6. CONCLUSÕES
Diante de todo o estudo realizado sobre o tema proposto, buscando obter pareceres, informações, artigos, enfim, matérias pertinentes ao assunto e, mesmo tendo enfrentado uma bibliografia escassa, foi possível chegar a algumas conclusões.
Pelas considerações esboçadas ao longo desta monografia, percebe-se que, para se posicionar a respeito da incidência ou não do ICMS nas operações da Internet, é preciso analisar a definição do próprio imposto em questão, bem como utilizar-se de conceitos clássicos do Direito Tributário Brasileiro.
O ICMS demonstra, sem dúvida alguma, um caráter mercantilista dentro da esfera tributária brasileira. É um imposto que, por tributar operações relativas à circulação de mercadorias e prestações de serviço de transporte interestadual e intermunicipal e comunicação, lida diretamente com o mercado econômico, constituindo-se, dessa forma, numa importantíssima fonte de receita para os Estados arrecadadores.
Nesta seara, é preciso levar em consideração não só a lucratividade do Estado enquanto detém essa valiosa fonte de recursos, mas, principalmente, o ônus que recai sobre o contribuinte deste imposto, eis que o setor econômico de um país é o centro da Nação.
A Internet, por sua vez, inserida na órbita econômica, representa uma peça de extrema relevância para o desenvolvimento geral de um país. Geral porque, nesses dias em que se aposta tudo na economia de tempo e de dinheiro, esse fenômeno revolucionário da área da informática se revelou um meio poderoso de facilitar tanto a vida de cada um dos cidadãos do mundo inteiro, como o planejamento e as táticas de governo dos Estados Soberanos.
Considerando as milhares de informações que podem ser obtidas através da rede, bem como todas as comodidades que o avanço da tecnologia nesta área pode oferecer, é inegável que o acesso à Internet constitui-se num dos métodos mais modernos de se chegar a um progresso econômico sócio-cultural.
Assim, levando-se em conta que o Brasil é um país em desenvolvimento, com graves mazelas nas áreas econômica e social e que apresenta um ônus tributário elevadíssimo, mister se faz analisarmos atentamente a possibilidade de incluirmos as operações da rede na pauta tributária. É preciso equilibrar os pratos da balança da Justiça, para que o contribuinte consiga suportar mais um pesado tributo sobre um serviço tão importante como este de acesso à Internet.
É certo que a justiça nunca vem de quem aplica a lei, mas sim de quem a sofre. Por isto, onerar estes serviços com alíquotas altíssimas, eis que o ICMS apresenta uma alíquota de 25%, seria, mais uma vez, negar que todo poder emana do povo, princípio constitucional assegurado aos cidadãos brasileiros por meio de representação.
Deste modo, se o legislador, que é o representante do povo para exercer o poder de criar as leis, agir de encontro ao interesse popular, caracterizado está o flagrante desrespeito à soberana vontade da população brasileira.
E é justamente para impor limites a intenções legislativas pejorativas dos nossos representantes no Congresso que a própria lei constitucional assevera o Princípio da Legalidade. Na esfera tributária, a máxima advém da regra que diz não existir tributo sem uma lei anterior que o defina.
Na esteira desse entendimento, para que seja possível tributar as operações da rede (sempre que se referir as operações da rede para fins de tributação, leia-se os serviços que são prestados pelos provedores de acesso à Internet. Isto porque essas operações só serão realizadas se existir a possibilidade de se ter acesso a elas, que se concretizarão, portanto, encima de um serviço prestado ao usuário para que essas operações virtuais se realizem faticamente) com ICMS, mister que essas operações estejam enquadradas na hipótese de incidência descrita na lei que rege esse imposto, para que, uma vez concretizadas no plano fenomênico, dêem ensejo ao fato gerador deste tributo.
É sabido que somente as operações relativas à circulação de mercadorias e prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação é que são passíveis de incidência de ICMS. Assim, necessária se faz uma classificação dos serviços prestados pelos provedores de acesso à Internet. É preciso saber qual é o tipo de serviço que é prestado ou, mais precisamente, se são serviços de comunicação ou não.
Analisando normas gerais de Direito Tributário e cotejando-as com a Lei Complementar n°87/96 que rege o ICMS e com a Lei de Telecomunicações Lei 9.472/97 (vale lembrar que a Lei 9.472/97, muito embora tenha revogado o artigo 10, parágrafo único da Lei 9.295/96, não modificou o entendimento do que seriam os serviços de valor adicionado. Apenas reestruturou-os, acrescentando mais algumas considerações a respeito da definição destes serviços), bem como com a Constituição Federal foi possível definir os serviços prestados pelos provedores de acesso como serviços de valor adicionado, o que indica que estão estes serviços fora do alcance de incidência tributária do ICMS.
