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A repercussão geral e a celeridade processual

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Agenda 14/02/2011 às 09:29

2.Celeridade processual e acesso à justiça

Dessa forma, percebe-se que a notória sobrecarga de trabalho observada na Suprema Corte representa mais um entrave na almejada celeridade processual. De fato, Abbud (2009, p. 293) traz algumas estatísticas que confirmam essa sobrecarga. No período entre 2000 e 2007, detectou-se que 96,2% dos processos que tramitaram no STF eram compostos por RE e Agravos de Instrumento (AI). Além disso, somente no ano de 2006, cerca de 110.116 dos processos que deram entrada no STF eram de RE e AI.

Diante disso, o legislador reformador procurou estimular um acesso pleno à justiça de modo mais ágil, instituindo a EC-45. Nessa Emenda, resgatou-se algo similar à arguição de relevância – existente antes da CRFB-88, e que denominou de RG. Esse passou a ser mais um pressuposto de admissibilidade dos RE, em um intuito de reduzir seu acesso à Suprema Corte.

2.1.Rito recursal

De modo geral, há dois juízos a serem tomados em relação a qualquer recurso. O primeiro trata da admissibilidade – onde são verificados certos pressupostos básicos que antecedem a análise seguinte. Nesta, por seu turno, é conferido o julgamento de mérito.

Diz-se, inicialmente, que o recurso é ou não conhecido, se presentes ou ausentes os referidos pressupostos de admissibilidade. Por conseguinte, com o julgamento do mérito, o mesmo recurso passa a ser ou não provido.

O recurso stricto sensu mais usual é a apelação, na qual um colegiado de magistrados processa um novo julgamento em consonância com o duplo grau de jurisdição previsto no ordenamento pátrio.

Deixando de lado embargos e agravos, cuja existência não busca essencialmente alterar decisões de mérito, passa-se a verificar o RESP e o RE. Enquanto aquele se destina ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), no que diz respeito a ofensas a leis federais; este, por sua vez, destina-se, primordialmente, a questões afetas aos dizeres constitucionais.

2.2.Recurso Extraordinário

Nesse sentido, desde a EC-45/04, não basta esse envolvimento constitucional, mas com igual importância se faz necessária verdadeira RG.

Com isso, os RE – responsáveis por grande parte do volume de trabalho da Suprema Corte, passam a encontrar mais um obstáculo no juízo de admissibilidade. Assim, o legislador reformador tentou dar maior importância àqueles recursos extremos que seriam merecedores de consumo temporal dos Ministros do STF.

Como afirmado anteriormente, o RE passa pelo crivo inicial da verificação dos pressupostos de admissibilidade – quer seja ele intempestivo, deserto, incabível ou carente de mais algum pressuposto, sua inserção junto ao STF se encerra nessa análise, a qual pode ser feita pelo Presidente do STF ou por seu Relator direto.

Estando contemplado pelos devidos requisitos de admissibilidade, o RE segue conhecido e aguarda pronúncia do Relator junto ao Plenário Virtual, a menos que seja presumida sua RG, nos dois casos previstos: decisão recorrida em oposição a verbete sumular e jurisprudência dominante, ambos do STF.

2.3.Matéria constitucional e Plenário virtual

Não sendo estabelecida a presunção, o Relator verifica se a matéria é da seara constitucional. Caso negativo, seu voto para a questão da RG acompanha automaticamente essa negação, haja vista não fazer sentido existir RG digna de apreço pelo STF diante de questões infraconstitucionais.

Nesse sentido, a ausência de manifestação dos demais Ministros implica em concordância tácita pela infraconstitucionalidade da matéria e consequente não conhecimento do recurso.

Caso contrário, se o Relator considerar a questão como de relevância constitucional, atribuirá esse voto, bem como aquele em que apreciará a RG.

Na sequência, votam os demais Ministros no meio virtual previsto. Assim, passados os vinte dias regimentais, a apuração é tomada com a presunção de RG a menos que se constitua o quorum qualificado de dois terços dos Ministros – ou seja, oito dos onze, em favor da ausência dessa RG – quando seria encerrada a questão com o não-conhecimento.

