Os motivos principais que permeiam a inserção do Poder Judiciário no mundo digital são a busca pelo maior acesso de todos à Justiça, pela maior celeridade e efetividade na prestação jurisdicional, bem como pela redução de gastos com procedimentos burocráticos, tais como protocolo, distribuição, juntada de petições, autuação etc., os quais demandam uma grande estrutura funcional.
Embalados por todo esse progresso tecnológico, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Supremo Tribunal Federal (STF), paulatinamente, estão deixando de lado os processos físicos, passando a receber as demandas para apreciação já na forma eletrônica.
Isso vem ocorrendo, principalmente, porque alguns tribunais de instância inferior já vêm digitalizando todos os seus processos físicos, a exemplo do Tribunal de Justiça do Ceará, que ao enviar recursos e feitos para apreciação das instâncias superiores, não mais os remetem na forma de papel (física), mas sim em arquivos digitais. Isto é, agora o processo físico permanece no tribunal de origem, aguardando o julgamento do recurso, cujos autos foram enviados digitalmente aos Tribunais Superiores. Estes, por sua vez, quando proferem seus julgados, apenas devolvem ao Juízo a quo os seus veredictos, também na forma informatizada.
Um dos grandes benefícios de toda essa modernização é a rapidez com que os processos chegam aos gabinetes dos ministros, já que os feitos lhes são enviados na forma digitalizada, não mais havendo a necessidade de remessa dos autos (físicos) para Brasília-DF, local onde são sediados o STJ e o STF.
Desse modo, não se pode negar que a Justiça está caminhando para uma era em que serão abolidos integralmente os processos físicos, para dar lugar apenas aos processos judiciais virtuais, desde o seu nascedouro (com o ajuizamento da demanda) até a sua morte (com o julgamento e respectivo trânsito em julgado em última instância).
No entanto, em meio a todas as vantagens que englobam a virtualização do Judiciário, surge um questionamento: por que os tribunais superiores permanecem exigindo dos jurisdicionados o pagamento do porte de remessa e retorno, quando do recolhimento de preparo dos recursos (extraordinário e especial), se os processos físicos permanecem nos juízos de origem e não são remetidos à Brasília?
Inicialmente, é necessário rememorar qual a serventia da verba denominada "porte de remessa e retorno", prevista no artigo 511 do Código de Processo Civil. Tal verba se trata de um valor que é pago pelo jurisdicionado, com natureza jurídica tributária de "taxa" [01], a fim de custear a remessa dos autos aos tribunais sediados em local diverso daquele da interposição do recurso. No caso dos recursos direcionados ao STJ e STF, o quantum a ser gasto pelo Recorrente dependerá do número de folhas do processo, além da localidade do juízo de origem.
Em outras palavras, a exigência do porte de remessa e de retorno está adstrita a uma contraprestação de um serviço público, no caso específico, de transporte de documentos, o qual é prestado pela Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – ECT.
Assim, se os processos agora são enviados na forma digital (pelo menos em relação aos feitos que são remetidos pelos tribunais que já aderiram à virtualização dos autos e recursos) para Brasília e, por conseguinte, não mais há a necessidade de utilização dos serviços prestados pelos Correios, mostra-se, portanto, sem fundamento a cobrança do porte de remessa e retorno no recolhimento do preparo. Aqui, também caberia usar o termo "desarrazoada" para tal exigência, porque, não obstante desnecessária em face dos avanços mencionados, se o Recorrente não recolher tal taxa, verá negado seguimento ao seu recurso, por insuficiência do preparo, o que leva à deserção, nos termos do já mencionado artigo 511 do Código de Processo Civil.
Parte-se da premissa que as mudanças advindas da modernização do Poder Judiciário objetivam, dentre outras razões, oferecer um maior acesso de todos à Justiça. Assim, não se pode permitir que a cobrança de tal verba continue sendo feita, sob pena de restringir tal acesso, já que nesse caso não há a ocorrência do respectivo fato gerador que a justifique, qual seja a utilização do serviço prestado pelos Correios, uma vez que os processos físicos permanecem no juízo de origem.
Desse modo, quando o Estado cria novos mecanismos e propõe mudanças que visam garantir o acesso à prestação jurisdicional e uma maior efetividade desta, não se deve admitir que haja contradições e armadilhas como as que aqui ora são apontadas.
Notas
- O artigo 77 do Código Tributário Nacional prevê que "as taxas cobradas pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, têm como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição".
036GILart72010