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Breves anotações sobre o princípio da busca da felicidade

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Agenda 18/07/2013 às 17:30

Independentemente de positivação, o direito à busca da felicidade tem surgido em decisões judiciais como decorrência do princípio da dignidade da pessoa humana, na tentativa de resguardar, em especial, o direito da igualdade.

Resumo: A felicidade é uma aspiração buscada pela maioria das pessoas, podendo ser identificada no cotidiano da vida em várias situações, com curta duração. Embora o conceito tenha entendimento diferente, dependendo do contexto em que se vive, existe a tramitação no Congresso Nacional da PEC da felicidade, no intuito de alterar-se o artigo 6º da Constituição Federal para incluir a busca pela felicidade como um direito fundamental do cidadão no Brasil. Várias são as legislações alienígenas que já reconhecem o direito da felicidade no ordenamento jurídico respectivo, merecendo destaque o tema em razão das novas fundamentações das decisões judiciais fazendo alusão ao denominado princípio.

Palavras-chave: Felicidade. Princípio. Constituição Federal.


1.  Introdução

A busca pela felicidade tem sido utilizada para fundamentar recentes decisões judiciais.

Ganhou evidência quando da Emenda Constitucional nº 66/2010, através da qual houve a extinção da separação judicial do ordenamento jurídico pátrio, sendo possível a dissolução da sociedade marital somente através do divórcio, na atualidade.

Não menos importantes são as novas decisões quanto à regulamentação do casamento entre homossexuais, já implementado através de resolução e recomendação judicial em vários Estados brasileiros, cabendo, também, a utilização do citado princípio, ainda implícito, quando dos pedidos de adoção de menores por homossexuais.[1]

Embora o conceito de felicidade possa ser entendido de forma diferente por inúmeras pessoas, é notório que trata-se de um objetivo, mesmo que abstrato, a ser alcançado em vários momentos da vida.

Entende-se, também, decorrer do princípio da dignidade da pessoa humana, tratando-se de uma aspiração universal, tanto que a Organização das Nações Unidas (ONU) reconheceu a felicidade como direito humano fundamental, constituindo objetivo fundamental de toda e qualquer política pública a ser adotada pelo Estado (SCHAFRANSKI, 2012).

Pois bem, pelo destaque que as decisões judiciais têm dado à aludida felicidade é que se faz pertinente e atual o estudo e abordagem do tema, tendo como objetivo principal o presente artigo o entendimento sobre o conceito de felicidade, como esta é vista no direito comparado; a análise da PEC da Felicidade e a possibilidade de alteração do texto normativo constitucional para inclusão de tal princípio.

Para tanto, a fim de efetivar-se a presente pesquisa bibliográfica, o método de abordagem a ser utilizado é o dedutivo, onde, a partir da relação entre enunciados básicos, denominadas premissas, tira-se uma conclusão, ou seja, serão analisadas vários entendimentos e pensamentos doutrinários sobre o tema, apontando-se os mais adequados para aplicação ao caso concreto (MARCONI, et. al., 2010). 

Quanto a metodologia de procedimento a presente pesquisa tem como base a confecção de artigo científico, explorando-se a legislação, a doutrina e artigos existentes sobre o tema (MARCONI, et. al., 2010).

Como técnicas de pesquisa, os instrumentos utilizados no desenvolvimento deste trabalho caracterizam-se pelas pesquisas bibliográfica, documental e legislativa, e ainda, englobam os artigos de revista e internet, além de vários outros meios e técnicas de pesquisa direta e indireta (CERVO, et. al., 2010).


2. Conceito de felicidade e o direito comparado

“A felicidade é fundamental (...) depende dos desejos subjetivos determinados pelos sentimentos de prazer ou de dor. (...) Ademais, a felicidade não passa de um ideal impossível de ser estabelecido. Ela tem por base as sensações empíricas e não a universalidade possível a priori” (DIFANTE, 2008).

