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Os interesses metaindividuais trabalhistas e a sua defesa em juízo pelo sindicato

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Agenda 28/08/2013 às 07:25

2 A DEFESA JUDICIAL DOS INTERESSES METAINDIVIDUAIS TRABALHISTAS PELO SINDICATO

2.1 LEGITIMIDADE DO SINDICATO

Em matéria trabalhista, a legitimidade para defesa dos interesses metaindividuais, seja por meio da ação civil pública ou da ação civil coletiva, é atribuída, de forma concorrente, ao Ministério Público do Trabalho e aos sindicatos. Nesse sentido é o magistério de Ives Gandra Martins Filho, que distingue a forma de atuação dos referidos legitimados:

A defesa dos interesses coletivos em juízo, através da ação civil pública, pode ser feita tanto pelo Ministério Público do Trabalho como pelos sindicatos, de vez que o ordenamento processual assegura a legitimidade concorrente de ambos (CF, art.129, §1º; Lei 7.347/85, art.5º, I e II). No entanto, o prisma pelo qual cada um encara a defesa dos interesses coletivos é distinto:

a) o sindicato defende os trabalhadores que a ordem jurídica protege (CF, art. 8º, III); e

b) o Ministério Público defende a própria ordem jurídica protetora dos interesses coletivos dos trabalhadores (CF, art. 127)[31].

A legitimidade dos entes sindicais emana da previsão do art.8°, III, da Constituição Federal, que determina:

Art. 8º É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte:

[...]

III - ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas;

Em que pese a clareza dos termos utilizados pela Carta Magna para atribuir legitimidade aos sindicatos para a defesa da categoria, intensas são as discussões, no âmbito da doutrina, sobre diversos aspectos de tal atuação.

Registre, a princípio, que a legitimidade do sindicato para a defesa dos interesses individuais da categoria não abrange os interesses meramente pessoais de seus membros, mas somente os individuais homogêneos da categoria por ele representada, ou seja, aqueles que, conforme visto, embora resultantes de lesões individuais, originam-se de circunstância de fato comuns.

Questão não menos importante refere-se à legitimidade para defesa dos interesses difusos trabalhistas. Parte da doutrina defende a legitimidade exclusiva do MPT em tal hipótese, de modo a excluir a legitimidade do sindicato. Tal entendimento deriva da interpretação do art 8°, III, da CF, que como visto, refere-se a interesses coletivos ou individuais da categoria. Segundo os adeptos dessa corrente, os interesses difusos, por serem titularizados por pessoas indeterminadas, naturalmente se afastam da noção de categoria, de modo a não serem abrangidos pelos dispositivos constitucional em comento e da proteção do sindicato. Esta é a posição de Bezerra Leite[32].

Com efeito, a idéia de categoria, conforme já visto, refere-se aos interesse coletivos em sentido estrito, que por definição dizem respeito a pessoas determinadas ligadas entre si por uma relação jurídica base. Tal fato, contudo, não exclui a possibilidade de que, quando atue na defesa de um interesse coletivo da categoria que representa, igualmente busque a tutela de interesses difusos, como por exemplo, referentes a futuros empregados que pertencerão àquela mesma categoria profissional, ou ainda à sociedade como um todo.

Ademais, segundo Mazzilli:

(...) em tese, o sindicato pode defender interesses transindividuais não só em matérias diretamente ligadas à própria relação trabalhista em si mesma, mas também em questões relativas ao meio-ambiente do trabalho ou à condição de consumidores de seus associados, ou ainda em outras hipóteses de interesse da respectiva classe, grupo ou categoria, desde que haja autorização dos estatutos ou de assembléia (não se exige autorização de cada substituto processual)[33].

A legitimidade do sindicato abrange a defesa judicial dos interesses metaindividuais trabalhistas de todos os integrantes da categoria, sejam eles sindicalizados ou não.

