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Repercussão da nova legislação falimentar na disciplina das execuções fiscais

Agenda 04/04/2010 às 00:00

SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Alteração na ordem de classificação do crédito tributário. 3. Executivos fiscais como exceção à regra do art. 6º, caput, da Lei nº 11.101/2005. 4. Destinação dos valores decorrentes da arrematação em execução fiscal diante da decretação da falência. 5. Satisfação do crédito tributário no novo regime falimentar. 6. Bibliografia.

Resumo: examina alterações operadas com o advento da Lei n.º 11.101/2005 quanto à disciplina das execuções fiscais no âmbito falimentar, como a nova posição atribuída ao crédito tributário na ordem de classificação e o procedimento para sua satisfação.

Palavras-Chave: Nova lei de falências. Execução fiscal. Crédito tributário.


1. Introdução

Quando da nova sistemática do Direito Empresarial, com o advento da Lei nº 10.406/2002, a novel legislação civil já apontava a necessidade de uma revisão na disciplina dos institutos da concordata e da falência, que se apresentasse não apenas mais condizente com a preocupação de manutenção da sociedade empresária, mas, mesmo quando essa restasse infrutífera, pudesse denotar um avanço no sentido de albergar os valores da segurança e eficiência.

Com esses objetivos, foi editada a nova Lei de Falências e Recuperação de Empresas (Lei nº 11.101/2005), acompanhada da Lei Complementar nº 118, que alterou dispositivos do Código Tributário Nacional.

Essas novas leis trouxeram importantes repercussões na seara da recuperação dos créditos fiscais. Algumas privilegiaram a proteção do mercado e dos negócios empresariais, em detrimento dos interesses do fisco. Dentre elas destaca-se a relativização do privilégio do crédito tributário, que passou a ser postergado, no regime falimentar, em relação ao crédito com garantia real.

Outras, ao contrário, procuraram favorecer a arrecadação fiscal. V.g., o art. 186, parágrafo único, III, do CTN, introduz novidade em relação à proteção da multa tributária no âmbito falimentar, havida como inexigível em vista da redação das Súmulas 192 [01] e 565 [02] do STF. No entanto, a aparente atenuação da preferência originalmente prevista na redação do art. 186, do CTN, agora consubstanciada pela previsão expressa no tocante à exigibilidade da multa tributária em face da massa falida, não parece ensejar repercussão de vulto na arrecadação fiscal. Explicamos: a penalidade figura em penúltimo lugar na ordem de preferências esculpida do art. 83 da Lei falimentar, em seu inciso VII, posposta a todos os créditos quirografários e precedendo apenas aos subordinados: os créditos previstos em lei ou contrato e os devidos aos sócios e administradores sem vínculo empregatício.

Assim, sabido que a Fazenda Pública persegue a satisfação de seu crédito através do rito disciplinado pela Lei nº 6.830/80 (Lei das execuções fiscais), e que a decretação da falência do empresário ou da sociedade empresária acarreta inevitáveis implicações materiais e processuais em tal mister, analisaremos, a seguir, a repercussão da nova disciplina falimentar na seara das execuções fiscais.


2. Alteração na ordem de classificação do crédito tributário

Classificar os créditos numa sistemática que se funda no tratamento paritário dos credores implica, em essência, reconhecer a necessidade de proteção a direitos e compatibilizar situações de desigualdades. Assim, com essa classificação, almeja a lei a harmonia dos interesses dos credores sobre o ativo do devedor.

Nesse escopo de harmonização, a Lei nº 11.101/2005 e a LC 118/2005 promoveram alterações significativas na ordem de preferência dos créditos dentro da falência.

De um lado, a redação do art. 83, I, da Lei nº 11.101/2005 limitou o privilégio dos créditos trabalhistas a 150 salários-mínimos, operando uma sensível redução da anterior preferência desses créditos.

De outro, tratou a LC 118/2005 de modificar a redação do art. 186, do CTN [03] e relativizar a preferência que até então gozava o crédito tributário em relação às demais dívidas do devedor, excetuadas as trabalhistas. Relativização que se verifica na inclusão dos créditos decorrentes de acidentes do trabalho ao lado dos créditos trabalhistas. E também na preferência outorgada aos créditos com garantia real sobre os de natureza fiscal.

