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A problemática da efetivação dos direitos fundamentais no século XXI

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Agenda 31/12/2011 às 16:23

4 Conclusão

Mais de vinte anos após a promulgação da Constituição Federal de 1988, são incontestes os avanços conseguidos. Porém, mais importantes do que todas as conquistas, hoje, é a efetivação dos direitos já assegurados pela norma legal. Não é mais necessário justificar, mas sim concretizar.

Diante da realidade atual, embora os direitos fundamentais ainda não apresentem existência real para grande parte dos brasileiros, devido à marginalização social e a discriminação econômica são indiscutíveis as mudanças que estão ocorrendo. As camadas sociais mais baixas estão conhecendo mais seus direitos e, por consequência, passando a exigí-los, e muito já avançou no sentido de organização de grupos para gestionar reivindicações.

Contudo, urge a necessidade de transcender o campo da dialética e da hermenêutica, a fim de assegurar aos cidadãos a efetividade de seus direitos. Verifica-se que o grande número de direitos fundamentais conduz à dificuldade na própria interpretação, mas devem ser criados caminhos que levem à consolidação de uma democracia participativa e voltada a atender os anseios da cidadania. A norma está criada, e, diga-se, muito bem. O próximo passo é a concretização dos direitos fundamentais.

Ainda, dando ênfase ao acesso à justiça, que representa a possibilidade última de efetivação daqueles direitos desrespeitados, imprescindível a reestruturação física, com a ampliação do quadro de Defensores Públicos, Promotores de Justiça, Juízes e servidores, bem como, a dotação do aparato operacional necessário como forma de assegurar a atuação do Judiciário e dos princípios do contraditório, a ampla defesa e a existência de um processo em prazo razoável.

Considerando a caótica situação do Poder Judiciário, a implementação de novas técnicas de resolução de conflitos no campo extrajudicial, tais como a arbitragem e a mediação, no âmbito do direito econômico e de família tendem a ajudar no processo de não engessamento desse Poder, que ficaria reservado à análise e julgamento dos demais direitos. Denota-se que, com a adoção de meios alternativos se estaria - senão terminando - reduzindo vertiginosamente problemas usuais que ferem direitos fundamentais.

Nessa perspectiva destaca-se a atuação dos PROCON’s, dos núcleos de apoio jurídico e instituições voltadas ao atendimento de consumidores, mantidos por diversas universidades, que representam um modo de auxílio às pessoas mais necessitadas, não apenas com a prestação de atendimento judicial, mas também com esclarecimentos que, não raras as vezes, evitam o ajuizamento de um novo processo e, com ele, toda a problemática que segue.

Diante desse contexto, a atuação de juízes, advogados e promotores ganha contornos ainda mais nobres, pois cabe a estes observar os preceitos legais e aplicá-los ao caso concreto, pois toda norma deve conduzir à sua própria concretização. O ensino jurídico, igualmente, apresenta importância fundamental, sendo imprescindível inserir valores éticos nestes que logo estarão fazendo parte da cena jurídica e, como tal, buscando a defesa dos direitos fundamentais.

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Tal atitude, por seu turno, não pode ser construída sob meras projeções, mas, sim, com a atenção dos três poderes voltadas para esta realidade, ao lado dos anseios dos cidadãos, fazer com que os meios sejam alcançados efetivamente.

A democratização da justiça somente pode ocorrer quando o povo conhece não apenas seus direitos, mas suas limitações. Assim, imperiosa a valorização do ensino, que reflete problema de base no país, como intercâmbio de idéias e transformações. Nesta senda, o Estado, associações de classe, escolas, universidades e os meios de comunicação massiva (rádio, televisão, jornais, revistas) possuem papel importante na conscientização popular acerca dos direitos e limites impostos pela norma legal.

