INTRODUÇÃO
As relações jurídico-virtuais não tiveram, até o momento, a atenção necessária para sair da subalternidade e não mais se atrelarem aos ramos tradicionais do Direito.
No dizer de OPICE BLUM (apud PAIVA, 2001), as relações virtuais e seus efeitos são uma realidade, afigurando-se uma tendência a substituição gradativa do meio físico pelo eletrônico, o que já ocorre e justifica a adequação, adaptação e interpretação das normas jurídicas nesse novo ambiente. Urge, porém, o estabelecimento de diretrizes que proporcionem segurança às relações estabelecidas no campo virtual, dada a sua especificidade.
Salienta ELIAS1 (apud PAIVA, 2001) que estudiosos vêm desenvolvendo novos modelos de legislação em face da tecnologia e suas inevitáveis conseqüências no mundo jurídico: novos tipos penais; novos tipos tributários envolvendo princípios fundamentais, como territorialidade e competência, non olet (cobrança dos rendimentos oriundos de serviços ilícitos), subsunção tributária (nullum vectigal sine praevia lege); novas disposições sobre direito autoral e direito comercial, em especial no que se refere à cartularidade, literalidade e autonomia das obrigações cambiais frente às transações eletrônicas e magnéticas etc. Por outro lado – e com prioridade –, procuram adequar os casos concretos ao sistema legal vigente, visando solucionar os conflitos decorrentes da utilização da rede mundial de computadores.
Examinando esse panorama, LORENZETTI2 (apud DELGADO, 2002) afirma que na era digital é preciso repensar importantes aspectos relativos à organização social, à tecnologia, à privacidade e à liberdade do indivíduo. Observa, ainda, que muitos enfoques não apresentam a sofisticação teórica que semelhantes problemas requerem: esterilizam, obnubilados pela retórica, pela ideologia e pela ingenuidade.
O Direito Eletrônico – ramo autônomo da ciência jurídica – caracteriza-se por sua complexidade no definir relações sociais e negociais vinculadas a uma tecnologia sofisticada e em grau de rápida e intensa expansão. Para DELGADO3, essas regras, mais do que aquelas estruturadas, serão marcadas pela dinâmica que lhes imprimirá a evolução tecnológica, exigindo grande criatividade por parte dos pensadores jurídicos.
Assim, cristalina é a necessidade de se disciplinar as inúmeras situações fáticas ainda não contempladas no ordenamento pátrio, muito embora, hoje, afigure-se mais fácil ao aplicador do direito buscar esta normativa no Código Civil, para solucionar questões relativas à proteção de dados. Contudo, nem sempre será possível a aplicação analógica das normas ora existentes às peculiaridades, por exemplo, do contrato eletrônico, comércio eletrônico, documento eletrônico etc. Daí a urgência em o legislador preocupar-se com a segurança jurídica das relações virtuais.
Mas não é só isso. É preciso incutir na consciência dos juristas a premente inserção, no currículo das faculdades de Direito, de uma cadeira para estudo da informática, com fulcro no aprimoramento dos estudos jurídicos e, conseqüentemente, adequá-los às tendências mundiais, proporcionando, assim, soluções mais coerentes às questões surgidas no mundo virtual (PAIVA, 2001).
Ora, na falta de legislação específica, cabe aos profissionais do direito atentar para as minúcias do contrato eletrônico, com fundamento nos princípios basilares da livre manifestação de vontade e da obrigatoriedade do cumprimento do contrato (pacta sunt servanda), para conferir segurança às partes contratantes, afastando-se a má-fé (BRUNO, 2001).
De acordo com BARROS (2007), os litígios envolvendo matéria contratual podem e devem ser dirimidos com base nas disposições do Código Civil, porém de maneira subsidiária, já que na grande maioria dos casos essa legislação não é suficiente para resolvê-los da forma adequada.
Outro ponto que suscita dúvidas diz respeito à jurisdição. Como solucionar a questão cujo modus operandi envolve vários países? Há controvérsias, entendendo a maioria da doutrina que, se o fluxo de informações for direcionado para o Brasil, o juiz nacional poderá se declarar competente. Essa assertiva torna-se de melhor aceitação em sede de relações de consumo, em que o computador do consumidor ludibriado será tido como o local da prática do delito, justificando-se, assim, a competência do órgão judicial pátrio. Estudiosos do assunto informam que, de acordo com o art. 100 do CPC, "em matéria de responsabilidade civil, inclusive a contratual, é competente o foro do local do ato causador do dano. No entanto, na rede, a existência de espaços virtuais dificulta, senão inviabiliza a individualização do lugar onde se deu o evento danoso" (SAMPAIO; SOUZA, 2000).
