VI. Conclusão
A conclusão a que chegamos com o estudo em tela nos mostra que num ordenamento jurídico não devem existir antinomias. A incompatibilidade entre duas normas é um mal que deve ser eliminado, pressupondo, destarte, uma regra de coerência dirigida aos que têm relação com a produção e aplicação do direito, isto é, ao legislador e aos juízes.
A coerência não é, contudo, condição de validade, mas é, sempre, condição para a justiça do ordenamento. Onde há antinomia, vale dizer, existência de duas normas válidas e antagônicas dentro do mesmo ordenamento jurídico, não há garantia de certeza, nem de justiça.
Por tal razão, a extirpação das antinomias é imprescindível à coerência do ordenamento jurídico, e, consequentemente, à preservação das exigências de certeza e justiça, valores estes conducentes da garantia de manutenção da segurança jurídica e da paz social.
De fora a parte o importante tema do resguardo da justiça e da segurança jurídica, subsistem, ainda, consoante leciona Bobbio, razões morais que justifica a eliminação das antinomias do Direito. Nessa senda, o jurista italiano ilustra o seu pensamento com a narração de um episódio de uma rixa, seguida de um duplo homicídio, colhido da clássica obra "Os Noivos", de Alessandro Manzoni. No mencionado episódio, o Frei Cristovão (também chamado Ludovico) e seu adversário disputam para caminhar pelo lado direito do muro, apoiando-se, cada qual, em costumes contrários. Ao cabo do embate, desponta a tragédia.
Depois de narrar o incidente, conclui Bobbio, citando C. Balossini [23], que:
"...como acontece em muitos outros negócios, estavam em vigor dois costumes contrários, sem que fosse decidido qual dos dois era o certo, o que dava oportunidade de fazer uma guerra cada vez que um cabeça-dura encontrasse outro da mesma têmpera".
Como visto do episódio narrado, escoimar antinomias do ordenamento jurídico, a par de atender a razões de ordem jurídica, consubstanciadas na necessidade de coerência do sistema, constitui imperativo de índole moral, sem o qual não sobreviveriam as tão encarecidas segurança jurídica e paz social.
VII. Bibliografia (citada e/ou consultada)
7.1. BASTOS, Celso Ribeiro: Hermenêutica e interpretação constitucional, 3ª ed. São Paulo: Celso Bastos Editora, 2002.
7.2. BOBBIO, Norberto: Teoria do Ordenamento Jurídico. 10ª ed. Brasília: Editora UnB, 1999.
7.3. DAVID, René: Os grandes sistemas do direito contemporâneo. 3ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
7.4. DINIZ, Maria Helena: Dicionário Jurídico - vol. 1. São Paulo: Saraiva, 1998.
7.5. ___________: Compêndio de introdução à ciência do direito. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 2005.
7.6. ENGISCH, Karl: Introdução ao pensamento jurídico. 8ª ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2001.
7.7. FERRAZ JR., Tercio Sampaio: Introdução ao estudo do direito. 4ª ed. São Paulo: Atlas, 2003.
7.8. HOUAISS, Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. 1ª ed. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.
7.9. KELSEN, Hans: Teoria geral do direito e do estado. 3ª. Ed. São Paulo: Martins Fontes, 2000.
7.10. ___________: Teoria pura do direito. 6ª. Ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
7.11. LARENZ, Karl: Metodologia da ciência do direito. 3ª. Ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1997.
7.12. ROSS, Alf: Direito e Justiça. 1ª ed. Bauru: Edipro, 2003.
Notas
- Cf. DAVID, René: Os grandes sistemas do direito contemporâneo. 3ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998, p. 16-9.
- Cf. BASTOS, Celso Ribeiro: Hermenêutica e interpretação constitucional, 3ª ed. São Paulo: Celso Bastos Editora, 2002, p. 85.
- MAXIMILANO, Carlos: Hermenêutica e aplicação do direito. Apud BASTOS, Celso Ribeiro: Hermenêutica e interpretação constitucional, 3ª ed. São Paulo: Celso Bastos Editora, 2002, p. 86.
- Cf. ENGISCH, Karl: Introdução ao pensamento jurídico. 8ª ed. Lisboa: Calouste Gulbenkian, 2001, p. 77.
- KELSEN, Hans: Teoria geral do direito e do estado. 3ª. Ed. São Paulo: Martins Fontes, 2000, p. 163-7.
- Cf. BOBBIO, Norberto: Teoria do Ordenamento Jurídico. 10ª ed. Brasília: Editora UnB, 1999, p. 71-4.
- Ibid., pg. 75-81.
- HOUAISS, Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. 1ª ed. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001. p. 236.
- DINIZ, Maria Helena: Dicionário Jurídico - vol. 1. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 210.
- Cf. FERRAZ JR., Tercio Sampaio: Introdução ao estudo do direito. 4ª ed. São Paulo: Atlas, 2003, p.207-9.
- Ibid. p. 212.
- BOBBIO, Norberto: Teoria do Ordenamento Jurídico. 10ª ed. Brasília: Editora UnB, 1999, p. 86.
- Ibid., p. 86-7.
- Ibid., p. 88.
- Ibid., p. 38.
- Ibid., p. 49.
- Ibid., p. 113.
- Ibid., p. 115.
- ENGISCH, Karl: Introdução ao pensamento jurídico. 8ª ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2001, p 309 e seguintes.
- Cf. DINIZ, Maria Helena: Compêndio de introdução à ciência do direito. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 477-8.
- ROSS, Alf: Direito e Justiça. 1ª ed. Bauru: Edipro, 2003, p. 158-9.
- Cf. BOBBIO, Norberto: Teoria do Ordenamento Jurídico. 10ª ed. Brasília: Editora UnB, 1999, p. 92.
- C. BALOSSINI: Consuetudini, usi, pratiche, regole del costume, 1958. Apud BOBBIO, Norberto: Teoria do Ordenamento Jurídico. 10ª ed. Brasília: Editora UnB, 1999, p. 114.