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Do pagamento por indenização na contratação sem licitação

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Agenda 10/09/2010 às 08:07

3. DA POSSIBILIDADE DO PAGAMENTO POR INDENIZAÇÃO

A Lei Federal nº 8.666, de 21 de junho de 1993, estabelece, como vimos em seu artigo 2.º, que todos os serviços contratados pela Administração Pública devem ser precedidos de licitação, salvo as hipóteses nela previstas. O artigo 26 da mesma Lei, por sua vez, elenca as condições para a efetivação da contratação nas hipóteses de dispensa ou inexigibilidade da licitação. Vejamos este artigo:

Art. 26. As dispensas previstas nos §§ 2º e 4º do art. 17 e no inciso III e seguintes do art. 24, as situações de inexigibilidade referidas no art. 25, necessariamente justificadas, e o retardamento previsto no final do parágrafo único do art. 8º desta Lei deverão ser comunicados, dentro de 3 (três) dias, à autoridade superior, para ratificação e publicação na imprensa oficial, no prazo de 5 (cinco) dias, como condição para a eficácia dos atos.

Parágrafo único.  O processo de dispensa, de inexigibilidade ou de retardamento, previsto neste artigo, será instruído, no que couber, com os seguintes elementos:

I - caracterização da situação emergencial ou calamitosa que justifique a dispensa, quando for o caso;

II - razão da escolha do fornecedor ou executante;

III - justificativa do preço.

IV - documento de aprovação dos projetos de pesquisa aos quais os bens serão alocados. 

Nas hipóteses de dispensa ou inexigibilidade vimos a necessidade de que seja formalizado o respectivo procedimento e o subseqüente contrato, quando for o caso, observando-se os requisitos previstos no referido artigo 26 da Lei.

No caso de não ser realizada licitação ou haver qualquer nulidade nesta ou na contratação, haverá, por conseguinte, afronta direta às disposições do art. 2º e ao art. 26 da Lei 8.666/93 – irregularidade que precisaria ser apurada, aplicando-se as respectivas sanções aos responsáveis.

Jurisprudência pátria já preleciona no sentido da possibilidade de anulação ou revogação de seus próprios atos quando eivado de vícios, ressalvados os direitos adquiridos e a apreciação judicial. Vejamos:

STF - Súmula nº 473: A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.

Doutra banda, a Lei 8.666/93, em seu artigo 49, atenta para as possibilidades de revogação da licitação explicitando o devido procedimento. Verbis:

Art. 49.  A autoridade competente para a aprovação do procedimento somente poderá revogar a licitação por razões de interesse público decorrente de fato superveniente devidamente comprovado, pertinente e suficiente para justificar tal conduta, devendo anulá-la por ilegalidade, de ofício ou por provocação de terceiros, mediante parecer escrito e devidamente fundamentado.

§ 1º  A anulação do procedimento licitatório por motivo de ilegalidade não gera obrigação de indenizar, ressalvado o disposto no parágrafo único do art. 59 desta Lei.

§ 2º  A nulidade do procedimento licitatório induz à do contrato, ressalvado o disposto no parágrafo único do art. 59 desta Lei.

§ 3º  No caso de desfazimento do processo licitatório, fica assegurado o contraditório e a ampla defesa.

§ 4º  O disposto neste artigo e seus parágrafos aplica-se aos atos do procedimento de dispensa e de inexigibilidade de licitação. (grifo nosso).

Assim, a anulação do processo licitatório ou do contrato não gera imediata obrigação de indenização por parte da administração, mas também não a exonera do dever de indenizar o particular pelo que este houver executado até a data em que a anulação for declarada e por outros prejuízos regularmente comprovados, como veremos a seguir na análise do artigo 59 da Lei 8.666/93.

Destarte, caso devido, existe a possibilidade de pagamento por indenização ao particular, todavia faz-se necessário o atendimento dos seguintes requisitos:

- seja comprovada a boa-fé do fornecedor e caso ainda perdure a disponibilidade orçamentária por parte da Administração;

- seja firmado Termo de Ajuste de Contas e promovida sua publicação no Diário Oficial do Estado;

- comprovação da regularidade fiscal da empresa perante as fazendas públicas federal, estadual e municipal, INSS e FGTS, nos termos do art. 29 da Lei nº 8.666/93.

Ou seja, quanto à efetivação do pagamento, se é realmente devido à empresa contratada, antes que seja efetuado é necessário exigir certidões atualizadas que comprovem sua regularidade fiscal.

