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Reestruturação do Poder Legislativo:

novos paradigmas de atuação político parlamentar

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Agenda 01/12/2000 às 00:00

5 - A importância das Comissões ao Poder Legislativo

O professor americano Ernest Griffith, em visita à universidade de Brasília pronunciou palestra de singular clareza donde se extrai este resumo. O professor Griffith narra um fato. Uma das maneiras do congresso americano obter suas informações é, assim como no Brasil, obter esclarecimentos com os membros do Executivo. Ocorreu segundo o professor americano um caso significativo. Convocou-se testemunhas do Poder Executivo para prestar esclarecimentos sobre determinada matéria de alto grau de complexidade. Os representantes do povo ouviram os depoimentos dos representantes do governo, os quais mostraram todo o conhecimento da matéria. Os parlamentares ficaram muito aborrecidos pelo fato de o Poder Executivo darem respostas precisas, enquanto eles, senadores, não tenham essa condição.

Aqueles parlamentares temeram que o governo representativo estivesse acabado. É isto, segundo o professor Griffith, porque o governo, hoje, pede reconhecimentos, técnicos, especialização, pesquisas profundas, e os membros das comissões americanas, como as nossas, não foram eleitos para serem técnicos. Mas aqueles homens não poderiam esmorecer, afinal de contas eram membros do congresso americano. Então, eles colocam o problema assim: como podia um representante eleito pelo povo, conseguir conhecimento suficiente, competência para enfrentar de igual para igual os técnicos do Executivo (na verdade, de nada vale grandes assessores, se não tiver parlamentares capazes de ser assessorados).

Então, eles colocaram a solução assim. Primeiramente o número de parlamentares foi reduzido para dois por comissão, e cada comissão desdobrada em subcomissões. Cada uma dessas comissões e subcomissões, se especializou em determinado tema: agricultura, política exterior, comércio. Assim, tornou-se possível, os depoimentos e os subsequentes projetos, precisam de pessoas especializadas. Cada comissão tinha autorização para contratar funcionários, que eram do primeiro escalão de cada área de conhecimento. Essas equipes ficariam a serviço imediatos das comissões. Cada comissão tem dois ou três desses especialistas. A esses assessores não cabia fazer recomendações. Isso cabia ao congresso. A função dos assessores era preparar matéria, analisar conseqüência, nas palavras do professor Griffith, "é um resultado inteligente, se usado somente argumentos válidos."

O desfecho da história é que o congresso evoluiu de casa dos discursos de especialistas em determinada área. Observe este resultado nas palavras do professor Griffith: "antes desta reforma, o congresso tendia a ressentir-se, a irritar-se com o Poder Executivo, pelo seu monopólio de conhecimentos. Agora, o congresso aparecia sugestões do Poder Executivo, confiante na competência e habilidade desde para avaliar, criticar, fazer mudanças, propor alguma coisa inteiramente, se for o caso, assim como nos Senadores e Deputados, que se especializaram, e nas equipes de assessores técnicos que não fazem recomendações, mas lhe apresentam os fatos para análise, quase com igual capacidade à do Poder Executivo."

Sabem quando se processou tal reforma escrita pelo então deão da School of International Service da America University? A mais de cinqüenta anos o congresso americano percebeu que a única maneira de conter o hipertrofismo do Executivo, era se aparelhar, se instituir, se especializar, trabalho que se deu através da divisão do congresso em pequenas comissões autônomas, reservando a soberania ao plenário.

É, sem sombra de dúvidas, a melhor proposta que se pode fazer a nível de atuação político parlamentar. A adoção do sistema do "congresso comissionado", que permitirá a especialização de todos os parlamentares. Àqueles parlamentares que se negarem a participar do processo, caberá à população, instruída pelo próprio congresso do "novo" sistema de atuação parlamentar, a selecionar representantes capazes de contribuírem para que o Poder Legislativo retome o seu legitimo papel, de Poder inteligente, capaz de acompanhar as evoluções sociais em pé de igualdade com o Poder Executivo.

