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Análise jurídico-administrativa do trabalho escravo no estado do Piauí

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Agenda 03/04/2013 às 09:49

Aborda-se o trabalho escravo de forma geral, o crime de redução à condição análoga à de escravo, bem como o trabalho escravo no Estado do Piauí, fazendo uma análise jurídico-administrativa.

INTRODUÇÃO

Apesar da abolição da escravatura, que ocorreu com a Lei Áurea, em 1888, ainda é possível encontrar casos de trabalho escravo no Brasil, inclusive no Estado do Piauí. A proibição de trabalho escravo encontra fundamento na Constituição Federal de 1988, bem como em normas infraconstitucionais, formando uma cadeia de proteção jurídica ao trabalhador.

Com características próprias, e impulsionada pela miséria que acomete o país, a escravidão moderna reduz o trabalhador à condição de objeto, restringindo-lhe a liberdade e privando-lhe de  seus direitos trabalhistas.

Ocorre que pouco se tem registrado e estudando sobre o tema no Estado do Piauí, o que não é proporcional à quantidade de trabalhadores submetidos ao trabalho análogo ao de escravo no Estado.

Dessa forma, o presente trabalho aborda o trabalho escravo de forma geral, o crime de redução à condição análoga à de escravo, bem como o trabalho escravo no Estado do Piauí, fazendo uma análise jurídico-administrativa.

O primeiro capítulo do trabalho faz uma busca histórica do trabalho escravo no Brasil, analisando também o conceito de trabalho escravo, a escravidão nos dias atuais e as medidas para erradicação do trabalho escravo.  Além disso, estuda-se o fundamento constitucional e infraconstitucional da proibição desse tipo de trabalho no país.

O segundo capítulo trata do crime de redução à condição análoga à de escravo, estudando seu conceito e a ação nuclear. Analisa-se, também, as consequências do consentimento do ofendido, o sujeito ativo, o elemento subjetivo do crime e a possibilidade de condenação por dano moral.

O terceiro capítulo se detém a analisar o trabalho escravo no Estado do Piauí, abordando inicialmente generalidades. Em seguida, passa-se à análise dos dados do Tribunal Federal da 1ª Região, do Ministério Público Federal, do Ministério Público do Trabalho e do Ministério do Trabalho e Emprego, esmiuçando os casos que tratam de trabalho escravo no Estado do Piauí.

Dessa forma, pretende-se analisar, do ponto de vista jurídico e administrativo, o trabalho escravo no Estado do Piauí.


1. TRABALHO ESCRAVO

1.1. ASPECTOS HISTÓRICOS

Concomitante ao estabelecimento das grandes empresas de monocultura da cana-de-açúcar, o trabalho escravo se instalou no Brasil[1], isso porque não houve êxito com a utilização da mão de obra indígena, tendo em vista a resistência dos jesuítas, que se dedicavam à catequização dos índios, a dificuldade da captura e a redução dessa população[2].

Os africanos tornaram-se as principais vítimas dos mercadores de escravos. Estima-se que cerca de 80% dos negros capturados na África, na primeira metade do século XIX, teriam vindo para o Brasil, que possuía aproximadamente 2,5 milhões de escravos.[3]

Havia escravos tanto nas fazendas como nas cidades, sendo estes chamados de “escravos de ganho, que exerciam certos ofícios prestando serviços ou fazendo pequeno comércio, rendendo lucros ao senhor”.[4]

Mesmo com a independência, o Brasil manteve várias características da época colonial, dentre elas, a exploração da mão de obra escrava, que lentamente fora substituída pelo trabalho do homem livre.[5]

Com o fim da escravidão no Brasil, o dinheiro antes aplicado nesse comércio, passou a ser investido na modernização da economia. Com o tempo, o governo passou a incentivar a imigração, pagando os custos da viagem e exigindo dos fazendeiros que pagassem um salário fixo anual. Dessa forma, a chegada desses imigrantes criou uma nova perspectiva das relações de trabalho.[6]

Ocorre que, como bem ressalta Rezende, “rompeu-se com a escravidão institucionalizada, porém muitas das relações da época do escravismo se mantiveram”[7]. Havia, sobretudo, o preconceito contra o trabalho manual, que representa uma dos grandes vestígios dos tempos de escravidão.

