COMUNICAÇÃO E CONTROLE INTERSUBJETIVO DA DIGNIDADE?
Sejamos mais particulares, no escopo do presente ensaio trata-se de colocar a questão de saber o que pensamos diante do Art. 1º, III, da CF/1988, ou seja, "a dignidade da pessoa humana" como Fundamento? "O princípio do fundamento reza: nihil est sine ratione. Traduz-se: "Nada é na verdade sem fundamento"." (HEIDEGGER, 1956). Então, ela é intersubjetivamente comunicável e controlável? Que vínculos ela cria com o dever? Como julgar sem saber onde existe e onde não existe, insofismavelmente, questão de dignidade, ou mesmo, questão de direito? Por exemplo, na recente decisão do STF, de 5 de maio de 2011, em atendimento a ADI nº 4277/DF e a ADPF nº 132/RJ, consagrando a simulação do sexual e o império do Mesmo, reconheceu por unanimidade a união estável entre casais homossexuais (igualando-o ao do casal heterossexual), que dizem ufanistas uns tratar-se de um "marco do Direito brasileiro", outros, consolidação do "Brasil como verdadeiro Estado Democrático de Direito, solidificando a igualdade de direitos para todos", e, principalmente, muitos, dizem que com a decisão "o Supremo consagra o texto constitucional e celebra a vida, o direito, a liberdade, tendo como foco principal a dignidade humana", e os mais entusiasmados ou os mais desesperados (Kierkegaard) afirmam peremptoriamente que "a decisão do STF "revolucionou o Direito de Família no Brasil", e, que por isso a decisão é um libelo em defesa da "dignidade da pessoa humana". Uau!... Tais declarações são estranhas, consagram a fascinação pelo desconhecimento dos referenciais perdidos; mas de onde provêem? Sabem eles realmente o que estão dizendo? Ninguém demonstrou a menor perplexidade, a mínima dúvida, todos pareciam fazer revelações fundadas em certezas e experiências conclusivas de um roteiro histórico que é, no mínimo, duvidoso. O que é exatamente a dignidade? A resposta não é evidente, nem se evidencia imediatamente. Mas palavra já faz parte do ortodoxia ético-política e jurídica predominante. Mas o que significa? E o que importa se o STF tomou para si a responsabilidade legislativa de seu significado e prática... E ninguém parece observar que, nas palavras de Roudinesco, "na ausência de um pensamento pertinente oriundo da medicina, da etologia ou da biologia, é o direito que dá as perversões – se não à perversão – sua nova face institucional" (ROUDINESCO, 2008). Tal responsabilidade é sensata e democrática? É isenta de perigos e equívocos? A resposta é não. Por que transformações passa o homossexualismo para merecer agora, com a decisão do STF, uma face e uma função institucional? Com qual significação? Que controle sobre os homossexuais se pretende instituir e exercer ao excluí-lo do rol das perversões? Que significa tal exclusão? Toda perversidade é imanentemente má? O perverso é sempre do mal ou é do bem que nasce e sofre o perverso? Quem terá que arcar com as conseqüências inesperadas de tal decisão? Difícil saber! Principalmente se considerarmos, de uma maneira mais genérica e crítica, como Roudinesco, que é "pela identificação com o ideal de uma fetichização globalizada do corpo e do sexo dos humanos e dos não humanos, e através da primazia generalizada de uma supressão de todas as fronteiras o humano e o não-humano, o corpo e psique, a natureza e a cultura, a norma e a transgressão da norma etc. --, que a sociedade mercantil de hoje está em vias de se tornar uma sociedade perversa. Aliás, tanto pela difusão de imagens quanto pela instauração de uma pornografia virtual, regulamentada, limpa, higienista, sem perigo aparente. Essa sociedade, de certa forma, é mais perversa que os perversos que ela não sabe mais definir, mas, cuja vontade de gozo ela explora para em seguida reprimi-la" (Cf. ROUDINESCO, 2008). Então, para começar, é hora de perguntar com seriedade e intransigência: o que a decisão do STF tem a ver (visão direta e não oblíqua) com a "democracia" e "a dignidade pessoa humana" etc.? Evidentemente nada, e a questão não tem nada a ver com ser contra ou a favor. Não