A Fazenda Pública, por sua vez, também possui papel importante na proteção dos direitos fundamentais. Há um número expressivo de ações contra a Fazenda Pública que poderiam, com facilidade, ser resolvidas na esfera administrativa, porém a negativa importa no ajuizamento de ações, diga-se, até mesmo sobre matérias pacificadas e sobre as quais o próprio ente federado já promulgou lei disciplinando a matéria. [55]

Forçoso concluir, assim, que muito já se avançou na conquista por direitos, e a Constituição Federal de 1988, ao positivar os direitos fundamentais dos cidadãos é prova disso. Porém, muito ainda deve - e pode – ser feito. Sendo fundamental tudo o que é básico, essencial, o Estado possui papel imprescindível na garantia de acesso irrestrito e proteção destes direitos aos cidadãos, universalmente. Reunindo forças entre os três poderes, traçando objetivos concretos e colocando-os em prática, a efetivação dos direitos fundamentais é uma realidade possível. Não basta munir os homens de leis ou enchê-los de direitos, é preciso conferir justiça.

O desafio do século XXI é, diante de uma sociedade complexa, buscar a valorização da integridade do ser humano e da vida digna, com o respeito aos direitos do outro, para só então ser possível a efetivação dos direitos fundamentais. Não basta acreditar. É preciso fazer.