Em verdade, “o sentimento de liberdade e igualdade iniciado em 1822, com a Independência, tomou impulso na proclamação da República, em 1889, e somente veio a completar-se em 1988, com a Constituição da República em vigor.”[8] Mesmo assim, ainda é possível encontrar trabalhadores em situação de total privação à liberdade.

1.2. CONCEITO DE TRABALHO ESCRAVO

Historicamente, o escravo é tratado como um bem, do qual seu proprietário pode dispor de acordo com sua conveniência. Conforme registrado pelo historiador Paul Veyne,:

Sendo um bem que se possui, um escravo é um inferior. E como esta inferioridade de um homem faz de outro homem seu proprietário, um chefe, esse amo, seguro de tal grandeza, a consagrará considerando natural a inferioridade do escravo: um escravo é um sub-homem por destino e não por acidente; a escravidão antiga tem por analogia psicológica menos remota o racismo.[9]

Para Montesquieu, "a escravidão propriamente dita é o estabelecimento de um direito que torna um homem tão próprio de outro homem, que este é o senhor absoluto de sua vida e de seus bens".[10]

De acordo com a Convenção nº 29 da OIT, trabalho forçado é aquele exigido de um indivíduo sob a ameaça de alguma punição e para o qual ele não se apresentou voluntariamente. Assim, ressalta-se, de início, que trabalho forçado não se confunde com trabalho escravo.

A doutrina e jurisprudência são pacíficas em afirmar que o trabalho escravo é aquele em que:

a pessoa é submetida a condições degradantes de trabalho, ao mesmo tempo que é restrita sua liberdade de locomoção. O trabalho escravo é todo aquele que restringe ou elimina a liberdade do ser humano em forma não prevista em lei. Independe de origem, classe social ou econômica do sujeito passivo da indigitada conduta.[11]

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Também nesse sentido, tem-se o entendimento do Tribunal Regional da 3ª Região, segundo o qual há trabalho escravo quando:

permanece o aviltamento das condições de trabalho, em que o empregado é submetido a situações degradantes de labor, em ofensa à ordem social consagrada no texto constitucional e aos direitos assegurados pela Legislação do Trabalho.[12]

O Supremo Tribunal Federal, por meio do informativo 524, de outubro de 2008, fixou o entendimento que:

a escravidão é um estado de direito pelo qual o homem perde, por lei, sua personalidade. O Brasil não reconhece tal estado, por isso não há escravidão no Brasil e nem crime que reduza a condição de escravo, mas a condição análoga à de escravo, ou seja, a algo semelhante.[13]

Para aclarar as ideias, tem-se que o conceito de trabalho escravo, de acordo com Carlos Henrique Bezerra Leite, tem três pontos elementares no que tange ao tipo de coação:

a) coação econômica – dívida contraída com o transporte para fazenda e compra de alimento. O empregado tenta saldar a dívida, mas não consegue, devido aos elevados valores cobrados;

b) coação moral/psicológica – ameaças físicas, e até de morte, por parte do responsável pela fazenda e constante presença de capataz, armado, em meio aos trabalhadores;

c) coação física – agressão aos trabalhadores como forma de intimidação.[14]

O conceito de trabalho escravo é, em verdade, o contrário de trabalho digno, o que também não é fácil de conceituar. Conforme explica Almeida,

as diversas conceituações existentes de trabalho digno não se diferenciam substancialmente, pois a própria força da palavra revela seu real significado, sendo que dignidade está aliada ao bem estar do homem, assim como o trabalho à sua necessidade de interação com todo o complexo sistema organizacional da sociedade em que vive.[15]

Assim, percebe-se que trabalho escravo é aquele que submete o homem a condições degradantes de labor, geralmente privando sua liberdade em razão de dívidas infundadas e submetendo-o à precárias condições de higiene e saúde, não sendo necessário que exista violência ou ameaça para caracterizá-lo.

