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Coragem e indolência:

prática jurídica e as garantias processuais penais.

Agenda 08/04/2014 às 10:06

Coragem, indolência, prática jurídica e as garantias processuais penais.

Nestas poucas linhas que se seguem, escrevi, inicialmente, o que se pode compreender por coragem. Em seguida, narro uma situação de prática jurídica. E, ao final, censuro a indolência. A coragem, entre outras conotações, pode ser compreendida como a ousadia. Ousadia para enfrentar, entre outras situações, aquilo que se mostra incoerente e ilógico. A noção de coragem também se acomoda bem na ideia de uma força espiritual materializada na habilidade de confrontar o temível som de discórdia. Ela é o ânimo que nos motiva ir além do convencional e enfrentar os desafios com confiança. A coragem impulsiona a marcha da vida para situações novas. Com poucas palavras: a coragem nos parece ser incompatível com o comodismo e com a inércia, quando o contexto em que se está reclama atitudes orientadas para a transformação da realidade que a nós se apresenta como inaceitável.Feita essa breve consideração sobre a noção de coragem, em seguida, importa-nos correlacioná-la a uma situação de prática jurídica, que, aliás, não é nova. É necessário coragem para enfrentar o inaceitável congelamento/petrificação das situações jurídicas postas em um enunciado de súmulas construídas pelas Cortes Superiores. Refiro-me ao enunciado contido na súmula número 273 do Superior Tribunal de Justiça, cujo teor reproduzo nas linhas abaixo:

“Intimada a defesa da expedição de carta precatória, torna-se desnecessária a intimação da data da audiência no juízo deprecado.”

Sob o ponto de vista prático, é algo próximo do seguinte: defesa! Foi expedida carta precatória para a comarca de [...] e ponto final. Diz a súmula textualmente, que não há a necessidade de comunicar por meio de intimação qual será a data e horário do ato processual a ser praticado no juízo deprecado.Esse entendimento, a meu ver, apesar de vir estampado em enunciado construído por Tribunal Superior, na prática, significa grave violação às garantias processuais com matriz constitucional. Refiro-me, em especial, ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa. 
Em data recente tivemos a oportunidade de dizer que o instrumento que viabiliza e concretiza as garantias processuais constitucionais, especialmente, a do contraditório e da ampla defesa são as comunicações eficazes das intimações judiciais. Eficazes no sentido de que elas cumpram a finalidade para a qual foram concebidas. E, a meu ver, elas não foram concebidas para outro fim, que não, o de conferir à defesa, o direito à oportunidade de participar de todos os atos processuais. Ora, bem, como participar de atos processuais se a comunicação da intimação, no caso da expedição de carta precatória, é incompleta? Isto é, não diz qual a data e horário em que se realizará o ato. Esse estado de coisas, lança sobre a defesa o desnecessário e pesado ônus de ter que acompanhar o itinerário das cartas precatórias nos juízos das comarcas deprecadas. Como dito, isso é desnecessário. Com o notório avanço da informática em nossos dias, as comunicações dos atos processuais podem e são feitos por meio do Diário da Justiça Eletrônico. Entretanto, não raras vezes, ainda aplica-se entendimento sabidamente ultrapassado. Assim, em vez de se enfrentar e confrontar o obsoleto, opta-se pela cômoda postura de aplicar, de modo acrítico, enunciados ultrapassados em verdadeira reprodução automática de precedentes. E o que considero mais grave: mesmo quando estes violam caríssimas garantias processuais com matriz constitucional. Se todos atores do processo judicial estão concitados à obedecer à Constituição, esse inaceitável estado de indolência, deve ser enfrentado, quiçá ultrapassado, com atos de coragem. Parece óbvio o que vou dizer no último parágrafo, mas não é; e a aplicação do enunciado da Súmula número 273, do STJ, como dito linhas acima, nos mostra isso. Ela ofende a Constituição e deve ser enfrentada com atos de coragem. Atos de coragem para se pedir e decidir com base na Constituição.

Autor: Edson Batista. Advogado.

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