Com a sua inclusão no caput do art. 186 do CTN, passaram os créditos decorrentes de acidente trabalho a também preferir ao crédito tributário. E, no caso do crédito acidentário, sem o limite de 150 salários mínimos aplicado aos créditos trabalhistas.

Além disso, na atual disciplina, a preferência do crédito tributário passa a subsistir apenas em face da parcela da dívida com garantia real que suplantar o quantum do próprio bem gravado. Na vetusta sistemática, conquanto os créditos tributários com fatos geradores anteriores à quebra restassem preteridos pelos encargos e dívidas da massa falida e pelos bens e valores passíveis de restituição, ainda assim, preferiam aos créditos com garantia real.

Destaque-se que a expressão créditos tributários abrange também os previdenciários, parafiscais e contribuições, independentemente de sua natureza e tempo de constituição. Tal entendimento se justifica porque aquele conceito trata de créditos públicos [04].

Segundo Waldo Fazzio Júnior [05], a preferência dos créditos com garantia real, especialmente os bancários assegurados por bens móveis ou imóveis, sobre os créditos tributários, na falência, amplia as margens de segurança dos investimentos das instituições financeiras nas empresas. Logo aumenta as possibilidades de reaver os valores desses bens, em caso de insolvência do empresário devedor, gerando, no mínimo, uma redução de risco.

Sintetizando, em decorrência das modificações acima expostas, de acordo com a sistemática atual, a hierarquia de preferências segue a seguinte ordem:

1.Créditos derivados de relações de trabalho, limitados a 150 (cento e cinqüenta) salários mínimos [06] por credor e créditos acidentários;

2.Créditos com garantia real até o limite do valor do bem gravado;

3.Créditos tributários;

4.Créditos com privilégio especial;

5.Créditos com privilégio geral;

6.Créditos quirografários;

7.Multas contratuais e penas pecuniárias;

8.Créditos subordinados.

Saliente-se que, para facilitar a reativação do falido, criou-se o denominado crédito extraconcursal, dividido em duas espécies: a) crédito extraconcursal por fornecimento de produtos e serviços durante a fase de recuperação judicial convolada em falência (parágrafo único, do art. 67) e b) crédito por quantias fornecidas à massa pelos credores (art. 84, II). Essas duas espécies de crédito estão em primeiro lugar na classificação, superando o trabalhista e o acidentário, privilegiando-se os terceiros que confiaram na plena recuperabilidade da empresa.


3. Executivos fiscais como exceção à regra do art. 6º, caput, da Lei nº 11.101/2005

Conforme preceitua o art. 6º, caput, da Lei nº 11.101/2005, a prescrição das obrigações do devedor suspende-se com a decretação da falência. E a das obrigações do devedor em recuperação judicial, com o deferimento do processamento desta. Em ambas as hipóteses o prazo prescricional volta a fluir com o trânsito em julgado da sentença de encerramento da falência ou da recuperação judicial. Não obstante, não se suspende a prescrição das obrigações de que era credor o falido ou titular da empresa em recuperação, nem a fluência de prazos decadenciais, mesmo das obrigações devidas por eles.

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Além disso, outra das principais conseqüências da decretação da falência em relação aos credores do falido é a suspensão das execuções individuais em curso. Trata-se de decorrência da prolação da sentença declaratória da falência que faz iniciar o processo de execução concursal do empresário ou da sociedade empresária.

Andou bem o legislador, uma vez que se mostraria inócuo que os credores pudessem continuar exercendo individualmente sua pretensão de cobrança judicial, simultaneamente à tramitação da execução concursal. Evitou-se o desenvolvimento de duas medidas judiciais de idênticas finalidades, a execução individual e a concursal. Ademais, foram prestigiados os princípios da celeridade e da economia processual, expressamente consignados no art. 75, parágrafo único, da Lei nº 11.101/2005, como balizadores do processo falimentar.