Somente depois de cumpridos esses requisitos é que o pagamento deverá ser concretizado.

3.1. O artigo 59 da Lei 8.666/93 e a obrigação de indenizar

Mesmo a contratação sendo nula, não existindo responsabilização do contratado, o pagamento dos serviços deve ser efetuado, a título de indenização, de conformidade com a regra constante do art. 59 da Lei 8.666/93, para que não ocorra enriquecimento sem causa, por parte da Administração, prática vedada pelo artigo 59 da Lei 8.666/93, verbis:

Lei 8.666/93:

Art. 59. A declaração de nulidade do contrato administrativo opera retroativamente impedindo os efeitos jurídicos que ele, ordinariamente, deveria produzir, além de desconstituir os já produzidos.

Parágrafo Único. A nulidade não exonera a Administração do dever de indenizar o contratado pelo que este houver executado até a data em que ela for declarada e por outros prejuízos regularmente comprovados, contanto que não lhe seja imputável, promovendo-se a responsabilidade de quem lhe deu causa. (grifos nossos).

Desta forma, deve a administração indenizar o particular pelos serviços/fornecimento executados até a data em que a nulidade foi declarada, desde que não tenha dado causa à esta nulidade.

3.2. O artigo 884 do Código Civil e o locupletamento ilícito

A responsabilização de quem deu causa aos prejuízos comprovadamente efetivados é item de primordial importância que, pelos princípios da moralidade e da legalidade, deve ser priorizada pela administração pública.

Destarte, o artigo 884 do Código Civil traz a possibilidade de restituição ao particular de valores auferidos com a falta de pagamento a este, por locupletamento ilícito, na possibilidade do particular não ter dado causa à nulidade contratual. Vejamos:

Código Civil:

Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários.

Assim, considerando-se que houve enriquecimento ilícito por parte da administração, advém o dever de indenizar o particular pelos valores indevidamente auferidos, desde que legalmente comprovados.

3.3. Dos ajustes de contas legais

Uma vez legalmente comprovado que a administração pública deve indenizar o particular, pugna-se para que seja viabilizado este pagamento pelo procedimento de ajustes de contas legais, lavrando-se o Termo de Ajuste de Contas e a publicação destes em Órgão Oficial.

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Em suma, para viabilizar o pagamento deverá ser lavrado Termo de Ajuste de Contas (art. 63, § 2º, da Lei nº 4.320/64), no qual constará a descrição dos serviços e a quitação, sem ressalvas, pelo prestador destes.

Neste ponto, é importante trazer os ensinamentos de Alexandre Santos de Aragão, Procurador do Estado e Advogado no Rio de Janeiro, mestre em Direito Público pela UERJ, em artigo publicado no Informativo de Licitações e Contratos – ILC nº 102 (agosto/2002 – p. 658):

A lavratura do termo de ajuste de contas, em casos como o ora analisado, é exigência da Lei Federal nº 4.320/64 (arts. 60 a 64) e, no caso do Estado do Rio de Janeiro, da Lei Fluminense nº 287 (arts. 90 a 95). O pagamento da despesa deve ser precedido de sua liquidação, que deve constar de documento escrito (art. 63, § 2º, Inc. I, Lei nº 4.320/64 e art. 90, § 2º, Inc. I, da Lei Fluminense nº 287/90) e possuir o respectivo empenho.

O termo de ajuste deverá conter a descrição e atestação minuciosa dos serviços prestados sem cobertura contratual válida e a quitação, sem ressalvas a ser dada pelo prestador dos serviços.

O valor a ser pago, conforme entendimento firmado em acordo, deve corresponder ao que fora estipulado no Termo de Ajuste de Contas ou no Relatório de Sindicância, caso não haja acordo, e desde que esgotadas todas as fases investigativas, mesmo sendo inválida a contratação. Evidentemente que desse critério de pagamento não pode resultar preço superior ao de mercado.

3.3.1. Uma análise do artigo 63 da Lei 4.320/64

O artigo 63 da Lei 4.320/64, nada mais é do que uma comprovação do direito adquirido pelo particular para que se efetive seu pagamento através da indenização. Objetiva apurar o objeto da contratação, seus valores e as comprovações de entrega/execução, de empenho e de acordos efetuados para se extinguir a obrigação. Vejamos a letra da Lei:

Art. 63. A liquidação da despesa consiste na verificação do direito adquirido pelo credor tendo por base os títulos e documentos comprobatórios do respectivo crédito.       