A felicidade é algo realmente buscada por todos os indivíduos, embora de difícil identificação, considerando as mudanças de estações, de humores pelos quais passamos no cotidiano e na vida.

Sustenta-se que a felicidade é de difícil conceituação e isso se dá pelas simples explicações que seguem:

Kant afirma que a constante busca pela felicidade se dá a partir da eterna insatisfação do homem enquanto ser empírico (e finito). Portanto, essa busca é impulsionada principalmente pelas necessidades e inclinações sensíveis. Já na abertura da Fundamentação, quando Kant refere-se aos dons da fortuna, enumera o poder, a riqueza, a honra, a saúde e também “todo o bem-estar e contentamento com a sua sorte, sob o nome de felicidade” (FMC, BA 1-2). Logo, a felicidade pode ser concebida e manifestar-se de diversos modos. Visto que os desejos e as inclinações humanas (nos quais se assenta o sentimento de satisfação), nada mais são do que princípios empíricos e subjetivos, a vontade humana (naturalmente considerada) não pode ser reduzida a um princípio comum e válido para todos. Nessa perspectiva cadahomem, empiricamente considerado, possui subjetivamente a necessidade de satisfazer as suas próprias aspirações. Então, é natural que cada ser humano, enquanto sujeito agente, busque para o seu agir as mais variadas finalidades. A satisfação, baseada nas necessidades empíricas ou em sentimentos atribuídos ao sensível, não é outra coisa senão a felicidade (DIFANTE, 2008).

PEREIRA apud SCHAFRANSKI (2012) comenta a possibilidade de qualificar dois componentes principais para alcançar-se a felicidade e medi-la, quais sejam, o bem-estar objetivo no qual estão inseridas circunstâncias objetivas da vida, como por exemplo, “renda, grau de escolaridade, condições de saúde, meios de transporte (...) moradia e o bem-estar subjetivo (...) composto de experiências subjetivas e de apontadores emocionais”, estando incluído, inclusive, a avaliação a respeito da satisfação com a vida que se tem.

Diferencia, ainda, que o bem-estar subjetivo é sinônimo de ser feliz, enquanto que a felicidade é analisada dentro de uma “conjuntura de sentir-se feliz”, estando mais ligada ao prazer (SCHAFRANSKI, 2012).

No enfoque religioso a busca da felicidade fragmenta-se em alegrias de curta duração, muitas vezes substituindo a busca pela salvação eterna, sendo conceituada a felicidade como a perfeita realização de si mesmo, podendo ser encontrada na entrega ao amor de Deus (QUEVEDO, 2007).

FERRAZ (et. al., 2007) esclarece que a maioria das definições de felicidade faz menção a um “estado emocional positivo, como sentimento de bem-estar e prazer”, apontando várias pesquisas efetivadas internacionalmente a fim de elucidar áreas da vida que podem afetar a felicidade, mencionando que o BRASIL ocupa o 32º (trigésimo segundo) lugar no ranking dos países com escores mais elevados de felicidade.

Nos citados estudos é identificado que com relação ao estado civil o casamento tem pouca influência na felicidade. Quanto aos filhos tem um efeito nulo ou fracamente negativo nos níveis de bem-estar. Assim também ocorrendo como a aparência física. Destaca-se que um dos maiores índices de felicidade é o comprometimento com a fé, “seja por meio da religiosidade, seja por meio da espiritualidade” (FERRAZ, et. al., 2007).

Quanto aos aspectos psicológicos elucida-se que a extroversão e autoestima estão relacionados com maiores índices de felicidade, enquanto que “ênfase ao dinheiro e ao sucesso profissional do que ter amigos íntimos ou um bom casamento – estão intensamente associados a menores índices de felicidade (...)” (FERRAZ, et. al., 2007).

Diante de tais parâmetros e observações concluiu-se que a felicidade é um “fenômeno predominantemente subjetivo, estando subordinada mais a traços de temperamento e postura perante a vida do que a fatores externamente determinados” (FERRAZ, et. al., 2007).

