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Direito constitucional ambiental

Agenda 01/10/2001 às 00:00

1. INTRODUÇÃO

O objetivo do presente trabalho é mostrar a importância do Direito Ambiental dentro do Direito Constitucional.

Para atingir tal finalidade, primeiro falaremos do Direito Constitucional e suas características: estrutura, eficácia e aplicabilidade.

Em seguida, abordaremos o tema dos Direitos e Garantias Fundamentais, para posteriormente, enfocarmos o Direito Ambiental como Direito Fundamental, demonstrando, portanto, sua relevância no âmbito Constitucional.

A priori, ressaltamos as limitações do presente trabalho, que, dada sua grande complexidade, apenas trata o tema de modo geral e superficial.


2. NORMAS CONSTITUCIONAIS

A Constituição de 1988 foi criada por um Poder Constituinte Originário, através de uma assembléia nacional constituinte, legitimada pela representação popular. O Poder Constituinte é o ponto inicial da ordem jurídica, não estando condicionada a qualquer mandamento anterior.

2.1. SUPREMACIA CONSTITUCIONAL

A estrutura do ordenamento jurídico (positivado) é constituído por um sistema de normas jurídicas escalonadas em níveis diferentes. A Constituição é a norma suprema, que está acima de todas as demais, que são chamadas de normas infra-constitucionais. Estas normas infra-constitucionais devem conformidade às normas constitucionais.

Qualquer modificação no texto constitucional, faz-se através de procedimento mais rigoroso, diferenciado do procedimento das normas infra-constitucionais. Esta é uma característica de Constituição Rígida, como é o caso da nossa.

Nesse sentido, o jurista José Joaquim Gomes Canotilho, em sua obra Direito Constitucional de Teoria da Constituição, conceitua(1):

"A constituição é – insista-se – uma ‘ordem’ jurídica fundamental. Não admira, por isso, que dentre as suas principais funções se inclua a de ela ser uma ordem fundamental do estado, pois é ela que conforma juridicamente a instituição social de natureza global, composta por uma multiplicidade de órgãos diferenciados e interdependentes, que nós designamos ‘estado’. O estado concebido como um complexo institucional é determinado e conformado na sua organização e formas de actuar pelo ‘direito’ (estado de direito) e, desde logo, pelo direito plasmado na constituição.

A constituição é ainda uma ‘ordem fundamental’ noutro sentido: no sentido de constituir a pirâmide de um sistema normativo que nela encontra fundamento. Neste sentido, a constituição aspira, como se viu, à natureza de ‘norma das normas’ (cfr. art. 112.°), pois é ela que fixa o valor, a força e a eficácia das restantes normas do ordenamento jurídico (das leis, dos tratados, dos regulamentos, das convenções coletivas de trabalho, etc.)."

2.2. APLICABILIDADE DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS

Todas as normas constitucionais têm eficácia jurídica. Contudo diferem no seu modo de aplicação. José Afonso da Silva, autor da obra "Aplicabilidade das Normas Constitucionais", classifica as normas constitucionais em normas de eficácia plena, contida e limitada.

As normas de eficácia plena são aquelas que podem produzir seus efeitos imediatamente, ou seja, desde sua entrada em vigor. As normas de eficácia contida são aquelas normas de aplicabilidade direta, onde se regulou determinado interesse, mas deixou aberta para que uma lei ou um princípio integralizasse sua aplicação. Por fim, as normas de eficácia limitada são aquelas que só produzem seus efeitos quando reguladas por outra norma, a exemplo das normas programáticas.

Importante a colocação de Jorge Miranda sobre as normas programáticas, que em seu Manual de Direito Constitucional afirma(2):

"As normas programáticas são de aplicação diferida, e não de aplicação ou execução imediata; mais do que comandos-regras explicitam comandos-valores; conferem ‘elasticidade’ ao ordenamento constitucional; têm como destinatário primacial – embora não único – o legislador, a cuja opção fica a ponderação do tempo e dos meios em que vêm a ser revestidas de plena eficácia (e nisso consiste a discricionaridade); não consentem que os cidadãos ou ‘quaisquer’ cidadãos as invoquem ‘já’ (ou imediatamente após a entrada em vigor da Constituição), pedindo aos tribunais o seu cumprimento só por si, pelo que pode haver quem firme que os direitos que delas constam, ‘maxime’ os direitos sociais, têm mais natureza de expectativas que de verdadeiros direitos subjetivos; aparecem, muitas vezes, acompanhadas de conceitos indeterminados ou parcialmente indeterminados."

