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Limites jurídicos ao princípio da informalidade no processo do trabalho

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Agenda 26/04/2010 às 00:00

4 LIMITES JURÍDICOS AO PRINCÍPIO DA INFORMALIDADE NO PROCESSO DO TRABALHO: CONFRONTO PRINCIPIOLÓGICO

4.1 INFORMALIDADE X JUS POSTULANDI

Como tratado no capítulo 2.1, o jus postulandi é um dos fundamentos que embasam a aplicação do princípio da informalidade, apesar de não ser o único. O princípio da informalidade é uma norma principiológica advinda da leitura de diversas outras no direito processual do trabalho.

São normas que visam à simplificação do procedimento, redução das formalidades, redução da possibilidade de incidentes que possam procrastinar o bom andamento da marcha processual com discussões desnecessárias. Em especial, há a previsão da concentração de fases, do recurso realizado por simples petição, da restrição aos meios de impugnação das decisões judiciais e da irrecorribilidade das decisões interlocutórias. Os princípios da proteção e da ampliação do acesso à justiça em conjunto com exercício do jus postulandi pelas partes impõem que o processo trabalhista seja simples e célere, atuando diretamente sobre os sujeitos da relação jurídica processual (partes da relação jurídica de direito material e juiz) e sobre o legislado. Tudo isso sempre tendo por fim a realização do direito material e a busca da verdade real.

No momento em que é colocado como objetivo a busca da verdade real, não se poderia exigir de alguém, cujo conhecimento técnico para a prática de atos postulatórios é, em regra, insuficiente, que sejam respeitados todos os rigores formais típicos de processo judicial. Por essa razão, nesses casos, o princípio da informalidade ganha maior vulto e importância.

Aqui, então, faz-se uma afirmação que será provada, com base nas premissas trazidas nos capítulos anteriores, através de situações hipotéticas. O princípio da informalidade somente deve ser aplicado em sua inteireza nos casos em que houver o exercício direto do jus postulandi pelas partes, independentemente de ser autor ou réu.

Exemplifique-se: um empregador humilde e analfabeto comparece à audiência na data marcada, sem que esteja assistido de advogado para defender seus interesses e produzir sua defesa. No presente caso, o princípio da informalidade deveria ser aplicado para permitir que o juiz esclareça de forma simples e informal que a não impugnação dos fatos aduzidos pelo autor gerará contra ele a presunção de veracidade dos fatos articulados na inicial (segundo efeito do princípio da informalidade no âmbito processual, qual seja, servir como mandamento finalístico de otimização para uma atuação mais informal e diligente do magistrado; capítulo 2.1).

De igual forma, o princípio da informalidade deveria ser aplicado para que o juiz, lendo a inicial para o Reclamante, pergunte a este, com imparcialidade, sobre sua versão dos fatos narrados na exordial, possibilitando que fosse aduzida a defesa oralmente.

Em um outro exemplo, de conclusão diametralmente oposta, já não há razão para aplicação do princípio da informalidade em sua inteireza. É o que ocorre quando a parte está assistida por advogado, uma vez que há a presunção de que a parte está assessorada por profissional idôneo e com conhecimento técnico para defender seus interesses em juízo. Quais seriam o valor defendido e o fundamento para que seja aplicado o princípio da informalidade a uma petição inicial redigida por advogado que não contenha o pedido expresso de condenação de um dos reclamados, quando consta este da relação das partes, de forma a que se considere o pedido como constante na reclamação trabalhista?

É neste ponto que se deve tomar bastante cuidado para se evitar que, em nome do princípio da informalidade, sejam maquilados erros e a deficiência de maus profissionais. Deve-se lembrar que para Alexy (apud AMORIM, 2005, p. 126), "princípios são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível, dentro das possibilidades jurídicas e reais existentes". Dessa forma, eles seriam mandados de otimização, que podem ser cumpridos em diferentes graus a depender do caso concreto e realidade normativa existente. Investigados os valores, direitos e interesses que estejam envolvidos no conflito, faz-se através do critério da ponderação, a atribuição de peso ou importância da aplicação do princípio no caso concreto, por final, decidindo-se pela prevalência ou não deste (ALEXY apud AMORIM, 2005, p. 128).

Contrapõe-se ao valor informalidade uma série de outros valores no presente caso. O fato de não haver pedido expresso de condenação limita o exercício do direito de defesa (e por sua vez os princípios da ampla defesa, do contraditório e do devido processo legal, bem como o princípio dispositivo, que serão estudados detalhadamente nos tópicos 4.3 e 4.4), já que não saberia a parte quais parcelas lhe foram imputadas na inicial. Se não inseriu tal pedido na petição inicial quais condenações recairiam sobre a sua pessoa e quais não?

Nos casos em que não há advogado assistindo parte, o valor amplitude de acesso à justiça, consegue elevar o peso do princípio da informalidade. Assim, continua necessário que conste na petição a intenção de obter a condenação da parte (pedido expresso), mas com um maior desprendimento ao formalismo no que toca a sua elaboração. Contudo, essa conclusão não pode se dar na mesma medida, caso a parte esteja assistida de profissional do direito. O causídico laborou com negligência na elaboração da peça processual, fato este que não pode em hipótese alguma ser chancelado pelo poder judiciário.

Em que pese tal entendimento, há julgadores que aplicam o princípio da informalidade para sanar a deficiência na elaboração da peça, ainda que a parte esteja auxiliada por advogado [16].

Nessa situação específica, ficaria parcialmente afastado o princípio da informalidade, o que não quer dizer que nas causas em a parte esteja acompanhada de advogado ele não será aplicado jamais. Não deve deixar de ser aplicado, porque o jus postulandi não é o único fundamento para aplicação do princípio da informalidade. O que ocorre é que sua aplicação se dará com menor peso.

Ainda continua aplicável a eficácia pré-jurídica em todas as suas hipóteses, para que sejam elaboradas leis claras e que simplifiquem o procedimento, inclusive nestas demandas. O mesmo se diga da eficácia no âmbito processual, podendo ser aplicado como fundamento prévio de validade para que sejam praticados atos com desprezo ao excesso de rigor formal, ou seja, a formalidade que esteja além do núcleo mínimo essencial [17]. Entretanto, não será necessário que o juiz atue de forma tão diligente para suprir as falhas das partes assessoradas por advogado quanto naquelas em que este não estiver presente, já que dispõem de profissional habilitado para defender seus interesses e evitar esse tipo de erro técnico.