Alguns doutrinadores costumam advogar que a exceção à regra da suspensão das execuções, quando da decretação da falência, abrange as execuções fiscais, as ações que demandam quantia ilíquida e as reclamações trabalhistas. Data vênia, da leitura do dispositivo pertinente (art. 6º) depreende-se que a única exceção à regra da suspensão das execuções refere-se às execuções fiscais. Conforme a lei de regência, a decretação da execução concursal apenas não inibe o prosseguimento dos executivos fiscais. Nesse sentido, o art. 187, do CTN, preceitua que o crédito tributário não participa de concurso de credores.

E as ações que demandam quantia ilíquida e as reclamações trabalhistas, tecnicamente falando, não são execuções, mas ações de conhecimento. E os processos de conhecimento contra o devedor falido ou em recuperação não se suspendem pela superveniência daqueles institutos, tendo em vista dispositivo expresso da lei.

Além das execuções fiscais, Fábio Ulhoa Coelho [07] aponta duas situações a considerar, nas quais cabe ao juiz estender o rol de exceções à regra geral de suspensão das execuções individuais em face do devedor. Segundo o doutrinador, devem continuar tramitando simultaneamente à falência:

a)Execução individual com hasta já designada. O magistrado do juízo universal da falência pode, quando da sentença declaratória, determinar que não se suspendam as execuções individuais com hasta já designada, como medida de economia processual. Ora, se um dos objetivos da falência é a venda dos bens do ativo da falida, e a execução individual estando já adiantada a ponto de se encontrar às vésperas da alienação judicial, determina o princípio da economia que se realize o ato nesta última.

Nesse sentido, a hasta é realizada na época da designação, mas o seu produto não é levantado pelo exeqüente, e sim entregue à massa falida. Dessa forma, o credor que movia a execução individual deverá habilitar o seu crédito na falência.

b)Execução individual com hasta já realizada. Claro está que esta execução não se suspende porque, em verdade, o bem da devedora já foi liquidado. Considera-se que a execução individual atingiu seu objetivo antes da decretação da execução concursal. Em tal hipótese, o credor que movia a execução individual levanta, do produto apurado em hasta, o valor de seu crédito. Se, acaso o produto da venda judicial do bem penhorado não for suficiente para a satisfação do crédito exeqüendo, o credor poderá habilitar na falência o saldo remanescente. Por outro lado, se, após a satisfação do credor individual, restar ainda produto da hasta, será entregue à massa falida.


4. Destinação dos valores decorrentes da arrematação em execução fiscal diante da decretação da falência

Como já abordamos em tópico precedente, a execução fiscal constitui exceção à regra da suspensão das execuções em face do devedor. Questão tormentosa, ainda não pacificada na doutrina nem na jurisprudência, devido, inclusive, à recente modificação operada pela nova lei de falências, diz respeito à destinação dos valores decorrentes da arrematação em execução fiscal, diante da decretação da falência.

Neste ponto, vale frisar a divergência de entendimentos acerca da destinação do montante apurado em hasta pública, como decorrência da constrição de bens da devedora, quando da decretação da falência.

Um dos entendimentos, consubstanciado na decisão infra, tende a outorgar um privilégio odioso à Fazenda, malferindo o princípio da par conditio creditorum [08] e da execução concursal.

Processual Civil. Execução Fiscal. Massa Falida. Bens Penhorados. Arrematação. Destinação do valor arrecadado – Lei nº 6.830/80 (arts. 5º e 9º) – súmula 44 TFR.

A questão, por si só, não paralisa o processo de execução fiscal, não desloca a competência para o juízo da falência, nem desconstitui a penhora realizada anteriormente à decretação de falência. Aparelhada a execução fiscal, o produto da arrematação não é colocado à disposição da massa falida. (STJ, Resp. 109705/RS). (grifamos).

Em sentido diverso, Julio Kahan Mandel [09] leciona que, no caso de falência do devedor, se o credor já tiver obtido a penhora de algum bem, por economia processual, o bem poderia ser vendido em leilão normalmente e o produto da venda seria revertido para a massa. Assevera o doutrinador que, na prática, isso somente será levado a cabo se o exeqüente já tiver despendido os custos para promover o leilão, pois se o produto da venda for encaminhado para a massa – em observância ao princípio par conditio creditorum e à execução concursalo credor somente terá mais despesas se prosseguir com a execução, sem uma previsão rápida de reembolso.