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As normas constitucionais programáticas, como visto, são normas-princípios. As normas-princípios são superiores às demais disposições constitucionais, por seu nível de abstração e generalidade, assumindo, portanto, um caráter de maior gravidade quando da violação destas normas-princípios.

Como forma de limitar o poder reformador da constituição, com o fim de garantir sua integridade, algumas normas-princípios não podem ser emendadas, é o que reza o § 4° do Art. 60 da Constituição de 1988:

"Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:

I – a forma federativa de Estado;

II – o voto direto, secreto, universal e periódico;

III – a separação dos Poderes;

IV – os direitos e garantias individuais."

E estas garantias são denominadas, comumente, de cláusulas pétreas.


3. DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS

Os direitos fundamentais, conforme visto, fazem parte das chamadas cláusulas pétreas. A positivação dessas normas-princípios teve a finalidade de proteção dos indivíduos perante o poder político. Esta foi uma das mais importantes vitórias da democracia.

Alguns autores, como Paulo Bonavides e Celso Antônio Bandeira de Mello, classificam os direito fundamentais, de acordo com seu reconhecimento pela Constituição, da seguinte forma: direitos fundamentais de primeira geração (são os direitos individuais à liberdade e à vida); direitos fundamentais de segunda geração (direitos sociais, econômicos e culturais) e os direitos de terceira geração (direitos de fraternidade).

Com a lição de Alexandre de Morais, complementamos o conceito de direito fundamental de terceira geração, indispensável ao nosso estudo(3):

(...) "protege-se, constitucionalmente, como ‘direitos de terceira geração’ os chamados ‘direitos de solidariedade ou fraternidade’, que englobam o direito a um meio ambiente equilibrado, uma saudável qualidade de vida, ao progresso, a paz, a autodeterminação dos povos e a outros direitos difusos, que são, no dizer de José Marcelo Vigiliar, os interesses de grupos menos determinados de pessoas, sendo que entre elas não há vínculo jurídico ou fático muito preciso."

O Supremo Tribunal Federal, consubstanciando com o mesmo entendimento, afirmou:

"Direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado: a consagração constitucional de um típico direito de terceira geração" (RTJ 155/206)

Destarte, já temos a primeira característica do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como um direito fundamental de terceira geração, pois cuida não só da proteção do meio ambiente em prol de uma melhor qualidade de vida da sociedade atual, como também das futuras gerações, caracterizando, assim, o sentimento de solidariedade.


4. DIREITO AMBIENTAL

O principal predador do meio ambiente é o homem. Durante séculos o meio ambiente foi alvo de exploração sem qualquer critério de proteção, o que acarretou o caos em que se encontra a natureza.

Atualmente a preocupação com a proteção do meio ambiente está globalizada, tendo sido criadas normas, Associações Nacionais e Internacionais, com iniciativas pública e privada.

Contudo não é o bastante. Falta vontade política e a informação da necessidade de proteger nosso meio ambiente ainda é restrita a apenas uma parcela da sociedade: a elite cultural e econômica, que por sua vez é informada, mas, em sua maioria, não é consciente.

Quem sofre mais com este fato somos nós brasileiros. Pois, num país subdesenvolvido, a quase totalidade da população, tem pouca ou quase nenhuma instrução. Ora, a preocupação principal dessa classe oprimida é com a alimentação do dia a dia, ficando os problemas relativos ao meio-ambiente, predominantemente, a cargo de vontades políticas, que, sabemos, são raras.

4.1. A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA DO MEIO AMBIENTE

Na Legislação Ambiental Brasileira, o conceito de Meio Ambiente é amplo, pois protege a vida em todas as suas formas, englobando, também, a proteção dos bens materiais e imateriais, sempre visando garantir uma boa qualidade de vida das gerações presentes e futuras. É o que demonstram os artigos 23, incisos III, IV, V VI, VII, IX; 170, inciso VI; e 225, caput da nossa Carta Magna, bem como a Lei 6.938/1981, em seu Art. 3°, I:

"Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:

(...)

III- proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos;

IV- impedir a evasão, a destruição e a descaracterização de obras de arte e de outros bens de valor histórico, artístico ou cultural;

V- proporcionar os meios de acesso à cultura, à educação e à ciência;

VI- proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas;

VII- preservar as florestas, as fauna e a flora;

(...)

IX- promover programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico;

(...)

XI- registrar, acompanhar e fiscalizar as concessões de direitos de pesquisa e exploração de recursos hídricos e minerais em seus territórios."

"Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

(...)

VI- defesa do meio ambiente."

"Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações."

"Lei 6.938/1981

Art. 3.° Para fins previstos nesta Lei, entende-se por:

I – meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas;"

Ora, levando em consideração o conceito de meio ambiente consolidado na Legislação Ambiental Brasileira, uma das mais avançadas do mundo, o meio ambiente ecologicamente equilibrado é requisito indispensável para o direito à vida. Daí seu caráter de direito fundamental.

4.1.1. DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E MEIO AMBIENTE EQUILIBRADO

Vale destacar o conteúdo do Art. 170, CF/88 que relaciona o princípio da defesa do meio ambiente com a ordem econômica.

A princípio seria difícil saber como conciliar um meio ambiente equilibrado com a exploração econômica de seus recursos, dentro de uma lógica capitalista, uma vez que, durante quase toda sua existência, o homem destruiu a natureza sem qualquer controle, como fonte de recurso financeiro.

Atualmente, defende-se a idéia de desenvolvimento sustentável. A professora Marcia Correia Chagas, em sua Dissertação de Mestrado explica o que significa essa idéia(4):

"Inicialmente faz-se necessário definirmos o que se entende por desenvolvimento sustentável. A expressão foi cunhada na Conferência Mundial de Meio Ambiente, realizada em 1972 em Estocolmo, e significa um desenvolvimento que responde às necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras de responder às suas próprias necessidades."

A utilização dos princípios do desenvolvimento sustentável na exploração da natureza, seria uma forma de conciliar a necessidade de um desenvolvimento econômico com a preservação do meio ambiente.


5. CONCLUSÃO

Diante do que foi exposto a conclusão não poderia ser outra: o direito ao meio ambiente equilibrado é assegurado pela Constituição como um direito fundamental de terceira geração, que está diretamente relacionado com o direito à vida das presentes e futuras gerações.

Entretanto, mesmo uma legislação ambiental avançada, não é o bastante para a efetiva proteção do meio ambiente, pois há uma enorme contradição entre o que está nas leis e a realidade.

Enfatizando: as normas jurídicas existem, falta então concretizá-las. Para tanto são indispensáveis:

1. a conscientização da sociedade de que nós humanos não somos donos da natureza, e sim, fazemos parte dela, aliada à conscientização de seu papel na sociedade como cidadão e

2. a vontade política das autoridades competentes.


NOTAS

1. José Joaquim Gomes Canotilho, "Direito Constitucional e Teoria da Constituição". 3 ed., Coimbra, Portugal, Editora Almedina, 1998, páginas 1336 e 1337.

2. Jorge Miranda, "Estrutura das Normas Constitucionais". 3 ed., Coimbra, Coimbra Editora, 1996, páginas 244 e 245.

3. Alexandre de Moraes, "Direito Constitucional". 6 ed., São Paulo, Editora Atlas, 1999, páginas 56 e 57.

4. Marcia Correia Chagas, "O Direito ao Meio Ambiente como Direito Fundamental à Vida". Dissertação de Mestrado em Direito Público da Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 1998, página 142.


BIBLIOGRAFIA

1. BONAVIDES, Paulo. Direito Constitucional. 8 ed., São Paulo, Editora Malheiros, 1999.

2. CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 3 ed., Coimbra, Editora Almeida, 1998.

3. CHAGAS, Marcia Correia. O Direito ao Meio Ambiente Como Direito Fundamental à Vida. Dissertação de Mestrado em Direito Público da Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 1998.

4. MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 7 ed., São Paulo, Editora Malheiros, 1998.

5. MIRANDA, Jorge. Manual de Direito Constitucional. 3 ed., Coimbra, 1996.

6. MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. 6 ed., São Paulo, Editora Atlas, 1999.

7. PRADO, Luiz Regis. Crimes Contra o Ambiente. São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 1998.

8. VITTA, Heraldo Garcia. O Meio Ambiente e a Ação Popular. São Paulo, Editora Saraiva, 2000.

Sobre a autora
Dayse Braga Martins

Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Direito Constitucional UNIFOR. Graduada em Direito e mestre em Direito Constitucional, ambos pela Universidade de Fortaleza UNIFOR. Advogada inscrita na OAB – CE. Professora assistente da graduação e da PósGraduação lato sensu da UNIFOR. Pesquisadora.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MARTINS, Dayse Braga. Direito constitucional ambiental. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 6, n. 51, 1 out. 2001. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2116. Acesso em: 22 dez. 2024.

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