RESUMO: O presente artigo visa o estudo dos Embargos Infringentes na vigência da Lei nº 10.352/2001, bem como o que preceitua a atual redação do artigo 530 do Código de Processo Civil, relativo ao cabimento de “embargos infringentes quando o acórdão não unânime houver reformado, em grau de apelação, a sentença de mérito ou houver julgado procedente ação rescisória”. O tema é tratado primeiramente pela conceituação dos Embargos Infringentes, em seguida discutem-se quais são os seus elementos estruturantes e o que nos é apresentado pela Doutrina e pela Jurisprudência. O tema possui relevância quando se entende que os Embargos Infringentes são, de modo geral, uma extensão do direito de ação.
PALAVRAS-CHAVE: Embargos Infringentes; Cabimento dos Embargos Infringentes.
O presente artigo trata das situações de cabimento dos Embargos Infringentes no âmbito do Código de Processo Civil e suas principais características, bem como objetiva analisar os pressupostos para sua admissibilidade, as hipóteses em que é cabível e como abordar os casos em que há divergência quanto a sua aplicabilidade. O tema é tratado por tópicos com a apresentação de considerações feitas pela Doutrina e pela Jurisprudência. É abordada a limitação sofrida pelo recurso, a qual adveio com a reforma editada pela Lei 10.352 de dezembro de 2001.
Estas situações travadas pela doutrina e jurisprudência pátria sobre o cabimento dos embargos infringentes que despertaram o interesse no tema e são mostradas pelo presente estudo. Neste sentido, não se tem a pretensão de propor soluções peremptórias a tais questões, mas sim oferecer uma visão quanto ao cabimento dos embargos infringentes que se coadune com o espírito da reforma processual que alterou, sobremaneira, a redação do artigo 530 do Código de Processo Civil.
1 Embargos Infringentes
1.1Conceito
Ressaltamos a nova ótica do conceito dos Embargos Infringentes na vigência da Lei nº 10.352/2001, que de redação simples e objetiva traz-nos o artigo 530 do Código de Processo Civil com o seguinte dizer: “Cabem embargos infringentes quando o acórdão não unânime houver reformado, em grau de apelação, a sentença de mérito, ou houver julgado procedente ação rescisória. Se o desacordo for parcial, os embargos serão restritos à matéria objeto da divergência”.
Portanto, constitui um recurso próprio contra acórdão não unânime que houver reformado, em grau de apelação, a sentença de mérito, ou houver julgado procedente a ação rescisória.
De outra forma dizer-se ia que Embargos Infringentes são utilizados para atacar acórdão não unânime do tribunal que reformou a decisão de primeiro grau, em grau de apelação ou que julgou procedente a ação rescisória, nos termos do art. 530 do CPC.
Além dos pressupostos gerais que são inerentes à propositura de todo e qualquer recurso, os Embargos Infringentes submetem-se a pressupostos específicos que lhe são próprios e, sem os quais não pode ser admitido, conforme se apreende do artigo 530 do Código de Processo Civil: o acórdão proferido em apelação ou em ação rescisória; a falta de unanimidade desse acórdão; e que, em caso de apelação, essa tenha reformado a sentença de mérito ou a ação rescisória tenha sido julgada procedente.
2 Elementos estruturantes dos Embargos Infringentes
O interesse em recorrer, ou interesse recursal, surge da necessidade de reapreciação do acórdão visando situação mais favorável para o recorrente.
Portanto , segundo Carlos Eduardo Ferraz de Mattos Barroso, “o interesse de recorrer está ligado ao conceito de sucumbência”. E, sucumbir, consiste em não receber da decisão tudo o que dela se esperava.
Jair José Perin cita o ensinamento do doutrinador Nelson Nery Júnior que dispõe:
[...] para o interesse recursal estar configurado, é imprescindível a presença do binômio necessidade + utilidade. A necessidade de interpor o recurso surge quando for o único meio para obter, naquele processo, o que pretende contra a decisão impugnada. Se ele puder obter a vantagem sem a interposição do recurso, não estará presente o requisito do interesse recursal.
O conceito de utilidade está intimamente ligado à ideia de sucumbência, gravame. A sucumbência é constatada de forma objetiva, sendo necessário apenas, examinar-se a decisão impugnada, e ver se o recorrente teve sua esfera jurídica atingida, piorada, ou não recomposta (Nery Júnior, 2004, apud, Perin p. 113).
Para um melhor esclarecimento no que tange à legitimidade, quem a tem para recorrer são as partes, o Ministério Público e o terceiro prejudicado, conforme dispõe letra do art. 499 CPC.
Ainda conforme explica Jair José Perin, possui legitimidade:
Somente a parte que for sucumbente em toda ou em alguma parte na decisão, os terceiros prejudicados e o Ministério Público, este quando não for sucumbente, como fiscal da lei, desde que estejam presentes os requisitos exigidos pela lei para atuar nesse sentido. (Perin, 2004, p. 113).