Esta, realmente, é a tendência mundial. Escreve com acerto a professora Atyr Emília de Azevedo Lucci: "A tendência dominante nos vários parlamentos do mundo é justamente para a formação de assessorias destinadas a funcionar como elemento de seleção das informações advindas de fora, como elemento de deputação do processo legislativo e como elemento de informação própria, de informação por assim dizer auto-suficiente do Poder Legislativo"

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Apesar do sucesso dessas medidas no congresso Norte-Americano, país que vive, assim como nós, o sistema presidencialista, é de se notar que a implantação de tais medidas seria facilitada sobre maneira se propostas num sistema parlamentarista, como acentua o professor mineiro Bonifácio de Andrada " enquanto o presidencialismo favorece o trabalho de equipe." (Parlamentarismo e Realidade Social (Ob.Cit.)). É claro que essa proposta de reforma e retomada de rumos, requer a participação do conjunto de parlamentar e não de um outro indivíduo isolado.

Não existe outro caminho. A única maneira de se garantir a democracia representativa, é fazer com que os poderes se igualem em condições de ação, e isso só é capaz com todos os poderes instruídos, especializados. O Poder Judiciário de a muito é um poder habilitado, esclarecido. O Poder Executivo, percebendo a necessidade imposta pelo sistema de se especializar, não mediu esforços neste sentido, tornando-se um poder ágil, eficiente. Agora é a fez do Poder Legislativo. É tempo deste Poder se armar, o que, hordiernamente só é possível se se dominar a informação.

Depura-se do que foi dito até agora duas importantes conclusões. Dá-se às comissões autonomia para opinar em caráter definitivo sobre matérias de menor importância, (leis ordinária, leis delegados, medidas provisórias, decretos legislativos, resoluções), excluindo, por exemplo, matéria constitucional, lei eleitoral, ratificação de contratos internacionais e autorizações de orçamento. Somando-se a isto a extinção do sistema bicameral, o congresso ganha velocidade, tornando-se assim ativo na vida econômica-social do Estado e não mero ratificador de direito. Por sua vez, o "sistema comissionário" permite a especialização do congresso, podendo debater de igual para igual com o Poder Executivo.

Mais os benefícios destas medidas não param por aí. O professor Aliomar Baleeiro, ex-deputado e ex-presidente do Supremo Tribunal Federal, disse certa feito " quando um deputado apresenta um projeto de lei ou quer criar uma situação nova, não regulada em lei, ou quer suprimir esta situação ou quer modifica-la , às vezes ele está visando um determinado assunto, um dispositivo único mas, inadvertidamente não se dá se da conta que aquele projeto, se for aprovado, vai revogar uma porção de artigos de leis, o que não estava na sua intenção. Ai vai, tal a expressão que ele usou, colocar o assunto abaixo de uma lei que ele nunca nem viu." Ora, isto pode ser perfeitamente resolvido se, em cada comissão como já dissemos, conter técnicos especialistas, capazes de vigiar tais deslizes. E mais, esta comissão teria, ao seu dispor, subcomissão para fazer a análises, e pronunciamentos sobre o projeto e os seus efeitos jurídicos. Ao nosso ver, a coisa é perfeitamente realizável.

Ainda, com relação ao poder deliberatório das comissões no maior número de matéria possíveis, objetam que o poder do Plenário ficaria reduzido, diminuído. Não há alternativas. É restringir as matérias do Plenário para ganhar em poder, eficiência, perfeição, qualidade e sedimento e agilidade.