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De outro norte, da fundamentação da proposta de emenda à constituição nacional, é apontado estudo estabelecendo o estado civil, entre outros parâmetros acima listados como indicadores de felicidade:

Em recente estudo, dois economistas brasileiros se propuseram a analisar, empiricamente, o que trazia felicidade aos brasileiros. Determinantes como renda, sexo, estado civil e emprego se mostraram diretamente ligadas às respostas dos pesquisados a respeito da felicidade. Concluiu-se, com base nesse estudo, que pessoas com maior grau de renda se dizem mais felizes, assim como aquelas pessoas casadas. A relevância do estudo, destarte, é estabelecer elementos concretos como determinantes da felicidade geral, demonstrando que é possível, sim, definir objetivamente a felicidade (Site Mais Feliz, 2010).

Destarte, o conceito sobre felicidade é alterado de pessoa para pessoa, de acordo com suas aspirações e com o modo de vida, podendo ser considerado felicidade vários fatores ou elementos da vida.

Nesse contexto, dada a importância do princípio em apreço, pertinente a análise sobre como a felicidade é entendida no ordenamento jurídico de outros países, mesmo que de forma sintetizada.

LEAL (2011) tece importantes comentários a fim de listar a forma como a felicidade é prevista no ordenamento jurídico de diversos países:

A Constituição do Japão, no seu artigo 13, dispõe que todas as pessoas tem direito à busca pela felicidade, desde que isso não interfira no bem-estar público, devendo o Estado, por leis e atos administrativos, emprenhar-se na garantia às condições por atingir a felicidade. A Constituição sul coreana, no seu artigo 10, diz que todos tem direito a alcançar a felicidade, atrelando esse direito ao dever do Estado em confirmar e assegurar os direitos humanos dos indivíduos. (...) O Reino do Butão estabelece pelo artigo 9º da sua Constituição, a adoção do INFB como indicador social, o índice Nacional de Felicidade Bruta, que considera indicadores que envolvem bem-estar, cultura, educação, ecologia, padrão de vida e qualidade de governo. Segundo a Corte interamericana de Direitos Humanos, o objetivo primordial do Estado Democrático é ‘a proteção dos direitos essenciais do homem e a criação de circunstâncias que lhe permitam evoluir espiritualmente e materialmente e atingir a felicidade (...)’.

LUNT apud FERRAZ, et. al (2007) ressalta que a felicidade é considerada como um valor tão precioso e “indiscutível” que na Declaração de Independência dos EUA é registrada como um direito inalienável.

Na fundamentação da proposta de emenda à constitucional nacional, são listados outros países que reconhecem a felicidade como direito fundamental:

Na Declaração de Direitos da Virgínia (EUA, 1776), outorgava - se aos homens o direito de buscar e conquistar a felicidade; na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (França, 1789) há a primeira noção coletiva de felicidade, determinando - se que as reivindicações dos indivíduos sempre se voltarão à felicidade geral. Hoje, o Preâmbulo da Carta Francesa de 1958 consagra a adesão do povo francês aos Direitos Humanos consagrados na Declaração de 1789, dentre os quais se inclui toda a evidência, à felicidade geral ali preconizada. Atualmente, a felicidade está elevada ao grau constitucional em diversos ordenamentos jurídicos. Nesse contexto, como deixar de citar o Reino do Butão, que estabelece, como indicador social, um Índice Nacional de Felicidade Bruta (“INFB”), mensurado de acordo com indicadores que envolvem bem - estar, cultura, educação, ecologia, padrão de vida e qualidade de governo, determinando o artigo 9º daquela Constituição o dever do INFB. O artigo 20, item 1 daquela Carta estabelece, na mesma esteira, que o Governo deverá garantir a felicidade do Estado de promover as condições necessárias para o fomento do povo. Em linha análoga segue o artigo 13º da Constituição do Japão e o artigo 10º da Carta da Coréia do Sul: o primeiro determina que todas as pessoas têm direito à busca pela felicidade, desde que isso não interfira no bem – estar público, devendo o Estado, por leis e atos administrativos, empenhar - se na garantia às condições por atingir a felicidade; o segundo estatui que todos têm direito a alcançar a felicidade, atrelando esse direito ao dever do Estado em confirmar e assegurar os direitos humanos dos indivíduos (Site Mais Feliz, 2010).