No que diz respeito ao terceiro prejudicado, ainda segundo o autor, este deve “demonstrar o nexo de interdependência entre o seu interesse de intervir e a relação jurídica submetida à apreciação judicial”. Faz-se necessário ainda que o terceiro seja prejudicado em algum interesse que esteja intimamente ligado à relação jurídica decidida.
A sucumbência é o pressuposto fundamental de admissibilidade de qualquer recurso. Deve haver o prejuízo, ou gravame, que a parte sofreu com a sentença. Os doutrinadores são unânimes em apontar a sucumbência como um dos pressupostos mais importantes. Nas exatas palavras de José Frederico Marques, dois são os pressupostos básicos dos embargos os quais seriam a sucumbência e o julgamento não unânime em ação rescisória ou em apelação.
Segundo exposição de Maximilianus Cláudio Américo Führer “a sucumbência é requisito essencial dos recursos, pois só o vencido de modo total ou parcial, tem legitimidade para recorrer. Quem não foi vencido, pelo menos parcialmente, não tem do que recorrer”.
No que tange à recorribilidade, têm-se que nem todas as decisões são passíveis de impugnação. A legislação determina que apenas os atos decisórios podem ser matéria de interposição de recurso. É cabível recurso de sentenças, sejam elas definitivas ou terminativas, das decisões dos juízes de primeiro grau, dos acórdãos proferidos em apelação ou em ação rescisória e da decisão do relator que indefere Embargos Infringentes.
Relevante salientar que, de acordo com o art. 504 do Código Processual Civil, não cabe recurso dos despachos de mero expediente, tendo em vista estes serem meros atos do juiz, tendo por objetivo o impulsionamento do processo, ou seja, não possuindo carga decisória que possa gerar gravame para qualquer das partes.
Conforme Jair José Perin, para que se interponha o recurso, é necessária a observação dos prazos legais fixados. Caso contrário, poderá incorrer em pena de preclusão ou trânsito em julgado da decisão. Nesse aspecto, leciona Aderbal Torres de Amorim:
Há um tempo para a propositura de algumas ações e há um tempo para a interposição de todos os recursos. O prazo é o lapso temporal dentro do qual algum ato há de ser praticado, sob pena de perecimento do direito (art. 183 do CPC.), ou não pode ser praticado, por não existir ainda o direito (art. 196). Há prazos absolutos, peremptórios (art. 182), e prazos dilatórios. Estes são prorrogáveis por convenção das partes, devidamente homologada (art. 181). Os recursos, todos eles, atendem aos primeiros. Mas há ações eternamente proponíveis – as declaratórias (Amorim, 2005).
O prazo para a interposição do referido recurso é de 15 dias, conforme dispõe o art. 508 d0 nosso Código Processual Civil.
Somente a lei pode instituir o pagamento de custas para determinado recurso, não sendo este o caso dos Embargos Infringentes, tendo em vista que o Código Processual Civil Brasileiro não se refere ao preparo, diferentemente do que ocorre nos casos de agravo e apelação. Também não excepciona a dispensa, como ocorre com o agravo retido e com os embargos de declaração.
3 Quando é cabível
Sabendo-se que há incongruência entre o espírito da reforma processual e o texto da lei, passa-se a enfrentar outros problemas práticos atinentes ao cabimento dos Embargos Infringentes de acordo com a primeira hipótese do artigo 530 do CPC. Considerando-se que para o cabimento dos infringentes é indispensável a presença da “ decisão de mérito ”, seja ela na sentença ou no acórdão, torna-se importante observar quais as decisões que se encaixam dentro deste conceito.
A decisão de mérito, por excelência, será aquela que enfrente a pretensão, nos termos do artigo 269, I, do CPC, o qual estabelece que “Haverá resolução de mérito: I – quando o juiz acolher ou rejeitar o pedido do autor”. Por sua vez, a pronúncia da decadência ou da prescrição, conforme segue o art. 269, IV, a rigor, também traduz rejeição do pedido, subsumindo-se à primeira hipótese. Por expressa disposição legal, haverá, ainda, decisão de mérito nas hipóteses de reconhecimento do pedido (art. 269, II), de homologação do trânsito (art. 269, III) e de renúncia do autor ao direito sobre que se funda a ação (art. 269,V). Aliás, tendo em vista que o trânsito em julgado de quaisquer umas destas decisões implica na formação de coisa julgada material, e que os Embargos Infringentes, de acordo com o espírito da reforma, visam justamente restringir o cabimento do recurso a este tipo de situação, impõe-se concluir que estas são as decisões que, se satisfeitos os demais requisitos, propiciam à parte vencida o manejo dos infringentes.
