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A regulamentação do setor de telecomunicações no Brasil

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Agenda 28/02/2011 às 10:17

5. O Novo Plano Geral de Outorgas

O primeiro Plano Geral de Outorga do setor de telecomunicações foi instituído pelo Decreto nº 2.354/98 e, como já visto, tem a sua finalidade descrita no artigo 84 da LGT, a saber: definir as áreas de atuação das operadoras, o número de prestadoras para cada uma delas, seus prazos de vigência e o prazo para admissão de novas operadoras, conforme disciplina o artigo 84 da LGT.

A divisão do território nacional nas quatro regiões delimitou a área de atuação das empresas (as empresas somente podiam prestar serviços dentro da sua região de atuação). Sendo assim, a concessão de serviços de telefonia em mais de uma região a uma mesma operadora era vedado, o que impossibilitava a aquisição de uma empresa pela outra.

Em novembro de 2008, foi editado o novo Plano Geral de Outorgas (PGO), após a proposta ter sido aprovada pela Agência Nacional de Telecomunicações e analisada pelo Ministério das Telecomunicações e pela Casa Civil. As principais modificações deste novo PGO são condizentes ao disposto no artigo 6º, nos § § 1º e 2º.

O parágrafo primeiro permite a realização de transferência que resulte em Grupo que contenha concessionárias em Setores de mais de uma Região definida neste Plano Geral de Outorgas, desde que atuem em conformidade com o Plano Geral de Metas de Competição, editado pela ANATEL, observado o § 5º.

O parágrafo segundo veda as transferências que resultem em Grupo que contenha concessionárias em setores de mais de duas Regiões definidas no PGO. Assim sendo, o atual PGO admite o controle de uma mesma concessionária em duas regiões, o que era vedado pelo PGO revogado.

Diversas são as conseqüências destas modificações, principalmente em se tratando da resultante concentração econômica no setor de telefonia fixa. Pode-se mencionar que uma das principais barreiras à entrada resultante do novo PGO é a deteriorização da interconexão para os clientes das telefonias fixas entrantes.

As empresas incumbentes além de usufruírem dos poderes advindos do monopólio do Sistema TELEBRÁS, com as modificações do PGO também detiveram vantagem na expansão geográfica permitida, pois possuem um porte significativamente superior comparado ao das demais empresas.

Além disso, como parte significativa dos usuários são clientes das empresas incumbentes, estas levam grande vantagem, pois, em grande parte de suas ligações efetuadas, não há preço de interconexão a ser pago [21]. Ou seja, a probabilidade de um cliente de uma empresa incumbente efetuar a ligação para um indivíduo desta mesma empresa é bastante provável devido à sua vasta atuação no mercado.

Assim, torna-se inviável a entrada de empresas concorrentes no mercado, pois estas terão de cobrar preços bem mais altos em comparação às empresas incumbentes, pois o número de seus clientes será relativamente inferior em relação ao número de clientes das empresas que já atuam no mercado desde a época do monopólio na década de 60. Ou seja, praticamente todas as ligações efetuadas pelos clientes da empresa entrante serão destinadas a indivíduos de outras operadoras, o que eleva o custo de ligação em grandes proporções.

Esta vantagem das empresas incumbentes, de "barateamento" de seus serviços, não pode ser acompanhada por seus concorrentes, pelo fato destes possuírem gastos relevantes com as interconexões, o que inviabiliza seus negócios.

Outro impacto decorrente do custo de interconexão aliado à concentração econômica é a vantagem das empresas incumbentes na participação de licitações, pois poderá oferecer lances bem mais baixos, eliminando as demais concorrentes que, mesmo se mais eficientes, são obrigadas a cobrar preços mais elevados devido às circunstâncias desvantajosas em que se encontram [22].

Porém, cumpre salientar que a concentração econômica não acarreta somente em desvantagens. Este ato poderá ter efeitos positivos para a sociedade podendo gerar uma melhora significativa nos serviços oferecidos com um menor preço, proporcionar avanços tecnológicos, economias de escala e de escopo e até mesmo acirrar a concorrência.

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6. Conclusão

O processo de desenvolvimento das sociedades pode ser diretamente influenciado pelas relações de desenvolvimento e poder econômico, como ocorria na época dos monopólios, proporcionando efeitos negativos e inúmeras insuficiências. Porém, em determinadas ocasiões a concentração de poder pode se apresentar bastante favorável, possibilitando, por exemplo, o melhor aproveitamento de economias de escala ou impulsionando o avanço tecnológico.