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Em seguida, pode ser melhor vislumbrada essa sequência lógica com o uso de um fluxograma delineador dos passos percorridos por essa questão dentro do STF.

  1. Fluxograma decisório de admissibilidade do RE no STF.

3.Perfil atual e perspectivas

Ao se lembrar da antiga arguição de relevância, utilizada em tempos anteriores à vigente Carta Magna, percebe-se o verdadeiro grau evolutivo concedido com a RG advinda da EC-45. Nesse sentido, Abbud (2009, p. 298) reforça que:

O advento da repercussão geral oficializa esse comportamento seletivo, tornando-o algo regulamentado, público e, nessa medida, controlável socialmente. Isso representa, sem dúvida, uma vantagem em relação ao sistema anterior e um ganho de qualidade à prestação jurisdicional oferecida nos recursos extraordinários. A aplicação daqueles antigos requisitos em situações questionáveis, às vezes de modo contraditório, torna-se a partir de agora absolutamente desnecessária.

Do mesmo modo, outra benécie observada e com reflexos futuros positivos reside na atenção concedida aos demais processos similares sobrestados no Tribunal a quo. De fato, na hipótese confirmada pelo não reconhecimento do caso paradigma como de RG, forçosamente seus semelhantes poderão ser liminarmente indeferidos, diante da ausência constatada do instituto ictu oculi.

Assim, denota-se uma evolução na prestação da atividade jurisdicional. Abbud (2009, p. 311) complementa que isso ocorreu "não tanto a partir de mecanismos atuantes sobre o processo, mas sobre o conjunto inter-relacionado de causas submetidas à apreciação do Judiciário, valorizando sua influência recíproca".

Ao se observar as estatísticas produzidas pelo STF para o ano de 2009, percebe-se a mudança substancial – na prestação jurisdicional, gerada pela introdução do instituto da RG no ordenamento pátrio. De fato, algo inédito ocorreu na distribuição de processo à Suprema Corte: esse total foi reduzido significativamente.

Segundo palavras do próprio STF (BRASIL, 2010b, p. 9), houve uma "rapidez proporcionada pelos institutos da repercussão geral e da súmula vinculante". Nesse sentido, o "resultado foi a redução no número de processos em trâmite na Corte, [...] e a diminuição no número de processos distribuídos.

Esse fluxo mais ágil pode ser vislumbrado na tabela a seguir, com redução superior a 38% no número de processos distribuídos.

  1. Variação do volume de processos junto ao STF, entre 2008 e 2009.

Processos

2007

2008

2009*

Δ%

Protocolados

119.324

100.781

81.081

-19,5

Autuados

108.099

73.271

60.318

-17,7

Distribuídos

112.938

66.873

41.107

-38,5

Baixados

128.485

90.727

71.319

-21,4

  1. BRASIL (2010b, p. 17).

* Período: janeiro a 10 de dezembro.

Com isso, a média de processos por Ministro, entre 2007 e 2008, caiu de 904 para 547 por mês, segundo o STF (BRASIL, 2009, p. 6). Na sequência, no biênio seguinte, também nos processos em tramitação houve redução: 9,4%, conforme aduz o STF (BRASIL, 2010b, p. 17).

  1. Variação do volume tramitado – STF, entre 2008 e 2009.

 

2007

2008

2009*

Δ%

Total em tramitação

129.206

111.855

101.378

-9,4

  1. BRASIL (2010b, p. 17).

* Período: janeiro a 10 de dezembro.

Essa redução fica mais notória quando observada na forma de gráficos como os disponibilizados pelo STF e exibidos abaixo.

  1. Processos em tramitação no STF. Comparativo 2006 x 2007 x 2008.
  1. Portal de Informações Gerenciais. (BRASIL, 2009, p, 6).

* Atualizado em: 15/12/2008.

