5. AS COMISSÕES DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA
Promulgada recentemente a Lei nº 9.958 de 12 de janeiro de 2000, instituiu a criação das Comissões de Conciliação Prévia, de um lado aplaudida por representar uma opção para a busca de soluções para os conflitos, de outro, é motivo de severas críticas em face da inconstitucionalidade que está sendo discutida, inclusive, com ação direta de inconstitucionalidade em trâmite no Supremo Tribunal Federal.
O artigo 625, letra "d" da referida Lei : "qualquer demanda de natureza trabalhista será submetida à comissão de conciliação prévia", que de certa forma, fere princípios estabelecidos em nossa Carta Magna, que garante : no art. 5º, inciso XXXV : "A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito."; no art. 114 e art. 114, parágrafo primeiro : "Compete a Justiça do Trabalho conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores e empregados. Parágrafo primeiro "frustrada a negociação coletiva, as partes poderão eleger árbitros."
A discussão sobre a inconstitucionalidade, em torno da obrigatoriedade de passagem pela Comissão de Conciliação Prévia, antes de procurar à Justiça do Trabalho, ofende o acesso direto, atual e efetivo, ao Poder Judiciário e representa um direito inviolável do cidadão e da pessoa humana. Especialmente, quanto se trata de direitos previstos na esfera trabalhista, onde todos os princípios processuais são no sentido de facilitação do acesso à Justiça e à Ordem Jurídica e as condições da ação jamais podem ser tidas como condições de acesso ao Poder Judiciário.
No entanto, Sérgio Pinto Martins(16) posiciona-se : " O procedimento adotado pelo artigo 625-D da CLT não é inconstitucional, pois as condições da ação devem ser estabelecidas em lei e não se está privando o empregado de ajuizar a ação, desde que tente a conciliação. Ada Pellegrini Grinover menciona não ser inconstitucional a proposta que estabelecesse a tentativa obrigatória da conciliação prévia, que não iria contrariar o inciso XXXV, do artigo 5º da Constituição, pois "o direito da ação não é absoluto, sujeitando-se a condições (as condições da ação), a serem estabelecidas pelo legislador". Não haverá o interesse de agir da pessoa, postulando a tutela jurisdicional, se não for observado o caminho alternativo da conciliação prévia, que seria uma situação bastante razoável, não ficando mutilada a garantia constitucional do direito ao processo. Kazuo Watanabe tem o mesmo pensamento. Se o empregado não tentar a conciliação, o juiz irá extinguir o processo sem o julgamento de mérito (art. 267, VI, do CPC), por não atender à condição da ação estabelecida na lei. A reivindicação só poderá ser feita diretamente à Justiça do Trabalho caso na empresa não exista a Comissão, nem tenha sido instituída no âmbito do sindicato da categoria, porque não haveria como se passar por comissão conciliadora."
Trata-se de uma lei recente e o próprio tempo dirá sobre a viabilidade dessa aplicação, temos que realmente a proposta de conciliação prevista na lei, dada sua objetividade e importância, é capaz de superar todas as deficiências encontradas nas Comissões de Conciliação Prévia.
6. - DISPOSIÇÕES FINAIS
Feitas várias análises a respeito do tema restam alguns questionamentos: Será que estamos preparados para uma negociação extrajudicial, especialmente a arbitragem? As partes irão acatar as decisões dos árbitros, se alguns, mesmo coercitivamente, não obedecem ou respeitam as sentenças prolatadas pelos juizes, à vontade do Estado? Qual o interesse dos empresários nesse tipo de negociação, se a mentalidade da grande maioria ainda é a do capitalismo selvagem, que prega e quer implantar no país o neoliberalismo, que não respeita Convenções Coletivas, que quer destruir os sindicatos, que usa a Justiça do Trabalho para fazer acordos vantajosos, se beneficiando do desespero do empregado desempregado, se locupletando da morosidade da Justiça do Trabalho e da gama de recursos que são usados apenas com intuito protelatório? Não estariam esses maus empresários pregando a arbitragem com o intuito de através daquele instituto fazer valer suas vontades, burlando as leis trabalhistas, modificando entendimentos/posições da Justiça do Trabalho, através de sentenças arbitrais?
Há de se analisar também o papel dos advogados na arbitragem. Que vantagem esse processo traria a eles? Não estariam eles perdendo clientes? Perdendo honorários? Os trabalhadores mal confiam hoje no Judiciário, será que confiariam em árbitro que estaria sendo remunerado pelo patrão, nos casos de dissídios individuais?Os sindicatos com a força que têm não conseguem negociar com a classe patronal, quase todas as convenções coletivas acabam em dissídio coletivo nos Tribunais Regionais do Trabalho, então, de que forma árbitros conseguiriam dirimir esses conflitos que nem o poder normativo da Justiça do Trabalho consegue apaziguar, subindo geralmente até aos Tribunais Superiores? Diante da realidade nacional, de recessão, de desemprego, de fome, de desespero, entraria o trabalhador em um processo arbitral em pé de igualdade com o patrão?
São questões que se entrelaçam ao primeiro questionamento, que devem ser analisadas conjuntamente, para se extrair uma conclusão a respeito da viabilidade da aplicação da arbitragem na Justiça do Trabalho, nos dissídios coletivos e individuais.