Pode-se mencionar que na economia contemporânea, o modo como o poder econômico se estrutura e se manifesta está em grande medida relacionado ao controle dos processos de produção, distribuição e uso da informação e do conhecimento. A atual economia da informação indica que novas possibilidades de reorganização e concentração de poder surgem e são claramente percebidas e aproveitadas por certos agentes.

O problema é que, constantemente, os interesses pessoais, políticos e econômicos de uma casta da população, detentora de grande poder e influência, preponderam sobre os interesses dos demais cidadãos, tendo em vista a busca desenfreada pelo lucro, típica do sistema capitalista.

Assim sendo, nosso sistema exige regras para disciplinar as condutas socialmente reprováveis ou as resultantes dos antigos monopólios, criando um ambiente competitivo e eficiente.

Salienta-se que as normas não passam de uma mera "folha de papel" caso não correspondam aos anseios sociais ou não sejam aplicadas devidamente. Nossa legislação deve ser rigorosamente aplicada, vislumbrando a preservação da concorrência, do bem estar social e dos demais princípios fundamentais. Os agentes reguladores devem zelar pelos seus propósitos não possibilitando que o poder de certos agentes econômicos ou políticos interfiram negativamente em suas atividades.

O Estado não pode sofrer influências advindas de grande agentes econômicos como ocorria na época dos monopólios, pois, desta forma, aplicará uma concorrência destoante de seus ideais. A concorrência deve ser leal para assegurar as relações do mercado e proporcionar o resultante bem-estar da coletividade.


7. Referências

ARAGÃO, Alexandre Santos de. Competência Antitruste e regulações setoriais. Revista do IBRAC, São Paulo, v.16, n.1, p.35, 2009.

BARRETO, Celso Albuquerque. Repressão ao abuso do poder econômico. São Paulo: Atlas, 1964.

COELHO, André Felipe Canuto. Assimetria informacional e colapso regulatório: o caso da Anatel. RDPE, Editora Fórum, ano 5, n.17, p. 09-40, janeiro/março 2007.

COUTINHO, Diogo Rosenthal; FARACO, Alexandre Ditzel; PEREIRA NETO,Caio Mario da Silva. Universalização das telecomunicações: uma tarefa inacabada. RDPE, Belo Horizonte: Editora Fórum, ano 1, n.2, p. 09-58, abril/junho 2003.

COUTINHO, Paulo C.; OLIVEIRA, André L. Rossi. Os impactos regulatórios e de defesa da concorrência da aquisição da Brasil Telecom pela Oi. Disponível em: http://www.poseconomia.ucb.br/005/00502001.asp?ttCD_CHAVE=4437&btImprimir=SIM. Acesso em 10 de outubro de 2009.

DELMANTO,Celso. Curso de concorrência desleal. São Paulo: José Bushatsky Editor, 1975

ESCOBAR, João Carlos Mariense. O novo direito de telecomunicações. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999.

FARACO, Alexandre Ditzel. Democracia e regulamentação das redes eletrônicas de comunicação: radio, televisão e internet. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2009.

______________________Concorrência e universalização nas telecomunicações: evoluções recentes no direito brasileiro. RDPE, Belo Horizonte: Editora Fórum, ano 2, n.8, p- 09-121, outubro/ dezembro 2004.

______________________ Dinâmica da inovação na Internet e regulação do Poder Econômico. RDPE, Belo Horizonte: Editora Fórum, ano 6, n.22, p.09-30, abril/junho 2008.

FORGIONI, Paula A. Direito Concorrencial e restrições verticais. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007.

MATTOS, Paulo Todescan Lessa. O mercado regulatório do setor de telecomunicações no Brasil e as condições de legalidade da regulação assimétrica de serviços com fundamento na aplicação do conceito de poder de mercado significativo. RDPE, Belo Horizonte: Editora Forúm, ano 6, n. 22, p. 197-222, abril/junho 2008.

PEREIRA NETO, Caio Mário da Silva. Análise de concentração econômica no setor de comunicação: defesa da concorrência, democracia e diversidade na esfera pública. Revista de Direito da Concorrência (retrospectiva 2003). Brasília: IOB/CADE, 2003.

SALOMÃO FILHO, Calixto. Direito Concorrencial: as condutas. 1ª ed. São Paulo: Malheiros, 2007.

