2 Fontes secundárias ou complementares
As fontes secundárias (também chamadas complementares) do Direito Tributário são estabelecidas pelo art. 100 do Código Tributário Nacional e, juntamente com as fontes principais (alhures expendidas), compõem a legislação tributária.
2.1 Atos Normativos
Os atos normativos são normas genéricas e abstratas, visando à minudência do regulamento. São expedidos pelas autoridades administrativas e, por vezes, interpretam certo ponto sujeito à atuação administrativa, aproveitando ao contribuinte que o cumpre. Exemplos: as portarias, as circulares, as resoluções, os pareceres normativos, etc.
Os atos normativos obedecem ao rigor hierárquico das normas, pelo que devem guardar conformidade à lei à qual são pertinentes.
Poder-se-ia enquadrá-los como lei em sentido lato sensu, pois têm força normativa, implicando o seu descumprimento na imposição de sanções.
2.2 Decisões Administrativas
Por lei, as decisões administrativas são dotadas de eficácia normativa, sendo emanadas de órgãos singulares ou coletivos como, por exemplo, os pareceres normativos proferidos pela Secretaria da Receita Federal, as decisões dos Conselhos de Contribuintes do Ministério da Fazenda, etc.
Celso Ribeiro Bastos (1999, p. 176), tratando do tema sob comento (decisões administrativas), preleciona, acerca da busca da tutela jurisdicional, verbis:
É da índole do nosso sistema constitucional a recorribilidade irrestrita ao Poder Judiciário independentemente do percurso prévio pela instância contenciosa administrativa. Esta é, portanto, voluntária. Cumpre observar, no entretanto, que as decisões proferidas pelos órgãos administrativos em favor do contribuinte são imodificáveis. Dá-se, aí, a impropriamente chamada coisa julgada.
A normatividade das decisões proferidas na esfera administrativa, que se aplicam não só a quem foi parte no processo que a originou, mas a todos os que estejam na mesma situação, sujeita-se, à obviedade, ao direito e garantia fundamental inserto no art. 5º, XXXV, da Carta da República.
2.3 Práticas reiteradas
Os usos e costumes que, adotados pelo contribuinte, eximem-no de qualquer penalidade, denominam-se introdutórios (nova norma de conduta oriunda de falta de lei); ab-rogatórios (consideram revogada uma lei que tenha deixado de ser aplicada); e interpretativos (explicam o sentido de uma lei).
Não paira dúvida que, em matéria tributária, acolhem-se somente os costumes interpretativos, posto que somente a lei (stricto sensu) pode instituir tributo, não sendo a lei revogada pelo costume, ainda que em desuso, nos termos do art. 2º da LICC [18].
Nesse sentido, "não podemos considerar os usos e costumes como fontes do Direito Tributário, tendo em vista que a obrigação tributária só pode resultar da lei" (ROSA JÚNIOR, 1991, p. 143).
Porém, especificamente, quanto às práticas reiteradas na administração, esclarece Celso Ribeiro Bastos (1999, p. 176), verbis:
As práticas reiteradas na Administração num determinado sentido geram no contribuinte o sentimento de estar cumprindo com o seu dever. Seria uma demasia exigir-se que ele próprio fosse se insurgir contra um comportamento administrativo que o beneficiasse para pleitear outro mais oneroso. Se a Administração decidir alterar essa prática, só poderá fazê-lo com relação aos comportamentos futuros e nunca relativamente aos pretéritos, pois estes encontram-se protegidos pelo caráter normativo de que se reveste o comportamento habitual da Administração.
2.4 Decisões judiciais
A solução legislada (constituição, lei, etc) contempla o caráter normativo, obrigando a todas as hipóteses submetidas à sua parte dispositiva.
A jurisprudência consolida-se como precedente (exemplo de solução), mas não obriga, por si, não constituindo o seu não atendimento uma infração. Esta, ocorre quando o contribuinte desatende à lei, ou o funcionário não a cumpre, ou o juiz decide contra o seu texto, ensejando os recursos especiais.
Segundo Ruy Barbosa Nogueira (1990, p. 71), "por isso é que se coloca a jurisprudência como fonte depois das disposições legisladas".