Nesses casos, deverá ser concedido o prazo de 10 dias para que a parte sane o defeito sob pena de extinção do processo, conforme enunciado da súmula 363 do colendo TST. O julgador apenas indicaria o ponto que indica viciado, mas não com base na informalidade, mas sim na lealdade e economia processual. Constatando a irregularidade, ainda que após a apresentação da defesa, juiz ainda assim poderá mandar emendar a inicial, contudo devolvendo o prazo de resposta, conforme lição de Jorge Neto e Cavalcante (2007, p. 680-681), para que seja respeitado o contraditório.

4.2 INFORMALIDADE X CELERIDADE

O princípio da informalidade no processo do trabalho tem como um de seus fundamentos o princípio da celeridade. Agem um sobre o outro, auxiliando, alterando e fundamentando-se mutuamente, tal qual a dialética prevista no Idealismo de Hegel. A celeridade pode ser alcançada através da limitação ao formalismo, conduzindo a um menor lapso temporal para efetivação do direito material. Já o princípio da informalidade tem como objetivo a redução do entraves formais ao núcleo mínimo essencial de maneira que se possa discutir em juízo plenamente as questões de direito material sem que haja excessivas questões de direito adjetivo que prejudiquem o andamento da marcha processual.

Buscando suprir a deficiência do "processo arcaico e ineficiente" é que ganha relevância a aplicação conjunta dos princípios da informalidade e da celeridade. Ambos como princípios que são mandados finalísticos de otimização de aplicação tanto na esfera processual quanto na pré-jurídica, no sentido de viabilizar ações para que o processo seja simples, célere e efetivo.

Tal ação conjunta se dá na esfera pré-jurídica quando o legislador estabelece regras procedimentais que concentram as fases processuais no menor número de atos que possam procrastinar o processo, bem como no menor lapso temporal para interposição de recursos comparativamente ao processo civil. Já na esfera processual, a aplicação conjunta se dará, por exemplo, quando o juiz, imbuído do espírito trazido pelos princípios em análise, realiza efetivamente todos os atos em uma audiência una.

É o que ressalta TOSTES MALTA (apud Rodrigues Pinto, p. 73), quando expõe que muitas das aplicações do princípio da informalidade conduzem à celeridade.

É que a celeridade, traduzindo-se na exigência de prazos exíguos e improrrogáveis, na concentração que reúna os atos processuais, tanto quanto possível, numa só audiência, e no saneamento, representando atividade corretiva do juízo para assegurar a boa marcha processual, conduz à pronta solução dos choques de interesses, diminuindo as tensões sociais por eles sempre despertadas.

Entretanto, a aplicação de tais princípios deve se dar através da utilização da ponderação de interesses e do confronto principiológico com a ampla defesa, o contraditório e o devido processo legal. Não se pode, em nome da simplicidade, não garantir o núcleo mínimo essencial de formalidades, permitindo-se que o processo se desenvolva ao livre arbítrio do juiz ou das partes. Igualmente a celeridade não pode resultar em insegurança na prestação jurisdicional, uma vez que o princípio da celeridade existe em decorrência do princípio do devido processo legal, visando à efetivação do direito material, porém com o objetivo de realizar o valor justiça. A justiça por sua vez, resulta da aplicação equânime do binômio celeridade X segurança jurídica [18].

Exemplifique-se: Nos termos do art. 765, da CLT, o juiz tem ampla liberdade na direção do processo e deve velar pelo andamento rápido das causas. Com base nesse artigo, poderia o magistrado indeferir o requerimento de determinada prova (verbi gratia, a pericial ou testemunhal) com o fundamento de que dilataria excessivamente a duração do processo. Contudo, tal poder diretivo do juiz não pode ir de encontro aos cânones constitucionais, de forma a impedir o direito de defesa, bem como o exercício do contraditório e do devido processo legal, para ambas as partes (reclamante e reclamado). Deve ainda o juiz, quando quiser indeferir o requerimento de prova, fundamentar expressamente as razões de seu indeferimento sob pena de nulidade, de forma a permitir a interposição de recurso pela parte interessada e o reexame da questão pelo tribunal.

4.3 INFORMALIDADE X DEVIDO PROCESSO LEGAL, AMPLA DEFESA E CONTRADITÓRIO

O princípio da informalidade tem sua restrição máxima, quando, na sua aplicação no caso concreto, este entra em conflito normativo com os princípios do devido processo legal, ampla defesa e contraditório. Como esposado ao longo do capítulo, o conflito normativo entre princípios, para sua resolução, depende do peso atribuído a cada um deles, mediante a ponderação de interesses.

Em nosso ordenamento jurídico, e na maior parte dos sistemas mundiais, o princípio do devido processo legal e os seus corolários tem uma grande força como mandamento finalístico de otimização, sendo pressuposto básico de validade, e, para doutrina moderna (CÂMARA, 2006, p. 49-50), até mesmo de existência do processo.

Como também explicitado ao longo de todo o capítulo 2, o princípio da informalidade é o mandamento finalístico de otimização que impõe que o legislador, as partes e o juiz limitem o formalismo (e, portanto, a exigência deste), ao seu núcleo mínimo essencial.

Ocorre que, diante da essencialidade da qual os princípios do devido processo legal, contraditório e ampla defesa são revestidos até mesmo para o desenvolvimento válido e regular do processo, eles sempre estarão contidos no núcleo mínimo essencial definidor do princípio da informalidade.

Na dimensão pré-jurídica, o princípio da informalidade serve como um mandamento finalístico de otimização para que o legislador: a) evite o tecnicismo exacerbado, de forma que as normas elaboradas estejam ao alcance dos leigos; b) faça uso de uma linguagem clara na redação dos dispositivos legais; c) não elabore normas que promovam o incremento do ritualismo e a morosidade na marcha processual com providências inúteis.

Na esfera pré-jurídica, o princípio do devido processo legal será aplicável como elemento definidor do núcleo mínimo essencial, nos casos em que o legislador, ao criar leis que visem à limitação ao formalismo, atue abusivamente, criando situações desarrazoadas ou desproporcionais.

Esta é uma nítida aplicação do devido processo legal em seu sentido material. A atuação do poder estatal para ser legítima deve sempre pautar-se dentro das margens do razoável e do proporcional. O estado não pode atuar abusivamente sujeitando o administrado a situações que firam a aplicação do devido processo legal.

