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Veiculação do nome do condômino inadimplente em áreas comuns

Agenda 29/05/2013 às 13:28

A cobrança abusiva, feita em público, acaba por ofender a honra do condômino inadimplente, causando-lhe prejuízo passível de indenização. É possível apresentar publicamente apenas o número da unidade condominial inadimplente, sem expressar de forma alguma o nome do condômino.

Diversos condomínios sofrem atualmente com os elevados índices de inadimplência. Talvez uma justificativa razoável para o grande número de devedores é que a multa praticada pelos condomínios para atraso no pagamento das taxas condominiais é muito baixa por força do artigo 1336, §1º do Código Civil, que estabelece a aplicação máxima de 02% (dois por cento) sobre o valor do débito.

“Art. 1.336. São deveres do condômino:”

“§ 1º O condômino que não pagar a sua contribuição ficará sujeito aos juros moratórios convencionados ou, não sendo previstos, os de um por cento ao mês e multa de até dois por cento sobre o débito.”

Assim, ao passarem por momentos difíceis, os condôminos preferem deixar em aberto a prestação condominial, vez que o juro cobrado é irrisório se comparado aos demais praticados pelo mercado.

Ao observar a inadimplência crescendo dia a dia, muitos síndicos e administradoras passaram a procurar soluções para reduzir o número de inadimplentes.

Contudo, a solução mais eficaz, que seria aquela atrelada à majoração da multa em caso de atraso não poderia ocorrer por força da previsão legal, bem como pela indisposição que seria gerada junto aos demais moradores, que em nome do bom convívio social acabam por preferir não se indispor com os demais condôminos, logo, restaria apenas o envio de notificações extrajudiciais aos inadimplentes.

Todavia, a prática demonstra que mesmo com o envio de diversas notificações o índice de inadimplência tende a não apresentar redução significativa, fato que motiva alguns síndicos e administradoras a buscarem punições alternativas.

Tendo em vista que a pena pecuniária não poderia ser majorada, as pessoas descritas passaram a se valer de métodos de cobrança indevidos, pois em diversos casos passaram a veicular de forma pública o nome dos condôminos inadimplentes nas áreas comuns do edifício, mais especificamente no hall de entrada do edifício, dentro dos elevadores, bem como no quadro geral de avisos e demais áreas acessíveis a todos que transitam pelo condomínio.

A prática acima descrita passou a gerar inúmeros problemas no convívio em condomínio, pois a cobrança pública expõe o devedor a situação vexatória, que permite inclusive a reparação por danos morais provenientes dos atos de cobrança indevida.

Portanto, a medida que seria adotada como uma solução aos elevados níveis de inadimplência passou a ser vilã dos condomínios, pois forneceu subsídios aos condôminos inadimplentes para pleitearem judicialmente reparações pecuniárias pela cobrança vexatória imposta por seus credores.

Vale ressaltar que não é proibido ao condomínio cobrar os condôminos devedores, muito pelo contrário, pois a cobrança é lícita e exigível, até mesmo pelo fato de que todos os demais moradores acabam por custear as despesas extras provenientes da falta de arrecadação.

Entretanto, a cobrança deve ser legitimada, eficaz e deve resguardar acima de tudo a intimidade do condômino devedor.

Quanto à modalidade de cobrança a ser aplicada, indispensável salientar que o legislador pátrio estabeleceu que a apta a ser utilizada se restringe ao campo financeiro/patrimonial, ou seja, em momento algum deve resultar em práticas de cobrança abusivas ou que ofendem a dignidade, imagem e a honra dos inadimplentes.

Dessa forma, apura-se que o meio de cobrança deve ser legitimado e a imposição de sanção ao condômino que está em mora com suas obrigações, deve se restringir à sanção de caráter pecuniário, devidamente prevista em lei, nos moldes do que já fora exposto.

Além do mais, devemos trazer a debate o fato de que a taxa condominial possui natureza propter rem, ou seja, autoriza em sede de execução judicial a penhora da própria unidade condominial, sem que se possa cogitar a incidência da Lei nº 8009/90, esta que dispõe sobre a impenhorabilidade do bem de família, logo, existe expresso amparo legislativo para viabilizar a cobrança por intermédio de tutela judicial, dispensando-se assim a utilização de métodos vexatórios como o tratado no presente artigo.

Com relação ao dano moral em sentido estrito, entende-se esse como a dor subjetiva, dor interior que escapa à normalidade do cotidiano, que por sua vez, acaba por causar ruptura em seu equilíbrio emocional, influenciando em seu bem estar, causando-lhe diversos dissabores subjetivos, tais como: constrangimento, decepção, sofrimento, ou seja, o dano moral ofende de forma direta e imediata os atributos da personalidade do ser humano vitimado por tal prática.