§ 1° Essa verificação tem por fim apurar:

I - a origem e o objeto do que se deve pagar;

II - a importância exata a pagar;

III - a quem se deve pagar a importância, para extinguir a obrigação.

§ 2º A liquidação da despesa por fornecimentos feitos ou serviços prestados terá por base:

I - o contrato, ajuste ou acordo respectivo;

II - a nota de empenho;

III - os comprovantes da entrega de material ou da prestação efetiva do serviço.

Desta forma, procede-se à liquidação dos valores devidos, comprovados através de todos os documentos que compõem o procedimento. Esta liquidação, pelo princípio da publicidade, deve ser publicada oficialmente através do Termo de Ajuste de Contas no Órgão Oficial, como veremos a seguir.

3.4. Da publicação dos ajustes de contas

Um resumo do Termo de Ajuste de Contas deverá ser publicado no Diário Oficial da União ou do Estado, conforme o caso, para que a sociedade e os órgãos de controle tenham conhecimento da existência da prestação desses serviços e do seu custo e possam exercer a devida fiscalização sobre a sua legalidade e economicidade.

A ausência dessa divulgação representaria afronta ao princípio da publicidade, previsto no art. 37, caput, da Constituição Federal, e no art. 3º, caput, da Lei Federal nº 8.666/93.


4. DOS PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVOS PARA APURAÇÃO DE RESPONSABILIDADES

A responsabilidade pela contratação indevida deverá sempre ser apurada, a bem da moralidade no serviço público.

Se o pagamento ao particular se efetivou, os danos ao erário deverão provocar a efetiva responsabilização do agente que lhe deu causa para que se reponha os valores e para que se puna exemplarmente quem agiu com conduta inadequada a um agente público.

Assim, segundo a Lei Federal n.º 8.112/90 – Estatuto dos Servidores Civis da União - a autoridade competente, assim que tiver ciência de quaisquer irregularidades, indicará uma comissão para imediata apuração que, após sua constituição, escolherá os encarregados para apurar as responsabilidades. Vejamos alguns artigos da Lei aplicáveis ao objeto:

Art. 143. A autoridade que tiver ciência de irregularidade no serviço público é obrigada a promover a sua apuração imediata, mediante sindicância ou processo disciplinar, assegurada ao acusado ampla defesa.

Art. 149. O processo disciplinar será conduzido por comissão composta de três servidores estáveis designados pela autoridade competente.

Art. 166. O processo disciplinar, com o relatório da comissão, será remetido à autoridade que determinou a sua instauração, para julgamento.

No capítulo IV, ‘Das Responsabilidades’, o legislador previu a responsabilização do servidor nas esferas administrativas, penais e civis. Vejamos alguns artigos:

Art. 121.  O servidor responde civil, penal e administrativamente pelo exercício irregular de suas atribuições.

Art. 122.  A responsabilidade civil decorre de ato omissivo ou comissivo, doloso ou culposo, que resulte em prejuízo ao erário ou a terceiros.

Art. 123.  A responsabilidade penal abrange os crimes e contravenções imputadas ao servidor, nessa qualidade.

Art. 124.  A responsabilidade civil-administrativa resulta de ato omissivo ou comissivo praticado no desempenho do cargo ou função.

Art. 125.  As sanções civis, penais e administrativas poderão cumular-se, sendo independentes entre si.

Art. 126.  A responsabilidade administrativa do servidor será afastada no caso de absolvição criminal que negue a existência do fato ou sua autoria.

No capítulo V, ‘Das Penalidades’, percebe-se a preocupação do legislador em explicitar minuciosamente as formas de penalizar o servidor no caso de comprovação da sua responsabilidade. Vejamos:

Art. 127.  São penalidades disciplinares:

I - advertência;

II - suspensão;

III - demissão;

IV - cassação de aposentadoria ou disponibilidade;

V - destituição de cargo em comissão;

VI - destituição de função comissionada.

A Lei 8.666/93, por sua vez, relaciona nos artigos 87 e 88 as sanções aplicáveis aos contratados da administração pública que deram causa à inexecução contratual. Vejamos:

Art. 87.  Pela inexecução total ou parcial do contrato a Administração poderá, garantida a prévia defesa, aplicar ao contratado as seguintes sanções:

I - advertência;

II - multa, na forma prevista no instrumento convocatório ou no contrato;

III - suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração, por prazo não superior a 2 (dois) anos;

IV - declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública enquanto perdurarem os motivos determinantes da punição ou até que seja promovida a reabilitação perante a própria autoridade que aplicou a penalidade, que será concedida sempre que o contratado ressarcir a Administração pelos prejuízos resultantes e após decorrido o prazo da sanção aplicada com base no inciso anterior.

