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Do direito a continuidade de pagamento em casos de pedido de prorrogação do benefício de auxílio doença

Agenda 26/10/2013 às 13:14

Apresentam-se detalhes sobre o sistema “data certa”, o pedido de prorrogação e o direito da continuidade de benefício no caso proposto.

INTRODUÇÃO

Sabe-se que o auxílio doença é um benefício do Regime Geral de Previdência Social que visa garantir uma renda para o segurado que necessitar se afastar do trabalho para tratamento de doença com duração temporária de mais de 15 dias.

É também, atualmente, um dos benefícios mais controvertidos administrados pelo INSS. Diversos são os motivos para as discussões a respeito dos auxílios doenças. Em especial ressaltamos o longo tempo entre os pedidos do benefício e a realizações das perícias médicas no INSS e a durabilidade prolongada dos benefícios tendo em vista a inexistência de prazo máximo para sua transformação em aposentadoria por invalidez.

Outro problema que se observa com frequência é a necessidade de realização periódica de perícias médicas nos casos de auxílios doenças que precisam ser renovados além do prazo de cessação previsto na alta programada.

Nesses casos, uma realidade estrutural acabava por causar grave prejuízo aos segurados, posto que a data da nova perícia em caso de pedido de prorrogação do benefício normalmente ultrapassa o prazo previsto para o fim do benefício.

Nesses casos o INSS entendia que o segurado deveria ficar sem receber o benefício até que tal perícia pudesse ser realizada, independente do tempo de espera.

Entretanto, decisões judiciais e resoluções administrativas criaram nova sistemática que garante a possibilidade de pagamento durante o tempo em que se aguarda a nova análise do estado clínico pelo perito do INSS.

Sem dúvida o segurado tem o direito à extensão do benefício nesse caso, posto que a demora para a realização da nova perícia se dá por impossibilidade administrativa do INSS e portanto não há que se admitir prejuízo do beneficiário. E não poderia ser outra a interpretação, até pelo caráter alimentar do benefício. Para entender melhor o direito, vejamos com mais detalhes os procedimentos administrativos adotados para a concessão do auxílio doença e suas formas de prorrogação.


1.    RÁPIDAS DEFINIÇÕES SOBRE O AUXÍLIO DOENÇA

O auxílio doença previdenciário é um benefício concedido ao segurado impedido de trabalhar por problemas de saúde (doença ou acidente) por mais de 15 dias consecutivos.

Para a concessão do benefício o segurado “está sujeito à comprovação da incapacidade laborativa em exame realizado pela perícia médica da Previdência Social” (KRAVCHYCHYN at al, 2013, p. 304).

No caso dos empregados urbanos e rurais, os primeiros 15 dias são pagos pelo empregador com base no salário contratado, e a Previdência Social paga o benefício a partir do 16.º dia de afastamento do trabalho. Para os demais segurados, inclusive o empregado doméstico, a Previdência paga o auxílio doença desde o início da incapacidade e enquanto a mesma perdurar. MARTINEZ (2011, p.844) bem lembra:

Durante sua fruição, o empregado é considerado licenciado pela empresa. Se esta lhe garante licença remunerada deverá pagar-lhe a eventual diferença entre o salário contratual e os 91% devidos pelo INSS.

Além disso, não será devido auxílio doença ao segurado que se filiar ao RGPS já porta­dor da doença ou da lesão invocada como causa para o benefício, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão.

Entretanto, a doença do segurado cujo agravamento é progressivo, mas que não impede o exercício de atividades laborativas, não pode ser obstáculo à filiação ao RGPS e, portanto, à concessão dos benefícios por incapacidade (art. 42, § 2.º, e art. 59, parágrafo único, da Lei n.º 8.213/1991).

Cabe indicar que “não impede a concessão de benefício por incapacidade o fato do segurado, embora incapaz, exercer atividade remunerada como empregado ou contribuinte individual no período correspondente” (TNU, PU 2008.72.52.004136-1, julgamento em 18.3.2011).

As regras gerais sobre o auxílio doença estão disciplinadas nos arts. 59 a 63 da Lei n.º 8.213/1991 e arts. 71 a 80 do Decreto n.º 3.048/1999.