É indubitável a carência de normas aptas a dirimir conflitos provenientes de relações virtuais. Nesse contexto, a importância de regras de Direito Eletrônico para compor danos resultantes de transações realizadas na rede mundial de computadores.
RELAÇÕES VIRTUAIS
A palavra "virtual" vem do latim virtus (que significa virtude, força, potência). Mas, afinal, o que é o virtual? Muitas tentativas são feitas no sentido de abarcar esta diversidade em uma única definição.
SOUZA4 define como virtuais nosso universo, realidades e comunidades; encontros, sexo e relacionamentos; empresas, amigos e animais de estimação etc..
Em seu livro O Que é o Virtual, LEVY5 (1996) apresenta interessante concepção de "virtualidade". Para começar, desmistifica uma falsa oposição entre o real e o virtual, afirmando que o virtual deve ser considerado como algo que existe em potencial. E prossegue:
[...] complexo problemático, o nó de tendências ou de forças que acompanha uma situação, um acontecimento, um objeto ou uma entidade qualquer, e que chama um processo de resolução à atualização.
No mesmo sentido, PAIVA (2001) assevera que não deve ser tomada como verdadeira a idéia de que existem dois mundos, um "virtual" e outro "humano", e sim que o mundo virtual está inserido no mundo humano, o que precisa ser levado a sério pelos doutrinadores, em virtude do impacto decisivo na sociedade.
E é justamente por constituir uma incontestável realidade que não se pode desprezar a influência da informática no cenário jurídico. Na verdade, o mundo virtual não precisa exteriorizar-se materialmente para gerar efeitos no mundo fático. Conectando-se à internet, é possível movimentar contas bancárias, efetuar pagamentos, realizar negócios etc. Assim, faz-se necessária ampla discussão sobre os problemas advindos da utilização da rede mundial de computadores, visando conferir segurança jurídica às relações concretizadas em seu âmbito.
TIPOS DE RELAÇÃO VIRTUAL
Muitas são as mudanças havidas no âmbito das relações humanas com o advento da internet, podendo-se destacar as seguintes:
- Infidelidade Virtual
Para GUIMARÃES6, a infidelidade virtual é um relacionamento erótico-afetivo mantido por meio da internet, consumando-se o adultério no caso de relações sexuais. Isto interessa ao Direito por envolver eventual dissolução do casamento ou da união estável.
PEREIRA (apud BEMBOM, 2000), em artigo publicado no jornal Estado de Minas, afirma que sempre haverá quem burle a lei para ir ao encontro da Lei do Desejo, nem sempre coincidente com a norma jurídica. Portanto, a infidelidade moral que se estabelece pela internet é apenas uma faceta da busca do desejo que o sistema legislativo pátrio não conseguirá solucionar satisfatoriamente por encontrar-se atado à noção de culpa.
Na relação virtual, a pessoa sai do seu espaço imaginário para relacionar-se com uma pessoa invisível, mas que está lá e lhe corresponde, podendo essa infidelidade acarretar o adultério propriamente dito. A Lei do Divórcio7 autoriza o pedido unilateral de separação ao cônjuge que foi vítima de infidelidade moral, como é a infidelidade virtual, pelo descumprimento de um dever legal, o que é considerado injúria grave.
Além das causas patológicas, a infidelidade também pode caracterizar-se fuga da vida real, na hipótese de falta de coragem do cônjuge para promover a separação formal.8 Aí está a razão da maioria dos relacionamentos virtuais.
- Delitos Cometidos pela Via Eletrônica
A doutrina classifica os delitos virtuais como puros (próprios) e impuros (impróprios). Para DAMÁSIO (apud LOPES, 2006), nos crimes puros, o objeto tutelado é a informática (segurança dos sistemas, titularidade das informações e integridade dos dados, dos periféricos e da máquina). Já nos crimes impuros, o agente se vale do computador para produzir resultado ofensivo ao mundo real, como ocorre com os crimes contra a honra (calúnia e difamação – arts. 138 e 139 do CP), que se consumam com o simples envio de e-mail.