Da análise do que são os serviços de valor adicionado e do que são os serviços de comunicação, pode-se vislumbrar que estes são um conjunto de atividades realizadas para que a comunicação ocorra ou que ofereçam meios para ela ocorrer, enquanto que aqueles são uma série de atividades realizadas encima de um serviço de comunicação preexistente, ou seja, eles têm um serviço de comunicação como suporte.
As operações da rede são desenvolvidas desta maneira, ou seja, elas somente se realizam se houver uma conexão suporte via telefone para ofertar a ocorrência da comunicação. É possível, portanto, desmembrar, juridicamente falando, esta operação em duas relações jurídicas distintas.
A primeira é a que existe entre o usuário e a concessionária local do sistema TELEBRÁS. O usuário se utiliza de uma linha telefônica para que tenha suporte a várias atividades que poderão ser desenvolvidas encima da prestação desse serviço. A empresa de telefonia está ofertando meios para que a comunicação via Internet ocorra. É um serviço de comunicação, portanto, e o usuário dele se utiliza para viabilizar a prestação de um serviço de valor adicionado, o qual, por sua vez, só se efetivará se existir este serviço de telecomunicação como base.
A segunda relação é a que existe entre o provedor de acesso e o usuário final. Os provedores de acesso à rede realizam a conexão dos usuários com a Internet, pois esta, sendo uma rede mãe de computadores, necessita de uma conexão local com o usuário para que este desfrute de suas operações. Esta ligação é feita pelo provedor, que somente vai prestar este serviço se já existir uma relação entre o usuário e a empresa de telefonia.
Nota-se, portanto, que essas duas relações jurídicas são distintas, porém interdependentes, pois o acesso à rede somente será viável se for executado um serviço base de comunicação para dar suporte a sua ocorrência. Enquanto o serviço prestado pela concessionária de telefonia é um serviço de comunicação, o serviço prestado pelos provedores de acesso são serviços de valor adicionado, não se confundindo com os de comunicação, portanto, muito embora deles dependentes.
Assim, sendo os serviços telefônicos serviços de comunicação, estão dentro dos parâmetros legais de incidência do ICMS, bem como atendem ao princípio da Estrita Legalidade Tributária e sobre eles recai, então, uma alíquota de 25%.
Nesta seara, é possível apontar um erro em se admitir que os serviços prestados pelos provedores de acesso à Internet também fossem classificados como serviços de comunicação. Se assim fossem classificados, sobre eles também recairia uma alíquota de 25% a título de ICMS, o que caracterizaria uma bitributação, uma vez que se estaria tributando duas vezes o mesmo fato gerador de um imposto. Seria dar guarida ao vício do bis in idem, eis que estaria sendo violado o limite da capacidade contributiva do contribuinte para esse fim, pois com alíquotas tão elevadas já se estaria beirando o confisco, bem como se caracterizaria o desrespeito ao Ordenamento Jurídico que o proíbe.
Outra falha em se considerar os serviços dos provedores como serviço de comunicação está no que dispõe a CF/88 (conforme preceitua o seu artigo 21, inciso XI) quando dita ser necessária autorização, concessão ou permissão para explorar os serviços de comunicação. É sabido que as empresas provedoras de serviço de acesso à rede não funcionam mediante autorização, concessão ou permissão do Poder Público, muito pelo contrário, elas giram em torno da iniciativa privada, não dependendo de qualquer outro requisito que não o capital para iniciarem e gerirem seus negócios.
Assim, uma vez que as atividades realizadas na Internet e prestadas pelos provedores de acesso são enquadradas perfeitamente na definição de serviços de valor adicionado e que, uma série de complicações se debruçariam sobre elas se fossem classificadas como atividades de comunicação (como pretendem alguns doutrinadores), tais como bitributação, violação à CF/88, em seu artigo 21, inciso XI, distorção da verdadeira natureza jurídica dos serviços prestados pelos provedores no afã de alargar as raias do fato gerador do ICMS, que, por sua vez, implicaria na quebra do princípio da Estrita Legalidade Tributária, enfim, várias e graves conseqüências que adviriam dessa definição, tentou-se esboçar algumas alternativas plausíveis para a tributação nas operações da Internet.
Uma delas foi a possibilidade de incidência do ISS nas operações da rede. Embora não aceita por boa parte da doutrina brasileira, essa alternativa tributária se mostra muito mais amena ao contribuinte do que a incidência do ICMS.
Quem entende ser inviável essa possibilidade, se alicerça no caráter taxativo da lista dos serviços tributáveis pelo ISS constante no Decreto-lei 406/68 e na Lei Complementar 56/87. Alegam que somente os serviços enumerados neste rol é que caracterizam o fato gerador deste imposto municipal.
Entretanto, a melhor maneira de encarar o Direito é de uma forma evolutiva, através de uma exegese dinâmica e atenta às modernidades que o avanço tecnológico, científico e cultural nos impõe. Assim, enxergar a lista pelo viés da taxatividade é o mesmo que parar no tempo por mais de dez anos e acreditar que nada evoluiu de lá até os dias de hoje.