No âmbito processual, o princípio da informalidade serve como fundamento prévio de validade para que sejam praticados atos com desprezo ao excesso de rigor formal, ou seja, as formalidades que esteja além do núcleo mínimo essencial. Também, serve como mandamento finalístico de otimização para uma atuação mais informal e diligente do magistrado.

Tal atuação mais diligente e informal que impulsiona o magistrado a providenciar qualquer diligência necessária para o andamento rápido da marcha processual também deve pautar-se pelos limites do devido processo legal substancial. Ou seja, na condução do processo o magistrado deve atuar com proporcionalidade e razoabilidade. Devem, portanto, para ser cabível a aplicação judicial do princípio da informalidade, estar presentes os pressupostos adequação, necessidade (existem outros meios?) e proporcionalidade em sentido estrito (as vantagens compensam?).

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Ao mesmo tempo, deve estar presente no núcleo essencial mínimo impassível de aplicação do princípio da informalidade a proteção a ampla defesa e o contraditório de forma que não haja risco de cerceamento de defesa.

4.3.4 Informalidade e risco de cerceamento de defesa: situações problema

4.3.4.1 Declaração da inépcia da inicial

Há uma situação bastante comum nos tribunais trabalhistas digna de reflexão. Diariamente, chega ao magistrado um grande um número de processos em que as petições iniciais são desprovidas de rigor técnico apurado. Nesses casos, os julgadores aplicam o princípio da informalidade para evitar a extinção de tais processos pela via da inépcia. Entretanto, a aplicação desse princípio, para todos os casos, quando em uma parcela deles este seria incabível, é feita de modo a violar a proporcionalidade e a razoabilidade.

O réu notificado para apresentar resposta a uma petição inicial que lhe prejudique o exercício do direito de defesa vê-se diante de um dilema: caso conteste, ainda que deficitariamente, em regra, os magistrados entendem que é aplicável o princípio da informalidade como fundamento prévio de validade para se evitar a inépcia, já que o mesmo apresentou formalmente a sua peça contestatória [19]; por outro lado, caso não conteste, correrá o risco de ver declarada a revelia, suportando todas as conseqüências jurídicas desse ato.

Em razão de o segundo ato ter a potencialidade de ser mais danoso ao Reclamado, a parte normalmente contesta, suportando as conseqüências.

Bezerra Leite (2006, p. 412) relata a prática dos tribunais:

No processo laboral o juiz, via de regra, não despacha a petição inicial, determinando a citação do réu. Esse ato processual é feito automaticamente pela Secretaria da Vara, como já ressaltado alhures.[...]

Assim , os juízes normalmente aguardam a apresentação da defesa e, verificando que esta se manifesta eficazmente sobre os pedidos, acabam por admitir petições iniciais falhas, às vezes ininteligíveis. É que, em tais casos, não se pode falar em violação ao princípio do contraditório e da ampla defesa, pois a peça de resistência do réu possibilita a cognição plena da demanda, podendo o juiz do trabalho adentrar no mérito em busca da correta aplicação do Direito e da promoção da justiça.

No entanto, em que pese o entendimento do eminente processualista, a jurisprudência dos tribunais trabalhistas no sentido de o mero esboço da defesa já afastar a possibilidade de declaração da inépcia, vai, sim, de encontro ao princípio da ampla defesa e do contraditório, já que na prática, induz ao cerceamento de defesa da parte ré.

Do conflito principiológico entre a informalidade e contraditório e a ampla defesa, em geral, ao valor pontencialidade material de apresentação de defesa deve ser atribuído peso maior do que aos demais valores que fundamentam a informalidade (capítulo 2), como o acesso à justiça, o jus postulandi e o princípio da proteção. É sabido que ninguém deve ser condenado sem que lhe tenha sido dado real oportunidade de se defender, tal qual dispõe o próprio enunciado constitucional do devido processo legal.

Como visto anteriormente, o princípio do contraditório não tem que ser respeitado apenas em seu aspecto formal (abertura de oportunidade para manifestação da parte sobre os atos), mas também há que se respeitar o aspecto material, que é dar a parte o poder de influenciar na formação do convencimento do magistrado no provimento jurisdicional final.

Ainda que se diga que a petição inicial trabalhista exija menor formalidade que a do processo civil, essa redução ao formalismo jamais pode acarretar em restrição ao exercício pleno do direito de defesa [20]. A limitação ao formalismo deve ser no sentido de permitir o acesso à justiça, v.g., não exigindo fundamentos jurídicos, ou com pequenos erros e impropriedades da parte. Mas, se da leitura da reclamação trabalhista perceber o juiz que da narração dos fatos não decorre logicamente a conclusão ou que da leitura da narrativa da peça um homem médio não consiga extrair seu sentido por deficiência excessiva na técnica de redação, o princípio da simplicidade não pode atuar.

Disso, extraí-se que o princípio da informalidade jamais poderá ser aplicado para afastar a inépcia em duas hipóteses: a) caso seja tamanha a deficiência da petição, a ponto de ser inviável formular e apresentar a defesa; b) excepcionalmente, ainda que apresentada a peça de defesa formalmente, ser tão manifesta a deficiência técnica da exordial, que impeça o reclamado de exercer materialmente seu direito de defesa.

No entanto, há uma solução plausível para que se possa preservar todos os princípios em conflito (a saber, informalidade, acesso a justiça, jus postulandi, ampla defesa, contraditório e devido processo legal), sem sacrifício de qualquer deles.

Como esclarece Carlos Alberto Alvaro de Oliveira (2003c, p. 11) "[...]se o juiz preservar as garantias das partes, vedado não lhe é adotar um ponto de vista mais maleável, adaptando o rigor formal ao caso, quando necessário para vencer o formalismo, obstaculizador da justiça na hipótese concreta."

Principalmente nos casos em que o jus postulandi é exercido diretamente pelas partes, bastaria para tanto que o magistrado, na audiência inaugural, no momento anterior a apresentação da peça contestatória, inquirisse o demandante esclarecendo os pontos falhos ou ininteligíveis, e caso permitido pela parte, reduziria a termo o quanto exposto oralmente, integrando aquilo para todos os efeitos legais a reclamação trabalhista. Tal idéia concretizaria o dever de esclarecimento, bem como o dever de prevenção que detém o magistrado em razão do princípio da cooperação.