Tal entendimento tem aplicação direta em relação aos executivos fiscais, especialmente agora que foi preterido, na falência, em detrimento do crédito com garantias.

Assim, no âmbito das execuções fiscais, em se tratando de constrição judicial operada anteriormente à quebra, procede-se da forma como já vinha entendendo os pretórios, ainda na vigência do Decreto-Lei nº 7.661/45. Isto é, o bem será levado à hasta pública e o produto da venda será revertido para o juízo universal da falência.

Execução Fiscal. Falência. Anterioridade da Penhora.

Não sujeição dos bens penhorados à arrecadação do juízo falimentar – primazia dos créditos tributários que, no entanto, é relativa, cedendo diante dos créditos trabalhistas – (...) produto da arrecadação que deverá ser posto à disposição do juízo da falência (...) (JTJ 120/329) Outros: JTJ 118/328; RSTJ 79/143 e 71/34. (grifamos).

EXECUÇÃO FISCAL E FALÊNCIA DO EXECUTADO APÓS A PENHORA. CLASSIFICAÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO.

1. A Corte Especial concluiu, por maioria, que: o produto arrecadado com a alienação de bem penhorado em Execução Fiscal, antes da decretação da quebra, deve ser entregue ao juízo universal da falência. (REsp 188.418YRS, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ de 27Y05Y2002);

2. O juízo da falência é indivisível e competente para todas as ações e reclamações sobre bens, interesses e negócios da massa falida, ressalvada a cobrança judicial do crédito tributário que não se sujeita a concurso de credores ou habilitação em falência, concordata, inventário ou arrolamento;

3. Deveras, o crédito tributário prefere a qualquer outro, seja qual for a natureza ou o tempo da constituição deste, ressalvados os créditos decorrentes da legislação do trabalho. (Arts. 186 e 187, do CTN c.c. art. 7º, da Lei de Falências e art. 29, da Lei de Execução Fiscal);

4. O Concurso de Credores caracteriza-se como um incidente da fase de pagamento, no qual os créditos são verificados, classificados e implementados. Ressalva do ponto de vista do Relator no sentido de que remeter o produto da expropriação da execução fiscal significa submeter o erário ao concurso de credores em juízo alhures, violando a norma complementar federal;

5. A exegese escorreita que preserva tanto as prerrogativas do Estado quanto o privilégio dos créditos necessarium vitae, como soem ser os trabalhistas e derivados de ações acidentárias, recomenda que, informado o juízo fazendário fiscal pelo juízo falimentar acerca dos créditos preferenciais constituídos ou a constituir, reserve a parcela necessária a esse implemento e só após proceda ao pagamento das preferências tributárias, remetendo a sobra ao juízo da falência.

6. Recurso especial desprovido, ressalvado o entendimento do Relator, mercê de mantida a força uniformizadora da jurisprudência. (RESP nº 658.487/PR (2004/0065348-4), Rel. Exmo. Sr. Min. LUIZ FUX, 1ª T./STJ, Unânime, julg. em 05.05.2005, DJ1 nº 101, 30.05.2005, p. 238). (grifamos).

PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. FALÊNCIA SUPERVENIENTE. PRODUTO OBTIDO COM A ALIENAÇÃO DOS BENS. ENTREGA AO JUÍZO UNIVERSAL. MATÉRIA PACIFICADA.

1. A Corte Especial consolidou entendimento no sentido de que a falência superveniente do devedor, por si só, não tem o condão de paralisar o processo de execução fiscal, nem de desconstituir a penhora realizada anteriormente à quebra. No entanto, o produto da alienação judicial dos bens penhorados deve ser repassado ao juízo universal da falência para apuração das preferências. (RESP 188.148/RS, Min. Humberto Gomes de Barros, DJ de 27/05/2002);

2. Agravo regimental provido para negar provimento ao recurso especial. (AGRG NOS EDCL NO RESP Nº 421.994 - RS (2002/0032970-3), Rel. o Exmo. Sr. Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, 1ªT./STJustiça, unânime, julg. em 09.09.2003, DJ1 nº 192, 06/10/2003, p. 208). (grifamos).

Execução fiscal. Falência. Executado. Crédito tributário.

