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Da impossibilidade de distinção de causa para pleitear a suspensão do serviço de telefonia celular (SMP)

Agenda 13/09/2012 às 15:33

O usuário adimplente de telefone celular tem direito de suspensão do serviço, sem cobrança de faturas, de 30 a 120 dias.

Resumo: Configura prática abusiva das operadoras de telefonia celular a cobrança de assinatura durante o período de suspensão dos serviços pedidos pelo consumidor, por motivo de perda ou roubo, pois a regulamentação setorial não faz qualquer distinção entre a causa da suspensão, conferindo a todo usuário adimplente, independente da sua motivação, esse direito em cada período de 12 meses.


O consumidor usuário de serviços de telefonia celular (chamada pela Anatel de serviço móvel pessoal – SMP), desde que adimplente, tem direito à suspensão, a cada 12 meses, dos seus serviços, por um período mínimo de 30 e máximo de 120 dias, quando não poderão ser cobrados quaisquer valores.

Embora não seja uma prática generalizada no mercado, algumas concessionárias têm feito distinção entre o motivo da suspensão. Se por motivo particular, não há cobrança. Se por perda ou roubo, há. Mas essa postura, além de criar regra que cerceia o direito do consumidor sem previsão contratual, também não encontra amparo na regulamentação da atividade.

Com efeito, a Resolução nº 477/2007 da ANATEL, que instituiu o Regulamento SMP, e o próprio contrato de adesão SMP, atribuem ao consumidor o direito de pedir a suspensão dos serviços prestados pela operadora, por até 120 dias, quando não será cobrada a assinatura, alongando-se, por igual período, o prazo de permanência, caso o cliente ainda esteja fidelizado à operadora, sem qualquer distinção da causa.

Nesse sentido, vale transcrever o art. 6º, VI c/c art. 34 da Resolução nº 477 de 7 de agosto de 2007 da ANATEL, que dispõe o seguinte, in verbis:

“Art. 6º Respeitadas as disposições constantes deste Regulamento bem como as disposições constantes do Termo de Autorização, os Usuários do SMP têm direito a:

(…)

VI - obter mediante solicitação, a suspensão do serviço prestado;

(…)

Art. 34. O Usuário adimplente pode requerer à prestadora a suspensão, sem ônus, da prestação do serviço, uma única vez, a cada período de 12 (doze) meses, pelo prazo mínimo de 30 (trinta) dias e o máximo de 120 (cento e vinte) dias, mantendo seu código de acesso e a possibilidade de restabelecimento da prestação do serviço na mesma Estação Móvel.

§1º A solicitação de suspensão de forma diversa da prevista neste artigo pode ter caráter oneroso.

§2º É vedada a cobrança de Assinatura ou qualquer outro valor referente à prestação de serviço, no caso da suspensão prevista neste artigo.

§3º O Usuário tem direito de solicitar, a qualquer tempo, o restabelecimento do serviço prestado, sendo vedada qualquer cobrança para o exercício deste direito.

§4º A prestadora tem o prazo de 24 (vinte e quatro) horas para atender a solicitação de suspensão e de restabelecimento a que se refere este artigo”.

Já a cláusula nº 4 do contrato de adesão/condições comerciais de concessão de benefícios para aquisição de aparelhos estabelece, previamente, que:

“4. Se o assinante solicitar a suspensão dos serviços do plano contratado, nos termos constantes do contrato SMP, o prazo de permanência ficará suspenso e só voltará a ser contado quando o contrato SMP for reativado”.

Em matéria de serviços de telefonia, as resoluções administrativas da ANATEL são fontes do direito.  A propósito, reza o art. 7º do CDC:

“Art. 7° Os direitos previstos neste código não excluem outros decorrentes de tratados ou convenções internacionais de que o Brasil seja signatário, da legislação interna ordinária, de regulamentos expedidos pelas autoridades administrativas competentes, bem como dos que derivem dos princípios gerais do direito, analogia, costumes e eqüidade”.

Diante desse quadro normativo, ficaram evidentes duas coisas: 1) seja por motivo particular, seja por perda ou roubo, e independente do valor da conta, o consumidor adimplente tem o direito de pedir a suspensão dos serviços; 2) o pedido de suspensão pode ocorrer durante o prazo de fidelização/permanência, que será estendido para frente.

Ao cobrar faturas dos usuários adimplentes que pedem a suspensão dos serviços, as concessionárias que adotam essa prática, criam regra que não foi prevista previamente em contrato ou nos regulamentos do setor. Não se pode subentender regras que restringem os direitos do consumidor. Essa prática, além de abusiva, implica infração contratual e viola a segurança que se espera das relações jurídicas.

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Por não obedecer as prescrições regulamentares, há um vício de qualidade na prestação dos serviços, nos termos do art. 20 § 2º do CDC, in verbis:

“Art. 20. O fornecedor de serviços responde pelos vícios de qualidade que os tornem impróprios ao consumo ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade com as indicações constantes da oferta ou mensagem publicitária, podendo o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:

(...)

§ 2° São impróprios os serviços que se mostrem inadequados para os fins que razoavelmente deles se esperam, bem como aqueles que não atendam as normas regulamentares de prestabilidade”.

Pontue-se ainda que o direito de suspensão, conforme caput do art. 34 da Resolução, só assiste ao usuário adimplente. Não foi mera opção do consumidor efetuar o pagamento das faturas, tampouco se pode alegar que o cliente furtado poderia voltar a usufruir os serviços suspensos, bastando adquirir novo chip.

Por isso, todos os pagamentos que vierem a ser feitos durante o período configuraram autêntica cobrança indevida e deve ser repetida, em dobro, nos termos do art. 42, par. único, do CDC, já que são vedadas as cobranças de assinatura ou qualquer outro valor. Nesse sentido:

“Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça.

Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável”.

Se a operadora não está prestando o serviço, não há causa jurídica para exigir o pagamento da franquia integral. Efetuar a cobrança, nessa hipótese, importa na violação do princípio que veda o enriquecimento sem causa.

Portanto, se há cobrança de faturas, há concomitantemente violação do contrato de adesão SMP; prestação de um serviço impróprio para o consumo porque não atende às prescrições regulamentares de sua atividade; violação do princípio que veda o enriquecimento sem causa; violação da boa-fé objetiva porque devem ser lidos os contratos de consumo, criando deveres anexos cooperação e lealdade; submissão do o consumidor a cobranças indevidas e a práticas abusivas que sequer encontram previsão contratual e na regulamentação setorial.

Sobre o autor
Ricardo Marques de Almeida

Procurador Federal no Estado do Rio de Janeiro. Representante Suplente da Carreira de Procurador Federal no Conselho Superior da AGU.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALMEIDA, Ricardo Marques. Da impossibilidade de distinção de causa para pleitear a suspensão do serviço de telefonia celular (SMP). Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3361, 13 set. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22609. Acesso em: 19 dez. 2024.

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