Vale observar que o crime de pornografia infantil se consuma no ato do encaminhamento das imagens pelo agente, ou seja, no local onde está o computador que envia as imagens ilícitas. A localização do provedor de internet, no qual as imagens estão armazenadas, não interfere na avaliação do juízo que vai processar a ação judicial.9
- Documento Eletrônico
Segundo COSTA (2002), a informática tem provocado a quebra de inúmeros paradigmas, como ocorreu com a implementação do documento eletrônico, que é gerado, transmitido, acessado e armazenado em sua forma original constituída por bits, necessitando tão-somente de uma assinatura digital para ter validade jurídica.
A assinatura digital permite que arquivos gerados em computador possam ser reconhecidos como documentos em sua forma original, eletrônica, sem necessidade de impressão no papel.
- Contrato Eletrônico
Aos contratos virtuais vêm sendo aplicados alguns dos princípios que informam o Direito Civil, a saber: (i) autonomia da vontade; (ii) consensualismo; (iii) boa-fé; (iv) identificação; (v) autenticação (criptografia e assinatura digital); (vi) impedimento de rejeição; (vii) verificação e (viii) privacidade.
VENTURA (apud ALMEIDA, 2003)10 defende uma precisa identificação das partes contratantes para que um contrato eletrônico seja tido como válido, porém não esclarece em que momento deve realizar-se tal identificação, se anterior, posterior ou juntamente com a proposta.
Quanto à autenticação, diz o autor que cartórios eletrônicos, consagrados internacionalmente como ciber11 ou certification Authorities12, asseguram a veracidade dos documentos por meio de sistemas criptográficos que se valem de uma chave pública para codificar determinado texto de modo a deixá-lo ilegível, devendo-se utilizar uma chave privada para reverter ou traduzir tal codificação.13
No tocante à assinatura eletrônica, afirma VENTURA que esta é criptografada ao ser adicionada a determinado documento, ficando a autoridade certificante responsável por atestar sua veracidade e fornecer as chaves. Caracteriza-se, assim, como algo pessoal e intransferível, representativa de um fato registrado em programa de computador.
ALMEIDA (2003) diz vislumbrar nessa tecnologia o aperfeiçoamento dos meios tradicionais de elaboração de documentos públicos e privados, que passaram a ostentar peculiaridades técnico-informáticas próprias.
Segundo OLIVER ITEANU (apud ALMEIDA, 2003):14
O contrato de comércio eletrônico pode definir-se como o encontro de uma oferta de bens ou serviços que se exprime de modo audiovisual através de uma rede internacional de telecomunicações e de uma aceitação suscetível de manifestar- se por meio de interatividade.
Sendo assim, a natureza do contrato eletrônico é a mesma dos contratos clássicos por também pressupor um acordo de vontades, com o intuito de constituir, modificar ou extinguir relações jurídicas de cunho patrimonial, "cuja celebração se dá por meio de programas de computador".15
- Comércio Eletrônico
Transações de bens intangíveis, além dos materiais, pela internet constituem o elemento central da dinamicidade comercial contemporânea, caracterizando-se o e-commerce (ALMEIDA, 2003).
Para HAYNE et al, o comércio eletrônico desperta interesse, mas também muitas discussões jurídicas. Fruto da tecnologia advinda com a internet, o comércio eletrônico é atividade bastante recente que não comporta tratamento simplista e fracionado, devendo ser visualizado conjunturalmente, ou seja, como um elemento importante da "nova economia", à luz dos desdobramentos da globalização.
A dificuldade que se vislumbra nesse caso reside no acatamento, pelo Judiciário, do documento originado das transações comerciais por meio eletrônico, embora lhes sirva de comprovante, dada a ausência de lei regulamentadora do seu uso.
- Direito Autoral Eletrônico
Com o avanço das telecomunicações, é inadmissível pensar em estabelecer relações pessoais e comerciais sem o uso da ferramenta virtual. Assinale-se, porém, os conflitos decorrentes da violação de direito autoral, que antes da rede mundial de computadores não causavam tanta preocupação.
A Constituição Federal e a Lei n° 9.610/98 conferem proteção ao direito autoral que, na internet, encontra uma exceção: o fair use. Esse instituto, criado nos Estados Unidos da América com o fim de legitimar o uso de obras literárias veiculadas na rede mundial de computadores, desde que sem o intuito de lucro, não foi recepcionado pelo ordenamento pátrio, constituindo-se apenas uma discussão jurídica, nas palavras de BLUM e ABRUSIO (2002).
Não obstante esse fato, cabe ressaltar o pronunciamento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que shows realizados em logradouros públicos, nos quais não se cobra o ingresso, não violam direitos autorais, o que poderíamos chamar de um atípico "fair use" brasileiro16.
