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Abuso de poder e inelegibilidades

Agenda 01/09/2000 às 00:00

O Direito Eleitoral ergue-se sob a égide de um tripé (assim no dizer de Olivar Coneglian, em sua Radiografia da Lei das Eleições), sendo os três amparos representados pela: Lei do Partidos Políticos (Lei 9.096/95), sendo esta bastante recente, escrita à luz da Constituição Federal de 1988, um pouco criticada, por que terá total vigência somente no ano de 2.002; a Lei das Inelegibilidades, também recente e que se constitui na Lei Complementar 64, de 18 de maio de 1990, mesmo que "recém nascida", já existem alguns pontos são modificados pela Emenda Constitucional 16; e por último; o Código Eleitoral, mesmo que na realidade praticamente inexista, eis que ultimamente, para cada eleição se elaborava uma lei específica revogando as disposições em contrário, tendo em conseqüência quase todo o conteúdo do Código Eleitoral sido revogado, porquanto, somente até a edição da Lei 9.504, de 30 de setembro de 1997, que "estabelece normas para as eleições" e não só normas específicas para uma um pleito específico, como anteriormente ocorria.

No tocante a abuso de poder, encontramos ligeiros detalhes no art. 74 da Lei n. 9.504/97, sendo que este nos remete ao artigo 22 da Lei complementar 64, bem como ao art. 37, § primeiro da CF/88, como se pode ver in verbis:

"Art. 37 – (...) ".

§ 1º. A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos".

Da Lei das Inelegibilidades:

"Art

74. Configura abuso de autoridade, para os fins do disposto no art. 22 da Lei Complementar nº 64, de 18 de maio de 1990, a infringência do disposto no § 1º do art. 37 da Constituição Federal, ficando o responsável, se candidato, sujeito ao cancelamento do registro de sua candidatura".

Assim, de plano cabe discorrer que a prática de qualquer destes preceitos do §1. do artigo 37 da CF, irá configurar abuso de poder, com posterior decretação de inelegibilidade, devendo porém, toda e qualquer prática ser relacionada exatamente com alguma finalidade eleitoral.

Deve-se proceder a investigação constante no artigo 22 da Lei das Inelegibilidades, no momento mais oportuno, sendo que pode ocorrer mesmo antes da inicio da campanha eleitoral, ou escolha dos candidatos.

O começo de tal investigação, ao contrário do que relata a lei quando usa a expressão "denunciar os culpados", que contraria o princípio de que toda pessoa deve se presumir inocente até que sua culpa seja demonstrada, deveria sim utilizar os termos, investigados, suspeitos, ou representados, todos presumidos inocentes até prova em contrário, mas não culpados. Todas as transgressões a que se refere esta lei serão apuradas mediante procedimento sumaríssimo de investigação judicial, relevados ainda, a prioridade que os feitos eleitorais tem em face do disposto na Lei 4.410, de 24 de setembro de 1967, desde o período de registro de candidaturas até 5 dias após a realização do segundo turno.

Julgada procedente a representação, o registro do candidato será cancelado; se julgada procedente após a eleição, remetida será cópia da decisão ao Ministério Público, que poderá oferecer interposição de recurso contra a diplomação. Frisa-se que resultante da má técnica utilizada para a escrita da Lei, dês que sempre realizada sem maiores estudos e com relativa pressa, a decisão procedente em relação ao abuso de poder, não acarreta anulação da eleição do candidato beneficiado, quando esta já tenha ocorrido, nem permite a cassação de seu mandato se já tiver ocorrido a diplomação do mesmo.

A decretação de inelegibilidade do candidato, não é somente para as eleições em curso, mas sim para as eleições que venham ocorrer nos três anos seguintes à sentença. Aqui temos outro exemplo da má utilização da letra da lei, já que, mantendo-se o mesmo período dos mandatos (4 anos), o candidato que for decretado inelegível, poderá participar na próxima eleição para o mesmo cargo que concorreu, a exceção da hipótese de infringência aos incisos I e II do artigo 55 da constituição Federal onde lapso temporal do período de inelegibilidade passa de 3 (três) para 8 (oito) anos (conforme alteração na Lei das Inelegibilidades pela LC 84 de 13.4.94) .