A arbitragem não veio para concorrer com a Justiça do Trabalho, pelo contrário, está apta a coexistir, uma não exclui a outra, está aí para trabalhar com ela na busca da paz social, porém, de uma forma menos burocratizada, mais célere, onde ainda rege a seu favor o princípio da confiança, entre as partes e delas em relação ao árbitro, o que não acontece na Justiça Estatal, onde não elegeram o juiz de comum acordo e de onde geralmente as duas partes saem insatisfeitas, uma porque perdeu, outra porque não ganhou tudo o que queria, ou se ganhou tudo, demorou muito, ou ganhou mas não levou.
O problema está na mentalidade de nosso povo, acostumado a contender, a brigar, a conflitar, a levar vantagem em tudo, infelizmente esse mal está arraigado, sempre um tem que perder para o outro ganhar, não estão acostumados com o ganha, muitos evitam um acordo só pelo fato de que estariam abrindo mão da "sua verdade".
NOTAS
1. Revista Jurídica Consulex, número 09, 1997.
2. Veja-se o depoimento do professor Wagner Giglio: "Nos últimos tempos a Justiça do Trabalho vem descumprindo sua missão de ser célere : nos grandes centros industrias, os processos se arrastam nas Juntas durante meses e anos, com outros anos despendidos percorrendo os Tribunais para, ao voltar às Juntas de origem, levarem ainda meses e, às vezes, mais de um ano para completar o processo de execução. Por falta de verbas, as instalações são freqüentemente precárias, o material é insuficiente e o pessoal administrativo é reduzido". In Curso de Direito do Trabalho: em Homenagem a Mozart Victor Russomano, São Paulo, Ed. Saraiva, 1985, p. 714.
3. BASSO, Maristela. In "Lei nova revitaliza a arbitragem no Brasil como método alternativo extra-judicial de solução de conflitos de interesses" , Editora Revista dos Tribunais, 1996, vol 733.
4. Mediação e arbitragem: uma solução para os conflitos trabalhistas no Brasil. São Paulo: LTr, 1994, p. 24
5. In MENEZES, Cláudio Armando Couce de, BORGES, Leonardo Dias. Op. Cit. p. 49.
6 In MENEZES, Cláudio Armando Couce de, BORGES, Leonardo Dias. Op. Cit. p. 50.
7. CUNHA, Marcelo Sales. A arbitragem como alternativa à solução dos conflitos trabalhistas. Universidade de Ribeirão Preto, 1999
8 Sobre o tema observa Cláudio Armando Couce de Menezes e Leonardo Dias Borges, in "Juízo Arbitral no Processo do Trabalho" do Suplemento Trabalhista 109. Editora Síntese. jul/98 : "Ao que parece, o legislador foi infeliz ao limitar a argüição da suspeição e do impedimento para a primeira oportunidade de a parte se manifestar. Malgrado o árbitro tenha sido escolhido pelas partes, de comum acordo, todavia, nada impede que ao tempo da escolha uma das partes não tivesse conhecimento de um fato que pudesse tomar viciada a capacidade subjetiva do árbitro. O mais inusitado é que ao mesmo tempo em que o legislador limita a oportunidade para a impugnação do árbitro, permite a aplicação do Código de Processo Civil neste particular, sendo que o Código não limita temporalmente a possibilidade de se argüir qualquer vício quanto à capacidade subjetiva do julgador, em se tratando de impedimento. Verifica-se, assim, a atecnia do legislador."
9 JÚNIOR, Joel Dias Figueira. "Arbitragem, Jurisdição e Execução". 2ª edição. p. 209. Editora Revista dos Tribunais. São Paulo, 1999
10 Argumenta Cláudio Armando Couce de Menezes e Leonardo Dias Borges, in "Juízo Arbitral no Processo do Trabalho" do Suplemento Trabalhista 109. Editora Síntese. jul/98. p. 139 : "É indispensável que a parte, além de intimada pessoalmente, conste do mandado, que se presumirão confessados os fatos contra ela alegados, caso não compareça ou, comparecendo, se recusa a depor. No procedimento arbitral, não há qualquer obrigatoriedade de se intimar (a lei fala em convocar) a parte, alertando-a dos riscos de sua ausência. Ora, se no processo estatal, em que o advogado é indispensável, a parte é alertada dos riscos de seu não-comparecimento, tal questão deveria ter sido observada pelo legislador arbitral, já que neste procedimento há permissão legal de a parte postular sem advogado."
11 Cf. Joel Dias Figueira Júnior, 2ª ed., p. 225, nota de rodapé 1.
12 PARIZATTO, João Roberto. "Arbitragem Comentários à Lei 9.307, de 23-09-96" . p 80. Editora de Direito. São Paulo : 1.997.
13 Vide Joel Dias Figueira Júnior, Arbitragem, Jurisdição e Execução, p. 237 e seguintes. Editora Revista dos Tribunais, 2ª edição. São Paulo 1999.
14 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Nulidades do Processo e da Sentença. 4ª edição. 2ª tiragem. p. 107. Coleção Estudos de Direito de Processo Enrico Tullio Liebman – vol. 16. Editora Revista dos Tribunais. São
15 VASCONCELOS, Antônio Gomes de. "Os Núcleos Intersindicais de Conciliação Trabalhista na Lei nº 9.958" , Revista LTr, n. 64, p. 201/205. São Paulo : 2000.
16 MARTINS, Sérgio Pinto. "Comissões de Conciliação Prévia". Repertório IOB de Jurisprudência – 2ª quinzena de fevereiro de 2000. nº 4/2000. Caderno 2. p. 65/68. São Paulo. 2000
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