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Competência processual internacional: particularidades e classificações

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Agenda 29/10/2011 às 13:22

4.Litispendência internacional

Agora adentra-se à análise do instituto da litispendência, que nas palavras de Dinamarco pode ser assim conceituado:

Litispendência é a pendência de um processo (pendência da lide). Um processo reputa-se pendente desde quando a demanda é apresentada ao Poder Judiciário (CPC, art. 263) até quando se torna irrecorrível a sentença que lhe põe termo com ou sem o julgamento do mérito (arts. 162, § 1º, 267, 269). (DINAMARCO, 2005, p. 370).

Neste mesmo sentido conceitua Jo (2001. p. 310), "O termo litis (lide) significa litígio, enquanto pendentia (pender, estar preso) significa ‘coisa pendente’. Por isso, litispendência significa a lide ou o processo que não foi decidido ou terminado, isto é, que está pendente".

No Código de Processo Civil, especificamente nos artigos 300 até 303, há a disposição do que cabe alegar preliminarmente na contestação. O artigo 301 traz uma série de questões que devem ser alegadas antes de iniciar a discussão sobre o mérito, e entre elas existe o instituto da litispendência. Conforme se denota abaixo:

Art. 301 - Compete-lhe, porém, antes de discutir o mérito, alegar:

...

V - litispendência;

...

§ 1º - Verifica-se a litispendência ou a coisa julgada, quando se reproduz ação anteriormente ajuizada.

§ 2º - Uma ação é idêntica à outra quando tem as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido.

§ 3º - Há litispendência, quando se repete ação, que está em curso; há coisa julgada, quando se repete ação que já foi decidida por sentença, de que não caiba recurso. (BRASIL, 1973).

Verifica-se, assim, que o próprio Código conceitua o instituto, demonstrando as hipóteses onde se configura a litispendência.

Vencidas as considerações iniciais sobre a litispendência no cenário processual civil nacional, adentrar-se-á na análise da litispendência internacional.

A litispendência internacional decorre das diferenças dos sistemas jurídicos processuais nos mais diversos países, sendo inevitável que ocorra em mais de um Estado processos sobre a mesma demanda. Infelizmente, ainda não há solução no âmbito internacional para tal situação.

Denota-se que a concorrência das jurisdições em um mesmo país não é nada interessante, tampouco a concorrência de jurisdições de Estados diversos. Enquanto no âmbito nacional a parte pode argüir litispendência, esta alegação não cabe em foros internacionais diversos.

A respeito dos tipos de litispendência internacional, ensina o doutrinador:

Existe um tipo pelo qual uma mesma ação ocorre concomitantemente no tribunal nacional e no tribunal estrangeiro. Esse tipo de litispendência internacional ocorre quando um mesmo autor interpõe duas ações contra um mesmo réu ou quando as posições ocupadas pelas partes diferem nas duas ações. Já um outro tipo de litispendência internacional é aquela na qual uma mesma ação ocorre concomitantemente em tribunais estrangeiros diferentes. Na prática, o tipo mais freqüente que se encontra é aquele onde uma mesma ação ocorre concomitantemente no tribunal nacional e no estrangeiro. (JO, 2001, p. 310).

Existem algumas teorias que dispõem soluções para o caso, destacando-se algumas dentre elas, de acordo com Jo (2001):

1.Teoria negativa do controle (teoria do não controle): Esta corrente entende de que não é possível a litispendência internacional. Ou seja, mesmo que exista processo no exterior, o juiz nacional deve apreciar a demanda aqui intentada. É irrelevante o processo no estrangeiro. O inconveniente é a dificuldade de harmonização da sentença, caso ocorra homologação. Esse sistema é seguido pelo Brasil.

2.Teoria do controle ativo (teoria da negação da litispendência internacional): Esta teoria defende que caso haja uma ação com a expectativa de ter a sua sentença ser homologada no país, o país deve recusar a nova lide, aplicando os princípios da litispendência nacional. O inconveniente é a relação de dependência com uma futura sentença estrangeira.

3.Teoria do foro próprio ("Propter forum theory"): Esta vertente baseia-se na possibilidade do foro nacional onde a ação for interposta ser mais adequada do que a estrangeira. Teoria de uso comum nos países que utilizam o sistema commom law. O grande inconveniente é que dependendo da posição do juiz, o foro pode ser conveniente ou não. Fato este que acaba gerando instabilidade jurídica. Na ocorrência do reconhecimento da jurisdição, poderá ser negada futuramente a homologação de sentença estrangeira.

4.Teoria do interesses das ações: Esta teoria vê a interposição de uma ação no exterior como renúncia à jurisdição nacional.

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No Brasil, a teoria adotada a respeito da matéria está disposta no art. 90 do Código de Processo Civil, in verbis:

Art. 90 - A ação intentada perante tribunal estrangeiro não induz litispendência, nem obsta a que a autoridade judiciária brasileira conheça da mesma causa e das que lhe são conexas. (BRASIL, 1973).

Denota-se, assim, a possibilidade de dividir o artigo em duas orações, sendo que, primeiramente, a ação intentada perante tribunal estrangeiro não induz litispendência e que, como segunda oração, não obsta a que a autoridade brasileira conheça da mesma causa e das que lhe são conexas.

Desta forma, chega-se a conclusão de que caso ocorra a propositura de uma demanda no exterior, isto não produzirá no Brasil um estado de processo pendente, e de que nada impede a repropositura de uma demanda em tríplice identidade com aquela.