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Conceitualmente se compreende por inelegibilidade: " (...) Inelegibilidade revela impedimento à capacidade eleitoral passiva (direito de ser votado) . Obsta, pois, a elegibilidade. Não se confunde com a inalistabilidade, que é impedimento à capacidade eleitoral ativa (direito de ser eleitor), nem com a incompatibilidade, impedimento ao exercício do mandato porque já está eleito" (Curso de Direito Constitucional Positivo, São Paulo, Malheiros Editores: 1993, página 339, José Afonso da Silva) .

Por melhor delineados, utilizo, os conceitos de PEDRO ROBERTO DECOMAIN, onde define como Abuso de Poder Econômico "o emprego de recursos produtivos (bens e serviços de empresas particulares, ou recursos próprios do candidato que seja mais abastado), fora da moldura para tanto traçada pelas regras de financiamento de campanha constante da Lei n. 9.504/97", continua mais adiante definindo como Abuso de Poder Político o "emprego de serviços ou bens pertencentes à administração pública direta ou indireta, ou na realização de qualquer atividade administrativa, com o objetivo de propiciar a eleição de determinado candidato". (1).

A inelegibilidade resulta não só do abuso de poder econômico ou político, mas também da utilização indevida de veículos ou meios de comunicação.

Há de se registrar o entendimento referente a expressão isolada "uso de veículos", reportando-se a veículos de transporte, já é vedado aos candidatos ou órgãos partidários, ou qualquer pessoa, o fornecimento de transporte ou refeições aos eleitores da zona urbana ou rural, mesmo em contraponto ao dever fornecimento gratuito de transporte, em dias eleições, a eleitores da zona rural.

Porquanto, entendendo que as expressões "veículos" e "meios" referem-se a comunicação, cabe distinguir meios de comunicação, como sendo o gênero e veículos de comunicação, o organismo específico que se serve de um dos meios de comunicação, não sendo mais gênero mas sim (v.g.) determinado jornal ou periódico.

Referindo-se a quem pode representar para que seja apurado o abuso de poder, a LC 64/90 assim descreve em seu art. 22, caput: "Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, (...) ", não se tratando assim, de procedimento em que a iniciativa possa caber a qualquer eleitor, já que o emso se encontra excluído. No mais, a fim de preservar ao judiciário a árdua tarefa de julgar, decepou-lhe o direito a iniciativa do processo, preservando assim total independência.

Nas realmente mal traçadas linhas desta Lei Complementar, o art. 24 assim refere "Nas eleições municipais, o Juiz Eleitoral será competente para conhecer e processar a representação prevista nesta lei complementar", esquecendo o legislador de referir o direito do Juiz de julgar a causa, porquanto, a jurisprudência, inclusive do colendo Tribunal Superior Eleitoral é no sentido de que a competência dos juízes eleitorais é de conhecer, processar e julgar as contendas.

Importante lembrar que em caso da procedência da representação, o candidato "beneficiado", terá cassado o registro de sua candidatura, e será aplicada a sanção de inelegibilidade não apenas ao candidato, mas também a todos que possam ter contribuído a prática do ato.

Por derradeiro, transcrevo um trecho da entrevista do Desembargador Fernando da Costa Tourinho Neto, recém-empossado presidente do Tribunal Regional Federal da primeira região, para a revista ISTO É (10.5.2000) :

"Na verdade, a grande maioria vota enganada pelo poder econômico, induzida a votar em um candidato financiado por grandes empresários, embalado pelo marketing das campanhas fantásticas e caras. A mídia, de forma subliminar, também faz campanha a favor das elites, principalmente a tevê. Acreditamos escolher os eleitos, mas estamos enganados. Legalmente o Congresso representa o povo, mas, se formos examinar como eles foram eleitos, verificaremos que a maioria esmagadora não tem nada a ver com o povo." (grifo nosso)


NOTA

(1) DECOMAIN, Pedro Roberto. Elegibilidade & Inelegibilidade. Obra jurídica – 2.000. p. 72

Sobre o autor
André Antônio Gavazini

acadêmico de Direito na UNOESC (Universidade do Oeste de Santa Catarina), em São Miguel do Oeste (SC)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GAVAZINI, André Antônio. Abuso de poder e inelegibilidades. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 45, 1 set. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1521. Acesso em: 23 dez. 2024.

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