Este mesmo autor refere-se à chamada jurisprudência administrativa, rotulando-a como uma quase jurisprudência, a qual constitui-se das soluções dos órgãos fiscais de julgamento (órbita administrativa), ensinando, verbis:
Estas soluções que do ponto de vista teórico são colocadas no final das fontes, porque o administrativo não decide conclusivamente, porque os seus julgados não produzem, mesmo na espécie, a chamada coisa julgada (qualidade que é encontrada na decisão judicial definitiva), entretanto têm muita importância prática em Direito Tributário, pois toda vez que esses órgãos decidem em última instância administrativa contra o fisco, praticamente fica estabilizada a decisão, porque pertencendo esses órgãos à própria Fazenda, não seria possível fosse ela pleitear ao Judiciário a modificação de sua própria orientação: ´Nemo potest venire contra factum proprium´. É o que reconhece atualmente o art. 156, IX, do CTN
Realmente, a decisão administrativa irreformável (definitividade na órbita administrativa, que não pode ser objeto de ação anulatória), extingue o crédito tributário, nos termos do art. 156, IX, do Código Tributário Nacional.
2.5 Convênios
Os convênios que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios celebram entre si, são ajustes ou acordos entre duas ou mais pessoas para a prática ou comissão de certos e determinados atos. Podem os convênios visar à execução de suas leis, serviços ou decisões, através da atuação de funcionários federais, estaduais ou municipais.
Os convênios, mesmo não possuindo força vinculativa absoluta, instrumentalizam a orientação na solução de problemas jurídicos relativos às normas que contenham, enquanto não forem transmudados em lei pelo legislativo, sendo que - erroneamente, na opinião de Luiz Emygdio F. da Rosa Júnior (1991, p. 143) – têm sido opostos às leis estaduais e municipais, redundando na injuridicidade.
Daí, a necessidade de validação do conteúdo dos convênios pelas Assembléias Legislativas, em ratificação aos termos prefirmados nas assembléias de Estados-membros, prelecionando Celso Ribeiro Bastos (1999, p. 177), verbis:
Sob o ponto de vista formal, são atos administrativos porque dimanam de órgão administrativo colegiado (assembléia de funcionários representantes do Poder Executivo dos Estados). Sob o ponto de vista material, são atos legislativos porque têm conteúdo de preceituação genérica e normativa (não há aplicação de norma a caso concreto). Como o princípio da legalidade para pôr e tirar o tributo exige lei em sentido formal – proveniente de órgão legislativo -, a previsão de ratificação pelo Poder Legislativo dos Estados teria precisamente esta finalidade: conferir aos convênios força de lei.
A hipótese é prevista na atual Constituição Federal – como o foi na anterior – tendo os convênios, por objeto, as matérias fiscais cujos efeitos (reflexos, repercussões) ultrapassam os limites territoriais de cada unidade da federação. Estabelece o art. 155, XII, g, da CF que cabe à lei complementar a regulamentação da forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, as isenções, os incentivos e os benefícios fiscais serão concedidos e revogados.
II - Código tributário
A Lei n. 5.172, de 25 de outubro de 1966, com as alterações posteriores, nos termos do Ato Complementar n. 36, de 13 de março de 1967 (art. 7º) passou a denominar-se Código Tributário Nacional.
O CTN é a principal lei complementar (em sentido material), mesmo tendo sido aprovado como lei ordinária, pois a Lei n. 5.172/66 é o seu veículo legislativo. É que, àquela época, o ordenamento jurídico-constitucional não previa a lei complementar. Esse status, redunda da análise comparativa do art. 146, da Constituição, com o art. 1º do CTN, que define o objeto da mencionada lei.
Portanto, o Código Tributário Nacional "tem hoje eficácia de lei complementar, por versar assunto reservado exclusivamente a esse tipo de ato legislativo, só podendo ser revogada por diploma desta natureza" (CARVALHO, 1985, p. 37 apud ROSA JÚNIOR, 1991, p. 138).
