V. Conclusão
Inicialmente não entrando no mérito da questão da favorabilidade ou contrariedade quanto à extradição do italiano Cesare Battisti, olhamos com cautela a decisão do Supremo Tribunal Federal no que se refere à primeira dissidência analisada neste artigo. Aparentemente, evidencia-se uma incoerência jurisprudencial no que tange a concepção de crime político. Como anteriormente apresentado, levantou-se no julgamento o argumento de que a caracterização do movimento esquerdista PAC, que Cesare Battisti integrava, como um grupo armado, é fator relevante para a não caracterização dos crimes supostamente cometidos por ele como de cunho político. No entanto, em caso precedente, o mesmo tribunal julgou crimes políticos aqueles cometidos por ex-integrante do grupamento armado FARC.
Em termos de direito como integridade, essa contradição nos leva a crer que a análise jurisprudencial não foi suficientemente aprofundada, ocasionando uma severa ruptura do romance em cadeia dworkiniano. Tal fato gera uma instabilidade no sistema que terá efeitos em decisões futuras: em um caso semelhante, a análise jurisprudencial revelará interpretações conflitantes.
Quanto à segunda dissidência, acreditamos que o Supremo agiu corretamente ao interpretar constitucional e jurisprudencialmente no que se refere à competência para decidir sobre casos de extradição. Fica evidenciado o apreço pela não exacerbação da interferência entre os poderes, limitando-se o STF à tarefa que constitucionalmente lhe compete, segundo a interpretação majoritária da Corte.
É necessário salientar que, embora a figura do Presidente seja comumente associada ao exercício da soberania do Estado, soberana é a Constituição, que o permite, nesse caso, e com base na interpretação da corte responsável por resguardar a Carta Magna, tratar o caso de extradição como especificidade correspondente às relações internacionais com os demais Estados. Cabe, portanto, à figura do Presidente defender a soberania da República Federativa do Brasil.
Depreende-se da discussão sobre a competência para extraditar e da problematização acerca da concessão de status de refugiado a Cesare Battisti, a relação com um debate ainda maior: a judicialização da política, isto é, o poder judiciário interferindo em questões de competência do poder executivo. Embora instigue o debate, acreditamos que no caso analisado neste artigo tal fenômeno não fica caracterizado. Percebemos, na verdade, a intenção do Supremo Tribunal Federal de resguardar as competências estabelecidas constitucionalmente. E nesse ponto, creditamos plausibilidade ao procedimento e à decisão do tribunal.
Notas
3
Ext 1085/IT – ITÁLIA, Plenário, Rel. Ministro Cezar Peluso, j. 16/12/2009.4DECRETO N° 863, de 9 de julho de 1993.
5Ext 1008/CB – COLÔMBIA, Plenário, Rel. Ministro Gilmar Mendes, j. 21/03/2007.
Referências
DWORKIN, Ronald. Império do Direito. Tradução de: Jefferson Luiz Camargo. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
EXT 1085/IT – ITÁLIA, Plenário, Rel. Ministro Cezar Peluso, j. 16/12/2009.
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