§ 1º  Se a multa aplicada for superior ao valor da garantia prestada, além da perda desta, responderá o contratado pela sua diferença, que será descontada dos pagamentos eventualmente devidos pela Administração ou cobrada judicialmente.

§ 2º  As sanções previstas nos incisos I, III e IV deste artigo poderão ser aplicadas juntamente com a do inciso II, facultada a defesa prévia do interessado, no respectivo processo, no prazo de 5 (cinco) dias úteis.

§ 3º  A sanção estabelecida no inciso IV deste artigo é de competência exclusiva do Ministro de Estado, do Secretário Estadual ou Municipal, conforme o caso, facultada a defesa do interessado no respectivo processo, no prazo de 10 (dez) dias da abertura de vista, podendo a reabilitação ser requerida após 2 (dois) anos de sua aplicação.

Art. 88.  As sanções previstas nos incisos III e IV do artigo anterior poderão também ser aplicadas às empresas ou aos profissionais que, em razão dos contratos regidos por esta Lei:

I - tenham sofrido condenação definitiva por praticarem, por meios dolosos, fraude fiscal no recolhimento de quaisquer tributos;

II - tenham praticado atos ilícitos visando a frustrar os objetivos da licitação;

III - demonstrem não possuir idoneidade para contratar com a Administração em virtude de atos ilícitos praticados.

Observa-se que, tanto o particular que deu causa à inexecução contratual, quanto o servidor da administração pública que foi responsável pela nulidade na licitação ou contratação podem ser responsabilizados e a própria administração pública deve proceder a uma sindicância, no caso de faltas leves, ou processo administrativo, no caso de faltas graves, para apuração de responsabilidades aplicando-se as sanções previstas em lei.

4.1. A Sindicância como inquérito administrativo ou medida cautelar

Segundo João Bosco Barbosa Martins, auditor-fiscal da Receita Federal e especialista em Direito Administrativo pela UFPE, em artigo "A sindicância administrativa como instrumento sumário de busca de autoria ou da existência de irregularidades no serviço público federal" [02], definindo a sindicância administrativa:

A sindicância administrativa é um procedimento apuratório sumário que tem o objetivo de apurar a autoria ou a existência de irregularidade praticada no serviço público que possa resultar na aplicação da penalidade de advertência ou de suspensão de até 30 (trinta) dias.

Para o Juiz de Direito aposentado Pedro Madalena [03], numa análise dos já mencionados artigos 143 e 145 da Lei 8.112/90, na sua obra "Processo Administrativo Disciplinar sob o enfoque prático", advém:

Pelo que se colhe da leitura dos arts. 143 e 145 da Lei 8.112/90, a Sindicância vem a ser a adoção de uma medida investigatória de irregularidade cometida ou em fase de ocorrência no serviço público, que se desencadeia sem rito ou procedimento previamente estipulado, cuja finalização pode ensejar: a) o arquivamento do Processo; b) a aplicação de penalidade de advertência ou suspensão de até 30 (trinta) dias; c) a instauração de Processo Disciplinar. (MADALENA, 1999, p. 17-18).

Já na opinião de José Armando da Costa a palavra sindicância "traduz o conjunto de atos ou diligências empreendidos no seio de uma repartição pública, objetivando apurar o cometimento de possíveis irregularidades por parte dos seus servidores." (COSTA, 2005, p. 265).

Percebe-se que a doutrina recorre à palavra sindicância para definir os atos administrativos ou diligências no âmbito do serviço público que objetivam apurar a existência de irregularidades que possam resultar na aplicação das penalidades de advertência ou de suspensão aos responsáveis.

Após a sindicância, identificados os servidores envolvidos na prática de transgressão funcional, deverá ser promovida a apuração de suas responsabilidades, na via administrativa, aplicando-se as penalidades ou mediante instauração de processo disciplinar, para o caso de faltas graves.

Na hipótese de ter ocorrido dano patrimonial para a Administração, em decorrência da contratação irregular, os servidores responsáveis pela contratação e a empresa contratada deverão repará-lo, promovendo-se a respectiva ação judicial, se necessário.

4.2. O Processo administrativo disciplinar

Segundo o saudoso Mestre Hely Lopes Meirelles, o processo administrativo disciplinar "é o meio de apuração e punição de faltas graves dos servidores públicos e demais pessoas sujeitas ao regime funcional de determinados estabelecimentos da Administração". (Op cit. p. 567).