1.3. O TRABALHO ESCRAVO NOS DIAS ATUAIS

O trabalho em regime de escravidão serviu de sustentáculo econômico, social e político à elite, formada por grandes proprietários rurais, e ao governo no Brasil durante muitos anos, sendo abolido em 1888.[16] Mesmo com a abolição da escravatura e mesmo com toda a legislação que garante os direitos dos trabalhadores, ainda é possível perceber resquícios de escravidão no Brasil atual.

Isso porque ainda há uma intensa exploração daqueles que se encontram em condições de extrema miserabilidade, inclusive trabalhadores.[17] No entanto, a antiga escravidão tem características diferentes da escravidão contemporânea, tendo esta indicadores próprios, dentre os quais se destacam o aliciamento e a servidão por dívida.

Atualmente o aliciamento dos trabalhadores é feito por um preposto (conhecimento como “gato”) do empregador, geralmente proprietário rural. Os chamados “gatos” recrutam pessoas em outras localidades, prometendo boa remuneração e boas condições de trabalho. Assim,:

o trabalhador, iludido pelas falsas promessas, aceita sair do seu domicílio para trabalhar na propriedade. Nesse momento, tem início uma outra etapa, na qual os trabalhadores contraem dívidas, que mais tarde serão responsáveis pela sua permanência na fazenda do proprietário rural. O próprio transporte do trabalhador até a fazenda costuma ser cobrado mais tarde, além dos produtos de alimentação, higiene e saúde, cuja aquisição fica restrita ao armazém da própria fazenda, onde os preços praticados são mais altos que os normalmente estipulados em outros estabelecimentos. Desse modo, o trabalhador, sem dinheiro para quitar seus débitos, vê-se oprimido pela estrutura montada pelo proprietário, que não permite que ninguém saia de sua fazenda sem pagar as dívidas, que crescem continuamente. Dentro desse contexto, pode-se observar o painel no qual a escravidão contemporânea se manifesta no Brasil.[18]

Diferente da época da escravidão do Brasil Colônia, a exploração do trabalho escravo hoje tem caráter social e é movida pela grande lucratividade do explorador.[19] Outra diferença daquela escravidão da escravidão moderna, é que nesta os trabalhadores recrutados não são apenas os negros, mas todos aqueles, independente da cor, que se encontram em situação de vulnerabilidade e pobreza.

Dessa forma, a redução de um trabalhador à condição análoga de escravo, como assevera Fernando Capez, ainda é uma situação muito comum, especialmente:

no interior dos Estados, onde indivíduos são contratados para prestar serviços como agricultores nas fazendas, tornando-se devedores de seus patrões em razão do que estes despendem com a sua contratação e manutenção (condução, moradia, alimentação, etc). Assim, até que quitem a dívida, esses indivíduos são forçados a prestar gratuitamente serviços aos proprietários de terras, sendo-lhes vedado o direito de abandonar o local de trabalho. Enquanto se encontram confinados, são, na maioria das vezes, privados de todas as condições dignas de sobrevivência, sendo-lhes negado muitas vezes o direito a condições de higiene, local de descanso, adequada alimentação, etc.[20]

São diversas as causas de manutenção do trabalhador forçado nos redutos autocráticos dos fazendeiros escravagistas. Entre estas causas estão a ingenuidade do trabalhador, que de fato acredita ter uma dívida a ser paga com o “gato” que lhe deu a oportunidade de estar empregado; ameaças às suas famílias, caso saiam da terra sem pagar "o que devem"; e, por fim, a coação física, com exemplos diários de selvagerias e de tentativas de intimidação, caso ousem abandonar o serviço.[21]

De acordo com os ensinamentos de Lívia Mendes Moreira Miraglia,:

o trabalho escravo contemporâneo é aquele que se realiza mediante a redução do trabalhador a simples objeto de lucro do empregador. O obreiro é subjugado, humilhado e submetido a condições degradantes de trabalho e, em regra, embora não seja elemento essencial do tipo, sem o direito de rescindir o contrato ou de deixar o local de labor a qualquer tempo.[22]

Percebe-se, dessa forma, que, apesar de apresentar características próprias, a escravidão nos dias atuais é comum, sendo que, como ressalta Renato Saraiva, “a história aponta no sentido de que os trabalhadores do campo sempre foram mais explorados e sacrificados, em relação aos trabalhadores urbanos”.[23]

Sabendo que ainda existe escravidão nos dias atuais, é importante entender o que tem sido feito para erradicar o trabalho escravo.