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O conceito supracitado é amparado inclusive pela doutrina contemporânea, nos moldes do que leciona Antônio Jeová Santos em sua obra Dano moral indenizável (04ª Ed., revisada, atualizada e ampliada de acordo com o novo Código Civil. São Paulo: RT, 2003): “a lesão afeta sentimentos, vulnera afeições legítimas e rompe o equilíbrio espiritual, provocando angústia, humilhação, dor etc”.

Dessa forma, resta claro que a cobrança abusiva acaba por ofender de fato a honra do condômino inadimplente, causando-lhe prejuízo passível de ressarcimento pecuniário por meio da via judicial, haja vista o preenchimento de todos os requisitos ensejadores da aplicação do instituto jurídico da responsabilidade civil.

A responsabilidade civil inclui-se no direito das obrigações, já que consiste na obrigação do agente causador do dano de indenizar a vítima que suportou o prejuízo.

Ao versar sobre o instituto jurídico supracitado Silvio Rodrigues (Direito Civil: responsabilidade civil. 20ª Ed., atualizada de acordo com o novo Código. São Paulo: Saraiva, 2003. 4v, p. 06) utiliza-se das lições do jurista Savatier, este define a responsabilidade civil “como a obrigação que pode incumbir uma pessoa a reparar o prejuízo causado a outra, por fato próprio, ou por fato de pessoas ou coisas que dela dependam”.

Seguindo o mesmo entendimento, Sérgio Cavalieri Filho (Programa de responsabilidade civil. 06ª Ed., revisada, aumentada e atualizada. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 24), também se valendo das lições de Savatier declara que a responsabilidade civil “designa o dever que alguém tem de reparar o prejuízo decorrente da violação de um outro dever jurídico”, ou seja, a responsabilidade consiste num dever jurídico sucessivo da necessidade de reparação do dano gerado pela violação de um dever jurídico originário.

Superado o conceito do instituto jurídico da responsabilidade civil, cumpre esclarecer que são quatro seus pressupostos ensejadores, sendo eles: ação ou omissão do agente, culpa do agente (apreciada em casos de responsabilidade civil subjetiva), relação de causalidade e dano experimentado pela vítima.

Ainda com relação ao tema, este também é previsto amplamente pela legislação pátria, que é expressa ao determinar que qualquer dano gerado a outrem, seja o prejuízo material ou moral, proveniente de ação ou omissão, negligência ou imprudência deve ser reparado.

A tutela supracitada fundamenta-se nos artigos 186 e 927, ambos do Código Civil Brasileiro, dispositivos estes que indiretamente tratam sobre o real objetivo do instituto jurídico da responsabilidade civil, que resumidamente consiste em restaurar um equilíbrio moral e patrimonial que fora objeto de violação, nos moldes do que já fora amplamente exposto.

“Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”

“Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.”

Portanto, resta incontroverso que a partir do momento que a divulgação pública do nome do condômino inadimplente nas áreas de uso comum passa a lhe gerar desconforto, bem como constrangimento, passa a ser cabível a aplicação do instituto jurídico da responsabilidade civil, este que embasa a cobrança judicial de justa indenização, tese esta adotada pela jurisprudência majoritária, de acordo com o que comprovam os julgados abaixo transcritos:

“INDENIZAÇÃO POR DANOSMORAIS. Circulação de informativo condominial que feriu a honra dos autores. Direito de cobrança exercido de maneira abusiva. Abuso de direito configurado. Reparação moral devida. RECURSO DESPROVIDO” (Apelação Cível nº 0170819-49.2009.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, 6ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Paulo Alcides, j. 6.10.2011).”

“Obrigação de fazer cc indenização por danos morais. Dano moral caracterizado pelas medidas vexatórias de cobrança praticadas pelo condomínio em relação aos condôminos inadimplentes, em especial desligamento do elevador social no andar da unidade devedora. Arbitramento em sete salários mínimos que se mostra em consonância com os parâmetros da jurisprudência, não enriquecendo nem empobrecendo e servindo para dissuadir o ofensor de práticas futuras semelhantes" (TJSP, 4ª Câmara de Direito Privado, AC 503998.4/5, Rel. Des. Maia da Cunha, j. 07 de maio de 2.007).”