Exige-se do sindicato, outrossim, a comprovação de pertinência temática entre os seus fins institucionais e o interesse coletivo defendido na ação coletiva, sob pena de não restar caracterizado o seu interesse de agir (Art. 82, IV, do CDC  e art. 5°, I, da LACP)

Outra exigência legal consiste na necessidade de comprovação de que está legalmente constituído há pelo menos um ano. Tal condição, no entanto, pode ser dispensada pelo juiz, em privilégio ao objeto tutelado. Marcos Fava defende a sua inaplicabilidade ao sindicato, em face do princípio da unicidade sindical (Art. 8°, II, CF):

No dizente ao sindicato, dado o reprovável regime da unicidade sindical vigente por força do art. 8° da Constituição Federal, não há falar em aplicação do quesito da pré-constituição. Do contrário, como só um sindicato pode representar os interesses de determinada categoria em dada base geográfica, correr-se-ia o risco de, durante pelo menos um ano, escoar-se a legitimação desse importante órgão de representação dos direitos transindividuais.[34]

2.1.1 Substituição Processual ou Representação?

Adota o direito processual pátrio a regra geral segundo a qual a titularidade da ação se confunde com a titularidade do direito material subjetivo que se pretende resguardar. Tal regra consubstancia-se no art. 6° do Código de Processo Civil, cuja previsão é no sentido que “ninguém poderá pleitear, em nome próprio, direito alheio, salvo quando autorizado por lei”. Trata-se da chamada legitimação ordinária.

Referida regra de coincidência funciona a título subsidiário, de modo que, eventualmente, a lei outorga legitimidade a quem, por definição, não integra os pólos subjetivos do objeto litigioso. Tal dissociação entre os sujeitos do processo e os da lide decorre de conveniência, e se chama “legitimação extraordinária”[35].

A legitimidade extraordinária autônoma ou substituição processual ocorre quando pessoa estranha ao objeto litigioso atua em nome próprio, no processo, e com absoluta independência em relação ao legitimado ordinário. Nelson Nery a define como “o fenômeno pelo qual alguém, autorizado por lei, atua em juízo como parte, em nome próprio e no seu interesse, na defesa de pretensão alheia”[36].

Afasta-se, pois, a substituição processual, da figura da representação, fenômeno ordinário, que decorre naturalmente do mandato. Na representação, em verdade, o representante não atua em seu próprio nome, mas em nome do representado.

Mas qual seria a natureza jurídica da atuação do sindicato na defesa dos interesses metaindividuais trabalhistas, com base no art. 8º, inciso III da Constituição? Substituição processual ou mera representação? A questão reveste-se de enorme relevância, não se constituindo em mera discussão acadêmica. Sua identificação, em verdade, implica em conseqüências de ordem prática, restringindo ou ampliando a abrangência da tutela coletiva pelo sindicato.

Em 1993, o TST editou a Súmula 310, com vistas a assentar o posicionamento quanto à hipótese do art. 8°, III, CF:

SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL – SINDICATO

I- O art. 8°, inciso III, da Constituição da República não assegura a substituição processual pelo sindicato. II – A substituição processual autorizada ao sindicato pelas Leis ns. 6.078, de 30.10.1979 e 7.238, de 29.10.1984, limitada aos associados, restringe-se às demandas que visem aos reajustes salariais previstos em lei, ajuizadas até 03.07.1989, data em que entrou em vigor a Lei n. 7.778. III – A Lei n. 7.788/1989, em seu art. 8°, assegurou, durante sua vigência, a legitimidade do sindicato como substituto da categoria. IV – A substituição processual autorizada pela lei n. 8073, de 30.07.1990, ao sindicato alcança todos os integrantes da categoria e é restrita às demandas que visem à satisfação de reajustes salariais específicos resultantes de disposição prevista em lei de política salariaL. V – Em qualquer ação proposta pelo sindicato como substituto processual, todos os substituídos serão individualizados na petição inicial, para o início da execução, devidamente identificados pelo número da Carteira de Trabalho e Previdência Social ou de qualquer outro documento de identidade.[...].

