"Art. 129. São brasileiros:

I - ............................................

II - Os filhos de brasileiro ou brasileira, nascidos no estrangeiro, se os pais estiveram a serviço do Brasil, ou, não estando, se vierem a residir no país. Neste caso, atingida a maioridade, deverão, para conservar a nacionalidade brasileira, optar por ela, dentro de quatro anos;"

Assim, até o termo final do prazo de opção – quatro anos, contados da maioridade –, o sujeito era considerado, para todos os efeitos, brasileiro nato sob a condição resolutiva.

A Constituição de 1.967, com a EC 1/69, dispunha da seguinte forma:

"Art. 145. São brasileiros:

I - natos:

...............................................

c) os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira, embora não estejam estes a serviço do Brasil, desde que registrados em repartição brasileira competente no exterior ou, não registrados, venham a residir no território nacional antes de atingir a maioridade; neste caso, alcançada esta, deverão, dentro de quatro anos, optar pela nacionalidade brasileira;"

A Constituição de 1.967 estabelecia duas hipóteses para aquisição da nacionalidade: o filho de pai brasileiro ou mãe brasileira, nascido no estrangeiro, desde que registrado na repartição brasileira competente no exterior, seria brasileiro nato; e, caso não registrado, mas vindo a residir no Brasil antes de atingida a maioridade, deveria, dentro do prazo de quatro anos, contados de quando completada a maioridade, optar pela nacionalidade brasileira.

Importante ressalvar que a maioridade, em análise, seria a de direito privado, 21 (vinte e um) anos, prevista no então Código Civil brasileiro de 1.916.

A redação original do artigo 12, I, "c", da Constituição Federal de 1.988 era a seguinte:

"Art. 12. São brasileiros:

I - natos:

...............................................

c) os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou de mãe brasileira, desde que sejam registrados em repartição brasileira competente, ou venham a residir na República Federativa do Brasil antes da maioridade (restrição temporal) e, alcançada esta, optem, em qualquer tempo pela nacionalidade brasileira;" (acréscimos lançados pelo autor)

O texto original da Constituição de 1.988 considerava como brasileiro nato os filhos de pai brasileiro ou de mãe brasileira, nascidos no estrangeiro, registrados em repartição brasileira competente.

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Já os filhos de brasileiro, nascidos no estrangeiro e que não tivessem sido registrados em repartição brasileira competente, deveriam, para adquirir a nacionalidade brasileira, vir a residir no Brasil antes de completar a maioridade e, quando atingida esta, requerer sua concessão – ato personalíssimo.

O texto original da CF/88 corresponde aos ditames da Lei de Registros Públicos, que no §2º do art. 32, §2º determina que: "o filho de brasileiro ou brasileira, nascido no estrangeiro, e cujos pais não estejam ali a serviço do Brasil, desde que registrado em consulado brasileiro ou não registrado, venha a residir no território nacional antes de atingir a maioridade, poderá requerer, no juízo de seu domicílio, se registre, no livro "E" do 1º Ofício do Registro Civil, o termo de nascimento".

A Lei de Registros Públicos em seu art. 34, §§ 3º e 4º permitia aos interessados solicitar o registro de nacionalidade brasileira provisório, que valeria por apenas quatro anos, contados da maioridade, constando tal situação do termo e das certidões expedidas pelo oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais. 

Desse modo, quando completada a maioridade e dentro do prazo de 04 (quatro) anos, deveria o interessado manifestar, mediante procedimento de jurisdição voluntária, perante o juiz federal competente, sua vontade de se tornar brasileiro nato.

Caso o interessado permanecesse inerte, dentro do lapso temporal de quatro anos, perdia o registro provisório efetuado nos termos do art. 32, §2º da Lei nº. 6.015/73 e a chance de ser considerado brasileiro nato, restando a ele a condição de estrangeiro ou, se preenchidos os requisitos legais, postular a condição de brasileiro naturalizado.