Em seguida, seria oportunizada ao réu a apresentação da defesa, e caso seja de seu interesse, aduziria oralmente qualquer dado complementar. Assim, preservar-se-ia o acesso à justiça, na forma originalmente concebida pelo legislador, bem como a celeridade e a instrumentalidade inerente ao processo. De igual maneira, qualifica-se o contraditório e realiza-se o dever de consultar.

Alguns poderiam dizer que não seria possível a realização deste expediente, pois após a citação do réu, não mais poderia ser modificado o pedido ou a causa de pedir, não se admitindo a mudança das partes ou a inovação na demanda, exceto com a anuência do réu (art. 264, CPC). Ocorre que não haveria, neste caso, qualquer modificação da lide. As partes, o pedido e a causa de pedir já foram estabilizados com a citação válida da parte ré. O que aconteceria, em verdade, seria um mero esclarecimento. Cabe ao juiz agir com razoabilidade e proporcionalidade para coibir que as partes utilizem desse expediente para mascarar uma alteração da demanda.

4.3.4.2 Impessoalidade na notificação postal

O legislador, no art. 841, §1º, da CLT, estabeleceu que, como regra geral, as notificações na Justiça do Trabalho serão feitas pela via postal, em um nítido impulso de simplificação do procedimento. Contudo, imagine-se o seguinte caso: ferir-se-ia o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa, quando apesar de correto o endereço na inicial, terceiro recebe a notificação ao invés do réu?

A jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho, com base no princípio da informalidade, vem entendendo que a notificação trabalhista no processo de conhecimento é impessoal [21], logo não necessitando que seja recebida diretamente pelo réu ou seu representante legal, tendo como requisito apenas que esteja correto o endereço apontado na peça incoativa [22]. Igualmente para a jurisprudência majoritária deste tribunal, esse terceiro não precisa ser empregado nem ter qualquer relação com o réu, levando apenas em consideração que a notificação se dê no endereço apontado na inicial, conforme requisito exposto nesse parágrafo, dessa forma não havendo qualquer violação a qualquer dos princípios abordados neste tópico.

Entretanto, tal entendimento não parece acertado. Reforça-se mais uma vez: os princípios do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório fazem necessariamente parte do núcleo mínimo essencial das formalidades, devendo ser atribuído peso maior a estes princípios do que à informalidade no exame de um conflito principiológico. Apesar de a notificação na seara trabalhista ser impessoal, a impessoalidade não pode inviabilizar o exercício do direito de defesa em sua plenitude.

A partir do momento em que se permite que terceiro, seja ele quem for, receba a notificação em nome do réu, está-se, na prática, obstando o direito de defesa deste do réu, violando também a garantia da notificação prevista na cláusula do devido processo legal.

Cogite-se a seguinte situação: um de terceiro que apenas estava de visita na empresa recebe notificação em nome do réu, sem repassá-la ao mesmo. Ainda assim a regra da impessoalidade deveria prevalecer, sem que haja a violação aos princípios do contraditório e do devido processo legal?

Apesar de a jurisprudência aplicar sem qualquer ressalva a impessoalidade, entende o autor desta obra que, ainda que com base no princípio da informalidade, a notificação realizada desta maneira macula o processo de vício insanável, pelo que não pode ele se desenvolver validamente.

Deve-se adotar uma postura com base na ponderação, na razoabilidade e na proporcionalidade. Que seja admissível a impessoalidade e o recebimento da notificação por terceiro é completamente razoável, tendo em vista a limitação à formalidade própria do direito processual do trabalho, em razão do caráter alimentar e da urgência de que normalmente gozam as verbas perquiridas. O que não é razoável é a não delimitação de quem seria este terceiro para que se permita o correto andamento do procedimento e a angularização da relação jurídica processual.

O critério da razoabilidade, que deve permear inclusive o mérito da decisão judicial, impõe que este terceiro seja pessoa que tenha algum nível de relação com a parte ré, de tal forma que este tenha uma obrigação de entregar a notificação ao demandado. Apesar de também poder ser esse vínculo o de emprego ou o de trabalho, estas não são seriam as únicas formas de relação que permitiriam a válida notificação do réu. Verbi gratia, o porteiro do prédio do sócio que receba a notificação por este, mesmo não sendo seu empregado, tem certo nível de relação com o reclamado, o que lhe confere um dever de entregar a notificação ao reclamado. O mesmo se diga do parente ou do coabitante do endereço indicado na exordial.

Delimitar todos os casos seria impossível, diante da vastidão de possibilidades. O que se buscou foi estabelecer um critério geral, com base na ponderação, que respeite os direitos fundamentais da parte ré, e que se encontre dentro da razoabilidade e da proporcionalidade. Com base nesse critério, poder-se-ia fazer a subsunção do caso concreto a essa tipologia.

4.3.4.3 Surgimento de nova causa de pedir

No processo civil, o autor deve se incumbir de inserir expressamente, no bojo da petição inicial, sob pena de extinção do processo sem a resolução do mérito da causa, a identificação das partes da demanda, a causa de pedir e o pedido, salvo se, oportunizado emendar a inicial, sane os vícios existentes. Estes elementos são de essencial importância, pois através destes se consagra o princípio da inalterabilidade da demanda, já que constituem elementos da ação.

Eles permitem também o exame da litispendência, da existência da coisa julgada, bem como aferir sobre quais capítulos da petição foi interrompida a prescrição, por exemplo, em caso de arquivamento do processo e apresentação de nova reclamação. No processo do trabalho, conforme afirmado no capítulo 2, na busca da limitação ao formalismo, dispôs o art. 840, §1º, que a reclamação trabalhista necessitará apenas da qualificação das partes, da breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio e do pedido.

Ainda que vigente no processo do trabalho o princípio da informalidade, é de fundamental importância que esteja presente na petição inicial a exposição da causa de pedir de forma a permitir o exercício pleno do direito de defesa, e evitar o risco de seu cerceamento.

Ratifica tal visão o ilustre processualista Carlos Henrique Bezerra Leite (2006, p. 392), quando trata do tema da causa de pedir:

Para nós, ainda que não exijam os rigorismos do CPC, é preciso ao menos que haja alguns elementos que tornem possível o exercício das garantias constitucionais consubstanciadas nos princípios do devido processo legal e da ampla defesa, essenciais ao Estado Democrático de Direito.