Dessa maneira, nos moldes do que já fora exposto, resta incontroverso que a tese majoritária adotada pelos Tribunais Superiores entende que a veiculação do nome do morador inadimplente em áreas de uso comum acaba por fundamentar o pedido de indenização a título de danos morais provenientes do constrangimento suportado perante terceiros.

Contudo, existem entendimentos diversos ao arrolado até o presente momento, que defendem a tese que não são todas as hipóteses de divulgação do nome do condômino inadimplente que lastreiam o pedido de reparação de danos morais.

A tese exposta no parágrafo acima ao ser analisada de forma pormenorizada, entende que a cobrança pública se presta a dar publicidade e transparência à gestão efetuada por síndicos e administradoras, logo, sustenta que a cobrança pública é salutar, porém, depende da forma que é desempenhada, sob pena de ofender a honra de terceiros.

Insta salientar que a tese supracitada é abordada também pela jurisprudência pátria, nos moldes do que atestam os julgados abaixo transcritos:

“Ação de indenização. Despesas condominiais. Inadimplemento do apelante. Dano moral. Publicidade dos devedores. Conduta legal do síndico. Ação improcedente. Apelação improvida” (Apelação nº 9176013- 17. 2008.8.26.0000, Rel. NESTOR DUARTE, julg. 02.04.12).

“Condomínio. Indenização. Alegação de constrangimento pela divulgação de relação de condôminos inadimplentes nos balancetes mensais. Ausência de conduta irregular ou intuito malicioso. Indenização indevida. Recurso improvido. Não constitui abuso ou exposição ao ridículo a simples inclusão do nome do condômino no rol dos devedores, nos balancetes mensais, não justificando cobrança de indenização por danos morais. A revelação de devedores é obrigação e não existe prova de que o réu tenha obrado com intuito de submeter o condômino à situação vexatória. Aliás, de igual intensidade é o sentimento daquele que paga suas obrigações em dia, mas se vê obrigado a suportar no rateio da parte dos inadimplentes” (Apelação 1.165.120-00/8, Rel. KIOITSI CHICUTA - J. 15.05.08).

Assim, ao analisarmos a questão de ambos os pontos de vista (moradores em dia com suas obrigações e moradores inadimplentes) chegamos à conclusão que a cobrança pública abusiva é aquela que consiste na exposição do nome (em sentido estrito) do condômino devedor aos demais moradores do edifício, fato constrangedor e que acaba por gerar prejuízos muitas vezes irreparáveis.

Desse modo, atingimos o questionamento final, é lícito ou não expor em público o nome do condômino inadimplente?

A resposta à pergunta acima se revela através do entendimento de que a cobrança pública legitimada é aquela que expõe apenas o número da unidade condominial (em sentido estrito) de propriedade do morador inadimplente como pré-requisito obrigatório para que haja a devida prestação de contas por parte do síndico/administradora perante os moradores do condomínio, logo, em momento algum é vedada a cobrança pública, mas devemos nos atentar à forma que veiculamos essa informação para evitar constrangimento perante terceiros.

Insta salientar ainda que a ausência do nome (em sentido estrito) do devedor nos murais de aviso a título de prestação de contas apesar de parecer uma alteração simples pode gerar grandes mudanças, pois revela transparência na gestão exercida pelo síndico/administradoras e preserva o condômino inadimplente de exposição indevida e ofensiva perante os demais moradores.

Sendo assim, é possível apresentar publicamente apenas o número da unidade condominial inadimplente, sem expressar de forma alguma o nome do condômino, pois, nos moldes do que entendem inclusive os Tribunais Superiores, a informação do número de inadimplentes é necessária para fornecer transparência à gestão realizada pelo síndico e administradoras, entretanto, a veiculação do nome do condômino moroso expõe esse a situação de cobrança vexatória facultando-lhe recorrer à via judicial para ter ressarcido o dano moral suportado.

 


Bibliografia:

CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 06ª Ed., revisada, aumentada e atualizada. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 24.

RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: responsabilidade civil. 20ª Ed., atualizada de acordo com o novo Código. São Paulo: Saraiva, 2003.4v, p. 06.

SANTOS, Antônio Jeová. Dano moral indenizável. 04ª Ed., revisada, atualizada e ampliada de acordo com o novo Código Civil. São Paulo: RT, 2003. 

Sobre o autor
Rodrigo Alves Zaparoli

Advogado. Graduado em Direito pela Faculdade de Direito pela Faculdade de Direito Mackenzie. Pós graduado em Direito civil pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ZAPAROLI, Rodrigo Alves. Veiculação do nome do condômino inadimplente em áreas comuns. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3619, 29 mai. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24556. Acesso em: 22 dez. 2024.

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