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Ao negar à atuação sindical o caráter de substituição processual, bem como restringi-lo às hipóteses estritamente previstas em lei e exclusivamente aos seus filiados, o entendimento consubstanciado na Súmula 310/TST ensejou, durante vários anos, a extinção sem julgamento de mérito, de inúmeros processos coletivos promovidos pelas entidades sindicais, de modo a ignorar um enorme número de lesões perpetradas em face dos trabalhadores.

Em posição jurisprudencialmente oposta ao TST, no que toca à interpretação do referido dispositivo constitucional, o Supremo Tribunal Federal posicionava-se no sentido de admitir a substituição processual pelo sindicato[37].

Em face do claro conflito com o entendimento firmado pelo STF, bem como das severas críticas ecoadas no âmbito doutrinário, o TST, embora tardiamente, cancelou a retrógrada Súmula 310, de modo a admitir a atuação do sindicato como substituto processual com base no art. 8°, III, CF.

Efetivamente, não pode prosperar o argumento segundo o qual a substituição processual deve estar expressamente prevista em lei, por se tratar de exceção à regra geral do sistema processual.

Com efeito, conforme explica Marcos Fava, “a substituição processual implica regra de exceção apenas no sistema clássico processual, e não no moderno processo coletivo, em que as peculiaridades da defesa dos interesses transindividuais exige legitimação ordinária dos corpos intermediários”[38].

Com efeito, os interesses metaindividuais apresentam características que reclamam a adoção, para sua efetiva defesa, de um sistema processual diverso do sistema tradicional, marcadamente individualista. Em sede de interesses coletivos em sentido amplo, a titularidade excede às pessoas singularmente consideradas, de modo a pertencer ao próprio gênero humano, coletivamente considerado. Tais características conduzem à necessidade de adoção da legitimidade extraordinária, relativizando-se as regras contempladas pelo sistema processual clássico.

Opera-se, assim, na seara do processo coletivo, uma inversão do preceito adotado pelo sistema processual clássico, no que toca à legitimidade extraordinária, que de exceção, passa a ser a regra geral. Nesse sentido, é a lição de Marcos Fava:

Da ótica do processo coletivo, a legitimação ativa para a proteção dos interesses transindividuais mostra-se, ordinariamente, extraordinária. Isto é, a regra geral, ao reverso do que se dá no processo clássico, é a da existência da relação de substituição processual, ordinariamente, o que exige a visitação deste instituto jurídico.[39]

Nesse sentido, ao atribuir ao sindicato, a defesa dos interesses metaindividuais trabalhistas da categoria, o art. 8°, III, CF contempla uma autêntica substituição processual. Com efeito, a entidade sindical atua, nesse caso, em nome próprio, em defesa de direito alheio, de modo a se adequar perfeitamente ao conceito do instituto em comento.

Trata-se de substituição processual anômala, eis que legitima o sindicato a propor a ação coletiva, sem, no entanto, desautorizar o empregado a ingressar individualmente.

Conforme visto, a jurisprudência do STF sempre tendeu a reconhecer a natureza jurídica de substituição processual da atuação do sindicato com base no art. 8°, III, CF. Veja-se, a título de ilustração, trecho do voto proferido pelo Min. Sepúlveda Pertence, no MS n° 20.936-4:

Tenho por iniludível, assim, que, no art.8º, III, efetivamente, não se tem representação, nem substituição processual voluntária, como no âmbito do art. 5º, XXI, mas, sim, autêntica substituição processual ex lege, por força direta e incondicional da própria Constituição

A doutrina, em sua ampla maioria compartilha do entendimento ora exposto[40]. Calha citar, por sua clareza e pertinência, a lição de Ronaldo Leal, abordando a paralisia do interesse de agir no âmbito laboral como justificativa para a substituição processual:

No campo do direito do trabalho, a paralisia do interesse de agir existe e é similar à primordial. Também aqui a realização do crédito traz consigo em débito, representado pela despedida, com o desemprego e a conseqüente cessação dos salários. Daí a necessidade da substituição do empregado isolado pelo seu sindicato classista, ao qual cabe, nos termos da Constituição, a defesa dos direitos e interesses da categoria, inclusive em questões judiciais. Ao sindicato da categoria está entregue o exercício da invocação da tutela jurisdicional ressarcitória como meio dê superação da paralisia do interesse de agir que acomete o empregado, em decorrência de uma situação sóciojurídica. (LEAL, 2002)