A questão consiste em saber qual a destinação judicial de bens penhorados em execução fiscal, na hipótese em que a executada entrou em falência após a penhora. A Turma negou provimento ao recurso, invocando a jurisprudência consolidada na Corte Especial no Resp. 188.148-RS, DJ 27/5/2002, em que prevaleceu a tese de que a decretação da falência não paralisa o processo de execução fiscal, nem desconstitui a penhora, uma vez que o sistema jurídico brasileiro livra o Estado de habilitar seus créditos em processo falimentar. Ademais, o produto da alienação judicial dos bens penhorados deve ser entregue ao juízo universal da falência para apuração de privilégios e eventual rateio entre os credores. O Min. Relator ressalvou seu entendimento pessoal no sentido de que o produto da arrecadação deveria permanecer no juízo executivo. Resp. 422.112-RS, Rel. Min. Luiz Fux, julgado 8/10/2002. (grifamos).

5. Satisfação do crédito tributário no novo regime falimentar

Preceitua o art. 187, caput, do CTN, com a redação determinada pela Lei Complementar nº 118/2005: A cobrança judicial do crédito tributário não é sujeita a concurso de credores ou habilitação em falência, recuperação judicial, concordata, inventário ou arrolamento.

Por gozarem de foro privilegiado, os créditos de natureza fiscal, parafiscal e trabalhista não se sujeitam à verificação de créditos. Embora silente, a novel legislação falimentar não alterou as exceções legais no que se refere à habilitação de créditos.

Assim, não se sujeitam à habilitação de créditos: a Fazenda Pública, o Instituto Nacional de Previdência Social e determinadas entidades paraestatais e fundos, por gozarem de foro privilegiado.

EMENTA: PROCESSUAL – EXECUÇÃO FISCAL – MASSA FALIDA – BENS PENHORADOS – DIREITO OBTIDO COM A ARREMATAÇÃO – ENTREGA AO JUÍZO UNIVERSAL - CREDORES PRIVILEGIADOS.

I – A decretação da falência não paralisa o processo de execução fiscal, nem desconstitui a penhora. A execução continuará a se desenvolver, até a alienação dos bens penhorados;

II – Os créditos fiscais não estão sujeitos a habilitação no juízo falimentar, mas não se livram de classificação, para disputa de preferência com os créditos trabalhistas (DL 7.661/45, art. 126);

III – Na execução fiscal contra o falido, o dinheiro resultante da alienação de bens penhorados deve ser entregue ao juízo da falência para que se incorpore ao monte e seja distribuído, observadas as preferências e as forças da massa. (Resp. 188.148/RS, Corte Especial, rel. Min. Humberto Gomes de Barros).

Fonte: DJ 25.2.2004, pg.: 00097. (grifamos).

Conforme já apontamos, a decretação da falência do devedor não suspende o processamento dos executivos fiscais propostos antes da caracterização do estado falimentar, nem impedirá que outros venham a ser ajuizados posteriormente.

Tal questão, aliás, tem suscitado intensos debates na jurisprudência e na doutrina, no que se refere ao procedimento a ser observado pela Fazenda Pública para a satisfação do seu crédito, já que não participa do concurso com os demais credores.

Nesse ínterim, três propostas são suscitadas no âmbito doutrinário.

A primeira corrente tem sufragado que, como o executivo fiscal não sofre suspensão em decorrência da decretação da falência, o juízo fiscal poderá penhorar qualquer bem da massa, caso a execução fiscal seja ajuizada após o estado de falência; ou, simplesmente, subsiste indiferente à quebra e, mantendo a constrição sobre o bem penhorado, impede sua arrecadação pelo juízo universal da falência. Em ambas as hipóteses, caberia ao juízo da execução fiscal expropriar os bens e, se após o adimplemento da Fazenda remanescer algum numerário, o que sobejar será enviado ao juízo universal para consolidação do ativo.

A segunda corrente considera mais razoável, mantida a penhora já efetuada, submeter o bem penhorado à administração do juízo universal, transferindo-lhe o bem devidamente onerado. E, sendo o caso de ação posterior à declaração da falência, proceder-se-ia à efetuação da penhora, no juízo da quebra, no rosto dos autos da execução coletiva.