 


 

2.    SISTEMA “DATA CERTA” OU ALTA PROGRAMADA

Desde 9.8.2005 o INSS iniciou o programa Cobertura Previdenciária Estimada (Copes) para a concessão dos auxílios doença, que permite que o benefício seja concedido com prazo determinado por evidências médicas. Esse sistema objetiva, teoricamente, uma avaliação médica que permita prazos diferenciados de duração para cada benefício, podendo em alguns casos evitar que o segurado se submeta a sucessivos exames periciais e principalmente eliminando gastos com perícias desnecessárias.

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Pelo sistema de concessão do auxílio doença até então em funcionamento, depois que o benefício era concedido, o beneficiário precisava fazer revisões na perícia médica do INSS em média a cada 60 dias. A regra era utilizada para qualquer tipo de doença, das mais simples às mais complexas.

Com o modelo criado em 2005, que instituiu a alta programada, o perito médico estabelece o período de cada benefício de forma individualizada, com base na história natural da doença, considerando o tempo necessário na reaquisição da capacidade para o trabalho.

Vale lembrar os ensinamentos de KERTZMAN (2011, p.412):

O INSS poderá estabelecer, mediante avaliação médico-pericial, o prazo que entender suficiente para a recuperação da capacidade para o trabalho do segurado, dispensada, nessa hipótese, a realização de nova perícia. Caso o prazo concedido para a recuperação se revele insuficiente, o segurado poderá solicitar a realização de nova perícia médica (art. 78, §§ 1º. E 2º. , do Dec. 3.048/99, acrescido pelo Dec. 5.844, de 13/07/06).

No que tange à validade da adoção da alta programa pelo INSS destacamos precedente da TRU da 4ª Região:

PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO DOENÇA. “ALTA PROGRAMADA”. BENEFÍCIO COM PRAZO FIXADO PELO INSS PARA FINDAR. LEGALIDADE DA CONDUTA ADMINISTRATIVA.

1. O instituto da “alta programada”, instituído pelo Decreto nº 5.844/06, não padece de ilegalidade. O segurado, caso entenda que sua incapacidade laboral persiste, pode formular na esfera administrativa, previamente à cessação de seu benefício, em prazo que lhe é disponibilizado para tanto, pedido de prorrogação ou de reconsideração.

2. Trata-se de proceder administrativo que visa à racionalização do trabalho do INSS, uma vez que somente aqueles segurados que acreditam necessitar da prorrogação do benefício terão de se submeter à nova avaliação médica.

3. Pedido de uniformização conhecido e provido.

 (TRU da 4ª Região. IUJEF 0004227-44.2009.404.7154. Relator p/Acórdão Juiz Federal André Luís Medeiros Jung. D.E. 13.10.2011).

Assim, a alta programada pode ser entendida como legal posto que permite a extensão do benefício caso o segurado requeira a continuidade do mesmo antes do seu fim, através do pedido de prorrogação. Vejamos então como funciona tal procedimento administrativo.


3.    PEDIDO DE PRORROGAÇÃO E PEDIDO DE RECONSIDERAÇÃO

Nos casos em que o prazo fixado para a data de cessação do benefício (DCB) de auxílio doença não for suficiente para a recuperação da capacidade de trabalho, o segurado pode efetuar o Pedido de Prorrogação até 15 dias antes do fim do benefício.

O objetivo desse pedido é evitar o término do auxílio doença antes da melhora do estado clínico do segurado, submetendo-o a nova avaliação para que o perito médico do INSS possa considerar a necessidade da continuidade do afastamento do trabalho.

O pedido de prorrogação significará, portanto, o agendamento de novo exame médico-pericial. O procedimento para o pedido pode ser feito pela Internet, através do site do INSS, ou por meio de ligação telefônica ao 135. Não existe limite para o ingresso de Pedido de Prorrogação, desde que os anteriores tenham sido deferidos. Assim, sempre que o benefício for prolongado, antes de 15 dias do novo término, o segurado terá direito a requerer novamente a prorrogação. Entretanto, se o médico mantiver a decisão de cancelamento do benefício o segurado poderá ingressar com o Pedido de Reconsideração.

O Pedido de Reconsideração é um direito do beneficiário quando:

– o resultado da avaliação médica realizada pelo INSS tiver sido contrária à concessão do benefício e o segurado não concordar com o indeferimento;

– o segurado tiver o benefício concedido, entretanto tiver perdido o prazo do Pedido de Prorrogação e não concordar com o cancelamento do benefício;

– o segurado tiver negado seu Pedido de Prorrogação do benefício.