Notas

  1. Para Streck e Morais, a constituição e desenvolvimento do Estado Moderno está calcada em quatro eixos: centralização e concentração de poder; supressão ou rarefação e, por conseguinte, neutralização ou debilitação, ao nível societário, das associações e comunidades intermediárias e das instituições e poderes de nível intermediário dotados de alguma autonomia; redução de população independente de classes a uma massa indistinta, anônima, uniforme, ou seja, à igualdade abstrata de sujeição comum a um poder direto e imediato; de um movimento em virtude do qual o Estado se separa e isola da sociedade. E arremata que a organização burocrática vem a ser o elemento fundamental que viabiliza os outros elementos essenciais de cuja confluência resulta a realidade material do país. STRECK, Lenio Luiz; MORAIS, José Luis Bolzan de. Ciência Política e Teoria do Estado. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p. 28-29.
  2. Na lição de Streck e Morais, "são princípios do Estado Democrático de Direito: A- Constitucionalidade: vinculação do Estado Democrático de Direito a uma Constituição como instrumento básico de garantia jurídica; B- Organização Democrática da Sociedade; C- Sistemas de direitos fundamentais individuais e coletivos, seja como estado de distância, porque os direitos fundamentais asseguram ao homem uma autonomia perante os poderes públicos, seja como um Estado antropologicamente amigo, pois respeita a dignidade da pessoa humana e empenha-se na defesa e garantia da liberdade, da justiça e da solidariedade; D- Justiça Social como mecanismos corretivos das desigualdades; E- Igualdade não apenas como possibilidade formal mas, também, como articulação de uma sociedade justa; F- Divisão de Poderes ou de Funções; G- Legalidade que aparece como medida do direito, isto é, através de um meio de ordenação racional, vinculativamente prescritivo, de regras, formas e procedimentos que excluem o arbítrio e a prepotência; H- Segurança e Certeza Jurídicas." STRECK; MORAIS, Ciência política e teoria geral do estado, p. 92.
  3. Ibid., p. 91.
  4. BARROSO, Luís Roberto. Constituição: etimologia e noções fundamentais. In: BARRETO, Vicente de Paulo (coord.). Dicionário de Filosofia do Direito. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 144-148.
  5. DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. São Paulo: Martins Fontes, 2002. p. 27-46.
  6. ALEXY, Robert. Sobre a Estrutura dos Princípios Jurídicos. Revista Internacional de Direito Tributário, Belo Horizonte: Del Rey, v. 3, jan./jun., 2005. p. 155-167.
  7. Para doutrinador José Alcebíades de Oliveira Junior, não são quatro gerações, e sim cinco. Na primeira geração estão os direitos individuais, que pressupõe a igualdade perante a lei e consideram o sujeito abstratamente; na segunda geração, consubstanciada nos direitos sociais, onde o sujeito é visto enquanto inserido no contexto social. Trata-se da passagem das liberdades negativas, de religião e opinião, por exemplo, para os direitos políticos e sociais, com a intervenção estatal, os direitos da terceira geração são os direitos transindividuais, também chamados de coletivos e difusos; na quarta geração encontram-se os direitos de manipulação genética, relacionados com a biotecnologia e a bioengenharia e que tratam da questão da vida e da morte; os direitos de quinta geração, por sua vez, são aqueles advindos da chamada realidade virtual, que compreendem o grande desenvolvimento da cibernética, implicando o rompimento de fronteiras e estabelecendo conflitos entre países com realidades distintas. JUNIOR, José Alcebíades de Oliveira. Teoria Jurídica e Novos Direitos. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2000. p. 85-86.
  8. Entende-se que possui fundamento a crítica que se criou na doutrina ao falar em gerações, pois não são eras, mas sim fases complementares entre si, que inexistem sem as demais. Contudo, nessa pesquisa as expressões gerações e dimensões serão tidas como sinônimos.
  9. Entre os direitos de terceira geração destaca-se o direito ao meio ambiente, aos recursos naturais e ao desenvolvimento.
  10. BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 12 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2002. p.525.
  11. SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 4 ed. rev., atual. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p. 61.
  12. A primeira realização concreta de direitos humanos ocorreu muito depois da Idade Antiga. No século XIII o absolutismo real, até então vigente, passou a ser contestado na reação dos barões ingleses que impuseram a João Sem-Terra o reconhecimento de direitos fundamentais existentes na Magna Carta. Importante anotar que, já em 1.215, com a Magna Carta se estabeleceu o direito fundamental que o governo deveria significar mais do que o domínio arbitrário, e o costume e a lei deveria erigir-se sobre o rei. Posteriormente sobreveio a Declaração dos Direitos do Homem adotada pelos Estados Unidos em 1776 e na França a partir da Revolução de 1789. JUNIOR, Teoria Jurídica e Novos Direito,p. 139-142.
  13. FACHIN, Luiz Edson; RUZYK, Carlos Eduardo Pianovski. Direitos fundamentais, dignidade da pessoa humana e o novo Código Civil: uma análise crítica. In: SARLET, Ingo Wolfgang (org.). Constituição, Direitos Fundamentais e Direito Privado. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003. p. 107-104.
  14. SARLET, op. cit., p. 47-48.
  15. Explica Luño que as primeiras constituições eram divididas em duas partes: a "dogmática" composta pelo rol dos direitos naturais positivados pela própria Carta Magna, com o intuito de não sofrer modificações por parte da legislação ou da administração; e a "orgânica" que disciplinava a estrutura e o funcionamento do Estado e seus poderes. Sua característica era a "rigidez constitucional", para proteger o conteúdo de eventuais alterações. LUÑO, Antonio Enrique Perez. Derechos humanos, estado de derecho y constitucion. 5.ed. Madrid: Tecnos, 1995. p. 251.