Roque Antônio Carraza (1999, p. 585-586), tratando do tema sub examine, assevera (em nota de rodapé), verbis:
A nosso ver, a Lei n. 5.172/66 continua, sim, sendo formalmente uma simples lei ordinária: materialmente, entretanto, é lei de cunho nacional. Nem poderia ser de outra forma, como escorreitamente sustenta Paulo de Barros Carvalho, ao inferir que o raciocínio ortodoxo "(...) representaria o mesmo dislate de conceber-se como Emenda Constitucional um decreto-lei que versasse matéria agora privativa do legislador constituinte, por virtude de ordem jurídica adventícia". Evidentemente, a matéria de que a lei em questão cuida (normas gerais em matéria de legislação tributária) passou a ser privativa de lei complementar, por determinação, primeiro, do art. 18, § 1º, da Carta de 1967/69 e, agora, do art. 146 da atual Constituição. Desta forma, a Lei nacional n. 5.172/66 só poderá ser revogada ou modificada por lei formalmente complementar.
Em verdade, o palco principal do Direito Tributário é a Constituição Federal (Lei Fundamental Tributária) - que disciplinou o exercício da atividade tributária e garantiu a liberdade e o patrimônio do contribuinte - e não o Código Tributário Nacional. Este, não tem o condão de ingerência naqueles temas, sob pena de revelar o inadmissível (e inconstitucional) autoritarismo.
Não pode o Código Tributário Nacional, inclusive, "estabelecer o modo pelo qual deverão ser entendidas e aplicadas, aos casos concretos, as leis tributárias federais, estaduais, municipais e distritais. Noutras palavras, não lhe é dado disciplinar a interpretação e a integração da legislação tributária" (CARRAZA, 1999, p. 587).
Sinoticamente, no que concerne à hermenêutica tributária, extrai-se dessa mesma obra e página, verbis:
Em suma: o contribuinte, o Fisco e, acima de tudo, o Judiciário não poderão ter sua atuação disciplinada por eventual ‘norma interpretativa’ contida na lei complementar ora em exame. O ideal seria que o novo Código Tributário Nacional – ao contrário do atual – não cuidasse deste tema, até para evitar possíveis inconstitucionalidades na aplicação das leis tributárias.
CONCLUSÃO
As fontes do Direito Tributário encontram-se delineadas no art. 96 do Código Tributário Nacional, sendo que a expressão legislação tributária nele inserida tem a conotação lato sensu, abrangendo as leis, os tratados e as convenções internacionais, os decretos e as normas complementares, desde que tenham por objeto, ainda que de modo parcial, a matéria tributária e as relações dela oriundas.
As normas complementares estão elencadas no art. 100 do CTN e referem-se aos atos normativos, às decisões proferidas pelas autoridades administrativas, às práticas reiteradas, e aos convênios celebrados pelas pessoas políticas.
Preocupa-nos não conter a Carta da República dispositivo expresso que obste o uso da medida provisória para instituição e modificação de tributos, consolidando uma ameaça aos contribuintes, em face do poder tributário do Estado e da eficácia imediata da medida provisória.
A doutrina entende que a medida provisória pode, tão-somente, criar impostos extraordinários de guerra e instituir empréstimos compulsórios de emergência (guerra, calamidade pública).
Vemo-nos, porém, inseguros e fragilizados frente à avalanche de edição de medidas provisórias, em manifesta afronta aos requisitos que lhe são imanentes (relevância e urgência), e em desfavor do "consumidor de justiça", com a concordância tácita do Judiciário.
Recentemente, estupefatos, vimos a absurda vulneração do Estatuto Consumerista (Lei n. 8.078/90), norma de ordem pública e interesse social, de berço constitucional, impingida teratologicamente por uma pretensa medida provisória que, praticamente, o "revogaria", sob argumento da crise de energia e que o procedimento visava a tutela do interesse nacional.
Questões desse jaez são uma constante no cenário jurídico-político do País, necessitando, imediatamente, de um instrumento legal mais eficaz à sua coibição e de uma atuação mais efetiva e enérgica dos Poderes Legislativo e Judiciário.
A abordagem aos tratados e convenções internacionais, também, merece destaque, vez que o mundo globalizado impõe as parcerias internacionais, destacando-se, hodiernamente, o Mercosul e a União Européia.
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