A terceira corrente defende, em qualquer das hipóteses, o aconselhamento para que o juízo da execução singular se limite a oficiar ao da execução concursal requerendo a reserva de numerário suficiente.

Expostas as correntes, passemos às ponderações.

A primeira corrente incorre em equívoco ao colocar em choque os juízos, malferindo o princípio do juízo universal da falência. Vale salientar que o crédito tributário apresenta, como uma de suas preferências, a não-sujeição, em sua cobrança judicial, à habilitação na falência. A competência para processar a execução da dívida ativa da Fazenda Pública exclui a de qualquer outro juízo, inclusive o da falência.

A segunda, no que tange à "penhora no rosto dos autos" é destituída de fundamento legal, pois não lhe serve o disposto no art. 674 do CPC, por não se coadunar ao caso. Nesse sentido, corroborando esse entendimento, assevera Julio Kahan Mandel [10] que, quanto aos créditos fiscais, a jurisprudência definirá como deverão se comportar, especialmente na falência, pois muitos Procuradores, ao arrepio da lei falimentar de 1945 quando em vigor, ao invés de pedir a reserva de crédito, buscavam a penhora do crédito no rosto dos autos.

PROCESSO CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. PENHORA NO ROSTO DOS AUTOS. FALÊNCIA. PREVISÃO LEGAL. ART. 187 DO CTN, ART. 674 DO CPC E 29 DA LEF.

I - A cobrança judicial da dívida ativa da Fazenda Pública não é sujeita a concurso de credores ou habilitação em falência, concordata, liquidação, inventário ou arrolamento, nos termos do art. 187 do CTN. O art. 29 da LEF também traz disposição semelhante.

II - O art. 674 do CPC autoriza a penhora no rosto dos autos e assim se deve proceder quando se tratar de execução fiscal promovida pela União Federal contra massa falida.

III - Agravo provido. (TRF/1ª Reg., AG 2001.01.00.024929-8/MG, Des. Fed. Cândido Ribeiro, DJ de 28.02.2002). (grifamos).

A terceira corrente, a nosso ver, traz a solução mais plausível. Em sede de execução fiscal, a reserva de bens do devedor falido, nos autos do processo de quebra, em garantia do débito exeqüendo, conta com a proteção do art. 31 da Lei nº 6.830/80.

LEF, Art. 31. Nos processos de falência, concordata, liquidação, inventário, arrolamento ou concurso de credores, nenhuma alienação será judicialmente autorizada sem a prova de quitação da Dívida Ativa ou a concordância da Fazenda Pública. (grifamos).

Se os bens arrolados no processo de falência somente podem ser alienados mediante prova da quitação da dívida ativa ou após a concordância expressa da Fazenda Pública, não procede o receio de que o crédito fiscal seja preterido por outros não privilegiados.

Em virtude de tais argumentos, a jurisprudência tem considerado idônea a garantia constituída de reserva de recursos no juízo falimentar.

EXECUÇÃO FISCAL. FALÊNCIA DA EXECUTADA.

1. Não estando o crédito tributário sujeito a concurso de credores, nem a habilitação em falência, deve a entidade credora requerer a expedição de ofício ao juiz do processo falimentar, solicitando reserva de recursos;

2. Enquanto não apurado o acervo da massa, nem pago o crédito, a execução deve permanecer suspensa, não incidindo a prescrição;

Recurso provido (TRF/2ª Reg., AC 90.02.26241-8/RJ, Des. Fed. Clélio Erthal, DJ de 09.04.1991). (grifamos).

PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO CONTRA MASSA FALIDA.

1. Constatada a falência da devedora, instaura-se a execução, citando-a na pessoa do síndico. Como o crédito tributário é privilegiado, não necessitando a Fazenda Pública de habilitar-se no respectivo processo, basta ao juiz da execução expedir ao juízo da falência, solicitando reserva de recursos;

2. Tendo a Fazenda uma sentença a seu favor, não necessita inscrever a dívida por ela representada, com vistas à obtenção de novo título executivo; basta executá-la;

- Recurso provido. Decisão reformada (TRF 2ª Reg., AI 89.02.03090/RJ, Des. Fed. Clélio Erthal, DJ de 04.12.1990). (grifamos).