O sistema processual brasileiro adotou a teoria da substanciação que diz que deve estar expressa na inicial a descrição dos fatos oriundos da relação de direito material. Em oposição a esta, há a teoria da individualização, dispondo que basta a mera afirmação da relação jurídica material que fundamenta o pedido. Para a formulação de pedido de anotação da CTPS, é necessário mais que apenas a afirmação de que era sujeito da relação de emprego (relação de direito material), mas também a razão pela qual se afirma que é sujeito desta relação, como haver pessoalidade, onerosidade, não eventualidade e subordinação (LEITE C., 2006, p. 392).

Apresentar-se-ão agora dois casos que ajudarão a estabelecer um critério de aplicação e limitação do princípio da informalidade no tocante ao tema causa de pedir.

O primeiro caso foi inspirado em um processo julgado no âmbito do TRT 5ª Região [23]. O reclamante pleiteia indenização por danos morais pelo dano causado a seu olho esquerdo (perda de visão). Alega na petição inicial que recebeu uma descarga elétrica de 13.000 volts que lhe trouxe conseqüências neurológicas e a perda da visão esquerda. A empresa se defende dizendo que não pode ser condenada, pois jamais houve tal acidente. Da prova oral (depoimento pessoal do reclamante e oitiva de testemunhas) e do laudo pericial realizados, extrai-se que em 1989 o reclamante sofreu um acidente de trabalho quando dirigia um carro da empresa, ao final do expediente. A perícia constatou a existência de nexo causal entra a conduta da empresa e o dano sofrido, ainda que por causa diversa da apontada na inicial.

Apesar de existir o direito a percepção da indenização pelo reclamante em razão do acidente automobilístico, não foi em razão disso que a indenização foi pedida na exordial. Dessa situação surgem duas possibilidades de decisão para o juiz: a) já que presente o nexo causal entre o dano e a conduta do réu, com base no princípio da informalidade, defere-se o pedido de indenização; b) em face da teoria da substanciação, uma vez que o pedido decorreu, segundo a petição inicial, de acidente por choque elétrico, e diante da inexistência de tal evento, indefere-se o pedido.

A decisão do magistrado deve pautar-se sempre pela análise dos conflitos principiológicos existentes, de forma que se estabeleçam os contornos do núcleo mínimo essencial de formalidades. Vale reafirmar que a garantia do exercício pleno do direito de defesa faz parte deste núcleo.

O réu sempre é notificado para apresentar defesa dos fatos e fundamentos jurídicos elencados na inicial. "B" que teve ajuizada contra si uma reclamação trabalhista movida por "A" pleiteando horas extras, não precisa se defender sobre o inadimplemento das verbas resilitórias, ainda que sejam devidas, pois estas não constam da inicial. Isso é um fundamento básico de direito processual. Não é obrigado também o Reclamado a produzir qualquer prova contra si.

Na hipótese do dano moral versada acima, no momento em que o demandado foi chamado para apresentar contestação, tem ele o ônus de se defender do fato a ele imputado, qual seja, o dano provocado por choque elétrico. Assim, se fosse condenado por causa diversa dessa, haveria uma violação ao princípio do contraditório e da ampla defesa, uma vez que não foi oportunizada manifestação sua acerca do objeto da condenação. Igualmente, não lhe seria ofertada a chance de potencialmente influenciar no provimento jurisdicional final. Ante o exposto, enxerga-se como a única via cabível à alternativa "b".

Dessa forma, mesmo diante do princípio da informalidade, como regra geral, em face da teoria da substanciação, aplicável ao processo do trabalho, não se admitiria a condenação com base em causa de pedir diversa da exposta na inicial.

Contudo, esta regra comporta exceção.

O segundo caso trazido é inspirado na enunciado da Súmula do TST n. 293:

ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. CAUSA DE PEDIR. AGENTE NOCIVO DIVERSO DO APONTADO NA INICIAL. A verificação mediante perícia de prestação de serviços em condições nocivas, considerando agente insalubre diverso do apontado na inicial, não prejudica o pedido de adicional de insalubridade.

Imagine-se que "C", obreiro humilde, ajuíza reclamação trabalhista em face de "D" buscando o pagamento de adicional de insalubridade. Alegou na inicial, que tinha contato com o elemento "X", nocivo a sua saúde. Realizada a perícia, ficou constatado que "C" trabalhava em condições nocivas, porém em contato permanente com o elemento "Y" e, não, como afirmado na inicial, com o elemento "X".

Neste caso, diversamente do anterior, a conclusão que se deve chegar é que é possível a condenação para o pagamento do adicional de insalubridade, ainda que causado por agente nocivo diverso do apontado na inicial. Isso se dá pelo fato de que não é razoável exigir de um leigo um conhecimento técnico avançado para identificar qual o elemento que lhe prejudicava a saúde. Em verdade, a causa de pedir objeto da demanda não é a nocividade resultante do elemento "X" ou "Y", mas sim o labor em ambiente insalubre. Por esta razão, não há qualquer prejuízo ao exercício pleno do direito de defesa.

Comentando a referida súmula Raymundo Carneiro Pinto (2007, p. 247-248), chega à idêntica conclusão.

Certamente nortearam a edição do presente verbete os princípios da economia e celeridade processuais. Deu-se uma interpretação mais flexível aos arts. 128 e 460 do CPC. Ora, admitamos que alguém reclamou o adicional de insalubridade apontado determinadas condições de trabalho (causa petendi). [...] Não seria racional obrigar o empregado – um leigo no assunto a propor uma nova ação trabalhista só porque ele, ao fundamentar seu pedido, não descreveu com exatidão, as causas de insalubridade.

Deste exemplo, pode-se estabelecer então um novo critério para a aplicação do princípio da informalidade e a admissão ou não de causa de pedir diversa da expressa na inicial na condenação. Ordinariamente, seria inadmissível a condenação com base em causa de pedir diversa da exposta na inicial, salvo quando esta alegação depender de conhecimento eminentemente técnico ou for um erro escusável. Para tanto deverá ser julgada a alegação com base nos critérios da proporcionalidade e da razoabilidade.

Retomando o primeiro exemplo, confundir um choque elétrico com acidente automobilístico não é um erro escusável, e é facilmente perceptível para um leigo a diferença entre ambos. Logo, seria insusceptível de aplicação do princípio da informalidade.

O permissivo para a utilização desta exceção deve ser utilizado com bastante cuidado e parcimônia. A admissão da possibilidade de condenação com base em causa de pedir diversa da exposta na inicial, como regra geral, traria uma série de problemas aos institutos da litispendência, da coisa julgada e da interrupção da prescrição em razão de arquivamento sem resolução do mérito da demanda.