Com a Emenda Constitucional de Revisão nº. 03/94:

"Art. 12. São brasileiros:

I - natos:

...............................................

c) os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira, desde que venham a residir na República Federativa do Brasil e optem, em qualquer tempo, pela nacionalidade brasileira;"

A ECR nº. 03/94 eliminou a determinação de que a residência se desse antes da maioridade e retirou do texto constitucional a possibilidade de o filho de brasileiros, nascido no estrangeiro, ser registrado em repartição brasileira competente, para fins de aquisição de nacionalidade. Portanto, para que venha adquirir a nacionalidade brasileira, os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira, deverão fixar residência na República Federativa do Brasil e realizar a devida opção (nacionalidade potestativa).

Considerando o texto original da Constituição e a redação dada ECR nº. 03/94, a opção pela nacionalidade brasileira poderia ser feita "em qualquer tempo", deixando de ter a eficácia resolutiva que, antes, se lhe emprestava, para ganhar, com o implemento da maioridade, a eficácia de condição suspensiva da nacionalidade brasileira, sem prejuízo de gerar efeitos ex tunc, uma vez realizada

Nelson Jobim a cargo da Relatoria da Revisão Constitucional, assim se manifestou: (cf., Alexandre de Moraes, ob. cit., p. 518)

"A opção pode agora ser feita a qualquer tempo. Tal como nos regimes anteriores, até a maioridade, são brasileiros esses indivíduos. Entretanto, como a norma não estabelece mais prazo, podendo a opção ser efetuada a qualquer tempo, alcançada a maioridade essas pessoas passam a ser brasileiras sob condição suspensiva, isto é, depois de alcançada a maioridade, até que optem pela nacionalidade brasileira, sua condição de brasileiro nato fica suspensa. Nesse período o Brasil os reconhece como nacionais, mas a manifestação volitiva do Estado torna-se inoperante até a realização do acontecimento previsto, a opção. É lícito considerá-los nacionais no espaço de tempo entre a maioridade e a opção, mas não podem invocar tal atributo porque pendente da verificação da condição."

A aquisição, apesar de provisória, dá-se com a residência no Brasil, sendo a opção uma condição confirmativa e não formativa de nacionalidade. Ou seja, no momento em que o filho de pai brasileiro ou mãe brasileira, que não estivessem a serviço do Brasil, nascido no estrangeiro, fixasse residência no Brasil adquiriria a nacionalidade provisória, que seria confirmada com a opção feita perante a Justiça Federal.

Percebe-se que opção pela nacionalidade, embora potestativa (dependente unicamente da vontade do optante) não é de forma livre, pois exige um processo de jurisdição voluntária, em que, verificados requisitos objetivos e subjetivos, é homologada a opção.

A Emenda Constitucional de Revisão nº. 03/94 revogou o art. 32, §3º (em parte) e os §§ 4º e 5º (in totum), da Lei de Registros Públicos, pois não mais permitia a restrição temporal tanto para residência no País, quanto para o pedido de opção pela nacionalidade. 

A Emenda Constitucional nº. 54/07 deu ao artigo 12, I, c, da Constituição Federal a seguinte redação:

"Art. 12. São brasileiros:

I - natos:

...............................................

c) os nascidos no estrangeiro de pai brasileiro ou de mãe brasileira, desde que sejam registrados em repartição brasileira competente ou venham a residir na República Federativa do Brasil e optem, em qualquer tempo, depois de atingida a maioridade, pela nacionalidade brasileira;"

A referida emenda também inseriu o art. 95 no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias:

"Art. 95. Os nascidos no estrangeiro entre 07 de junho de 1994 e a data da promulgação desta Emenda Constitucional, filhos de pai brasileiro ou mãe brasileira, poderão ser registrados em repartição diplomática ou consular brasileira competente ou em ofício de registro, se vierem a residir na República Federativa do Brasil."

A nova redação da alínea "c", inciso I, art. 12 da CF/88, permite dupla interpretação, pois em uma primeira leitura não é possível identificar se os requisitos de residência no Brasil e do requerimento da nacionalidade referem-se apenas aos que venham a residir no Brasil ou se aplicam também aos registrados no órgão competente.