  16. SARLET, op. cit., p. 52-53.
  17. Ibid., p. 77-79.
  18. MENDES, Gilmar Ferreira. Os Direitos Fundamentais e seus Múltiplos Significados na Ordem Constitucional. Revista Diálogo Jurídico, Salvador, n. 10, 2002. Disponível em: http://www.direitopublico.com.br. Acesso em 21 de ago. de 2011.
  19. SARLET, A eficácia dos direitos fundamentais, p. 54.
  20. Enquanto os direitos fundamentais são aqueles positivados na Constituição Federal, e, por conseguinte, aplicáveis aos membros de determinado ordenamento jurídico.
  21. MORAIS, Alexandre de. Direito Constitucional. 22 ed. São Paulo: Jurídico Atlas, 2007. p. 28.
  22. SARLET, A eficácia dos direitos fundamentais,p. 25.
  23. ALEXY, Robert. Teoria de los Derechos Fundamentales. Madrid: Centro de Estudios Políticos y Constitucionales, 2002.
  24. LUÑO, Derechos humanos, estado de derecho y constitucion, p.48.
  25. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 22 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2002. p. 178.
  26. Ibid., p. 179-182.
  27. SARLET, A eficácia dos direitos fundamentais, p. 75
  28. TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. Tratado de Direito Internacional dos Direitos Humanos. v. 1. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1997. p. 407.
  29. SILVA, Curso de Direito Constitucional Positivo, p. 183.
  30. SARLET, A eficácia dos direitos fundamentais, p. 86-90.
  31. CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional. 7 ed. Portugal: Almedina, 2003. p. 477-478.
  32. SARLET, Ingo Wolfgang. Dimensões da Dignidade:Ensaios de Filosofia do Direito e Direito Constitucional (org.) Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005. p. 171.
  33. BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. 5 reimp. Rio de Janeiro: Campus, 1992. p. 21.
  34. SARLET, Ingo Wolfgang. As dimensões da dignidade da pessoa humana: construindo uma compreensão jurídico-constitucional necessária e possível. In: Sarlet, Ingo Wolfgang. Dimensões da Dignidade: Ensaios de Filosofia do Direito e Direito Constitucional (org.). Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005. p. 16-26.
  35. LORENZETTI, Ricardo Luis. Fundamentos do direito civil. Tradução de Vera Maria Jacob Fradera. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998. p. 145.
  36. PIOVESAN, Flávia. Temas de Direitos Humanos. São Paulo: Max Limonad, 2003. p. 378.
  37. MARTINS, Leonardo. Do vínculo do Poder Judiciário aos direitos fundamentais e suas implicações práticas. Revista da Ajuris. Porto Alegre: Ajuris. Ano XXXII. n. 98, jun., 2005. p. 161-193.
  38. TEPEDINO, Gustavo. Temas de Direito Civil. 3 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2004. p. 224.
  39. Nesse sentido, menciona Streck que "sendo o texto constitucional, em seu todo, dirigente e vinculativo, é imprescindível ter necessariamente em conta o fato de que todas as normas (textos) infraconstitucionais, para terem validade, devem passar, necessariamente, pelo processo de contaminação constitucional." STRECK, Lenio Luiz. Hermenêutica jurídica e(m) crise:uma exploração hermenêutica da construção do direito. 5 ed, ver. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p. 250.
  40. RUIZ, Castor M. M. Bartolomé. Renascimento e pós modernidade, anverso e reverso do humanismo.. In: BARRETO, Vicente de Paulo (coord.). Dicionário de Filosofia do Direito. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 144-148.
  41. BAUMAN, Zygmunt. Modernidade líquida. Tradução de Plínio Dentzien. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001. p. 15
  42. MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor: o novo regime das relações contratuais. 5.ed. São Paulo: RT, 2005. p. 175-179.
  43. CORRALO, Giovani. Discursos sobre ética na pós-modernidade: reflexões interdisciplinares sobre o comportamento humano, liderança e política no séc. XXI. Passo Fundo: 2010. p. 15.
  44. MORAIS, José Luiz Bolzan de. As crises do Estado e da Constituição e a Transformação Espacial dos Direitos Humanos. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002. p. 75-76.
  45. MENDES, Os Direitos Fundamentais e seus Múltiplos Significados na Ordem Constitucional, p. 47.
  46. MARINONI, Luiz Guilherme. Novas linhas do processo civil: O acesso à justiça e os institutos fundamentais do direito processual. São Paulo: RT, 1993. p. 20-27.
  47. BOBBIO, A era dos direitos, p. 1.
  48. MARINONI, op. cit., p. 30-35.
  49. DINAMARCO, Cândido R. Escopos Políticos do Processo. In: GRINOVER, Ada Pelegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel; WATANABE, Kazuo (Org.). Participação e Processo. São Paulo: RT, 1988. p. 115-127.
  50. MARINONI, Novas linhas do processo civil,.p. 26-30.
  51. Ibid. p. 20.
  52. SARMENTO, Daniel. Direitos Fundamentais e Relações Privadas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004. p. 73.
  53. HESSE, Konrad. A força normativa da constituição. Trad. De Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1991. p. 20-21.
  54. STRECK, Lenio Luiz. Jurisdição constitucional e hermenêutica: uma nova crítica do direito. 2 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 15.
  55. Exemplo claro disso é a leva de ações em face do Estado do Rio Grande do Sul, ajuizadas por Servidores Públicos, com base na Lei Estadual n° 10.395/95, onde o Estado sequer contestava as ações, uma vez que a matéria é pacífica e estava dispensado de tal. Mais uma vez resta demonstrado que a efetividade dos direitos fundamentais somente pode ocorrer com a união das três esferas de poder.
Sobre o autor
Rafael Selonk

Bacharel em Direito. Secretário de Juiz de Direito na 1ª Vara Judicial da Comarca de Casca (RS).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SELONK, Rafael. A problemática da efetivação dos direitos fundamentais no século XXI. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 3104, 31 dez. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20757. Acesso em: 22 nov. 2024.

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