Não diferente dos demais países acima identificados, no Brasil também visualiza-se a possibilidade de incluir à Carta Magna a busca pela felicidade como princípio através da PEC da felicidade.


3. Pec da felicidade

A busca pela felicidade foi motivo de Projeto de emenda à Constituição proposta por CRISTOVAM BUARQUE (nº 19/2010), no intuito de alterar-se o artigo 6º da Carta Magna, intitulando-a como direito.

Chamada de PEC da Felicidade, o objetivo é a sua busca, pelos indivíduos, através de viabilidade, pelo Estado e pela sociedade, de condições adequadas para exercício de tal direito.

Nesse contexto, importante a análise dos fundamentos para a proposta da Emenda Constitucional em comento:

A presente Proposta de Emenda à Constituição não encontra os óbicesmateriais previstos no artigo 60, parágrafo 4º do Texto, haja vista que nãohá proposta de supressão de qualquer dos direitos ali encartados.Como já exposto, a expressa previsão do direito do indivíduo de perquirir afelicidade vem ao encontro da possibilidade de positivação desse direito,ínsito a cada qual. Para a concretização desse direito, é mister que o Estadotenha o dever de, cumprindo corretamente suas obrigações para com asociedade, bem prestar os serviços sociais previstos na Constituição.A busca individual pela felicidade pressupõe a observância da felicidadecoletiva. Há felicidade coletiva quando são adequadamente observados ositens que tornam mais feliz a sociedade, ou seja, justamente os direitossociais–uma sociedade mais feliz é uma sociedade mais bem desenvolvida,em que todos tenham acesso aos básicos serviços públicos de saúde,educação, previdência social, cultura, lazer, dentre outros.Evidentemente, as alterações não buscam autorizar um indivíduo a requererdo Estado ou de um particular uma providência egoística a pretexto deatender à sua felicidade. Este tipo de patologia não é alcançado pelo queaqui se propõe, o que seja, repita-se, a inclusão da felicidade como objetivodo Estado e direito de todos.A alteração no artigo 6º éreflexo, justamente, do escopo principal previstonesta Proposta de Emenda à Constituição, sendo os direitos sociais(educação, saúde, alimentação, trabalho, moradia, lazer, segurança,previdência social, proteção à maternidade e à infância, a assistênciaaosdesamparados) essenciais para que se propicie a busca, pelos indivíduos,com reflexos na sociedade como um todo, da felicidade.Há muito norma positiva contempla a busca pela felicidade como umdireito. (...) Todos os direitos previstos na Constituição–sobretudo, aqueles tidos comofundamentais–convergem para a felicidade da sociedade. É assegurado odireito à uma vida digna, direito esse que pode ser tido como fundamentalpara que a pessoa atinja a felicidade. Também a vida com saúde é fator queleva felicidade ao indivíduo e à sociedade.Uma adequada segurança públicaimplica em uma vida mais feliz, indubitavelmente. E assim ocorre com umsem-número de direitos encartados na Constituição.Os critérios objetivos da felicidade podem, no contexto constitucional, serentendidos como a inviolabilidade dos direitos de liberdade negativa, taiscomo aqueles previstos no artigo 5º (variantes da vida, ao Estadoprestacional–os direitos sociais, como os preconizados liberdade,igualdade, propriedade e segurança), além daqueles relacionados no artigo6º do Texto Constitucional. O encontro dessas duas espécies de direitos–osde liberdade negativa e os de liberdade positiva–redundam, justamente,no objetivo da presente Proposta de Emenda à Constituição: a previsão dodireito do indivíduo e da sociedade em buscar a felicidade, obrigando-se oEstado e a própria sociedade a fornecer meios para tanto, tanto se abstendode ultrapassar as limitações impostas pelos direitos de égide liberal quantoexercendo com maestria e, observados os princípios do caputdo artigo 37,os direitos de cunho social(Site Mais Feliz, 2010).