No entanto, com a leitura do art. 95 do ADCT percebe-se que a locução "os nascidos no estrangeiro de pai brasileiro ou de mãe brasileira, desde que sejam registrados em repartição brasileira competente" indica que, para fins de aquisição da nacionalidade brasileira, o registro em repartição brasileira competente é suficiente para declarar o sujeito como brasileiro nato sem que precise fixar residência no Brasil.

Dessa forma, a EC nº. 57/07, retomando o texto original da CF/88, positivou a necessidade da maioridade para a realização da opção e a possibilidade de registro em repartição brasileira no exterior. [01] Lembrando que o Consulado Brasileiro é extensão administrativa do território nacional e, pois, competente para a lavratura dos atos de registro (artigos 18 e 19 do Decreto-Lei 4.657/42). 

Com efeito, o texto constitucional continua incompatível com a restrição temporal prevista nos §§ 3º (em parte), 4º e 5º, do art. 32, da Lei nº. 6.015/73, mas é possível, ainda, fazer o registro previsto no § 2º do citado artigo (registro provisório), que não confere a qualidade de brasileiro nato ao indivíduo, o que somente se dará com a conclusão do processo de opção.

Compete ao juiz federal homologar a opção pela nacionalidade brasileira (art. 109, X, da CF/88). A Lei nº. 818, de 18 de setembro de 1.949, estabelece o seguinte procedimento:

a) Autuada a petição inicial instruída com a documentação necessária, o órgão do Ministério Público Federal será ouvido no prazo de cinco dias. Não há necessidade de audiência.

b) O juiz homologa a opção, se preenchidos os requisitos constitucionais

Como se trata de procedimento de jurisdição voluntária, aplica-se por analogia o disposto no art. 866 do CPC: entregam-se os autos ao requerente para que o Oficial do Registro Civil das Pessoas Naturais, independentemente de mandado, registre a "opção" pela nacionalidade brasileira, como determina o art. 29, VII, da Lei 6.015/73. Todas as observações constantes nos termos de nascimento anteriores a ela devem ser canceladas por averbação, a requerimento do interessado, nos termos do artigo 97 da Lei de Registro Públicos.            

Lembra-se que, conforme o § 2º do art. 29 da Lei de Registros Públicos, "é competente para a inscrição da opção de nacionalidade o cartório da residência do optante, ou de seus pais. Se forem residentes no estrangeiro, far-se-á o registro no Distrito Federal".

Em resumo, a EC nº. 54/07 uniformizou a situação jurídica dos nascidos no estrangeiro de pai brasileiro ou de mãe brasileira, que não estejam a serviço da República Federativa do Brasil, e que necessitam da concessão da nacionalidade brasileira para que possam exercitar todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana. Vale salientar que o registro provisório, a despeito de amenizar os óbices causados pela legislação nacional aos estrangeiros residentes no Brasil, não assegura a crianças e adolescentes todas as oportunidades e facilidades conferidas aos nacionais.


F O N T E S :

2ª ed., Atlas, 2003.

SILVA, José Afonso da. Direito Constitucional Positivo. 22ª ed., Malheiros, 2003.

Supremo Tribunal Federal – AC 70-QO/RS – Relator: Min. Sepúlveda Pertence

Supremo Tribunal Federal – RE 418096/RS – Relator:  Min. Carlos Velloso


Nota

  1. A exigência de registro nos órgãos competentes representa, para alguns autores, uma forma repristinação parcial e tácita do texto constitucional anterior à ECR nº. 03/94.
Sobre o autor
Glauco Pereira Almeida

Tabelião do 2º Ofício de Notas de Congonhas/MG

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALMEIDA, Glauco Pereira. Aquisição da nacionalidade originária e a EC nº 54/2007. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2205, 15 jul. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13153. Acesso em: 27 abr. 2024.

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