IV – Requisitos para a implantação do regime de turnos ou escalas e consequente flexibilização da jornada de trabalho, de que trata o art. 3º do Decreto nº 1.590/95
Da leitura do caput do art. 3º do Decreto nº 1.590/95[9], anteriormente já reproduzido, extraem-se os requisitos que devem ser observados para a implantação do regime de turno ou escalas de que trata o dispositivo, assim sintetizados:
a) serviços que exijam atividades contínuas de regime de turnos ou escalas, em período igual ou superior a doze horas ininterruptas;
b) exclusivamente para servidores que atuem no atendimento ao público ou no período noturno;
c) jornada de seis horas diárias e trinta horas semanais; e
d)dispensa do intervalo para refeições.
Primeiramente, cumpre esclarecer que, como ferramenta de gestão, sua instituição insere-se no âmbito de discricionariedade do dirigente máximo da entidade, no caso do INSS, o seu presidente. Não se trata, assim, de direito do servidor, motivo pelo qual descabe qualquer alegação de direito adquirido. Nesse sentido, o Advogado-Geral da União, no aprovo ministerial da Nota Técnica nº 007 PGF/LLC/2008, assim pontuou:
Aprovo, nos termos do Despacho do Consultor-Geral da União nº 174/2008, a NOTA Nº AGU/AFC-07/2008.
Acrescento, todavia, que a análise do disposto no art. 3º do Decreto nº 1.590, de 1995, na redação em vigor (Decreto nº 4.386/2003) é da competência exclusiva do ‘dirigente máximo do órgão ou da entidade’, no caso, do INSS.
Ou seja, sem afastar a aplicação do referido Decreto e sem necessidade de nenhuma alteração normativa, o presidente do INSS tem total competência para, na forma do dispositivo citado, avaliar dentro do órgão que dirige a sua incidência.
Outro não foi o entendimento sedimentado na já referida Nota Técnica nº 007/PGF/LLC/2008, aprovada pelo Consultor-Geral da União (Despacho nº 174/2008) e pelo Advogado-Geral da União,verbis:
16. Ante o exposto, s.m.j., deve-se responder à proposição da PGF pela aplicação do regime legal da jornada de 40 horas semanais a todos servidores públicos da administração pública federal direta e indireta, deferindo-se o regime de 30 horas semanais, apenas aos que exercerem efetivamente atividades em serviços que exigirem prestação contínua em período diário igual ou superior a 12 horas ininterruptas, em função de atendimento ao público ou trabalho no período noturno, mediante ato especial do chefe da instituição que indique a atividade respectiva e os servidores alcançados, sendo a possibilidade contrária somente com alteração do Decreto nº 1.590/95.
De outra banda, vale mencionar que a implantação da jornada reduzida ora examinada dar-se-á sem redução da remuneração, consoante entendimento já sedimentado pela Coordenação-Geral de Elaboração, Sistematização e Aplicação de Normas - COGES/SRH/MP e veiculado no Ofício nº 300/2003/COGES/SRH/MP, confira-se:
1. Por intermédio do FAX datado de 2 de outubro de 2003, o Senhor Diretor Geral da Escola Técnica Federal de Cáceres-MT solicita informação desta Divisão de Análise e Orientação Consultiva/DIORC/COGLE/SRH acerca da aplicação Decreto nº 4.836, de 9 de setembro de 2003, no que se refere às seguintes questões:
“1 – Se existe ou não redução de remuneração no caso de o servidor fizer opção pela jornada mencionada no Decreto supra?
2 – Os servidores ocupantes de Função CD e FG poderão aderir à jornada reduzida diante do Decreto?
3 – A aplicação desta norma cabe a todos os setores da instituição?
2. A alteração produzida pelo Decreto nº 4.836, de 9 de setembro de 2003, no art. 3º do Decreto nº 1.590, de 10 de agosto de 1995, permitiu aos dirigentes de órgãos e entidades cujos serviços exigirem atividades contínuas de regime de turnos ou escalas em período igual ou superior a doze horas ininterruptas, autorizar os servidores a cumprir jornada de trabalho de seis horas diárias e carga horária de trinta horas semanais, sem intervalo para refeições.
3. A adoção da jornada de trabalho de seis horas diárias, introduzida pelo Decreto nº 4.836, de 2003, está condicionada estritamente à função de atendimento ao público ou trabalho no período noturno, e não implica em redução de remuneração, cabendo ao dirigente máximo do órgão ou entidade, a partir de minucioso estudo de necessidades avaliar a oportunidade e o interesse da administração na aplicação dessa medida.
4. Importa realçar que a regulamentação trazida no Decreto nº 4.836, de 2003, não se aplica aos ocupantes de cargo em comissão ou função de confiança, tendo em vista o exercício do comissionamento está sujeito ao regime de dedicação integral ao serviço, previsto no § 2º do art. 19 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990.
5. Relativamente àqueles servidores que desejarem permanecer na jornada de trabalho de oito horas diárias, entende esta Divisão de Análise e Orientação Consultiva/DIORC/COGES/SRH, não haver qualquer empecilho de ordem técnica, cabendo ao dirigente máximo do órgão ou entidade a análise de cada caso, observando-se a conveniência e a oportunidade administrativa.