Destarte, a felicidade é listada como direito a ser buscado por todos os indivíduos, como sendo a tradução de uma vida digna, a qual deve ser propiciada pelo Estado. Pela fundamentação acima, entende-se que a felicidade, a vida digna do ser humano somente será alcançada com a consequente positivação normativa.

Embora ainda inexiste o citado direito explícito na Constituição Federal, consoante anteriormente se evidenciou, não deixa de ser utilizado como razão de decidir em situações da vida levadas à litigio perante o Poder Judiciário Nacional.

Isso decorre da própria importância que se dá aos princípios constitucionais, sendo a busca pela felicidade ainda implícito, porém entendido como decorrente da própria busca pela dignidade humana.

Supõe-se a ausência, talvez, de normatização, considerando a própria dificuldade em quantificar, qualificar e conceituar a felicidade, no intuito de identificar um parâmetro a fim de aferir a concretização do entendido direito.

Quanto a situação aventada RUBIN (2010) identifica a dificuldade de quantificar a felicidade, razão pela qual, noticiando pesquisa efetivada pela Revista Forbes, lista dois questionamentos efetivados a fim de medir tipos de bem-estar, quais sejam “auto avaliação de satisfação com a própria vida; (...) como cada indivíduo se sentia no dia anterior ao da entrevista”.

BARROS apud RUBIN (2010) entende que as pessoas criam suas próprias ideias de satisfação de felicidade, chegando a questionar sobre o conceito de felicidade da forma que segue:

Mas o que é felicidade? Trata-se de algo tangível, mensurável e delimitável? Cuida-se de algum estado físico e mental dependente da agregação de fatores materiais? Ou é algo cujo alcance demanda a presença apenas de fatores imateriais? A felicidade se associa ao prazer, à paz ou ao amor? O seu atingimento exige atividade, disciplina, constância nas condutas? Ou, contrariamente, decorre do repouso e da ausência da ordem? (Barros apud Rubin, 2010).

Pois bem, consoante acima listado, pela própria dificuldade em conceituar, mensurar a felicidade, podendo ser distintamente entendida pelos seres humanos é que se questiona a forma pela qual será entendida e satisfeita se normatizada, a exemplo da saúde, da educação, da moradia. No entanto, de outro norte, importante frisar que é justamente através do direito que são resolvidos os conflitos sociais e mesmo objetivado as pretensões de ações contenciosas, razão pela qual não se torna indispensável a positivação almejada pela PEC da felicidade.

Considerando-se que o Direito, além de uma ferramenta para a solução dos conflitoshumanos, é em essência um instrumento de pacificação social, infere-se sua orientaçãoteleológica para a construção de um mundo no qual as pessoas possam buscar, livremente,a felicidade, quaisquer que sejam as dimensões materiais e imateriais desse sonho (Barros apud Rubin,2010).

Ademais, CARVALHO (et. al, 2010), lista a felicidade como a razão maior da vida, existindo lógica na fato de “os governos terem como prioridade desenvolver, implementar e melhorar as condições que a favoreçam”, identificando como finalidade da administração pública o “bem como da coletividade”, devendo a atividade do administrador público ser orientada para tal finalidade.


4. A felicidade como princípio constitucional nacional

BONAVIDES apud LEAL (2008) salienta que os princípios “são materiais mediante os quais a doutrina pode ‘edificar com confiança a construção jurídica’”.