se trata de assumir uma posição maniqueísta, nem de julgamento, nem de crucificação, nem de repressão ao homossexualismo. Ao contrário, devemos a eles RESPEITO, assim mesmo, maiúsculo; mas não a custas de censuras e recusa de qualquer visão crítica e radical sobre eles. Não se trata, portanto, de ser reacionário ou não, mas, antes, de saber "separar o joio do trigo". O que queremos colher? Precisamos saber isso, para não arrancarmos o trigo... Não se trata, portanto, de neutralidade política. Como ficar neutro ou calado diante dos delírios homossexuais que já proclamam: "Para além de qualquer nostalgia em relação aos modelos gregos, helenístico e cristão, Foucault enxerga na homossexualidade moderna uma oportunidade estratégica de criação e de exploração de um campo relacional plural, horizontal, aberto às experimentações de prazer, desejo e convivência, relançando o "devir-homossexual" como inventividade, como experimentação, como criação de modos de vida plurais, com espaço para a singularização dos laços eróticos (micro)políticos e estéticos" (PAIVA, 2008). "Devir-homossexual como inventividade"? Uma "nova forma de existência, com base na sexualidade" (PAIVA, 2008). De onde nos vem a possibilidade de tamanho absurdo? Ora, observa Baudrillard, da "mesma forma que é absurdo dissociar em outras culturas o religioso, o econômico, o político, o jurídico, ou seja, o social e outras fantasmagorias categoriais pela simples razão de não terem cabimento naquelas culturas e que estes conceitos são como doenças venéreas com as quais as infectamos para melhor "compreendê-las, também é absurdo autonomizar o sexual como instância, como dado irredutível, ao qual todos os outros possam ser reduzidos" (BAUDRILLARD, 1984). "Devir-homossexual como inventividade"? Uma "nova forma de existência, com base na sexualidade gay? Sem dúvida! Ah!Ah!Ah! Mesmo porque, no estado de natureza nos parece evidentemente óbvio e natural que exista a homossexualidade em todo agrupamento de indivíduos sexualizados (de qualquer espécie, inclusive humana), onde um pequeno número de indivíduos machos fortes, adultos e ativos formam (digamos, na luta que culmina na "sobrevivência dos mais aptos") um "harém" de fêmeas, com as quais se acasalam, reservando assim para si com ferocidade despótica todas as fêmeas disponíveis, inclusive as próprias filhas e repelindo todos os machos mais fracos, inclusive seus filhos (Cf. DOBZANSKY, 1968). Para tal, no desenvolvimento da falsa-consciência homossexual temos que: "(...) A luta homossexual deve [...] aspirar à criação de um novo "direito relacional", que permita todo tipo de relações, em vez de impedi-las ou bloqueá-las" (ORTEGA, 1999, apud, PAIVA, 2008), e, assim, quem sabe,abrindo espaço maior também para a avissodomia, cinofilia, necrobestialismo, ofidicismo, simiofilia, voyeurismo animalesco, pseudozoofilia, sadismo bestial etc., enfim, qualquer forma de zoofilia ou homofilia em sua realidade mais cruel e imune a qualquer condenação penal. E no desenvolvimento da consciência-infeliz homossexual que: "A possibilidade de constituir formas novas de sociedade é também possível para a comunidade heterossexual, que tem de ser incluída na luta por um novo "direito-relacional" [...]". (ORTEGA, 1999, apud, PAIVA, 2008). Tem de ser incluída? Essa é boa! "Novo direito-relacional"? Em que consistiria? Responde Antonio Crístian Saraiva Paiva: "E é justamente no que a amizade permite ser tomada como instrumento de luta pela afirmação de novas virtualidades relacionais, novos estilos de amor, de trocar prazer, que sua tematização está indissociavelmente atrelada à questão da homossexualidade, da criação de uma "cultura gay", de um "modo de vida gay", que abriria um "especo outro no qual os indivíduos se produziriam como grupo social" (PAIVA, 2008). A amizade e o homossexualismo? Como esse binômio seria possível? Tudo é muito precipitado, bizarro, hiperbólico, paradoxal... "Pergunto-me", questiona Philippe Ariès, "se não haverá uma relação entre a extensão do domínio de uma homossexualidade