Cabe-nos destacar que o INSS não tem aceito pedido de reconsideração para os casos de indeferimento por falta de carência ou perda da qualidade de segurado.

Segundo a Autarquia, o pedido de reconsideração somente poderia ser requerido quando relacionado diretamente com a análise médica do pedido, ou seja, com relação à doença.

O prazo para interposição é de 30 dias após a data da cessação do benefício anteriormente concedido, ou de 30 dias contados da data da decisão negatória do benefício. Alguns postos do INSS têm adotado entendimento de que, nos casos de negatória do benefício, o início do prazo seria da data da negativa, ou seja, normalmente da data da perícia. Assim, é importante ficar atento a fim de não perder o prazo de interposição do pedido de reconsideração.

O pedido de reconsideração poderá ser feito pelo site do INSS ou pelo telefone 135. Para tal pedido não é necessário que se elabore arrazoado, sendo apenas registrado o requerimento para que se marque novo exame médico-pericial.

Salientamos, entretanto, que o pedido de reconsideração só pode ser requerido uma vez pelo segurado. Se negado o pedido de reconsideração, o segurado que discordar terá que interpor recurso para Junta de Recursos visando a revisão da decisão. Se concedido, ao final do novo prazo o segurado poderá interpor o pedido de prorrogação.

Registre-se ainda que o Pedido de Reconsideração (PR), foi instituído pela Resolução INSS/DC nº 161, de 22 de junho de 2004, garantindo ao segurado, em caso de inconformismo, o direito à realização de novo exame médico pericial a ser efetuado por profissional médico da Perícia Médica do INSS que não tenha participado do exame inicial.

Como já dissemos, se a nova perícia confirmar a capacidade para voltar ao trabalho, o beneficiário pode ainda dar entrada em recurso na própria agência que concedeu o benefício, num prazo de 30 dias, a contar da data da ciência.

Nesses casos não são aceitos recursos pela Internet ou por chamadas ao telefone 135. Esse recurso à JR é avaliado pelo setor de perícia médica e será encaminhado à Junta de Recursos do Conselho de Recursos da Previdência Social, que emitirá decisão sobre o assunto.

Podemos ponderar que a eficácia dessa nova sistemática é duvidosa, pois, em muitos casos, tem gerado o cancelamento de benefícios quando o segurado se encontra incapacitado, provocando um aumento considerável no número de demandas judiciais. Além disso, muitos segurados reclamam de não receber a orientação adequada na agência quanto aos prazos e procedimentos a serem adotados, perdendo, muitas vezes, o prazo para interposição do pedido de prorrogação ou reconsideração.

Grande problema também era a interrupção do pagamento dos benefícios nos casos de pedido de prorrogação, tendo em vista o curto prazo para sua interposição (15 dias antes do término do benefício) e a impossibilidade do INSS de realizar a nova perícia dentro desse prazo.

Nesses casos o segurado ficava prejudicado e tinha que aguardar a realização da nova perícia para o restabelecimento do benefício. Tal prejuízo foi discutido judicialmente e a discussão resultou em decisão favorável aos segurados, senão vejamos:


4.    DO DIREITO A CONTINUIDADE DO AUXÍLIO DOENÇA ATÉ A REALIZAÇÃO DA NOVA PERÍCIA EM CASO DE PEDIDO DE PRORROGAÇÃO

Como dito, o pedido de prorrogação não resultava, inicialmente, na continuidade automática do benefício até a nova perícia.

O INSS adotou administrativamente o entendimento de que o benefício cessaria e somente haveria o pagamento dos valores caso o médico concordasse com a continuidade da necessidade de afastamento do trabalho.

Mas tal procedimento poderia causar grave dano ao segurados até porque, em alguns casos, a demora para a realização da nova perícia ultrapassava 6 meses. Assim, não poderia o segurado aguardar todo esse tempo sem o recebimento da verba, que tem caráter substitutivo do salário do trabalhador.

A pacificação do problema se deu com a decisão proferida na Ação Civil Pública – ACP nº. 2005.33.00.020219-8 (14ª. Vara da Justiça Federal de Salvador/BA), determinou ao INSS que, no procedimento de concessão do benefício de auxílio doença, inclusive naqueles decorrentes de acidente do trabalho, uma vez apresentado pelo segurado pedido de prorrogação, mantivesse o pagamento do benefício até o julgamento do pedido após a realização de novo exame pericial.