Analise-se a hipótese de um reclamante ajuizar duas reclamações trabalhistas em face do empregador "E", em ambas pleiteando dano moral, porém com causas de pedir distintas. Na primeira pleiteou em razão de choque elétrico que lhe tirou a visão; na segunda, pleiteou fundamentando em acidente automobilístico. As ações foram processadas em juízos distintos. O réu foi revel nas duas ações. Por disporem, em tese, de assuntos diversos, não foi acusada a existência de litispendência. Ocorre que apenas uma das causas de pedir realmente procede, qual seja, o acidente automobilístico. A partir daí, a primeira ação segue o quanto enunciado no primeiro exemplo. Caso nesta ação o julgador entenda cabível a condenação, ainda que por causa de pedir diversa da expressa na inicial, o réu será processado duas vezes pelo mesmo fato, o que é inadmissível. Terá dois títulos judiciais contra si, em razão do mesmo ato e do mesmo objeto. Tal raciocínio aplica-se, mutatis mutandis, à coisa julgada.

No que toca à interrupção da prescrição, lembre-se de que somente ocorre a interrupção desta, nos casos de arquivamento sem resolução do mérito da demanda, para aqueles pedidos e causa de pedir que foram objetos da primeira reclamação. Não se admite ampliação subjetiva ou objetiva. Logo, permitir a transmigração de uma tese em outra, importaria necessariamente em retirar do réu o poder de utilizar a prescrição, cabível neste caso, como matéria de defesa.

Convém lembrar ainda que, fundamentado nos princípios dispositivo e da congruência que serão abordados no tópico seguinte, como regra, o juiz está adstrito ao quanto disposto na inicial, não podendo inovar na lide, nem julgar litígio que não lhe foi apresentado por meio de petição inicial.

4.4 INFORMALIDADE X PRINCÍPIO DISPOSITIVO E PRINCÍPIO DA CONGRUÊNCIA: SITUAÇÕES FÁTICAS

4.4.1 Limitação quanto à interpretação do pedido

Trazendo à lembrança premissas presentes no capítulo 2, o princípio da informalidade serve como mandamento finalístico de otimização para uma atuação mais informal e diligente do magistrado. Tal atuação mais diligente e informal decorre até mesmo da leitura conjunta do princípio da informalidade com o art. 765 da CLT que impulsiona o magistrado a providenciar qualquer diligência necessária para o andamento rápido da marcha processual. Fazendo uso deste princípio, no âmbito processual, o julgador pode e deve suprir pequenas omissões das partes na ocasião da instrução processual [24].

Em algumas ocasiões ocorre de o juiz deparar-se com pedidos sucintamente redigidos utilizando expressões, que, individualmente consideradas, não significam o real objeto da busca do provimento jurisdicional. Seriam os casos de o reclamante fazer pedido de "férias", de "horas extras" ou até fazer uso de abreviaturas como "DSR", que significa descanso semanal remunerado.

Com base nas explanações trazidas acima, em regra, o magistrado deve proferir a decisão de acordo com as limitações impostas pelo pedido do autor e da defesa. Por essa razão, a interpretação que se dá ao pedido ganha grande relevância.

José Joaquim Calmon de Passos (2004, p. 209) demonstra a prática relativa aos pedidos no processo civil:

Interpretar restritivamente o pedido é tirar dele tudo quanto nele se contém e só o que nele se contém, sem que se possa ampliá-lo por força da interpretação extensiva ou por consideração outra qualquer de caráter hermenêutico. Compreendido no pedido só o que expressamente contiver, não o que possa, virtualmente, ser o seu conteúdo.

No âmbito do processo laboral, em virtude da existência do princípio da informalidade, a interpretação do pedido não pode se dar de maneira tão restritiva.

Diversamente do que se poderia concluir da leitura exegética da reclamação, ao pleitear "férias" e "DSR" na inicial, não pretende o Reclamante ver reconhecido o seu direito de descansar. De igual maneira, não busca o reclamante ao utilizar a expressão "horas extras" que lhe seja oferecido qualquer trabalho após sua jornada normal de labor. O que quer em verdade o empregado é o pagamento da remuneração das férias não gozadas, das horas prestadas em labor extraordinário e do repouso semanal remunerado. Nesses casos, o pedido deve se analisado em cotejo com a causa de pedir de forma a permitir se chegar a uma conclusão acerca da sua real extensão. Logo, com interpretação menos restrita.

O raciocínio acima aventado é ainda mais justificável nos casos em que a parte exerce diretamente o jus postulandi, já que não é dado ao leigo ter que adquirir conhecimentos jurídicos para a elaboração da petição inicial. O princípio da informalidade ganha outros contornos justamente nessas ocasiões, concedendo poderes ao magistrado para que atue com maior grau de inquisitoriedade, buscando a verdade real e os fatos não informados de forma clara pela parte não assistida por advogado.

A prática das hipóteses acima aventadas era bastante comum, principalmente, na época em que havia uma maior quantidade de reclamatórias verbais reduzidas a termo pelas secretárias das varas. A redução a termo consistia no preenchimento de uma ficha indicando os dados funcionais do reclamante, sucintamente o direito o qual foi violado e o pedido, sem a possibilidade de exposição de teses jurídicas.

O princípio da informalidade autorizaria o magistrado a proceder à análise e requisitar esclarecimentos das partes, em audiência, de forma que possa delimitar a extensão da lide. É uma conseqüência lógica da limitação ao formalismo. O juiz promoverá atos que facilitem o julgamento célere e dirigido à primazia da realidade.

Essa atitude não implica em violação do princípio da congruência, nem mesmo do princípio dispositivo. O pedido continuará limitando a atuação do magistrado. Imagine-se que um trabalhador cooperativado preste serviços à empresa "X". Ajuíza reclamatória em face da tomadora de serviços pleiteando a declaração de vínculo de emprego, somente. No entanto, em tese, não seria possível o reconhecimento do vínculo com a tomadora, em razão do art. 466, parágrafo único, da CLT, salvo existência de alegação no sentido da nulidade do vínculo com a cooperativa, com base no art. 9º, da Consolidação.

No processo civil, diante do menor grau de aplicação do princípio da informalidade, provavelmente tal petição seria indeferida por inépcia, se não emendada no prazo legal, uma vez que formulado pedido juridicamente impossível, indo de encontro a dispositivo de lei. Em um de seus sentidos, "a possibilidade jurídica do pedido pressupõe a inexistência de uma proibição expressa dentro do ordenamento jurídico que impeça o juiz de deferir ao autor o bem da vida vindicado" (LEITE, C., 2006, p. 269).