Registre-se, por outro lado, posição de parte da doutrina, no sentido de que, a hipótese em discussão não alberga caso de legitimação extraordinária na forma de substituição processual, mas sim de legitimação autônoma. Argumenta tal corrente que quando os entes legitimados atuam em defesa dos interesses difusos e coletivos, o fazem em defesa de seus interesses próprios, eis que relacionados às suas funções institucionais. Nesse sentido, Marcos Fava afirma:

[...] a dictomia tradicional que separa legitimação ordinária de extraordinária, simplesmente pela titularidade do direito material correspondente ao objeto da tutela não se amolda às necessidades do processo coletivo. Neste, diversamente do que ocorre no clássico, a titularidade do direito de ação do ente legitimado em favor da coletividade não decorre de vinculação a interesse próprio, stricto sensu, mas de um largo interesse, ligado umbilicalmente às suas funções institucionais. O sindicato não tem direito material às horas extraordinárias, mas lhe pertence o ônus de ajuizar ação coletiva em busca da regularidade da jornada dos trabalhadores de determinada empresa, renitente em corretamente aplicar o texto legal correspondente.[41]

Ocorre que os entes legitimados, no caso os sindicatos, quando atuam na proteção dos interesses metaindividuais, defendem muito mais que meros interesses próprios, agindo sim na defesa dos direitos individuais de cada um dos integrantes da categoria, em substituição de todo o grupo lesado. Em verdade, a coisa julgada em caso de procedência do pedido, aproveita a todo o grupo. Nessa esteira, Hugo Mazzilli afirma, em brilhante lição:

Alguns autores mencionam a natureza autônoma ou ordinária da legitimação para as ações civis públicas ou coletivas. [...] Que os legitimados ativos à ação civil pública ou coletiva também tenham interesse próprio na solução da lide, isso é perfeitamente possível admitir, Com efeito, uma associação civil que compareça a juízo na defesa de interesses transindividuais, também estará defendendo seu objeto estatutário e, portanto, interesse próprio, os entes públicos, não excluído o Ministério Público, a par de defenderem interesses de grupos, também defendem interesses da coletividade, como um todo, para o que estão votados. Entretanto, os legitimados ativos à ação civil pública ou coletiva fazem mais que defender interesse próprio. Não só quando o objeto da ação coletiva seja a defesa de interesses individuais homogêneos, mas também quando verse interesses difusos e coletivos, está claro eu os legitimados ativos defendem interesses de cada integrante do grupo lesado e, nesse ponto, estamos diante de uma forma de legitimação extraordinária.[42]

Resta, pois, demonstrado que a hipótese do art. 8°, III, CF corresponde a uma autêntica substituição processual, atuando o sindicato na defesa dos interesses metaindividuais da categoria como seu substituto processual.

Como conseqüência lógica do entendimento ora exposto, decorre a constatação no sentido da prescindibilidade de autorização expressa dos filiados por meio de instrumento de mandato ou ata da assembléia geral com poderes específicos, sob pena de restar prejudicada a efetiva tutela dos interesses metaindividuais dos trabalhadores, que assim ficariam sujeitos à retaliação patronal.

2.2 COMPETÊNCIA

A competência para apreciar as ações coletivas trabalhistas é obviamente da Justiça do Trabalho, em face do art. 114, I da Constituição Federal, com redação dada pela Emenda Constitucional n° 45/04, que atribui a esta justiça especializada o julgamento “das ações oriundas da relação de trabalho”.

Nesse sentido, em se tratando de ação civil pública trabalhista, o procedimento a ser adotado é o da reclamação trabalhista[43].

Quanto à competência funcional na ação civil pública e na ação civil coletiva, em matéria trabalhista, calha registrar a existência de corrente na doutrina, embora minoritária, no sentido de atribuir competência originária aos tribunais. Tal entendimento decorre de suposta semelhança de tais ações com os dissídios coletivos, cuja competência, por força do art. 678, I, da CLT, pertence aos órgãos de segundo grau de jurisdição.