- Direito à Intimidade, à Vida Privada, à Honra e à Imagem da Pessoa
Ganha destaque no ambiente virtual a tutela dos direitos da personalidade (CF, art. 5º, X e CC, art. 11 usque 21).
De acordo com COSTA JÚNIOR (apud CESUL, 2007), na vida privada cogita-se da inviolabilidade da personalidade no seu mundo particular, à margem do mundo exterior. É o cidadão em seu isolamento moral, convivendo com a própria individualidade. O direito à privacidade veda quem quer que seja de imiscuir-se na vida particular do outro.
Aduz MARTINS (apud CESUL, 2007) que a questão acerca da desfiguração da imagem, na internet, deve merecer o mesmo tratamento legal conferido aos meios clássicos de comunicação. Por certo que toda violação dessa natureza constituirá, em última razão, violação à imagem do ofendido.
Para GRISARD (apud CESUL, 2007), a imagem, bem jurídico protegido pela Carta Magna (art. 5º, incisos V, X e XXVIII, alínea a), possui características peculiares. Além de direito personalíssimo, é absoluto (oponível erga omnes), indisponível (não pode dissociar-se do corpo humano), indissociável (por menos que a pessoa aprecie sua imagem não há como mudá-la) e imprescritível, podendo ser objeto de contrato entre pessoas físicas e jurídicas.
O CÓDIGO CIVIL
Desde que entrou em vigor, em janeiro de 2003, o novo Código Civil (arts. 1.011 e 1.016) vem sendo aplicado na resolução de conflitos decorrentes de relações virtuais (invasões por hackers, envio de mensagens não solicitadas (spam), entre outros), não obstante a necessidade premente de novas ferramentas jurídicas para lidar com essa questão. E é nesse contexto que aflora o Direito Eletrônico que, embora de forma precária, começa a fomentar uma nova disciplina.
Quando o assunto é invasão de privacidade, o art. 187 do Código Civil é claro ao estabelecer que "comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos maus costumes". Noutro momento, o Código enquadra a pessoa ou empresa que envia os conhecidos spam, sujeitando-se o agente a processo por danos morais ou financeiros. Isso vale também para os provedores que permitem este tipo de ação por parte dos usuários. Nesse sentido, decisão proferida pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina nos autos da Apelação Cível nº 2004.012152-0, DJSC de 19.08.04, pp. 34-35, de cuja ementa transcrevemos o seguinte excerto:
APELAÇÃO CÍVEL – INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – PUBLICAÇÃO DE ANÚNCIO EM PÁGINA DE CLASSIFICADOS EM SITE DA INTERNET – MENSAGEM OFENSIVA À HONRA, IMAGEM E NOME DO AUTOR DA DEMANDA – NECESSIDADE DE CONTROLE E FISCALIZAÇÃO POR PARTE DO PROVEDOR – DEVER DE INDENIZAR – QUANTUM CAPAZ DE COMPENSAR O LESADO E REPRIMIR ATOS SEMELHANTES PELO LESANTE – MAJORAÇÃO – RECURSO DO AUTOR PROVIDO E DA RÉ DESPROVIDO.
Nesse julgado, o Relator Desembargador JOSÉ VOLPATO DE SOUZA socorreu-se do Código Civil para fundamentar seu voto, porém reconhece que a questão ainda pende de regulamentação.
No que se refere ao envio de spam, urge a criação de um cadastro de spammers17 por órgãos de fiscalização não-governamentais, tal qual os cadastros de devedores inadimplentes, pois, segundo RONALDO LEMOS (apud BALERINI), Especialista em Direito da Tecnologia, a tendência é incriminar quem tem endereço físico, como os provedores de acesso e as empresas que prestam serviços on-line. E conclui o jurista: "Em vez de buscar a responsabilização do agente, busca-se a responsabilização do intermediário. Isto é completamente equivocado".
LILIAN LEMOS (2007), por sua vez, defende que os provedores sejam responsabilizados pelos conteúdos que expõem, não importando tal medida em cerceamento da liberdade de expressão nem censura, e sim no reconhecimento de que não existe liberdade sem responsabilidade, sem garantias éticas nas quais deve se pautar a construção nacional. Ressalta, todavia, que a linguagem do Código Civil é bastante abstrata e aberta, dificultando a definição do que é "desrespeitar os direitos na internet", e portanto não serve como instrumento para coibir abusos na rede mundial de computadores.