  1. Protocolo X Autuação X Distribuição. Em 2006, 2007 e 2008.
  1. Portal de Informações Gerenciais. (BRASIL, 2009, p, 7).

* Atualizado em: 15/12/2008.

  1. Comparativo de Processos Distribuídos entre 2007 e 2008.
  1. Portal de Informações Gerenciais. (BRASIL, 2009, p, 7).

* Atualizado em: 15/12/2008.

  1. Carga de trabalho no STF, ao longo de cinco anos.
  1. Portal de Informações Gerenciais. (BRASIL, 2009, p, 11).

* Atualizado em: 15/12/2008.

No ano de 2008, o STF identificou que os AI e RE somaram 89% do total de processos em tramitação. Desse modo, torna-se claro e evidente o grau de "importância da aplicação do instituto da Repercussão Geral" (BRASIL, 2009, p. 8). E isso é nítido ao se analisar o gráfico e a tabela seguintes, de autoria do STF.

  1. Classe dos processos em tramitação – STF, em 2008*.

Classe dos processos

Total

AI

50.884

RE

45.811

Outros

12.509

Total

109.204

  1. BRASIL (2009, p. 8).

* Em tramitação até 15/12/2008.

  1. Classe dos processos em tramitação – STF, em 2008*.
  1. Portal de Informações Gerenciais. (BRASIL, 2009, p, 8).

* Em tramitação até 15/12/2008.

Essa é a verdadeira expectativa deixada no seio da sociedade brasileira: evolução das instituições rumo à almejada paz social, a qual somente poderá ser conquistada com um Judiciário célere e eficaz.


CONCLUSÃO

Com o passar dos anos, a demanda social por acesso à justiça encontrou possibilidade de vazão, mormente no período posterior à promulgação da atual Constituição. Assim, questões das mais diversas foram surgindo por todo o país e, gradualmente, foi havendo um acúmulo de Recursos Extraordinários no STF.

Isso veio a contribuir bastante para a morosidade da justiça no país. Desse modo, o legislador reformador lançou a Reforma do Judiciário, por meio da EC-45/04. Com ela, surgiu o instituto da RG, o qual somente fora implementado com a Lei nº 11.418/06 – que acrescentou dois artigos ao CPC, bem como com a ER nº 21/07, a qual estruturou o Regimento Interno do STF para trabalhar com esse instituto.

De fato, esse novo requisito de admissibilidade foi instaurado para reduzir o elevado afluxo de Recursos Extraordinários que demandavam a atenção dos Ministros do Supremo, restringindo-os a apenas os mais relevantes para a sociedade.

Logo, pode ser visto que, além desse benefício, outro também surgiu. Trata-se da possibilidade de não-conhecimento liminar no Tribunal a quo, de todos os recursos similares ao caso paradigma – que restavam sobrestados enquanto o STF cuidava da questão representante das demais. Obviamente, esse possível não-conhecimento liminar somente passa a estar disponível quando o RE paradigma não se constituir em verdadeiro caso de RG, conforme externar o acórdão corresponde do STF para essa situação.

Portanto, as perspectivas são positivas quanto ao impacto do instituto da RG para garantir a defendida celeridade processual.


REFERÊNCIAS

ABBUD, A. A. C. A repercussão geral dos Recursos Extraordinários e o julgamento por amostragem no âmbito do Supremo Tribunal Federal (CPC, Arts. 543-A e 543-B). In: GIANNICO, M.; MONTEIRO, V. J. de M. (Coord.). As novas reformas do CPC e de outras normas processuais. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. xxiv, 447 p.

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Sobre o autor
Anderson Lima do Nascimento

Graduando em Direito pela Universidade de Brasília - UnB; Especialista em Recursos Hídricos da Agência Nacional de Águas - ANA; Engenheiro de Infra-estrutura Aeronáutica pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica - ITA, com MBA em Gestão Pública pela Universidade Federal Fluminense - UFF.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

NASCIMENTO, Anderson Lima. A repercussão geral e a celeridade processual. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2784, 14 fev. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18483. Acesso em: 19 dez. 2024.

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