1.4. ERRADICAÇÃO DO TRABALHO ESCRAVO

A OIT – Organização Internacional do Trabalho foi criada após a primeira guerra mundial e sempre prezou pela prevalência da justiça social no âmbito do trabalho, tendo papel determinante no combate ao trabalho escravo no Brasil. Agindo em conjunto com o governo federal, a OIT ajudou a criar medidas eficazes de combate ao trabalho escravo, especialmente com a implementação do Plano nacional para erradicação do trabalho escravo, lançado em 2003.[24]

Ocorre que sempre foi um grande desafio do Governo brasileiro erradicar o trabalho escravo. “Não se trata simplesmente de salvaguardar a imagem do país no exterior ou mesmo atuar internamente apenas para dar uma resposta às denúncias que surgem de todos os lados”.[25]

O combate ao trabalho escravo envolve diversos atores sociais e envolve “desde fortes pressões políticas dos poderes locais até situações de risco de vida para os que se envolvem na missão de combater todas as formas de trabalho escravo ou degradante”. [26]

Tal processo de erradicação do trabalho escravo envolve, ainda, várias medidas, tanto de cunho legislativo, como o efetivo ataque às práticas criminosas do trabalho forçado na sua origem, salvando e reabilitando as suas vítimas, eliminando outros aspectos de exploração laboral e promovendo oportunidades de trabalho digno para todos.[27]

A título de exemplo de medida legislativa, cita-se a PEC 438, proposta em 2001, que tem como principal fundamento a propositura de sanções severas para os criminosos proprietários rurais que mantiverem trabalhadores em condições análogas à de escravo, estabelecendo pena de perda da gleba onde for constatada a exploração de trabalho escravo (expropriação de terras), revertendo a área ao assentamento dos colonos que já trabalhavam na respectiva gleba.[28] Ocorre que a falta de interesse dos legisladores fez com que tal PEC estagnasse.

Determinada reportagem de Ulisses Campbell, veiculada dia 14 de dezembro de 2003 no jornal Correio Brasiliense, analisando a escravidão no Brasil, relatou que

o Ministério do Trabalho libertou nos últimos anos 29.587 trabalhadores do regime de escravidão em seis estados. Desse total, 11,8 mil voltaram à senzala por falta de oportunidade de emprego, com um índice de reincidência, que chega em 40% em alguns estados, sendo, assim, o maior desafio do governo na erradicação do trabalho forçado no Brasil.[29]

Apesar de todos os esforços para retirar pessoas da situação de escravidão, a falta de oportunidades tem feito com que elas retornem para a realidade de trabalhos degradantes e desumanos.

1.5. FUNDAMENTO CONSTITUCIONAL

A proibição do trabalho escravo tem fundamento na Constituição Federal, bem como em tratados internacionais assinados pelo Brasil, constituindo crime a redução do trabalhador à condição análoga à de escravo.

A Constituição Federal de 1988 repudia a prática do trabalho escravo ou forçado, seja por disposições expressas, seja pelo conjunto de princípios que carrega.  Isso porque “todo o texto constitucional tem como ideologia principal a igualdade dos seres humanos, sua dignidade, seu crescimento intelectual e evolução pessoal, tudo isso não podendo ser alcançado sem liberdade”.[30]

A Dignidade da Pessoa Humana constitui uma dos fundamentos da República Federativa do Brasil, previsto no artigo 1º, III, da Constituição Federal, e um dos seus objetivos fundamentais para a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, conforme artigo 3º, I, da referida Carta. O trabalho em condições análogas à de escravo fere diretamente o princípio da dignidade da pessoa humana.

Além disso, as relações internacionais da República Federativa brasileira são regidas pelo princípio da prevalência dos Direitos Humanos, conforme artigo 4º, II, da CF.

Já o artigo 5º, III, da Constituição da República Federativa do Brasil contém a proibição do trabalho forçado, dispondo que "ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante".

Sendo, portanto, a liberdade do ser humano uma garantia constitucional, que é violada com o trabalho em condições análogas à de escravo.