normalizada e o enfraquecimento do papel desempenhado pela amizade na sociedade contemporânea"(ARIÈS,1983). E observa criticamente: "Progresso da homossexualidade e dos seus mitos, recuo da amizade, prolongamento da adolescência que se instala massivamente no núcleo da sociedade global: estas são características essenciais do nosso tempo que ligam não sei que correlação" (ARIÈS, 1983). Mas inegavelmente, concluímos, o homossexualismo "apresenta-se como produto de um mercado estritamente sexual, ligado ao orgasmo" (ARIÈS, 1983). No mais só a psicanálise poderia dar-nos uma indicação pois que coloca a questão da e em questão a "vida interior"... E talvez seja pertinente e prudente vacinar-se contra qualquer argumentação sofistica e observar imediatamente, como o faz com muita competência Elisabeth Roudinesco, que: "Nenhuma ciência, com efeito, salvo se for perversa, poderá provar a existência de qualquer perversão no reino animal. Os animais não conhecem nem a Lei nem a transgressão da Lei, não são fetichistas, nem zoófilos, nem pedófilos, nem coprófilos, nem necrófilos, nem criminosos, nem sádicos, nem masoquistas, nem voyeuristas, nem exibicionistas, nem capazes de sublimação. Não são transexuais, nem travestis, nem sequer homossexuais, bissexuais ou heterossexuais. A atividade sexual animal não responde a nenhuma dessas classificações" (ROUDINESCO, 2008). E assim, talvez, entender que entre os humanos a coisa é bem diferente; e, ao contrário, todas as perversões são possíveis e, mesmo, "desejadas", algumas são socialmente más, outras não, outras nem tanto, ou seja, a existência de uma dependência biológica indispensável do instinto sexual em relação à formação social e civilizadora, e, ao mesmo tempo, a multiplicidade e a extensão das possibilidades e das impossibilidades sociais e culturais de controle e de satisfação dos instintos (que a homossexualidade, por exemplo, é apenas uma das enésimas variáveis derivadas e não a hegemônica), revela-nos que o prazer voluntário de subjugar (a sempre presente dialética do senhor e do escravo em uma de suas mil e uma variações e desdobramentos psíquicos), e a "incessante e alucinada busca do gozo lúbrico" (que antropologicamente, digamos, teve factualmente partida no "estupro dos mais fracos" ou na "masturbação" etc. e que se inscreve psicoplástica e psicogeneticamente na psique) cumprirão seu papel para todo o sempre consagrando a "servidão sexual voluntária". Afinal, era preciso criar algum meio de satisfação substitutiva (mesmo que de base alucinatória) da necessidade sexual não sublimada, de realização do instinto (que impõe o desejo) etc. De busca do prazer, de gozo, de orgasmo sob o signo sócio-cultural do Mesmo e do Outro, da igualdade e da diferença, de liberdade e da felicidade et alli, sendo o Outro, a diferença, a felicidade simulacro do "sujeito/objeto" escondida na figura da amizade gay. E assim que, entre a espécie humana, alguns machos (e fêmeas), muitos (e muitas), cuja essência sócio-cultural fundamental consiste no desenvolvimento ontológico dialético do não-Ser, trabalham em profundidade (sem recair em pura negatividade) a própria denegação da e na diferença sexual, muitos, (e muitas), cuja fraqueza os dota de uma a "espinha mais flexível", aptos a pôr-se de quatro, dobrados pela força bruta e brutal de um desejo sexual imperativo do Outro identificado intersubjetivamente como o Mesmo – o desejo do Outro como diferente não existe, mas a sedução ainda persiste na igualdade como alteridade do cuidado de si numa interioridade concentrada no Mesmo –, são obrigados (por pura contingência) a dobrar-se, dobram-se e passam a sonhar e sonham fazer filhos pelas costas (movimento que Baudrillard vê em ação a "lógica da simultaneidade dos efeitos inversos"), fazem do ânus trombeta e cantam as vitórias de tal prazer e se tornam "homossexuais" sob o signo, é óbvio, do "direito natural" (Spinoza), articulados dialeticamente por uma consciência sexual infeliz e acalentados por consolações de uma falsa-consciência sexual emancipadora. Em