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Excesso de lotação em unidade autônoma de condomínio edilício

Agenda 02/02/2011 às 12:58

Ocorrendo excesso de lotação em unidade condominial, é possível ao Condomínio Edilício obrigar a respectiva supressão? A resposta exige rápida lembrança de alguns dispositivos legais.

É sensível a conseqüência do excesso populacional em unidade condominial: abala a segurança desejável podendo por vezes inviabilizar o enfrentamento de sinistros – espraiando danos a condôminos e a visitantes; obviamente esse excesso perturba a utilização esperada e plausível, do prédio e dos equipamentos, pelos demais condôminos; eleva indubitavelmente as despesas de manutenção (basta exemplificar com o incremento da energia elétrica gasta nos elevadores, para atendimento do maior número de usuários); pode acarretar sanções da Administração Pública, fortemente danosas à massa condominial (sujeita a suportar multas ou até, à interdição do prédio).

O aspecto da segurança apresenta os maiores temores e, escaldada por eventos terríveis, a população dos centros urbanos aprendeu a submeter-se a treinamentos de fuga em caso de incêndios, a manter funcionários habilitados a lidar com eventos dessa espécie, a cuidar dos equipamentos e das instalações. Óbvio, o excesso populacional (vale dizer: a presença de gente em maior quantidade que a originalmente prevista e para a qual prédio e instalações foram planejados) pode acarretar danos de extrema relevância e notória seriedade.

A construção do prédio e a instituição do condomínio exigem, é claro, a atenção a diversas normas que basicamente buscam a atenção a critérios de segurança, urbanismo, salubridade, boa utilização do edifício, enfim.

Não é só: as peculiaridades do prédio são descritas e as regras de utilização são reduzidas a convenções, do que resulta ser o uso do edifício em condomínio, disciplinado por leis civis, pela legislação edilícia, pela convenção condominial. A todos esses diplomas, haverá o condômino de se curvar.

Sob o prisma dos deveres dos condôminos, está previsto no artigo 1333, do Código Civil, que a convenção condominial é "obrigatória para os titulares de direito sobre as unidades, ou para quantos sobre ela tenham posse ou detenção" e, dentre os deveres do condômino, insere-se a essencial obrigação de "dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores" (artigo 1336 – IV, do Código Civil). Logo, é inequívoco o respaldo legal para exigir a utilização adequada da unidade autônoma, em esperada atenção à convenção do condomínio.

Por igual são válidas as decisões alcançadas em assembléias do condomínio e ainda, aquelas previsões dispostas em regulamentos ou regimentos internos, desde que respeitadas as disposições legais. Afinal, nada mais são, tais decisões e regulamentos, que a expressão, alcançada pelo consenso dos mais atentos interessados (os condôminos), acerca da melhor forma de utilizar o que é comum (por exemplo, os corredores do prédio) e de disciplinar quanto possa atingir o uso do que seja particular (por exemplo, o apartamento durante a noite, quando se procura restringir o barulho a níveis razoáveis), sempre mantida a tolerância que naturalmente há de caracterizar a conduta de quem esteja em um condomínio e não em um imóvel isolado.

Sob o viés do que venha a estar estipulado na convenção do condomínio há de conter, esse diploma, normas racionais e adequadas à legislação, até porque de outra forma esbarraria em entraves para o seu registro e, se passasse pelas exigências formais em detrimento da legislação, findaria fulminada por nulidade, valor algum teria dada a palmar supremacia da lei (e do bom-senso) sobre os ajustes particulares. Em outras palavras: caso (por eventual defeito) a convenção do condomínio preveja lotação superior à admitida pela legislação, esta última prevalecerá sobre aquela.

É importante a averiguação da legislação edilícia. Na cidade de São Paulo a matéria foi disciplinada pela Lei 11.228/92, suas alterações e decretos que a regulamentaram. Basicamente, no que diz com o tema, a legislação municipal fixou critérios para cálculo da quantidade admitida de pessoas, em cada prédio e em cada pavimento.

A par da legislação propriamente dita, é rigoroso observar as normas técnicas homologadas pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), reconhecida como único "Foro Nacional de Normalização", por meio da Resolução nº. 07, de 24.08.1992, do Conselho Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial - CONMETRO. Tais normas podem restringir o exercício de atividades em determinadas circunstâncias (sendo fácil imaginar algumas restrições de atividades em edifícios) e são voltadas, exatamente, à proteção de direitos fundamentais (tais como o direito à segurança, ao meio ambiente, à saúde); são válidas, equiparando-se às leis, pois com base nelas editadas, como entendem os doutrinadores.

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É sempre de boa cautela, em questões dessa natureza, recordar o direito de vizinhança, regulado pelos artigos 1277 a 1281, do Código Civil. Não decorrerá conclusão outra: sempre será possível exigir uso do imóvel de maneira que jamais prejudique a segurança, o sossego, a saúde dos vizinhos e, sob este enfoque, vale frisar que existirá o "direito de fazer cessar" as práticas danosas. Sob esse regramento, aliás, são cediças decisões judiciais proibindo o inadequado uso de propriedades vizinhas em um sem número de situações, tais como quando haja excesso de barulho feito por bares, o exercício de atividades incompatíveis com a região, a manutenção de grande quantidade de animais sem condições de higiene. Nessa esteira, possível exigir-se a ocupação da unidade autônoma por população adequada.

Pois bem: desrespeitada previsão de uso adequado (segundo a lei, a convenção, norma técnica ou – por que não? – o bom senso), surgirá o direito de o Condomínio revigorar o bom uso e por igual, o dever de o Síndico do Condomínio, tomar as providências compatíveis.

Não parece suficiente a singela aplicação das multas mencionadas na lei, quiçá na convenção, merecendo realce, sobre a imposição de pena ao usuário nocivo, a necessidade de ser providenciada a urgente adequação do uso, única via para alcançar a segurança e o adequado estar dos condôminos e dos visitantes do prédio.

Em circunstância tal, parece perfeitamente manejável o pedido judicial de "antecipação de tutela" (artigo 273, do Código de Processo Civil) ou de pleito cautelar, conforme o caso concreto. Será postulado que jamais pretenderá proibir o uso da unidade condominial, mas, sim, terá por objetivo impedir o uso abusivo e vedar o acesso à unidade condominial, de freqüentadores em quantidade superior à admissível.

Desde que admitir o excesso populacional de uma unidade significaria extrair da massa condominial o direito ao uso razoável da propriedade, em benefício de um condômino apenas, extração que irritaria normas de variadas naturezas, mostra-se justificável a eliminação de tal excesso, cumprindo ao Condomínio, na hipótese, demonstrar adequadamente a infração, como condição necessária à obtenção de ordem judicial que restaure o uso adequado do imóvel.

Sobre o autor
Jaques Bushatsky

Advogado e administrador de empresas. Fundador e diretor da Mesa de Debates de Direito Imobiliário (MDDI). Integrante do Conselho Jurídico do Secovi-SP. Com mais de 30 anos de experiência, é especialista nas áreas de Condomínio e Locação. É sócio da Advocacia Bushatsky.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BUSHATSKY, Jaques. Excesso de lotação em unidade autônoma de condomínio edilício. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2772, 2 fev. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18403. Acesso em: 17 nov. 2024.

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