Inicialmente a ação alcançava apenas o Sindicato dos Bancários da Bahia, mas em razão de outras seis ações coletivas semelhantes ajuizadas em diferentes lugares do Brasil, o STJ decidiu o conflito de competência determinando a competência por prevenção da 14a. Vara Federal de Salvador. Assim, a decisão emitida ação civil pública passou a ter eficácia sobre todo o território nacional.

Com base nisso o INSS editou a Resolução INSS/PRES nº. 97, de 19.7.2010 - DOU de 20.7.2010, no seguinte teor: “Art. 1º Estabelecer que no procedimento de concessão do benefício de auxílio doença, inclusive aqueles decorrentes de acidente do trabalho, uma vez apresentado pelo segurado pedido de prorrogação, mantenha o pagamento do benefício até o julgamento do pedido após a realização de novo exame médico pericial.”

Ficou determinado ainda pelo art. 2° da mesma resolução que tanto o  INSS como a DATAPREV adotariam medidas necessárias para o cumprimento desta resolução.


CONCLUSÃO

O benefício de auxílio doença é, em resumo, um benefício que garante a dignidade e a subsistência do segurado quando este necessita se afastar temporariamente de sua atividade por motivo de doença.

É, portanto, benefício de caráter alimentar e essencial à manutenção da vida.

Assim, não se admite que, apenas por má organização ou visando uma facilidade do sistema, o segurado sofra o interrompimento dos pagamentos do benefício enquanto a doença perdurar.

O sistema data certa, duramente criticado pela maioria da doutrina, foi entendido como legal pela jurisprudência. Entretanto, a determinação de uma data de cessaçãp do benefício futura e presumida não deve significar qualquer limitação no direito de manutenção do benefício de auxílio doença do segurado caso a melhora não ocorra na suposição prevista pelo perito do INSS.

Assim, a jurisprudência adequou o procedimento para que, nos casos de pedido de prorrogação e se o INSS não conseguir marcar a perícia antes da data de cessação prevista inicialmente, o segurado deve manter o benefício até que nova perícia possa ocorrer.

Infelizmente, em algumas agências do INSS está se observando o descumprimento de tal determinação, com a interrupção indevida dos pagamentos nos casos de pedido de prorrogação por parte do segurado.

Tal proceder é descumprimento direto de ordem judicial e inclusive, descumprimento de resolução interna, impondo ao servidor responsável penalização legal e administrativa.

Deve o segurado, ou qualquer pessoa que do ato tomar ciência, requerer a abertura de processo disciplinar contra o servidor diretamente responsável pela interrupção do benefício que pode inclusive ser o chefe da agência em que o descumprimento se der de forma reiterada, sem o prejuízo de qualquer medida judicial a ser tomada no caso concreto.

Vale lembrar por fim que a decisão judicial emitida pela 14a. Vara Federal de Salvador está em vigor e deve ser cumprida pela autarquia previdenciária em todo o Brasil.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

KRAVCHYCHYN, Jefferson Luis; KRAVCHYCHYN, Gisele Lemos; CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Prática Processual Previdenciária. 3ª. Edição. São Paulo: Conceito, 2012.

KRETZMAN, Ivan. Curso prático de direito previdenciário. 8ª. Edição. Salvador: Editora Jus Podivm, 2011.

MARTINEZ, Wladimir Novaes. Curso de direito previdenciário. 4ª. Edição. São Paulo: LTr, 2011.

Sobre a autora
Gisele Kravchychyn

Advogada em Santa Catarina, Paraná e Sergipe. <br>Presidente da Comissão de Seguridade Social da OAB/SC<br>Diretora de Atuação Judicial do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário - IBDP<br>Pós Graduada em Direito Previdenciário. <br>Pós Graduada em Gestão de Previdência Privada. <br>Autora de “Prescrição e Decadência no Direito Previdenciário” <br>E de “Prática Processual Previdenciária”.<br>Sócia da Kravchychyn Advocacia e Consultoria.<br>

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

KRAVCHYCHYN, Gisele. Do direito a continuidade de pagamento em casos de pedido de prorrogação do benefício de auxílio doença. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3769, 26 out. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/25571. Acesso em: 5 nov. 2024.

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