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A exigência de notificação pessoal e direta de nomeação em cargo e emprego públicos.

O caso do AgRg no RMS 37.227-RS do STJ

Agenda 13/06/2013 às 08:01

Se o candidato de concurso público tem obrigação de manter seus dados cadastrais atualizados, não faz sentido desprezá-los no momento mais importante: o da nomeação. A Administração não pode comunicar o aprovado por mera publicação em diário oficial.

Dentro do prazo de validade estipulado no edital de regência do certame, com ou sem prorrogação, o Poder Público dispõe de discricionariedade para nomear obrigatoriamente os certamistas aprovados e classificados, isto é, que passaram dentro do número de vagas eventualmente previstas, e tantos quantos certamistas forem necessários daqueles que foram aprovados mas não classificados, ou seja, que passaram fora do número de vagas previstas, constituindo o chamado cadastro de reserva ou espera.

Nessa perspectiva, vê-se no seguinte aresto do Supremo Tribunal Federal:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. CONCURSO PÚBLICO. PREVISÃO DE VAGAS EM EDITAL. DIREITO À NOMEAÇÃO DOS CANDIDATOS APROVADOS. I. DIREITO À NOMEAÇÃO. CANDIDATO APROVADO DENTRO DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTAS NO EDITAL. Dentro do prazo de validade do concurso, a Administração poderá escolher o momento no qual se realizará a nomeação, mas não poderá dispor sobre a própria nomeação, a qual, de acordo com o edital, passa a constituir um direito do concursando aprovado e, dessa forma, um dever imposto ao poder público. Uma vez publicado o edital do concurso com número específico de vagas, o ato da Administração que declara os candidatos aprovados no certame cria um dever de nomeação para a própria Administração e, portanto, um direito à nomeação titularizado pelo candidato aprovado dentro desse número de vagas. (RE 598099/MS, Relator(a):  Min. GILMAR MENDES, DJe-189 DIVULG 30-09-2011 PUBLIC 03-10-2011). Destaquei.   

Até mesmo aqueles candidatos que têm direito subjetivo à nomeação, pois foram aprovados dentro do número de vagas, podem não ser convocados a assumir cargo ou emprego público de imediato. A rigor, conforme a conveniência e necessidade da Administração Pública, podem ser nomeados até o último dia do prazo de validade do concurso público, sem que isto se revele, de acordo com o Pretório Excelso, antijurídico.

Sem embargo, não me furto de externalizar minha reserva quanto a essa intelecção, uma vez que se há previsão editalícia de vagas, significa dizer que a Administração Pública tem necessidade imediata por recursos humanos e previsão orçamentário-financeira para realizar referidas nomeações, sendo, assim, a meu ver, conduta contraditória nomear os candidatos que foram aprovados dentro do número de vagas muito tempo depois de homologado o resultado final do certame, mesmo que ainda dentro do lapso temporal de validade.

E não se olvide que o comportamento contraditório infringe os princípios da boa-fé objetiva e lealdade que devem sempre presidir e nortear as relações interpessoais, e com mais razão, a relação entre o Estado e os administrados, por exigência do princípio da moralidade, insculpido na CF, art. 37, caput. Aliás, existe um brocardo jurídico neste sentido: Nemo potest non venire contra factum proprium, quer dizer, ninguém pode contrariar o seu próprio fato ou ato. É regra comezinha de boa convivência e harmonia na sociedade.

É regra editalícia comum prevê que é de exclusiva responsabilidade do candidato manter atualizados os seus dados cadastrais, incluindo o endereço residencial, contato telefônico, de celular e de e-mail, junto à Administração Pública para fins de convocação, nomeação à assunção de cargo e emprego públicos.

Em que pese essa legítima exigência, é comum o Poder Público convocar os candidatos apenas por meio de diário oficial, achando isto suficiente. Para ele pode até ser, mas para quem não tem o costume e nem tempo de ler diário oficial, a divulgação apenas por esse meio constitui-se, a meu sentir, pouca consideração e apreço pelo candidato nomeado, para não dizer outra coisa, ainda mais se se pensar que indigitada convocação pode não ocorrer de imediato para aqueles aprovados dentro do número de vagas, que dirá para aqueles que detêm mera expectativa de direito, por estarem em cadastro de reserva ou espera.

A vida hodierna nos enche de responsabilidades e preocupações, de maneira que é desarrazoado exigir que durante dois anos, por exemplo, o candidato verifique na internet todos os dias se sua tão sonhada nomeação foi realizada. A situação se torna mais dramática se se pensar naqueles candidatos que não dispõe de internet em sua casa, o que não é nada impressionante em se cuidando de Brasil. Imagine-se a quantidade de dinheiro que esses candidatos ao final de dois anos terão despendido, gastado com acesso à internet por ciber.

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Então, a nomeação apenas mediante diário oficial se afigura observância incompleta do edital de regência do certame, na medida em que se exige do certamista manter atualizados os seus dados cadastrais. Se esses dados cadastrais atualizados não são usados para o instante que mais se revelam relevantes, qual seja, a nomeação do candidato à assunção de cargo ou emprego público, essa exigência editalícia se torna despicienda, inservível, inútil.

