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A objetivação do recurso extraordinário na jurisdição contemporânea.

A criatividade judicial

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Agenda 04/10/2009 às 00:00

Conclusão

A polissemia das palavras e a distância material entre a generalidade do enunciado normativo e as peculiaridades do caso concreto a decidir e os métodos próprios de conhecimento da Constituição tornam a atividade do intérprete-aplicador muito relevante no Pós-Positivismo. Descobriu-se, com a nova compreensão das ciências culturais, que tais problemas, na realidade, são da essência do objeto da ciência jurídica, o Direito, cujo conhecimento se dá por conceitos. Com tais características irredutíveis, o intérprete-aplicador faz muito mais que descobrir a vontade do legislador (o sentido da norma). Faz a mediação e a superação da distância entre o abstrato e o concreto, escolhe os métodos jurídicos adequados e formula conceitos, tudo lidando com suas influências subjetivas sobre o objeto cognoscível.

Assim lida a jurisdição contemporânea com a experiência normativa. A ideologia jurídica prevalecente no século XIX, o Positivismo, que afirmava que "o juiz é a boca da lei" teve suas premissas sociológicas e filosóficas ruídas. A Teoria da Cognição judicial ganhou novos contornos com o constitucionalismo contemporâneo e a ideologia Pós-Positivista. O intérprete é criativo e não um mero repetidor da vontade do legislador.

Não se pode interpretar um texto normativo, senão com relação aos problemas jurídicos concretos, reais. Nenhuma decisão ocorre no vazio. Trata-se de uma conclusão realizada por meio de uma atividade interpretativa contextualizada, que leva em conta condições sociais e históricas, sem falar nos condicionamentos socioculturais, nos preconceitos ou na ideologia dos intérpretes. A aplicação jurisdicional de modelos interpretativos aos enunciados normativos no caso concreto ampliam-nos e enriquecem-nos, adquirindo novas possibilidades de utilização a casos semelhantes. Cada modelo jurídico, portanto, acaba por servir de precedente e ponto de partida para futuras aplicações.

Tomando em consideração essa criatividade do intérprete na formulação de modelos jurídicos, pode-se afirmar que os fundamentos de uma decisão ganham um lugar ímpar no processo contemporâneo (art. 93, X, CRFB/88), visto que não são conhecidos por um simples processo lógico-formal de subsunção. Na fundamentação estão as complexas razões determinantes da decisão criadas pelo método empírico-dialético. Demonstrada a argumentação jurídica (fundamentação), a sociedade civil poderá aferir a legitimidade das decisões.

Na jurisdição constitucional, essa atividade criativa do intérprete ainda é mais acentuada não só porque o intérprete se debruça sobre enunciados abertos, polissêmicos e indeterminados, mas também a rigidez constitucional e os consequentes postulados da força normativa e da máxima efetividade da Constituição acabam por colocar a Corte Constitucional acima dos demais poderes. Como as decisões desses tribunais acerca de matéria constitucional têm a força geral e obrigatória da lei, a criação da norma geral nos fundamentos dessas decisões acabam por se tornar mais uma fonte do Direito.

O STF é a Corte Constitucional do Brasil e exerce sua atribuição de guardião da força normativa da Constituição através de um sistema de controle misto (art. 60 c/c art. 102, caput, I, a e III, CRFB/88). Tradicionalmente não atribui-se eficácia erga omnes e vinculante (força de lei) às decisões do STF no controle difuso (RE) por questões processuais. Como a questão constitucional é conhecida de forma prejudicial à questão principal, não incidem esses efeitos que são correlatos à coisa julgada.

No entanto, a questão de constitucionalidade não se confunde com a questão principal desejada pelas partes. A ampliação do controle concentrado com eficácia erga omnes e força vinculante e as alterações promovidas pelo legislador ordinário suscitam essa conclusão. A questão principal é dependente da constitucional, mas é autônoma em virtude da posição que ocupa na hierarquia das leis, isto porque as decisões da Corte Constitucional também são fontes do Direito.

Além disso, realizar distinções de eficácia entre os sistemas de controle de constitucionalidade não se adéqua aos princípios que norteiam a jurisdição constitucional. Ambos têm por objetivo a Supremacia da Constituição através das mesmas técnicas de hermenêutica, por isso não se pode diferenciar os efeitos em razão da mudança do procedimento.

Essa criatividade, por outro lado, tem como limite a própria Constituição, que representa a vontade do povo. Por isso, não se pode afirmar que a jurisdição constitucional carece de legitimidade democrática. Da mesma forma que o legislador tem como limite a Constituição, a jurisdição constitucional também. Assim como aquela, o Poder Judiciário representa um dos três poderes que compõem a República Federativa do Brasil (art. 2º, CRFB/88). Isso não pode ser desconsiderado.

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Desta forma, a tese da "mutação constitucional" aplicada pelo STF para sustentar a abstração do controle difuso não significa que está atuando como Legislador Constituinte. Significa, sim, que está atuando nos estritos limites do poder jurisdicional conferido pela própria Constituição, legitimando técnica processual há muito aceita pelo legislador, com o fito de atribuir tutela efetiva às suas decisões como intérprete e guardião da Carta Magna.


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______________ Agravo Regimental em Agravo de Instrumento. Segunda Turma. AI-AgR 375.011/RS. Rel. Ellen Gracie. 05 out. 2004. DOU 28.10.2004.

______________ Habeas Corpus. Plenário. HC 82.424/RS. Rel. Maurício Corrêa. 17 set 2003. DOU 19.03.2004.

Sobre o autor
Anderson Estevam de Souza Leite

Advogado e Professor Universitário. Especialista em Processo Civil

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LEITE, Anderson Estevam Souza. A objetivação do recurso extraordinário na jurisdição contemporânea.: A criatividade judicial. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2286, 4 out. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13625. Acesso em: 23 dez. 2024.

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