Analogicamente, é possível enquadrar as operações da rede no item de número 24 da lista dos serviços tributáveis pelo ISS, que dispõe sobre análises de sistemas, exames, pesquisas, informações, coletas e processamento de dados de qualquer natureza.
Deste modo, o caráter meramente exemplificativo da lista é a melhor saída, inclusive para uma boa saúde econômica dos Municípios, que terão mais uma fonte de renda para obter receita através da tributação. E, para os contribuintes, ao invés de arcarem com uma pesada alíquota de 25% do ICMS, serão gravados com uma alíquota de, no máximo, 5%.
Além disso, tributar as operações da rede com ISS, não acarretará a ocorrência de bitributação e nem a violação do artigo 21, inciso XI da CF/88, pois, de maneira nenhuma seria possível, neste caso, enquadrar essas operações como atividades de comunicação, já que estas são passíveis de incidência de ICMS.
Entretanto, se restar pacificado o entendimento de que o ISS não é a melhor solução para esta questão, lançou-se a hipótese de os serviços prestados pelos provedores de acesso à rede estarem abrangidos pelo instituto jurídico da Imunidade Tributária.
Buscou-se essa alternativa na analogia, inclusive para fins do disposto no artigo 108 do CTN (o qual proíbe que o emprego da analogia resulte na exigência de tributo não descrito em lei), que seria possível fazer com a imunidade descrita no artigo 150, inciso VI, letra d da CF/88, que reza estarem imunes à tributação os livros, os jornais, os periódicos e o papel destinado a sua impressão.
Com efeito, se o jornal, o livro e o periódico são meios populares e hábeis de disseminação da educação e da cultura, sendo assim instrumentos de relevante interesse e significado público e, por atenderem a esse fim social de extrema importância, estão imunes a incidência dos tributos, não menos imunes estariam as operações da Internet, que, hoje em dia, estão colocando em segundo plano os livros e os jornais e cumprindo fielmente a sua função, servindo como um meio muito mais inteligente e eficaz de levar informações e sabedoria até as pessoas.
Assim, quem nega nos dias de hoje o papel relevante que a Internet exerce no mundo inteiro, em qualquer área, não vive numa realidade moderna e civilizada, mas sim tenta sobreviver de uma maneira esclerosada num mundo que não lhe garante mais lugar.
É preciso, portanto, saber que o Ordenamento Jurídico existe para assegurar os direitos dos cidadãos, bem como para garantir, através da lei e de uma conduta de valores, que as suas necessidades estarão garantidas. Deste modo, é preciso visualizar, antes de mais nada, os interesses populares que clamam pela jurisdicização do Direito.
Se a Internet tornou-se um concreto instrumento à disposição de qualquer pessoa, sendo utilizada em larga escala por todos, para os mais diversos fins, é lógico que deve ser regulada pelas normas jurídicas, para tentar evitar possíveis litígios nessa área.
Quanto à esfera tributária, que também faz parte do Ordenamento Jurídico, antes de qualquer outra, é preciso levar em consideração a tolerância econômica do contribuinte, bem como as graves conseqüências de uma tributação exorbitante, para que seja possível que as normas jurídicas garantam satisfação e segurança para os cidadãos brasileiros.
Assim, é preciso pesar as vantagens e as desvantagens de uma tributação na operações da Internet.
Acreditar na viabilidade de incidência de ICMS nestas operações seria o mesmo que negar a própria natureza jurídica dos serviços prestados pelos provedores de acesso, bem como incorrer em graves conseqüências para os cidadãos e para o Direito Brasileiro, tais como bitributação, violação dos dispositivos da Magna Carta Nacional e uma excessiva onerosidade tributária que extrapola os limites da capacidade contributiva dos contribuintes.
Visualizar na hipótese de incidir ISS nas operações da rede um caráter meramente exemplificativo da lista que o rege e empregar a analogia para tributar com este imposto os serviços prestados pelos provedores, alivia o país, como um todo, de todas aquelas mazelas supra mencionadas.
E, ainda, examinar a possibilidade de os serviços dos provedores estarem abrangidos pela Imunidade Tributária, caracteriza mais um caminho disponível para garantir uma interpretação moderna e evolutiva da Ciência Jurídica, bem como atende a um dos fins sociais mais importantes do Estado Brasileiro, levar educação e cultura de graça a todos os cidadãos brasileiros.
Contudo, não se espera esgotar aqui o assunto nem as alternativas tributárias viáveis ao tema proposto, mas tão somente abrir caminho para uma discussão que merece muita atenção por parte dos juristas e do legislador brasileiro. É preciso levar sempre em consideração a necessidade de livrar a mente do intérprete do direito daqueles conceitos e princípios bolorentos, que se agarram na lei, cegando muitos operadores jurídicos a ponto de privá-los da melhor visão que se pode alcançar da Ciência Jurídica, a Justiça.