Evidencia LEAL(2008) que o Estado deve facilitar os sonhos dos indivíduos, através dos quais é possível o alcance da almejada felicidade. Ressalta, ainda, que embora não se tenha a busca da felicidade como princípio expresso, vários são os julgados trazendo-a como fundamento de decisão, consoante exemplo que segue:

O ministro Carlos Velloso, nos autos do Recurso Extraordinário nº 328.232/AM(DJ 20/04/2005), fez registro: (...) convém registrar, que uma das razões mais relevantes para a existência do direito está na realização do que foi acentuado na Declaração da Independência dos Estados Unidos da América, de 1776, o direito do homem de buscar a felicidade. Noutras palavras, o direito não existe como forma de tornar amarga a vida dos seus destinatários, senão de fazê-la feliz. (LEAL, 2008).

Destarte, a pretensão que se almeja com o ajuizamento de uma demanda certamente é para alcançar-se o que não é possível extrajudicialmente, seja pela impossibilidade de um objeto administrativamente, seja pela existência de um litígio, cabendo, com o regular exercício do direito de ação, buscar o indivíduo o objetivo pretendido.

Ainda, outro exemplo de utilização da busca pela felicidade como razão de decidir é a notícia abaixo veiculada:

O ministro Celso de Mello, no julgamento da Medida Cautelar na Ação Diretade Constitucionalidade nº 3.300/DF (DJ 09/02/2006), consignou:Não obstante as razões de ordem estritamente formal, que tornaminsuscetível de conhecimento a presente ação direta, masconsiderando a extrema importância jurídico-social da matéria–cuja apreciação talvez pudesse viabilizar-se em sede de arguição de descumprimento de preceito fundamental-, cumpre registrar,quanto à tese sustentada pelas entidades autoras, que o magistérioda doutrina, apoiando-se em valiosa hermenêutica construtiva,utilizando-se da analogia e invocando princípios fundamentais(como os da dignidade da pessoa humana, da liberdade, daautodeterminação, da igualdade, do pluralismo, da intimidade, da não-discriminação e da busca da felicidade), tem reveladoadmirável percepção do alto significado de que se revestem tantoo reconhecimento do direito personalíssimo à orientação sexual,de um lado, quanto a proclamação da legitimidade ético-jurídicada união homoafetiva como entidade familiar, de outro, em ordema permitir que se extraiam, em favor de parceiros homossexuais,relevantes consequências no plano do Direito e na esfera dasrelações sociais. (LEAL, 2008).

Conclui dizendo que o princípio da busca da felicidade surge como princípio constitucional implícito, mas atrelado ao princípio da dignidade da pessoa humana (LEAL, 2008).

Retornando a ideia da positivação, salienta LIMA (2011) que em tese não seria necessária anormatização do direito fundamental à felicidade no ordenamento jurídico por estar abrangido por outros princípios já adotados, esclarecendo, no entanto, o entendimento da importância de tal alteração, no intuito de resgatar a garantia dos direitos sociais.

Outro importante julgado sobre o princípio em apreço é a fundamentação do Ministro Celso de Melo é analisado no RE 477554 MG, afirmando que a busca da felicidade aparece como “afirmação, gozo e expansão dos direitos fundamentais”:

“(...) - O reconhecimento do afeto como valor jurídico impregnado de natureza constitucional: um novo paradigma que informa e inspira a formulação do próprio conceito de família. Doutrina. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E BUSCA DA FELICIDADE.- O postulado da dignidade da pessoa humana, que representa - considerada a centralidade desse princípio essencial (CF, art. 1º, III)- significativo vetor interpretativo, verdadeiro valor-fonte que conforma e inspira todo o ordenamento constitucional vigente em nosso País, traduz, de modo expressivo, um dos fundamentos em que se assenta, entre nós, a ordem republicana e democrática consagrada pelo sistema de direito constitucional positivo. Doutrina. . - O princípio constitucional da busca da felicidade, que decorre, por implicitude, do núcleo de que se irradia o postulado da dignidade da pessoa humana, assume papel de extremo relevo no processo de afirmação, gozo e expansão dos direitos fundamentais, qualificando-se, em função de sua própria teleologia, como fator de neutralização de práticas ou de omissões lesivas cuja ocorrência possa comprometer, afetar ou, até mesmo, esterilizar direitos e franquias individuais. - Assiste, por isso mesmo, a todos, sem qualquer exclusão, o direito à busca da felicidade, verdadeiro postulado constitucional implícito, que se qualifica como expressão de uma ideia-força que deriva do princípio da essencial dignidade da pessoa humana. Precedentes do Supremo Tribunal Federal e da Suprema Corte americana. Positivação desse princípio no plano do direito comparado. A FUNÇÃO CONTRAMAJORITÁRIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E A PROTEÇÃO DAS MINORIAS (...)” (jul. 16/08/2011).

Existem entendimentos, no entanto, quanto ao fato da busca da felicidade não configurar uma norma, regra ou princípio, embora possa ser utilizado como fundamentação a amparar decisões judiciais:

A despeito das decisões do STF, não é possível enquadrar, de plano, a busca da felicidade como direito fundamental. Também não se pode conferir dimensão normativa direta à busca da felicidade (pois a felicidade é decorrente do gozo de direitos fundamentais).A felicidade configura, inegavelmente, objetivo a ser conquistado pelos indivíduos e meta a ser perseguida pelo Estado. Por isso se fala em novo índice: FIB –Felicidade Interna Bruta, para medir o nível de felicidade da população de um país.Portanto, a relação entre Direito e a busca da felicidade configura objeto de debate recém instaurado na comunidade jurídica nacional, especialmente após decisões proferidas pelo STF.Significa que o Direito não pode ser considerado ciência jurídica pura, eis que interdisciplinar, pois se conecta com a psicologia, filosofia, sociologia e outras ciências humanas. Por isso, o sistema jurídico deve contemplar mecanismos para que os indivíduos alcancem a máxima felicidade.Isso não permite concluir, entretanto, que a busca da felicidade seja prodigalizada e utilizada para fundamentar todo e qualquer argumento jurídico ou decisão judicial, pois o seu alcance decorre do cumprimento dos direitos fundamentais já assentados e reconhecidos. Vale dizer, é impossível fundamentar uma decisão com base apenas na busca da felicidade.Assim, a busca da felicidade não configura uma norma (regra ou princípio), diante da ausência de autonomia e de densidade normativa, mas isso não impede sua invocação para justificar a proteção a um direito ou a um princípio já previstos no sistema jurídico (SCHULZE, 2012).

Pois bem, pelos entendimentos acima listados verifica-se que, na prática forense, embora, ainda, não normatizado, a busca pela felicidade é considerada como decorrente do princípio da dignidade da pessoa humana, sendo utilizado como fundamento para inúmeras decisões de procedência de ações.

Nesse contexto, cabe a cada operador do direito, embora não expresso, utilizar-se do citado direito a fim de esgotar todas as possibilidades no intuito de efetivar a prestação jurisdicional àqueles que se socorrem ao Poder Judiciário.

Consoante se evidenciou, a própria hermenêutica jurídica viabiliza interpretações mais amplas, capazes de ensejar a conquista das pretensões dos demandantes em juízo. Assim, sendo ou não positivada como direito fundamental ou princípio constitucional, a busca pela felicidade continuará a ser observada e utilizada como razões de decidir, visando a plena proteção do indivíduo e dos direitos pelo mesmo almejados.

Sobre a autora
Carla Matiello

Assessora de Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado do Paraná - PR. Especialista em Direito Civil e Processual Civil.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MATIELLO, Carla. Breves anotações sobre o princípio da busca da felicidade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3669, 18 jul. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24959. Acesso em: 22 nov. 2024.

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