Não se nega que a razão de ser do diário oficial nada mais é do que concretizar o princípio da publicidade dos fatos e atos do Poder Público, insculpido no art. 37, caput, da CF/1988. Por outro lado, não se pode desconsiderar a nossa realidade social no sentido de que a maioria dos brasileiros não tem o hábito de ler se quer jornal impresso, que dirá diário oficial.

A interpretação e aplicação do Direito, ensina Dirley da Cunha Jr (Curso de Direito Constitucional. 6ª ed. Salvador: Ed. Juspodivm, 2012) não deve ser realizada de forma descolada, desvinculada da realidade histórico-social na qual se insere, uma vez que o próprio Direito retira suas forças e sua razão de existir, sua legitimidade dessa realidade.

Sensível a essas questões, o Superior Tribunal de Justiça julgou um caso da seguinte forma (in Informativo nº 515/2013)

DIREITO ADMINISTRATIVO. DIREITO DO CANDIDATO APROVADO EM CONCURSO PÚBLICO A SER COMUNICADO PESSOALMENTE SOBRE SUA NOMEAÇÃO. O candidato tem direito a ser comunicado pessoalmente sobre sua nomeação no caso em que o edital do concurso estabeleça expressamente o seu dever de manter atualizados endereço e telefone, não sendo suficiente a sua convocação apenas por meio de diário oficial se, tendo sido aprovado em posição consideravelmente fora do número de vagas, decorrer curto espaço de tempo entre a homologação final do certame e a publicação da nomeação. Nessa situação, a convocação do candidato apenas por publicação em Diário Oficial configura ofensa aos princípios da razoabilidade e da publicidade. A existência de previsão expressa quanto ao dever de o candidato manter atualizado seu telefone e endereço demonstra, ainda que implicitamente, o intuito da Administração Pública de, no momento da nomeação, entrar em contato direto com o candidato aprovado. Ademais, nesse contexto, não seria possível ao candidato construir real expectativa de ser nomeado e convocado para a posse em curto prazo. Assim, nessa situação, deve ser reconhecido o direito do candidato a ser convocado, bem como a tomar posse, após preenchidos os requisitos constantes do edital do certame. Precedente citado: AgRg no RMS 35.494-RS, DJe 26/3/2012 (AgRg no RMS 37.227-RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 6/12/2012)  

Não obstante a decisão referir-se à candidato aprovado fora do número de vagas, não vejo razão em contrário para essa intelecção não ser estendida ao aprovados dentro do número de vagas. Isto, para além de não representar nenhum tipo de ônus financeiro e nem aumentar as responsabilidades ordinárias dos agentes públicos, significa conferir a máxima eficácia ao princípios da publicidade, boa-fé objetiva e lealdade, na medida em que se terá a certeza de que o candidato contemplado com a nomeação em cargo ou emprego público foi regularmente cientificado, dando-lhe a oportunidade de tomar posse que, via de regra ocorre, pois a grande maioria das pessoas que tem êxito em certame público, são pessoas que despenderam muito tempo e dinheiro, sem falar da abdicação de várias coisas, pelo sonho de ser agente público.

E imaginar que esse sonho pode ser destruído pela deficiência administrativa em realizar a sua cientificação quanto à nomeação, parece-me demasiadamente injusto.

Injusto, porque o candidato não deu causa à perda do prazo para tomar posse que, via de regra, é de trinta dias (Lei nº 8.112/1990, art. 13, §1º), contados da data da nomeação, se quer teve a oportunidade de se manifestar se queria ou não assumir o cargo ou emprego público, simplesmente porque sua convocação foi veiculada apenas em diário oficial, embora tenha cumprido com a obrigação editalícia de manter atualizados os seus dados cadastrais.

Assim, em homenagem aos princípios da publicidade e moralidade no Poder Público, deve-se ter certeza de que o candidato teve ciência da sua nomeação, mediante uma notificação pessoal e direta, e não através apenas de uma notificação presumível, ficta, que é a divulgação por meio de diário oficial.


Referências

Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil. 1988. Disponível em www.planalto.gov.br

Cunha Jr, Dirley da. Curso de Direito Constitucional. 6ª ed. Salvador: Ed. Juspodivm,2012.

Pinheiro, Wecsley dos Santos. Nomeação por concurso público – direito subjetivo versus expectativa de direito. Recurso Extraordinário nº 598.099. In Prática Jurídica, ano XI, nº 123, 30/06/2012, Ed. Consulex, pp. 10-12.

Superior Tribunal de Justiça. Informativo de Jurisprudência. Disponível em http://www.stj.jus.br

Supremo Tribunal Federal. Pesquisa de Jurisprudência. Disponível em http://www.stf.jus.br   

Sobre o autor
Wecsley dos Santos Pinheiro

Bacharel em Direito. Assessor jurídico do Ministério Público do Trabalho da 8ª Região.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PINHEIRO, Wecsley Santos. A exigência de notificação pessoal e direta de nomeação em cargo e emprego públicos.: O caso do AgRg no RMS 37.227-RS do STJ. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3634, 13 jun. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24698. Acesso em: 22 dez. 2024.

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