PROCESSUAL CIVIL – EXECUÇÃO FISCAL - A COBRANÇA JUDICIAL DA DÍVIDA ATIVA DA FAZENDA PÚBLICA NÃO ESTÁ SUJEITA A CONCURSO DE CREDORES EM FALÊNCIA - A RESERVA DE BENS GARANTE O DIREITO DA FAZENDA.

1. A cobrança judicial da dívida ativa da Fazenda Pública não está sujeita à habilitação em falência ou concordata. Isto porque, havendo numerário para a satisfação do crédito, o síndico efetuará o pagamento. Porém, não havendo, o juízo da execução deverá pedir a reserva de bens, junto ao juízo falimentar, para que o pagamento ocorra no momento da liquidação, respeitada apenas a preferência absoluta do crédito trabalhista.

2. Agravo improvido. (TRF 2ª Reg. AGV 17175/RJ, Des. Fed. Wanderley de Andrade Monteiro, DJ de 18.07.2002). (grifamos).

Em casos tais, quando da expedição de ofício ao juízo universal da falência, a execução deverá ser suspensa até que seja apurada da massa falida o quantum necessário à satisfação do crédito tributário.


6. Bibliografia

JÚNIOR, Waldo Fazzio. Nova lei de falência e recuperação de empresas. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2006.

COELHO, Fábio Ulhoa. Comentários à Nova Lei de Falências e de Recuperação de Empresas. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 2007.

PAIVA, Luiz Fernando Valente de (coordenação). Direito Falimentar e a Nova Lei de Falências e Recuperação de Empresas. São Paulo: Quartier Latin, 2005.

HARADA, Kiyoshi. Lei de execução fiscal. Aspectos polêmicos. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n 1463, 4 jul. 2007. Disponível em <http://jus.com.br/artigos/10086>. Acesso em: 13 out. 2007.


Notas

  1. Súmula 192, STF: Não se inclui no crédito habilitado em falência a multa fiscal com efeito de pena administrativa.
  2. Súmula 565, STF: A multa fiscal moratória constitui pena administrativa, não se incluindo no crédito habilitado em falência.
  3. CTN, Art. 186. O crédito tributário prefere a qualquer outro, seja qual for sua natureza ou o tempo de sua constituição, ressalvados os créditos decorrentes da legislação do trabalho ou do acidente de trabalho. Parágrafo único. Na falência: I – o crédito tributário não prefere aos créditos extraconcursais ou às importâncias passíveis de restituição, nos termos da lei falimentar, nem aos créditos com garantia real, no limite do valor do bem gravado; II – a lei poderá estabelecer limites e condições para a preferência dos créditos decorrentes da legislação do trabalho; e III – a multa tributária prefere apenas aos créditos subordinados.
  4. A prevalência dos interesses do Fisco, em nosso direito, remonta ao Alvará Real de 1756, D. José I, onde se asseguraram os direitos das fazendas na insolvência dos comerciantes prejudicados pelo terremoto de Lisboa.
  5. JÚNIOR, Waldo Fazzio. Nova lei de falência e recuperação de empresas. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2006.
  6. A lei estabelece que os trabalhadores que devem receber até 150 salários mínimos terão prioridade no pagamento durante o processo de falência (artigo 83). Acima desse limite, as dívidas trabalhistas tornam-se créditos quirografários (sem preferência).
  7. COELHO, Fábio Ulhoa. Comentários à Nova Lei de Falências e de Recuperação de Empresas. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 2007.
  8. Igualdade das condições do crédito.
  9. PAIVA, Luiz Fernando Valente de (coordenação). Direito Falimentar e a Nova Lei de Falências e Recuperação de Empresas. São Paulo: Quartier Latin, 2005.
  10. PAIVA, Luiz Fernando Valente de (coordenação), op. cit. p. 136.
Sobre o autor
Tiago Murilo Pereira Lima

Servidor do Ministério Público de Pernambuco. Pós-graduando em Direito Público pela Escola Superior da Magistratura de Pernambuco.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LIMA, Tiago Murilo Pereira. Repercussão da nova legislação falimentar na disciplina das execuções fiscais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2468, 4 abr. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14600. Acesso em: 10 jan. 2025.

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