As ações coletivas, no entanto, não se confundem com os dissídios coletivos, eis que na verdade, apresentam características que as aproximam mais dos dissídios individuais. Nesse sentido é a jurisprudência dominante do Tribunal Superior do Trabalho, conforme se pode verificar no acórdão de n° ACP-92867/93.1, de relatoria do Min. João Orestes Dalazen:

Impende realçar, por primeiro, que a ação civil pública “trabalhista”, em que pese pressuponha a defesa de interesses coletivos e/ou difusos, não exprime propriamente um dissídio coletivo, na acepção corrente em direito e processo do trabalho. Trata-se a rigor, de uma figura híbrida, com características do dissídios individual e do dissídio coletivo. Identifica-se com este no que supõe uma pluralidade indeterminada de sujeitos em conflito. Todavia, no ordenamento jurídico brasileiro, aparta-se do dissídio coletivo e afina-se com o dissídio individual no que tange ao objeto. (...) Logo, por mais irônico e paradoxal que se mostre, a ação civil pública “trabalhista” assemelha-se mais a um dissídio individual plúrimo que a um dissídio coletivo.

No que toca à competência territorial, esta pertence à vara do trabalho onde ocorreu a lesão, se de âmbito local, ou a vara do trabalho da capital do Estado ou do Distrito Federal, seja a lesão de âmbito regional ou nacional. Trata-se da regra do art. 93, de aplicação às ações coletivas trabalhistas.

O TST acolheu a tese ora exposta, consolidando-a por meio da Orientação Jurisprudencial n° 130, da SBDI-2:

SDI – II – OJ. 130 - Ação civil pública. Competência territorial. Extensão do dano causado ou a ser reparado. Aplicação analógica do art. 93 do código de defesa do consumidor. DJ 04.05.2004 - Parágrafo único do artigo 168 do Regimento Interno do TST. Para a fixação da competência territorial em sede de ação civil pública, cumpre tomar em conta a extensão do dano causado ou a ser reparado, pautando-se pela incidência analógica do art. 93 do Código de Defesa do Consumidor. Assim, se a extensão do dano a ser reparado limitar-se ao âmbito regional, a competência é de uma das Varas do Trabalho da Capital do Estado; se for de âmbito supra-regional ou nacional, o foro é o do Distrito Federal.

Registre-se que mencionado entendimento tem recebido severas críticas de parcela da doutrina. Argumenta-se que a aplicação analógica do art. 93 do CDC, desprezando-se a regra geral do art. 2° da LACP, de modo a fixar foro único para os danos que se estendam por mais de um Estado (DF) ou por mais de uma de uma localidade de um mesmo Estado (Capital do Estado), dificulta a efetivação da tutela coletiva.

Sendo assim, tal corrente defende o cancelamento ou revisão da referida OJ para afastar a incidência analógica do art. 93 do CDC, ou então conceder-lhe interpretação que resguarde a competência concorrente dos foros de qualquer das localidade alcançadas pela extensão do dano causado ou a ser reparado, m atenção à regra geral do art. 2° da LACP. Nessa esteira, veja-se o entendimento de Bezerra Leite sobre o tema:

De nossa parte, não sustentamos o cancelamento da OJ n. 130, e sim a sua adequação ao moderno sistema da LACP/CDC, de modo a permitir a competência concorrente, não apenas para a ação de conhecimento, como também, e principalmente, para a liquidação e a execução do julgado.[44]

Em artigo dedicado ao polêmico assunto, Fábio Leal Cardoso conclui pela:

(...) necessidade de revisão da Orientação Jurisprudencial n. 130, da SBDI-2, do Tribunal Superior do Trabalho, seja para permitir a competência concorrente entre as varas das capitais dos Estados com os órgãos do foro do Distrito Federal nas hipóteses de dano regional ou nacional, seja para resgatar-se a amplitude geográfica dos danos supraindividuais, como prevista no art. 93, da Lei do Consumidor.[45]

Em que pese a razoabilidade deste entendimento, frise-se que a OJ 130 da SBDI-2 do TST, permanece válida, de modo que para o TST, a competência é exclusiva do foro do DF, em se tratando de danos que estendam por mais de um Estado, e da Capital do Estado, quando se estendam por mais de uma localidade do mesmo Estado (aplicação analógica do art. 93 do CDC).