A esse respeito, destaca Cândido Rangel Dinamarco:

Nega-se que a pendência de processo no exterior impeça a propositura da mesma demanda aqui, até porque o juiz brasileiro de primeiro grau, ao apreciar eventual defesa consistente nessa litispendência estrangeira, teria de penetrar no exame dos requisitos para a homologação de sentença que lá vier a ser proferida – o que consistiria uma antecipação do juízo de delibação reservado ao Superior Tribunal de Justiça. (DINAMARCO, 2005, p. 371).

Apesar de todo o exposto, é inegável que algum efeito possa produzir a litispendência internacional, dentre os quais destaca o doutrinador:

A pendência de um processo no Brasil (litispendência) produz certos efeitos substanciais e processuais em relação às partes e, em alguma medida, também perante terceiros (infra, nn. 406-407). A litispendência estrangeira não produz os efeitos processuais consistentes em prevenir o juízo, perpetuar a competência, estabilizar a demanda ou suspender outros processos em caso de prejudicialidade (art. 90, 1ª parte). É, porém razoável o entendimento de que a citação válida, ainda quando feita alhures, produz os efeitos substanciais de constituir o devedor em mora, interromper a prescrição ou tornar litigiosa a coisa (infra, nn. 419 ss.). (DINAMARCO, 2005, p. 371).

Jô (2001, p. 313) acrescenta que: "O art. 90 do CPC não reconhece claramente a existência de litispendência internacional no Brasil, apesar do conflito com o Código de Bustamante".

Além disso, no Brasil, a extinção do processo está calcada na coisa julgada e não na litispendência. Desta maneira, a interposição do processo não é o mais importante, mas sim, qual deles transitará em julgado primeiro, seja a homologação de sentença estrangeira, seja o processo em trâmite no território nacional. Assim, uma vez transitado em julgado um dos processos, o outro deverá ser extinto.

Tal situação, frisa-se, só é passível de discussão na competência concorrente, porque nesta hipótese, as partes podem recorrer a mais de um foro, em diversos países. Desta forma, uma das partes pode acionar a outra em outro foro, sem que haja litispendência.

Portanto, conclui-se, a litispendência internacional não gera efeitos processuais no direito pátrio, de forma a impedir o devido processamento de igual demanda perante o judiciário brasileiro.


5.Considerações finais

O presente trabalho teve por objeto a análise da competência do judiciário brasileiro em matérias com cunho internacional, visando oferecer uma visão sobre os institutos que integram este tema, fundamentando na doutrina, jurisprudência, leis e regulamentos.

Primeiramente, efetuou-se uma breve distinção entre jurisdição e competência, ainda sob o âmbito de direito interno, de maneira a explicitar que competência é uma delimitação da jurisdição, é a medida da jurisdição, ou ainda, a maneira de exercer a jurisdição, que é una.

Em seguida, passou-se a análise da jurisdição internacional propriamente dita, expondo a sua conceituação, abrangência, espécies e tipos. Visando, assim, situar e delimitar a matéria a ser tratada, que no Brasil encontra-se disposta nos artigos 88 e 89 do CPC, onde se estabelece as matérias que possuem conexão internacional que o Brasil é competente para analisar.

Ato contínuo, analisou-se as classificações doutrinárias da competência internacional, de maneira a dar noção sobre as diversas classificações efetuadas pela doutrina. Dentre estas classificações, destacam-se a de competência absoluta e relativa, e exclusiva e concorrente. Enquanto na relativa/concorrente, outro país poderá analisar a lide além do Brasil, podendo a sentença ser homologada no Brasil, na competência absoluta/exclusiva caberá unicamente aos tribunais pátrios conhecerem a lide, sendo não produzindo qualquer efeito no Brasil as decisões prolatadas no estrangeiro.

Por fim, adentrou-se ao tema da litispendência internacional, concluindo, de forma devidamente fundamentada, o não reconhecimento do instituto perante o direito brasileiro. Assim como, a impossibilidade de reconhecimento deste de forma a obstar o prosseguimento de igual demanda já proposta no estrangeiro perante o judiciário brasileiro.


Referências

RECHSTEINER, Beat Walter. Direito Internacional privado: teoria e prática. 11 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008.

JO, Hee Moon. Moderno direito internacional privado. São Paulo: LTr, 2001.

DIDIER JÚNIOR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil. Bahia: Podivm, 2007.

DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Civil: Volume I. 5ª ed. São Paulo: Malheiros, 2005.

SILVA NETO, Orlando Celso da. Direito Processual civil internacional brasileiro. São Paulo: LTr, 2003.

BRASIL, Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Institui o Código de Processo Civil. Disponível em: www.planalto.gov.br. Acesso em 10 de mar. 2009.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental na Carta Rogatória 2.116 - US. Agravante: Companhia Industrial do Sisal – CISAL contra decisão do Relator. Relator Ministro Barros Monteiro. Órgão Julgador Corte Especial. Data do Julgamento 30/06/2008. Data da Publicação/Fonte DJe 07/08/2008. Acesso em 03 de mar. de 2009. Disponível em: www.stj.jus.br.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 05 de outubro de 1988. Disponível em: www.planalto.gov.br. Acesso em 10 de mar. 2009.

ARAÚJO, Nadia de. Direito Internacional privado: teoria e prática brasileira. Rio de Janeiro: Renovar, 2003.

Sobre o autor
Ariel Aleixo Frainer

Advogado bacharel em Direito pela Universidade Regional de Blumenau - FURB. Pós graduando em Direito Constitucional pela Universidade Anhanguera - Uniderp em parceria com a Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FRAINER, Ariel Aleixo. Competência processual internacional: particularidades e classificações. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 3041, 29 out. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20334. Acesso em: 24 nov. 2024.

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