6. Assim, em resposta aos questionamentos formulados na inicial, informa-se:
1 - A jornada de seis horas diárias prevista no Decreto nº 4.836, de 2003, não implica em redução remuneratória dos servidores lotados nas repartições públicas cujos serviços exigem atividades continuas ou ininterruptas, em função de atendimento ao público ou trabalho no período noturno.
2 – Não. Os servidores ocupantes de cargo em comissão ou função de confiança estão sujeitos ao regime de dedicação integral ao serviço, estabelecido no § 1º do art. 19 da Lei nº 8.112, de 1990, portanto a eles não se aplica a jornada do Decreto nº 4.836, de 2003.
3 – Não. Somente àqueles que desempenham atividades relacionadas ao atendimento ao público.
Da leitura da manifestação supra, constata-se, ainda, que o regime diferenciado não se aplica aos servidores que ocupam cargo em comissão, uma vez que estes servidores estão sujeitos ao regime de dedicação integral ao serviço, nos termos do § 2º do art. 19 da Lei nº 8.112/90. No mesmo sentido, já se pronunciou a Consultoria Jurídica do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão[10].
Por derradeiro, como muito bem ressaltado pela COGES/SRH/MPOG, a jornada especial (art. 3º do Decreto nº 1.590/95) apenas poderá ser conferida àqueles que desempenham atividades ligadas diretamente ao atendimento ao público.
Diante de todo o exposto, percebe-se que, muito embora a instituição do regime diferenciado em referência fique a cargo do gestor máximo da entidade, a discricionariedade que lhe foi conferida é regrada. Assim, apenas poderá ser adotado se forem observadas todas as exigências estabelecidas no art. 3º do Decreto em referência.
V – Conclusão
Com base nos fundamentos anteriormente expostos, conclui-se que o regramento específico contido no art. 4º-A da Lei nº 10.855/04, afasta apenas a incidência da regra geral do art. 19 da Lei nº 8.112/90 e de seu regulamento contemplado no art. 1º do Decreto nº 1.590/95, e não todas as regras do referido decreto.
Conforme se demonstrou, as demais regras do supramencionado decreto, na medida em que versam sobre a organização e funcionamento da administração pública federal, são perfeitamente aplicáveis à Carreira do Seguro Social.
Verificou-se, ainda, que a implantação do regime de turnos ou escalas, que permite, em consequente, a redução da jornada de trabalho dos servidores, é uma ferramenta de gestão, sujeita ao juízo discricionário do dirigente máximo das entidades, no caso concreto, do Presidente do INSS, que se alinha aos novos paradigmas de uma gestão pública moderna, pautada no cânone da eficiência.
Diante de todo o exposto, constatou-se que, muito embora a instituição do regime de turnos ininterruptos de atendimento fique a cargo do gestor máximo da entidade, a discricionariedade que lhe foi conferida é regrada. Assim, apenas poderá ser adotado se forem observadas todas as exigências do art. 3º do Decreto.
VI – Referências Bibliográficas
1. ALEXANDRINO, Marcelo & PAULO, Vicente. Direito Administrativo Descomplicado. 20ª edição rev. e atual. São Paulo: método, 2012, p. 132.
2. CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 21ª edição. Rio de Janeiro: lumen Juris, 2008, p. 434.
3. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 21ª ed. São Paulo: Atlas, 2008, p.220.
4. MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de Direito Constitucional/Gilmar Ferreira Mendes, Inocêncio Mártires Coelho, Paulo Gustavo Gonet Branco. 4ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 956.
Notas
[1]ALEXANDRINO, Marcelo & PAULO, Vicente. Direito Administrativo Descomplicado. 20ª ed. rev. e atual. São Paulo: método, 2012, p. 132.
[2]ADI 2.564-3/DF, Rel. Ministra Ellen Gracie, DJ de 06/04/2004.
[3]Maria Sylvia Zanella Di Pietro, Gilmar Ferreira Mendes e Hely Lopes de Meirelles.
[4]MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de Direito Constitucional/Gilmar Ferreira Mendes, Inocêncio Mártires Coelho, Paulo Gustavo Gonet Branco. 4ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 956.
[5]DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 21ª ed. São Paulo: Atlas, 2008, p.220.
[6]DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 21ª ed. São Paulo: Atlas, 2008, p.220.
[7]ADInMC 1.590/SP, rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ, 15.08.1997, P.37034, Ement. V. 01878-01, p. 92, j. 19.06.1997, Tribunal Pleno.
[8]CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 21ª edição. Rio de Janeiro: lumen Juris, 2008, p. 434.
[9]Art. 3ºQuando os serviços exigirem atividades contínuas de regime de turnos ou escalas, em período igual ou superior a doze horas ininterruptas, em função de atendimento ao público ou trabalho no período noturno, é facultado ao dirigente máximo do órgão ou da entidade autorizar os servidores a cumprir jornada de trabalho de seis horas diárias e carga horária de trinta horas semanais, devendo-se, neste caso, dispensar o intervalo para refeições. (Redação dada pelo Decreto nº 4.836, de 9.9.2003)
[10]NOTA/MP/CONJUR/Nº 0231 – 3.4/2009.