Considerando-se que, como já dito, o espírito da reforma é restringir o cabimento dos embargos infringentes aos acórdãos (e não as sentenças) que apreciem o mérito da causa, o fundamental para aferição do cabimento do recurso é verificar se o acórdão enfrentou o mérito da causa, ou se simplesmente se restringiu à enfrentar o mérito recursal. Isto porque a pretensão trazida ao tribunal nas razões de recurso pode ser semelhante à deduzida na demanda inicial (situação em que o mérito recursal coincidirá com o mérito da causa) ou alguma outra referente à vida do processo (situação em que o mérito recursal será diverso do mérito da causa). Fato é que a simples análise do mérito recursal pelo acórdão não satisfaz o requisito legal, visto que por si só não implica no julgamento do mérito da causa. Portanto, para o cabimento dos Embargos Infringentes impõe-se que o mérito recursal não esteja dissociado do mérito da causa.
Discute-se também na doutrina e jurisprudência sobre o cabimento dos infringentes contra os acórdãos que enfrentem o julgamento de agravos, neles inclusos, o de instrumento (art. 523, do CPC), o retido (art. 524, do CPC), e o interno (art. 557, §1º, do CPC). A questão objeto de debate é se a menção do artigo 530 do CPC ao cabimento do recurso “em sede de apelação” impediria a interposição dos Embargos Infringentes contra acórdãos que não apreciem recursos de apelação. O autor Marcelo Negry entende que a lei não restringe o cabimento dos Embargos Infringentes à matéria de direito. Tal formulação deve ser deduzida em relação necessária com as questões de direito e de fato decididas no acórdão embargado.
Considerando-se que de acordo com a legislação vigente nada impede que as matérias veiculadas e julgadas através de agravo retido, agravo interno e agravo de instrumento sejam efetivamente de mérito, os julgamentos de tais recursos implicarão em decisões de mérito. Por isso, o que interessa para o cabimento dos infringentes em tais casos é verificar se a decisão proferida pelo tribunal “ad quem” enfrentou ou não o mérito da causa, ou, se a decisão tem, ou não, o condão de formar coisa julgada material. Caso a resposta seja positiva e o acórdão substitua por maioria de votos a decisão de primeira instância, cabíveis serão os Embargos Infringentes, seja contra o recurso de apelação, seja contra os agravos suscitados.
4 Considerações
Foi possível perceber ainda, ao fim dos estudos, que “cabem embargos infringentes contra acórdão, proferido por maioria, em agravo retido, quando se tratar de matéria de mérito”, conforme Súmula 255 do STJ, que pacificou as decisões dos tribunais, admitindo o cabimento de Embargos Infringentes contra acórdão, não unânime, de agravo retido em recurso de apelação, quando envolver questão de mérito.
Percebeu-se ainda que os Embargos Infringentes são recursos cabível quando relativo ao mérito da questão, após decisão ímpar que aponta a possibilidade de sua admissão, admissão dos Embargos Infringentes, atendida certas circunstâncias, e a partir de acórdão não unânime.
Importante frisar ainda que os Embargos Infringentes, na seara penal, foram objeto recente de intenso debate e grande repercussão na mais alta corte do País, o que causou ferrenha discursão sobre seu cabimento no famoso caso denominado “Mensalão”, o que fez com que tal recurso voltasse a ser objeto de apreciação no âmbito jurídico.
5 Referências
AMORIM, Aderbal Torres de. Recursos cíveis ordinários. Porto Alegre: Livraria do advogado, 2005.
BRASIL. Código de Processo Civil. Lei 5.869 de 11 de janeiro de 1973. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5869.htm. Acesso em 07 outubro de 2013.
BRASIL. Lei 10.352 de 26 de dezembro de 2001. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LEIS_2001/L10352.htm. Acesso em 07 outubro de 2013.
FÜHRER, Maximilianus Cláudio Américo. Resumo de processo civil. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 1996. v. 4.
MARQUES, José Frederico. Manual de direito processual civil. São Paulo: Saraiva, v. 3, 1975.
NEGRY, Marcelo. Embargos Infringentes: apelação, ação rescisória e outras polêmicas. Belo Horizonte: Del Rey, 2007.
NERY JÚNIOR, Nelson. NERY, Rosa Maria Andrade. Código de processo civil comentado. 4. ed. São Paulo. In Revista dos Tribunais, 1999.
PERIN, Jair José. O sistema recursal previsto no código de processo civil brasileiro e particularidades dos embargos infringentes para a interposição de recurso especial e extraordinário. Debates em direito público: In Revista de direito dos advogados da união. Campinas, Millennium, ano III, n. 3, p. 113, 2004.
THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento, vol 1. Rio de Janeiro: Forense, 2012.