6 - Um Poder disciplinado

Dissemos, em várias oportunidades, que o Poder Legislativo está metido numa crise. Esta, no nosso entendimento, advém de dois fatores, um de ordem externa e outra de ordem interna. O primeiro, já tratamos exaustivamente, são as novas realidades, principalmente econômicas, a que estamos sendo submetidos pelo sistema. O mundo global e volátil requer respostas rápidas, e Poder Legislativo não as pode dar, por ser um, poder, historicamente, lento. O outro fator, que ao nosso ver contribui sobremaneira para o agravamento da situação é estritamente de ordem interna, e a solução para este problema chama-se disciplina. Nas palavras do professor Aliomar Baleeiro "se há uma coisa de que o Parlamento precisa, para ser forte, para ter poder, para mandar, para se respeitado, é de uma disciplina interna." Realmente. A especialização, o conhecimento, a participação no sistema comissionário requer disciplina dos parlamentares. Não há que se falar em restruturação do Poder Legislativo se não fazer força neste sentido. As instituições, e mesmos os países, que se mantém firmes e poderosas são aquelas que se autodisciplinam. Ao parlamento relapso e desinteressado as punições devem ser rigorosos. Não há que se admitir um representante do povo interessado com os rumos da nação. Não há necessidade de ser uma disciplina militar, mas que seja uma verdadeira dis-ci-pli-na. E o parlamento que não se enquadrar "enquadrar" pelo rígido regimento interno, o será pelo grande regimento: o povo. o congresso, as assembléias e as câmaras municipais devem esclarecer o povo, a respeito dos parlamentares inativos.


7 - A imagem do Poder Legislativo

O que pensa a opinião pública sobre o Poder Legislativo? Há uma opinião formada a respeito do congresso? Qual a imagem que o Poder Parlamentar oferece a opinião pública? As perguntas poderiam ser multiplicadas, mas um ponto é comum a todas elas: se há uma imagem do congresso: ela é a pior possível. A revista VEJA, de 30 de setembro de 1998 divulgou pesquisa sobre qual instituição, na opinião do povo, que menos contribuiu para o "bem do país", e lá estão os representantes do povo: são os piores colocados. O professor José Augusto Guerra, atribuiu tal fato à tendência da opinião pública em criar estereótipos, ou seja, o povo tem uma imagem, em partes, distorcida da relevância do Poder Legislativo na vida de um país democrático. Na verdade o congresso seria um grande "desconhecido".

É necessário que o Poder Legislativo, e o Congresso Nacional em especial, reflita sobre a sua atual condição. Não se admite a atual situação que se assenhorou do Poder Legislativo. Esta instituição não pode ser passiva, estática, parasita. O congresso é uma força viva, expressiva e que deve entrar em movimento. E isto só se fará com as reformas necessárias. O que é certo é que "deixar do jeito que está pra ver como é que fica", é aceitar, pacificamente a desestruturação gradativa desse Poder, até que a história dê a ele um papel meramente figurativo. Foi isso que se deu com os soberanos no sistema monarquistas europeus. Agora, cabe a nós evitar que o mesmo processo se repita com o Legislativo nas democracias modernas.

Arrumada a casa, o Legislativo deve mostrar ao povo sua importância. Cabe à própria instituição desmistificar os estereótipos formados ao seu respeito, divulgando seu esforço em acompanhar os acontecimentos históricos, as reformas que estão sendo feita neste sentido, o porque de um poder legislativo, em fim, um "marketing" que conscientize o povo da importância dessa entidade. E a grande relevância desse empreendimento divulga dos é, como diria Rosseau, "chamar o povo à democracia". Não existe democracia sem Poder Legislativo, e não existirá Legislativo se ele não se adequar às necessidades da atual conjectura político-social, que poderia ser assim resumida: na política um Poder Executivo hipertrofiado dada omissão, ou "hipertrofia" do Poder Legislativo. Na economia, o mundo requer agilidade e segurança de posicionamento, e o Poder Legislativo, ainda é lento. No social, nunca esteve tão em voga a idéia de justiça, liberdade, bem estar, em fim, os povos estão mais exigentes e requerem dos seus representantes respostas seguras, conscientes, inteligentes e mais, devem ser imediatos.