Entende-se como ‘falta grave’ um ilícito administrativo que corresponde à quebra de um dos interesses públicos da Administração, quais sejam, as infrações funcionais. Analisaremos as infrações funcionais que ensejam nulidades na licitação ou contratação no serviço público.

A priori, convém esclarecer a necessidade da administração pública seguir os princípios do Contraditório e do devido processo legal, utilizando a equidade e a proporcionalidade em todas as fases do processo, para que não incorra em arbitrariedades ou abuso de poder. Isto poderia gerar nulidade processual.

Segundo o procurador do Estado de Alagoas, Sérgio Ricardo Freire Pepeu no seu artigo [04] "Processo administrativo disciplinar", o Processo Administrativo Disciplinar

...é composto de três fases, a instauração, o inquérito administrativo dividido em instrução, defesa e relatório, e o julgamento. Se a Autoridade Administrativa não tiver elementos suficientes para instaurar o Processo Administrativo Disciplinar, quer por dúvidas quanto a autoria do fato ou por quanto a irregularidade ou não no serviço público procederá à sindicância, que de toda forma estará inclusa nos autos do processo administrativo disciplinar; a sindicância também é utilizada para a aplicação de punição quando o ato não exigir, expressamente, o Processo Administrativo. (PEPEU, 1999, p. 11).

Destarte, no caso da presença de elementos suficientes de irregularidades na contratação, esta perpetrada por agente da administração pública, para os servidores envolvidos na prática da irregularidade apontada (como no exemplo da contração de prestador de serviços sem a observância da Lei de Licitação), deve ser instaurado processo disciplinar para apurar suas responsabilidades administrativas.

Também deverá ser apurada a responsabilidade civil, dos servidores e dos representantes da empresa contratada, se restar configurada a existência de prejuízo para a Administração (superfaturamento de preços) e a responsabilidade penal, se forem identificados, no procedimento administrativo a ser instaurado (processo disciplinar), indícios da prática do crime capitulado no art. 89 da Lei 8.666/93, que veremos a seguir.

4.3. Das punições administrativas, civis e penais.

Após o processo disciplinar, identificados os envolvidos na prática da ilegalidade apontada (e.g, a contratação de prestador de serviços sem a observância da lei de licitações), terão que ser responsabilizados, conforme determina o parágrafo único do art. 59 da Lei 8.666/93.

Neste sentido, consignamos que o art. 89 desse diploma legal tipifica como crime tanto a dispensa ou inexigibilidade de licitação fora dos casos previstos em lei quanto a inobservância das formalidades atinentes a estes procedimentos, dispondo:

Art. 89. Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades pertinentes à inexibilidade:

Pena – detenção, de 3 (três) a 5 (cinco) anos, e multa.

Parágrafo Único. Na mesma pena incorre aquele que, tendo comprovadamente concorrido para a consumação da ilegalidade, beneficiou-se da dispensa ou inexibilidade ilegal, para celebrar contrato como o Poder Público.

No que concerne à responsabilidade penal, se restar configurada, deverá ser encaminhada cópia dos autos da sindicância ao Ministério Público, de conformidade com a regra constante do artigo 102 da Lei 8.666/93 e do artigo 154 da Lei 8.112/90, verbis:

Lei 8.666/93:

Art. 102.  Quando em autos ou documentos de que conhecerem, os magistrados, os membros dos Tribunais ou Conselhos de Contas ou os titulares dos órgãos integrantes do sistema de controle interno de qualquer dos Poderes verificarem a existência dos crimes definidos nesta Lei, remeterão ao Ministério Público as cópias e os documentos necessários ao oferecimento da denúncia.

Lei 8.112/90:

Art. 154.  Os autos da sindicância integrarão o processo disciplinar, como peça informativa da instrução.

Parágrafo único.  Na hipótese de o relatório da sindicância concluir que a infração está capitulada como ilícito penal, a autoridade competente encaminhará cópia dos autos ao Ministério Público, independentemente da imediata instauração do processo disciplinar. (grifos nossos).

No caso particular de responsabilização penal, Tribunais Superiores têm orientado suas decisões no sentido de punir apenas a conduta DOLOSA do agente, com conseqüente prejuízo à Administração. Vejamos:

CRIMINAL. PROCEDIMENTO LICITATÓRIO. JULGAMENTO DAS CONTAS PELO TRIBUNAL DE CONTAS. REGULARIDADE. ELEMENTO SUBJETIVO. DENÚNCIA. REJEIÇÃO.