última instância, não é o que dizem com "corpo de homem, alma de mulher", ou "ninguém nasce mulher, torna-se mulher" (Simone de Beauvoir) etc.? Inegavelmente, diz-nos Baudrillard: "Quando o mesmo se acasala com o mesmo tudo se torna obsceno" (BAUDRILLARD, 1996). Estamos querendo é saber: estamos criando uma República obscena? Isso significa que seria coerente criminalizar a homossexualidade, punir os homossexuais, dizer que o homossexualismo é contra a natureza, tratá-los como "doentes mentais" etc.? Evidentemente que não se trata de nada disso. E isso é o que se verifica historicamente desde a antiguidade clássica e, mesmo, na mais primitiva. Mesmo porque, diz-nos Baudrillard: "A liberação sexual, como a das forças produtivas, é potencialmente sem limites. Exige uma profusão realizada, sex affluent society. Não poderia tolerar a raridade dos bens sexuais, tampouco a dos bens materiais" (BAUDRILLARD, 1991). Isso em todas as sociedades, em todos os modos de produção registrados pela história, e, no caso particular da sexualidade, até a invenção da transgressão, da hierarquia, da disciplina, do controle etc., isto é, o homossexualismo etc. perdura na idéia do "direito natural" ou enquanto ele for a idéia do direito (ou nela mesma decline com a ascensão do cristianismo), como exemplifica Paul Veyne nos casos da Grécia e de Roma na antiguidade. Diz ele, "Catulo gaba-se das suas proezas" com rapazes e mulheres, e, em suas poesias "ameaça os seus inimigos de que os violará para mostrar o seu triunfo sobre eles" (VEYNE, 1983). "Cícero cantou os beijos que colhia dos lábios do seu escravo-secretário. Conforme os seus gostos, cada um optava pelas mulheres, os rapazes ou um e outros; Virgílio tinha o gosto exclusivo pelos rapazes; o imperador Cláudio, pelas mulheres; Horácio repete que adora os dois sexos" (VEYNE, 1983). O mais antigo monumento das letras latinas, o teatro de Plauto, "está cheio de alusões homófilas" e que "o modo habitual de contrariar um escravo é lembrar-lhe o serviço que o seu senhor espera dele e para o qual o escravo se tem de pôr de quatro" (VEYNE, 1983). "Desejo aos meus inimigos que amem as mulheres e aos meus amigos, os rapazes", escrevia o poeta Propércio num dia de amargura, pois a pederastia "e um rio calmo e sem naufrágio: que mal recear num espaço tão estreito" (VEYNE, 1983). "Para Platão, não era o homossexual que era contra-natureza, mas apenas o gesto que ele realiza. A distinção é de peso: um pederasta não era um monstro, membro de alguma raça de pulsões incompreensíveis – era muito simplesmente um libertino" (VEYNE, 1983). Concluindo, diz Veyne: "a pretensa repressão legal da homossexualidade visava na realidade impedir que um cidadão fosse sodomizado como um escravo" (VEYNE, 1983). E de fato o sexo não tem nada a ver com isso, "o que importa é não ser escravo, e não ser passivo. O legislador não pensa sequer em impedir a homofilia. Quer apenas proteger o jovem cidadão contra as investidas ativas" (VEYNE, 1983). Concluindo com Veyne, temos que no mundo Grego, tanto quanto no Romano, "não se classificava as condutas segundo o sexo, amor pelas mulheres ou pelos rapazes, mas em atividade ou passividade: ser ativo é ser macho, qualquer que seja o sexo do comparsa passivo. Ter prazer virilmente ou dá-lo servilmente, tudo está aí" (VEYNE, 1983). Em outras palavras, a proibição do incesto, o complexo de Édipo, tanto quanto a "pretensa repressão legal da homossexualidade" são apenas casos, (fundamentais por sinal) dentre todos os casos de desenvolvimento de nossos "abrigos abstratos" (ou "prisões imaginárias" como se queira, mas que nos colocou imediatamente ao abrigo possível da opressão sexual), que se constituíram em algo como que uma segunda natureza que se revelou, no decurso da história, facilmente corruptível, mutável, porque múltipla e imersa na multiplicidade de desacordos que a atravessa e o reivindica casuisticamente de acordo com uma complexa correlação de forças egoístas dominantes e seu leque de abrangência, intensidade, irradiação e necessidade.