Entretanto, no processo laboral, marcado pela limitação ao formalismo, seria permitido ao magistrado aceitar e até mesmo deferir tal pedido, ainda que inexistente o prévio caminho da nulidade do contrato com a cooperativa afastando a proibição expressa, caso constate, no caso concreto, que o mesmo se fundamenta na existência de irregularidades passíveis de serem declaradas nulas [25]. O juiz executaria por si só esse raciocínio jurídico para poder deferir o pedido, declarando a nulidade do ato.

Vale ressaltar que jamais a interpretação do pedido poderá ser abrangente ao ponto de se conceder algo que não foi objeto de pedido pela parte. Será cabível para aqueles casos nos quais há pequenos erros ou utilizações de expressões atécnicas ou ainda para afastar o indeferimento da petição por inépcia, quando do cotejo do pedido com a causa de pedir for visível a real intenção do autor [26].

A limitação material da aplicação da informalidade por esse viés serão os potenciais conflitos com os princípios do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal. Assim, é de todo conveniente que, para as dúvidas de maior grau, o juiz promova estes esclarecimentos na audiência inaugural, antes de ser oportunizada apresentação da peça contestatória, de forma que se possibilite, em seguida, a parte ré aduzir oralmente o complemento da sua defesa e esteja assim satisfeito o contraditório e a ampla defesa. Entretanto, com fulcro no art. 765, da CLT, poderá o magistrado a qualquer tempo fazê-lo, visando à verdade real. Importante ressaltar que jamais poderá haver neste momento em que a parte presta esclarecimentos qualquer inovação na lide, seja subjetiva ou objetivamente, devendo o juiz estar atento e agir com razoabilidade e proporcionalidade para evitar os abusos.

4.4.2 Exigência de pedido expresso

No tópico 3.6, foi defendido que, como regra geral, o juiz, ao proferir o comando sentencial, estaria limitado pelo quanto disposto no pedido da inicial (congruência interna) e o alegado pela defesa (congruência externa), não podendo conceder nada além, diverso do quanto pleiteado ou ainda deixar de analisar parcela deste.

Ainda assim, o princípio da congruência sofre mitigações no processo laboral. Em alguns casos a lei expressamente autoriza a que o julgador defira pedidos que não foram elaborados na reclamação trabalhista. O caso típico seria o quanto disposto no art. 467 da CLT.

A lei os estabelece em razão de sua importância, natureza ou caráter de ordem pública. Fredie Didier Junior (2007, p. 398) elenca alguns exemplos de pedidos implícitos:

a) os juros legais (art.405 e 406 do CC-2002; b) ressarcimento das despesas processuais e dos honorários advocatícios (art. 20 do CPC); c) correção monetária (art.404 do CC- 2002); d) pedido relativo a obrigações com prestações periódicas, pois o autor está desobrigado a pedir as prestações vincendas: o magistrado deve incluir, na decisão, as prestações vincendas e não pagas (art. 290 do CPC, ver adiante). Importar frisar que os juros convencionais ou compensatórios não prescindem do pedido expresso do autor, não se constituindo pedido implícito.

Não sendo previsto na lei, não há que se considerar a existência de pedido implícito, não podendo o magistrado apreciar nada fundamentado nessa premissa.

Entretanto, na seara trabalhista há discussão acerca da possibilidade de condenação de um reclamado ainda que não tenha sido formulado pedido expresso nesse sentido, quando implícita a intenção de pleitear bem da vida em face deste [27].

A resolução dessa controvérsia perpassa obrigatoriamente pelo confronto principiológico da informalidade com os princípios do devido processo legal, contraditório e a ampla defesa, dispositivo e congruência. Se o juiz, em regra, apenas deve conhecer daquilo que lhe foi demandado por meio de uma petição inicial; se ao apreciar o litígio ele deve se ater ao quanto disposto no pedido do autor e o apresentado na defesa, não devendo deferir nada além ou diverso que foi pleiteado, nem deixar de analisar, ainda que parcialmente, nenhum dos pedidos; se ao réu deve ser oportunizada apresentação de defesa de forma que possa influenciar no livre convencimento do magistrado; se o réu para o exercício de seu direito de defesa tem como base o instrumento de formalização do direito de ação que é peça reclamatória; se os pedidos implícitos devem ser apenas aqueles expressamente previstos no texto legal; se dentro núcleo mínimo de formalidade impassível de aplicação do princípio da informalidade encontram-se as garantias para o exercício pleno do direito de defesa.

Com base nesses fundamentos seria inviável a condenação de um reclamado caso não tenha sido formulado pedido expresso nesse sentido [28]. Contudo, conforme será tratado no tópico 4.4.3, apesar da necessidade de ser expresso, não há exigência de que seja formulado em capítulo próprio (petitório).

4.4.3 Pedido não formulado em capítulo próprio

Aconselha a boa técnica processual que na elaboração da petição inicial a mesma seja dividida em capítulos. Inicialmente, narram-se os fatos, passa-se ao direito e, ao final, redigem-se os pedidos e requerimentos que ficam no petitório.

Como ressaltado por diversas vezes ao longo desta obra, o princípio da informalidade impulsiona que o processo do trabalho seja regido no impulso de limitarem-se as formalidades excessivas e despiciendas. Não é necessário para que o reclamante exerça seu direito de ação que ele detenha maiores conhecimentos acerca da técnica processual.Todavia, algumas ponderações devem ser feitas.

A individualização da lide se dá através do reconhecimento de seus elementos estabilizadores, quais sejam, partes, pedido e causa de pedir. A partir deles são traçados os limites objetivos e subjetivos da coisa julgada. Assim, "o que não tiver sido objeto do pedido, por não integrar o objeto do processo, não será alcançado pelo manto da coisa julgada" (CÂMARA, 2006, p. 474).

Fazendo uma analogia, na sentença, existem parcelas que não têm caráter decisório. "O relatório, que obviamente não contém qualquer elemento decisório, não transita em julgado. Quanto à motivação da sentença, esta não é alcançada pela coisa julgada, como se verifica pela leitura do art. 469 do CPC" (CÂMARA, 2006, p. 474-475). Apenas a parte dispositiva da sentença é que transita em julgado. O dispositivo está para a sentença, assim como o petitório está para a petição inicial. Expõe Bezerra Leite (2006, p. 548):

Por outro lado, a prática forense trabalhista tem revelado, não raro a existência de sentenças em que o dispositivo se limita a reportar-se à fundamentação. Há quem sustente que o decisum remissivo à fundamentação não invalida a decisão, pois a sentença, como norma jurídica que é, comporta interpretação e, com isso, o intérprete deve pesquisar no conjunto da sentença onde está a parte ou o item que realmente contempla o dispositivo.