O inciso XVIII, do citado artigo, por sua vez, trata da liberdade de exercício profissional, prevendo que "é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer".

No inciso XLVII, alínea "c", ainda do artigo 5º da Constituição Federal, há a proibição da adoção de pena de trabalhos forçados. Ou seja, nem mesmo o Estado pode forçar alguém a trabalhar, mesmo que em atividade lícita.

Ressalta-se que, de acordo com entendimento pacificado na OIT, conforme sua Convenção 29, não se inclui como trabalhos forçados a imposição de serviço militar ou obrigações cívicas.[31]

Além da dignidade da pessoa humana, a livre iniciativa e os valores sociais do trabalho também constitui um dos fundamentos da República Federativa do Brasil. Sendo que, dessa forma, “todo corpo constitucional aponta para uma mesma direção: a condição sempre crescente da melhoria e proteção do trabalhador”.[32]

Ademais, a Constituição Federal determina que a propriedade deve atender à sua função social, e:

tal comando só é passível de cumprimento quando os empreendedores (na maioria das vezes pecuaristas) obedecem à legislação trabalhista, utilizando mão-de-obra e a propriedade para progresso da região e do país e não única e exclusivamente com intuito de lucro.[33]

Já o artigo 7º da Constituição Federal garante aos trabalhadores as condições mínimas para exercício de sua profissão com dignidade, respeito e possibilidade para crescimento intelectual e pessoal.

Percebe-se, dessa forma, que há ampla fundamentação constitucional para a proibição do trabalho escravo ou análogo à de escravo na República Federativa do Brasil.

Ademais, o artigo 6º da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto São José de Costa Rica), promulgada no Brasil pelo Decreto nº 678, de 06/11/1992, assegura que ninguém será submetido à escravidão ou à servidão, que são situações proibidas em todas as suas formas.

1.6. FUNDAMENTO INFRACONSTITUCIONAL

No âmbito infraconstitucional, a Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, com a finalidade de restringir e punir os empregadores que por ventura venham violar as condições dignas de trabalho e, portanto, submeter seus empregados às condições precárias, estabelece: multa ao empregador que mantiver empregado não registrado; multa ao empregador que infringir qualquer dispositivo concernente ao salário mínimo; multa ao empregador que violar as condições de estabelecidas no tocante à jornada de trabalho; penalidade para as infrações pertinentes às férias anuais remuneradas.[34]

Com isso, a legislação trabalhista também serve como fundamento para a proibição do trabalho em condições análogas à de escravo no Brasil.

Como mencionado acima, a exploração de mão de obra escrava acarreta o não atendimento da função social da propriedade, o que desencadeia processo de desapropriação do imóvel pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), observadas as Portaria nº 101, de 12/1/96, do MTE, a Lei nº 8.629/93 e a Lei Complementar nº 76, de 6/6/93.

Ainda na esfera legislativa infraconstitucional, o Código Penal brasileiro apresenta alguns artigos, tipificando condutas que, de alguma forma, afetam o trabalho humano livre, como o artigo 149, que tipifica o crime de redução de alguém à condição análoga à de escravo, o artigo 197 que tipifica o crime de atentado contra a liberdade de trabalho, o artigo 203, que prevê o crime de frustração de direito assegurado por lei trabalhista, e o artigo 207, que tipifica o crime de aliciamento de trabalhadores de um local para outro do território nacional.

A seguir, analisa-se com maior profundidade o crime de redução de alguém à condição análoga à de escravo, previsto, como citado, no artigo 149 do Código Penal.

Como bem explica Bitencourt, reduzir alguém à condição análoga à de escravo, “fere, acima de tudo, o princípio da dignidade humana, despojando-se de todos os seus valores éticos-sociais, transformando-o em res, no sentido concebido pelos romanos”.[35] Assim, o trabalho, que deveria dignificar o homem, o destrói.

Sobre a autora
Bruna Letícia Teixeira Ibiapina

Advogada, com pós graduação em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pelo Centro Unificado de Ensino de Teresina - CEUT.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

IBIAPINA, Bruna Letícia Teixeira. Análise jurídico-administrativa do trabalho escravo no estado do Piauí. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3563, 3 abr. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23999. Acesso em: 23 dez. 2024.

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