2.3 EFICÁCIA DA DECISÃO

Quanto aos efeitos da decisão proferida em ação coletiva proposta pelo sindicato em defesa de interesses individuais homogêneos ou coletivos da categoria, eventual procedência do pedido a todos aproveitará, enquanto a improcedência somente prejudicará os trabalhadores que tiverem intervindo no feito na qualidade de litisconsortes (Art. 103, III e § 2° do CDC; Art. 21 da LACP)

Quando a defesa referir-se a interesses difusos, outrossim, a improcedência por falta de provas não impede o ajuizamento de outra ação coletiva, desde que esta seja fundada em nova prova. O trânsito em julgado, contudo, em razão de qualquer outro motivo diverso da falta de prova implica na extinção sem julgamento de mérito de outra ação coletiva com o mesmo objeto (Art. 103, I, CDC; Art 16 da LACP).

2.4 AÇÕES INDIVIDUAIS E LITISPENDÊNCIA

Questão polêmica refere-se à possibilidade de existência de litispendência entre ação coletiva ajuizada por sindicato representante de categoria profissional, na condição de substituto processual e reclamação individual trabalhista pelo empregado, quando ambas possuem o mesmo pedido.

Sobre o tema, é possível apontar tendência predominante, nos julgados proferidos pela Justiça Trabalhista, inclusive o TST, no sentido do reconhecimento de litispendência em tais casos, de modo a se extinguir o processo sem julgamento de mérito, com fundamento no art. 267, V, do Código de Processo Civil – CPC. Nesse sentido, são os seguintes arestos: (Apud LEITE, 2010)

Litispendência – Ação anterior proposta pela entidade sindical – Substituição processual – E posterior pelo trabalhador individualmente – Acolhimento. Provada a anterioridade da ação ajuizada e a identidade da matéria, relativamente à ação posterior, impõe-se o acolhimento da preliminar suscitada, inteligência do parágrafo 3º do artigo 267 do CPC, a par do seu relevante interesse, já que se destina a evitar a prolação de decisões conflitantes e contraditórias. Irrelevante a circunstância de se tratar de anterior ação proposta pelo Substituto Processual (não havendo identidade de partes), seja porque o trabalhador possa ter figurado no rol de substituídos e, ainda que assim não fosse, dele seria o direito material em debate. Hipótese em que a extinção do processo é de rigor – art. 267, V, do CPC”. (TRT 15ª R., 5ª T. ac.25259/97, Rel. Luís Carlos Cândido Martins Sotero.

Litispendência Substituição processual Violação legal. Não viola a lei decisão do egr. Regional que reputa configurada a litispendência entre a ação individual do empregado e a ajuizada pelo Sindicato da categoria do Autor, como substituto processual, porquanto presentes a identidade substancial de partes e de pedido. Inteligência do artigo 301, V, § 1º, do CPC. Recurso não conhecido”. (TST, 1ª T., ac. 2372/97, Rel. Min. João Oreste Dalazen)

Ocorre que, data vênia, a corrente jurisprudencial citada olvida o disposto no art. 104 do CDC, segundo o qual:

 As ações coletivas, previstas nos incisos I e II e do parágrafo único do art. 81, não induzem litispendência para as ações individuais, mas os efeitos da coisa julgada erga omnes ou ultra partes a que aludem os incisos II e III do artigo anterior não beneficiarão os autores das ações individuais, se não for requerida sua suspensão no prazo de trinta dias, a contar da ciência nos autos do ajuizamento da ação coletiva. (grifou-se)

Na mesma toada, asseveram Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart, ao analisarem o mencionado dispositivo:

Sabe-se, por outro lado, que a litispendência é instituto concebido (e, conseqüentemente, regido arbitrariamente) pelo legislador, que pode dar-lhe a disciplina que bem lhe aprouver. Em relação à litispendência considerada em face das ações individuais, a solução alvitrada pelo legislador é simples: a segunda ação deve ser extinta sem resolução do mérito (art. 267, V, c/c o art. 301, § 3º, do CPC). Mas no referente às ações coletivas a disciplina é outra: a litispendência não se opera como regra, sendo livre a propositura, na pendência de ação coletiva, de ação individual (ou vice-versa), sem que uma venha a influenciar a outra. De fato, como se prevê no dispositivo examinado, a sorte da ação coletiva não influencia o resultado da ação individual – ainda que ambas versem sobre o mesmo tema, fundados na mesma causa de pedir e contendo o mesmo pedido – a não ser quando, ciente da propositura da ação coletiva, o autor da ação individual expressamente requeira a suspensão de seu pleito nuclear para aguardar o resultado daquela. (grifou-se).[46]

Se não bastasse a clareza do citado art. 104 do CDC, é possível concluir que não há identidade de partes na hipótese em discussão. Isso porque, na ação coletiva, muito embora defenda interesses dos substituídos, o sindicato atua em nome próprio.

A tese que ora se defende, no sentido da inexistência de litispendência, é endossada por grande parte da doutrina, como, a título de exemplo, Ada Pellegrine Grinover[47], Carlos Henrique Bezerra Leite[48] e o Ministro do TST, Luiz Philippe Vieira de Mello Filho[49], em artigo publicado sobre o tema.

Ademais, a jurisprudência predominante do STJ perfilha tal entendimento[50]:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. REAJUSTE. PLANO COLLOR. AÇÃO AJUIZADA POR SINDICATO E AÇÃO INDIVIDUAL. LITISPENDÊNCIA. INOCORRÊNCIA. DISSÍDIO PRETORIANO COMPROVADO. 1. Esta turma,reiteradamente, tem decidido que, a teor do art. 255, e parágrafos, do RISTJ, para comprovação e apreciação do dissídio jurisprudencial, devem ser mencionadas e expostas as circunstâncias que identificam ou assemelham os casos confrontados, bem como juntadas cópias integrais de tais julgados ou, ainda, citado repositório oficial. Dissídio comprovado. 2. Pacificou-se a jurisprudência da Corte no sentido de que não ocorre litispendência da ação individual em face de ação coletiva ajuizada por entidade de classe ou sindicato. 3. Recurso conhecido e provido para afastar o óbice processual, determinando o retorno dos autos ao Tribunal de origem para exame das demais questões postas.” (REsp 327184/DF, 5ª T., Rel. Min. Jorge Scartezzini, DJ 02.08.2004)

AÇÃO COLETIVA. DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. AÇÃO INDIVIDUAL. LITISPENDÊNCIA. A circunstância de existir, em curso, ação coletiva, em que se objetiva a tutela de direitos individuais homogêneos, não obsta o ajuizamento da ação individual. CADERNETA DE POUPANÇA. A responsabilidade pelo pagamento a menor do devido aos poupadores é do depositário, com quem contratou, e que terá sido o beneficiário da diferença, salvo no caso em que houve o bloqueio do numerário, perdendo ele a respectiva disponibilidade. O art. 17 da Lei nº 7.730/89 não se aplica às cadernetas de poupança cujo período aquisitivo se tenha iniciado até 15 de janeiro do ano em que editada. Interpretação conforme a Constituição. (REsp 147473/SC, 3ª T., Rel. Min. Eduardo Ribeiro, DJ 6.03.1998)

Sobre o autor
Gustavo Nabuco Machado

Advogado da União; Bacharel em Direito pelo Centro Universitário UniCEUB; Especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Universidade Candido Mendes; Especialista em Direito Público pela Universidade Candido Mendes.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MACHADO, Gustavo Nabuco. Os interesses metaindividuais trabalhistas e a sua defesa em juízo pelo sindicato. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3710, 28 ago. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/25151. Acesso em: 24 nov. 2024.

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