1 - O entendimento pretoriano é no sentido de que a falta de observância das formalidades à dispensa ou à inexigibilidade do procedimento licitatório de que trata o art. 89 da Lei 8.666/93, apenas será punível "quando acarretar contratação indevida e retratar o intento reprovável do agente". "Se os pressupostos da contratação direta estavam presentes, mas o agente deixou de atender à formalidade legal, a conduta é penalmente irrelevante".

2 - O julgamento pelo Tribunal de Contas, atestando a regularidade do procedimento do administrador, em relação ao orçamento da entidade por ele dirigida, ou seja, a adequação à lei das contas prestadas, sob o exclusivo prisma do art. 89 da Lei 8.666, é, em princípio, excludente da justa causa para a ação penal, quando nada pela ausência do elemento mínimo da culpabilidade que viabiliza seja alguém submetido a um processo criminal, dada a falta de probabilidade ainda que potencial de uma condenação. Somente a intenção dolosa tem relevância para efeito de punição. O dolo no caso é genérico, mas uma consciência jurídica mais apurada não pode e nem deve reconhecer, quando da dispensa da licitação, como no caso, movida pelo justificado açodamento na conclusão e inauguração das obras, motivação ilegítima que a acusação não aponta e cifrada em vantagem pecuniária ou funcional imprópria.

3 - Denúncia rejeitada.

(STJ - Apn 323/CE. Relator Ministro Fernando Gonçalves, Órgão Julgador: Corte Especial. Julgamento: 05/10/2005, Publicação: DJ de 13/02/2006, p. 642). (grifos nossos).

Concluímos que tanto o legislador quanto os Tribunais Superiores trataram de prever a punição exemplar dos servidores ou particulares envolvidos em ilegalidades na licitação/contratação com o poder público, explicitando normas de conduta que devem ser seguidas rigorosamente, sob pena de responsabilização nas esferas administrativas, civis e penais, independentemente do pagamento por indenização ao particular ou ao ente público.

4.4. Uma análise da Lei Federal 8.429/92 – Improbidade Administrativa

A Lei 8.429/92, conhecida como Lei de Improbidade Administrativa, trouxe avanços significativos na questão da punibilidade ao agente público. De uma leitura de seus principais artigos percebe-se a intenção do legislador de não aceitar desvios na administração pública, tratando também de punir os seus agentes, sendo servidor ou não, considerando como agente público todo aquele que exerce, nas entidades públicas, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por qualquer forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função.

Vejamos alguns artigos desta Lei aplicáveis à espécie:

Art. 1° Os atos de improbidade praticados por qualquer agente público, servidor ou não, contra a administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, de Território, de empresa incorporada ao patrimônio público ou de entidade para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com mais de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita anual, serão punidos na forma desta lei.

Art. 2° Reputa-se agente público, para os efeitos desta lei, todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades mencionadas no artigo anterior.

Art. 3° As disposições desta lei são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta.

Art. 4° Os agentes públicos de qualquer nível ou hierarquia são obrigados a velar pela estrita observância dos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade no trato dos assuntos que lhe são afetos.

Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente:

I - facilitar ou concorrer por qualquer forma para a incorporação ao patrimônio particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º desta lei;

II - permitir ou concorrer para que pessoa física ou jurídica privada utilize bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º desta lei, sem a observância das formalidades legais ou regulamentares aplicáveis à espécie;

V - permitir ou facilitar a aquisição, permuta ou locação de bem ou serviço por preço superior ao de mercado;

...

VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente;

...

IX - ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento;

...

XIV – celebrar contrato ou outro instrumento que tenha por objeto a prestação de serviços públicos por meio da gestão associada sem observar as formalidades previstas na lei; (grifos nossos).

Percebe-se, portanto, a preocupação do legislador intentando proporcionar ao erário uma proteção significativa e conjugando a tipificação administrativa, cível e penal, notadamente aos gastos públicos sem amparo legal.

Tal avanço proporcionou ferramentas para que o executivo e o judiciário e o próprio legislativo, em qualquer esfera, tenha plenas condições de agir com o rigor necessário à causa pública.

Sobre o autor
Franklin Ramos de Carvalho

Advogado em São Luís-MA, pós-graduando em Direito Eleitoral. Engenheiro Eletrônico, pós-graduando em Eng. e Seg. no Trabalho

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CARVALHO, Franklin Ramos. Do pagamento por indenização na contratação sem licitação. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2627, 10 set. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17375. Acesso em: 18 dez. 2024.

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