Nos dizeres de BLUM e BRUNO (2002), embora o legislador não tenha se preocupado em tratar especificamente das implicações jurídicas dos negócios virtuais, é nítido que pequenas regras introduzidas pelo novo Código Civil poderão surtir efeitos no mundo virtual.
Vale lembrar que tramita no Congresso Nacional mais de cento e cinqüenta projetos de lei sobre o tema, sendo salutar, talvez, incentivar a incorporação ao Código Civil em vigor de alguns pontos constantes das proposições legislativas.
CONCLUSÃO
É cristalino o avanço tecnológico vivenciado por grande parte do mundo, em especial pelo Brasil. De bom alvitre, portanto, que fosse criado um juizado especial para tratar dos conflitos decorrentes das relações virtuais, com magistrados dedicados exclusivamente ao exame das lides originadas no espaço eletrônico, devido à sua especificidade.
Por outro lado, há uma forte resistência à sistematização do Direito Eletrônico. Sem dúvida, um anacronismo que não se pode mais admitir, em face do avanço das modernas tecnologias e, também, por se tratar de um direito multifacetário e com peculiaridades próprias.
Com efeito, não é dever apenas do Direito Civil dispor acerca das conseqüências dos meios informáticos sobre os negócios jurídicos, pois, como bem observou MARIA HELENA DINIZ18, referindo-se ao novo estatuto civil:
Não se poderá decretar a sua velhice precoce. É verdade que nele não estão contidas questões sobre contratos eletrônicos, parceria entre homossexuais, experiência científica em seres humanos, direitos difusos, pesquisa com genoma humano, clonagem humana, efeitos jurídicos decorrentes da reprodução assistida, medidas sócio-educativas aplicadas à criança e ao adolescente, relações de consumo, entre outras. Essas e outras matérias não são objetos de estudo do Direito Civil, por pertencerem a outros ramos jurídicos. Então, em razão de suas peculiaridades, esses temas devem ser regidos por normas especiais. O novo Código é obra legislativa de grande importância, apesar de não ser perfeito, pois nenhuma obra humana o será. Almejar isso seria uma utopia, ou melhor, pretender o irrealizável.
LAWAND (2003) ensina que qualquer seara do conhecimento que faça uso dos meios informáticos, notadamente a rede mundial de computadores, será objeto de análise e estudo pelo Direito Eletrônico, que se espraia pelo Direito Civil, Direito Administrativo, Direito Penal, Direito Tributário, dentre outros. Trata-se de uma esfera do conhecimento sui generis, pois não há como abordá-lo, livre de equívocos, sem levar em consideração as demais.
E PATRÍCIA PECK (apud LAWAND, 2003)19 enfatiza:
O direito é resultado da união entre linguagem e comportamento. Quando a linguagem e o comportamento mudam, o direito também deve mudar. É o que está acontecendo com o direito em uma sociedade digital, como é a nossa hoje. (...) Para isto, a tecnologia vem contribuindo desde 1920, com a expansão dos veículos de massa e, mais recentemente, com o telefone celular, o e-mail, a internet, a banda larga, a TV interativa, e assim por diante. (...) O Direito Digital consiste na evolução do próprio direito, abrangendo todos os princípios fundamentais e institutos vigentes, assim como introduz novos institutos e elementos para o pensamento jurídico, em todas as sua áreas (Direito Civil, Direito Autoral, Direito Comercial, Direito Contratual, Direito Econômico, Direito Financeiro, Direito Tributário, Direito Penal, Direito Internacional etc.). Esse novo direito é resultante da aplicação da fórmula tridimensional do direito, com seus 3 elementos: fato, valor e norma, adicionado de um quarto elemento importantíssimo – o tempo.
A internet, como espelho do mundo real, envolve muitos perigos. Assim, cabe ao legislador, porém sem exageros, diminuir ao máximo as possibilidades de danos e fraudes no meio virtual, criando mecanismos que permitam ao Poder Judiciário assegurar aos cidadãos a proteção dos seus interesses, com rapidez e eficiência, uma vez que esta será a marca dos negócios e relacionamentos interpessoais no futuro.
O Direito possui como característica renovar-se constantemente, por meio de uma interpretação evolutiva do ordenamento jurídico, inspirada no progresso social. Sendo assim, e considerando as profundas transformações havidas neste século, impõe-se avançar nos estudos do Direto Eletrônico, para que sejam encontradas soluções adequadas aos problemas advindos das relações virtuais.