Como nos ensina o professor José Augusto Guerra, sobre a necessidade e a importância da opinião pública com o sedimento a todo esse aparelhamento Legislativo: " não transformemos, porém , a pesquisa de opinião pública panacéia. Por si mesma ela nos dará apenas a possibilidade de tomar conhecimento de determinado comportamento, num determinado assunto. Os inquéritos assemelham-se aos exames clínicos: facilitam o diagnóstico. Só depois, quando nos vimos refletidos nesse espelho, é que teremos condição de se sentir o que realmente representamos na realidade política e social do Brasil de hoje".


Conclusão

Não teve, esta dissertação, a intenção de ser um roteiro de sugestão que resolvesse os males que circundam o Poder Legislativo. Nos esforçamos, desde o início, em sustentar um aforismo: os circunstâncias atuais, impostos pelo sistema global, requer, mais do que nunca, presteza, segurança e agilidade nas atitudes intervencionistas do Estado. O Poder Legislativo, por se caracterizar pela lentidão de seu processo, fica à parte nas atuações Estatais. A conseqüência disso é que, o Poder Executivo adquire, cada vez mais, importância na intervenção do Estado, principalmente na economia, o que coloca à margens do sistema, o Poder Legislativo.

A questão que se põe é se este é o real papel do Poder Legislativo, o de mero conhecedor de direito. Acreditamos que não, e agora podemos retomar àquela questão formulada no início de nossos trabalhos: Está, o Poder Legislativo em condições de contribuir positivamente com êxito das grandes decisões? Não. O Poder Legislativo deve saltar da condição de mero espectador dos grandes acontecimentos para ente atuante do processo. O Poder Legislativo deve, em pé de igualdade, constituir junto com o Poder Executivo as soluções exigidas pelo Estado e pela Sociedade. E isso não se verificará se não houver agilização nas tomadas de posição, um assessoramento eficaz e operante e, principalmente, a especialização de seus membros. Está última, sem dívidas, é a de maior importância e a de maior dificuldade de implantação devido, especialmente, pelo elevado percentual de renovação dos membros do congresso, 45% na última eleição (nos Estados Unidos a renovação gira em torno de 5%). Mas isto só a maturidade democrática será capaz de nos dar. Enquanto isso, o que podemos fazer, é tomar as devidas medidas que restaure a dignidade deste baluarte da democracia, chamado Poder Legislativo.

Esses fatos são inegáveis e levam, no nosso entendimento, a conseqüências gravíssimas. Da mesma forma que o Estado Absolutista Hobbesiano não resiste ao Poder Legislativo, o Estado Democrático não resiste à sua falta. A história é cíclica, e se repete. O Poder Absoluto foi posto em xeque porque as circunstâncias históricas daquela época exigiram do Estado espécies de prestações que aquele Estado não consegui corresponder, logo sucumbiu-se. Surge, assim, o Poder Parlamentar, como ente capaz de responder àquelas prestações. Agora o Poder Legislativo está se mostrando a cada dia, incapaz de dar contribuição satisfatória às questões propostas ao Estado, parte Por sua lentidão, parte por sua desorganização e, maiormente, por sua falta de conhecimento especializado e a necessidade da implantação de um sistema comissionário eficiente, o que na falta, gera a lentidão.

Ora , não existe democracia sem Poder Legislativo, da mesma forma que não existe democracia com um Poder Legislativo inseguro, lento, inativo, no que se refere a matérias de avultada importância, em fim, um "dinossauro desarmado." As reformas para adequar esse Poder às novas exigências socio-político-econômicas são inevitáveis e devem ser profundas. Do contrário, a história se incumbirá de fazer sucumbir aquilo que já foi esteio da democracia moderna.


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Sobre o autor
Anderson Rosa Vaz

acadêmico de Direito na Universidade Federal de Uberlândia (MG)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VAZ, Anderson Rosa. Reestruturação do Poder Legislativo:: novos paradigmas de atuação político parlamentar. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 48, 1 dez. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/232. Acesso em: 24 nov. 2024.

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