Se, na prática forense, é possível existir comandos dispositivos que se encontram espalhados ao longo da fundamentação da sentença, igualmente é possível havê-los na exordial.

Saliente-se ainda que, na sentença, por vezes são abordadas matérias que são objeto de conteúdo decisório, mas que, contudo, não fazem coisa julgada. Seria a hipótese da declaração de inconstitucionalidade incidental promovida em controle difuso. Trata-se de um obter dictum (declaração incidental). Da mesma forma ocorre com a reclamação trabalhista.

Um reclamante ajuíza ação pedindo danos morais, materiais e lucros cessantes decorrentes de LER, alegando que o fato se deu em razão da grande quantidade de horas que trabalhava realizando serviço repetitivo, inclusive em labor extraordinário. Apesar de o fato de ter havido ou não prestação de serviço em horas extras poder ser objeto de prova e influir no convencimento do magistrado quanto à existência ou não da doença de trabalho, o mesmo em nenhum momento foi pleiteado pelo Reclamante, não podendo ser deferido judicialmente. Para que pudesse ser objeto do pronunciamento judicial, deveria ter ocorrido uma cumulação de ações nesta demanda, o que não houve.

Deve-se ter em mente essa diferença. Assim como na sentença existem parcelas que não fazem coisa julgada, da mesma forma há temas tratados na inicial que não são objeto da demanda e são tratados apenas incidentalmente. Logo, o magistrado deve ser cauteloso para observar esse fato.

Acrescente-se ainda a necessidade de haver pedido expresso pleiteando ao juiz o provimento jurisdicional. A intenção precisa estar ressaltada na exordial. Não basta a menção do fato. Não é suficiente que o reclamante somente indique determinada empresa como ré ou ainda que diga que a mesma é tomadora de serviço de sua empregadora. Deve dizer o que pretende buscar da prestadora. A ausência de formulação escrita nesse sentido viola os princípios que possibilitam o exercício do pleno direito de defesa.

Daí extraem-se duas conclusões [29]: a) Deve haver formulação expressa na forma de pedido em algum lugar da petição, ainda que fora do capítulo próprio; b) Não é possível condenação baseada em questão incidental, mas apenas aquelas que sejam pleiteadas principaliter tantum.

Vale ressaltar, todavia, que este posicionamento não é unânime, havendo julgados concluindo em sentido contrário [30].

4.4.4 Comutação de pedido e julgamento extra petita

A comutação de pedido ocorre quando, tendo sido pleiteado determinada coisa, o juiz concede algo diverso do quanto foi pedido. A partir da análise de duas situações concretas, será estabelecida uma conclusão acerca do cabimento ou não da comutação de pedido, baseada no princípio da informalidade.

Um reclamante ajuíza reclamação pleiteando danos materiais pelos gastos médicos em razão de acidente de trabalho que lhe resultou na perda de dois dedos da mão esquerda. Requisitou também condenação em danos morais com base na mesma causa de pedir. O juiz, contudo, ao julgar a lide, decidiu ser incabível na espécie o dano moral. Porém, condenou a parte ré ao pagamento de indenização mensal até os 60 anos de idade para a parte autora, fundamentando no princípio da informalidade.

Eis um caso típico de julgamento extra petita. Ainda que constate a existência de direito da parte a autora, o magistrado não pode inovar na lide, estando limitado ao disposto no pedido. A concessão de prestação diversa do que foi pleiteado viola todos os princípios relacionados ao exercício pleno do direito de defesa.

Imagine-se o seguinte: um reclamante ajuíza ação em face de duas Reclamadas. A primeira foi sua empregadora; no que toca à segunda, alegou que esta era a tomadora de serviço. Pediu expressamente a condenação de ambas as reclamadas solidariamente.

É pacífico na jurisprudência que é incabível o pedido de responsabilidade solidária nestes casos de terceirização, pois o enunciado da súmula 331 do colendo TST prevê outra forma de responsabilidade. Em verdade, assistiria direito ao Reclamante que a segunda reclamada fosse responsabilizada subsidiariamente, em razão de sua culpa in eligendo e culpa in vigilando. Diante dessa situação alguns julgadores entendem que seria cabível a condenação em responsabilidade subsidiária ainda que não o tenha sido feito expressamente por tratar-se de concessão de pedido menos abrangente [31].

Note-se que o pedido não foi alterado. Antes o que se pedia era a responsabilização, só que de forma total, sem que fosse possível argüir o benefício de ordem advindo da subsidiariedade. Não há qualquer problema que o juiz conceda prestação menos abrangente. Se a parte pede condenação em danos morais no valor de dez mil reais, o julgador pode deferir apenas dois mil reais. Igual raciocínio deve ser executado.

Esse exemplo trazido diferencia-se daqueles trazidos no tópico 4.4.1, porque neste, ao invés de não haver nenhum pedido expressamente formulado, há pedido, ainda que se condene em termo diverso do que foi originalmente pleiteado.

Conclui-se, portanto, que, conforme as palavras dedicadas no tópico 3.6, como regra geral, o juiz não pode conceder bem da vida diverso do que foi objeto de pedido da parte. Tal situação inocorre quando deferida prestação menos abrangente que o pedido inicial.

Sobre o autor
Isan Almeida Lima

Advogado em Salvador (BA). Sócio da Lima e Lima Advogados Associados. Professor efetivo de Direito processual civil, prática cível e direito civil na Universidade do Estado da Bahia (UNEB), campus VIII. Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Pós-graduado Lato sensu em Direito do Estado pela Faculdade Baiana de Direito/Jus Podivm. Bacharel em Direito pela Universidade Federal da Bahia-UFBA. Professor de Direito Processual Civil, Direito Constitucional e Direito Administrativo em cursos preparatórios da carreira jurídica . Autor de livros e artigos jurídicos em revistas especializadas.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LIMA, Isan Almeida. Limites jurídicos ao princípio da informalidade no processo do trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2490, 26 abr. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14738. Acesso em: 25 nov. 2024.

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