_____________________ (coordenação). Regulação e desenvolvimento. São Paulo: Malheiros, 2002.

______________________Direito concorrencial- as estruturas. São Paulo: Malheiros, 1998

SULLIVAN, Lawrence Anthony. Antitrust. St. Paul: West Publishing, 1992.

SUNDFELD, Carlos Ari. Transferência de controle de concessionária de telecomunicações. RDPE, Belo Horizonte: Editora Fórum, ano 3, n.10, p.77-85, abril/junho 2005.


Notas

  1. O presente texto não apresenta a evolução do setor de telecomunicações de maneira específica. O objetivo é demonstrar, sucintamente, os principais marcos da história do setor.
  2. Para visualizar melhor a significativa atuação do Sistema TELEBRÁS: "Ao completar 25 anos, em 1997, a TELEBRÁS já havia instalado mais de 17 milhões de telefones fixos, com tecnologia própria, de vanguarda e de reconhecimento mundial. Em julho de 1998, o Sistema Telebrás alcançou a marca de 18,2 milhões de terminais fixos instalados e 4,6 milhões de celulares, em 22,9 mil localidades". Os dados foram extraídos da página da internet: http://www.telebras.com.br/historico.htm, acesso em 15/07/2010.
  3. É a redação do caput do artigo 42 da Lei 4117/62: "Art. 42. É o Poder Executivo autorizado a constituir uma entidade autônoma, sob a forma de empresa pública, de cujo capital participem exclusivamente pessoas jurídicas de direito público interno, bancos e empresas governamentais, com o fim de explorar industrialmente serviços de telecomunicações postos, nos termos da presente lei, sob o regime de exploração direta da União". A EMBRATEL é a empresa que explora este setor.
  4. Nas palavras de André Felipe Canuto Coelho, está-se diante do colapso regulatório "quando políticas de regulação através de normas jurídicas não conseguem remediar os problemas de mercado que supostamente deveriam corrigir, ou ainda quando a intervenção gerar consequências não intencionais adversas sobre a eficiência (COELHO, 2007, p. 12).
  5. O serviço de telefonia fixa comutada é atualmente a única modalidade de serviço de telecomunicação prestada no regime público.
  6. Esta disposição está estabelecida no artigo 127, IV da Lei Geral de Telecomunicações. Nesse sentido, conforme menciona Paulo Todescan Lessa Mattos, "O princípio da isonomia está associado ao princípio da neutralidade concorrencial do Estado. O Estado não pode praticar atos que criem condições distintas de concorrência no mercado para agentes econômicos que estejam vinculados a um mesmo regime jurídico na oferta de produtos e serviços. Tal impossibilidade decorre diretamente do princípio da livre iniciativa, previsto no artigo 170, caput, da Constituição Federal" (MATTOS, 2008, p. 196-222).
  7. A ANATEL substitui a SDE e SEAE na instrução do processo, porém as secretarias podem emitir parecer no decorrer do processo.
  8. Quanto à complementaridade do CADE e da ANATEL, "a aplicação de regras de defesa da concorrência não é suficiente, por si só, para garantir o bom funcionamento do setor de telecomunicações. Trata-se de um setor em que a regulação tem um papel fundamental na garantia de diversidade e pluralismo" (PEREIRA NETO, 2003, p. 59).
  9. As regiões são constituídas da seguinte forma: Região I: Rio de Janeiro, Minas Gerais, Espírito Santo, Bahia, Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Ceará, Piauí, Maranhão, Pará, Amapá, Amazonas e Roraima. a Região II: Distrito Federal e os Estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins, Rondônia e Acre; a Região III congrega o Estado de São Paulo.
  10. Ressalta-se a competência da EMBRATEL para a prestação dos serviços de longa distância, tendo em vista a sua atuação em território nacional.
  11. São exemplos de concessionárias privatizadas ainda em exercício no setor de telefonia fixa no Brasil a Telemar/Oi (Região I), Brasil Telecom (Região II) e a Telefônica (Região III).
  12. Dispõe o caput do artigo 54 da Lei 8.884/94: "Os atos, sob qualquer forma manifestados, que possam limitar ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência, ou resultar na dominação de mercados relevantes de bens ou serviços, deverão ser submetidos à apreciação do CADE".
  13. "Universalizar significa tornar determinada categoria de serviço fruível por todos os seguimentos sociais, de forma ampla e sem limitações decorrentes de condicionantes econômicas, geográficas ou culturais" (COUTINHO; FARACO; PEREIRA NETO, 2003, p. 09-58).
  14. Importante salientar que a competência para assegurar a universalização, existência e continuidade dos serviços é competência da União. As obrigações incidem sob as prestadoras em regime público, não significando que estas sejam as competentes para assegurar tais princípios.
  15. As obrigações decorrentes da universalização serão objeto de metas periódicas, o que se realiza pela edição do Plano Geral de Metas de Universalização (PMUD). Salienta-se que as fontes de financiamento da universalização devem ser neutras em relação à competição. O artigo 81 da LTG, apresenta duas possíveis fontes de financiamentos neutros. A saber: (i) os orçamentos da União, dos Estados, dos municípios e (ii) um fundo constituído para esta finalidade e para qual contribuirão as prestadoras de serviços de telecomunicações nos regimes públicos e privados. Quanto à contribuição referente ao item (ii), é devida ao Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (FUST), uma taxa de 1% sobre a receita operacional bruta decorrente da prestação de serviços de telecomunicações em geral, conforme regula o artigo o disposto no artigo 6º da Lei nº 9998/00 (lei que instituiu o FUST).
  16. Consoante a esta afirmação, dispõe o artigo 6ª da LGT: "os serviços de telecomunicações serão organizados com base nos princípios da livre, ampla e justa competição entre todas as operadoras". Nesse sentido, há a configuração da concorrência até mesmo entre empresas de regimes jurídicos distintos.
  17. "A legislação brasileira Antitruste, embora impregnada de um sentido neoliberalista, não tem como único objetivo restabelecer o único mecanismo de preços e da concorrência. O legislador constituinte procurou, ainda, proteger o consumidor contra produtos que pretendem aumentar, arbitrariamente, seus ganhos em função de posições monopolísticas" (BARRETO, 1964, p.23).
  18. Nas palavras de Celso Delmanto, "o Estado quer e incentiva a competição, não só porque está representa uma das liberdades que ele garante a todos os indivíduos, como pelo que ela própria lhe significa em termos de desenvolvimento e progresso". (DELMANTO, 1975, p. 11).
  19. Dispõe o artigo 220, § 5º da Constituição Federal que "os meios de comunicação não podem, direta ou indiretamente, ser objeto de monopólio ou oligopólio".
  20. Nesse sentido, afirma Caio Mário da Silva Pereira Neto que "a preocupação mais ampla em relação a questões concorrenciais no setor de comunicação tem sua origem na doutrina e casuística norte-americanas. Naquele País, a discussão costuma ser articulada por meio de uma metáfora que se refere à eliminação de concorrência no "mercado de idéias" (marketplace of ideas), na qual o "mercado de idéias" é concebido como o lócus onde diversos valores intangíveis competem para a aceitação na sociedade. A concorrência no setor de comunicação é uma condição sine qua non para a garantia da concorrência entre pontos de vista antagônicos no mercado de idéias. Da mesma forma, mantendo-se a metáfora,estruturas monopolistas no setor de comunicação impedem a manifestação de diferentes pontos de vista, restringindo a concorrência de idéias" (PEREIRA NETO, 2003, p. 59).
  21. A tarifa de interconexão é fixada pela Resolução nº 458/2007 da ANATEL em seu artigo 12º.
  22. A legislação Alemã estabelece vários critérios para o estabelecimento do preço de interconexão. Por exemplo, o § 7 do decreto regulamentador (Telekommunikations-Entgeltregulierrungsverordnung, de 1996) veda as mudanças das tarifas dos serviços de rede caso isso prejudique as oportunidades dos agentes econômicos. No Brasil, a questão do preço de interconexão está disposta no artigo 157 da LGT, o qual determina que o provimento da interconexão às redes seja realizado em termos não discriminatórios, sob condições técnicas adequadas, garantindo preços isonômicos e justos, atendendo ao estritamente necessário à prestação do serviço.
Sobre a autora
Renata Carvalho Kobus

Graduando da Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Tem experiência acadêmica na área do direito, com ênfase em Direito Empresarial e Concorrencial. É monitora de Direito Societário, integrante do grupo de pesquisa "Regulação Econômica e Atuação Empresarial-PUC/PR" e desenvolve iniciação científica há três anos. Possui também experiências de estudo e trabalho no Conselho Administrativo de Defesa Econômica -CADE

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

KOBUS, Renata Carvalho. A regulamentação do setor de telecomunicações no Brasil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2798, 28 fev. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18572. Acesso em: 23 nov. 2024.

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