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A concessão de incentivos fiscais e o limite temporal estabelecido pela Lei nº 12.859, de 10 de setembro de 2013

A instituição de incentivos fiscais pelo Poder Público é que possibilita a isonomia intentada pela Constituição, do contrário, se os referidos incentivos forem extintos, certamente haverá uma tendência natural de migração dos investimentos para ambientes mais competitivos, sob a perspectiva de evitar prejuízos futuros.

A Lei nº 4.239, de 27 de junho de 1963 estabeleceu que:

“Art. 13. Os empreendimentos industriais ou agrícolas que se instalarem, modernizarem, ampliarem ou diversificarem, nas áreas de atuação da SUDAM ou da SUDENE, até o exercício de 1982, inclusive, ficarão isentos do imposto de renda e adicionais não restituíveis incidentes sobre seus resultados operacionais, pelo prazo de 10 anos, a contar do exercício financeiro seguinte ao ano em que o empreendimento entrar em fase de operação ou, quando for o caso, ao ano em que o projeto de modernização, ampliação ou diversificação entrar em operação, segundo laudo constitutivo expedido pela SUDAM ou SUDENE”.

Nos termos do dispositivo citado, é cediço o entendimento de que os incentivos fiscais relativos à isenção/redução de Imposto de Renda e adicionais não restituíveis, uma vez concedidos, serão estendidos pelo prazo de 10 anos, tendo como marco inicial da contagem do referido prazo, o exercício financeiro seguinte ao ano da concessão do incentivo, nos termos do laudo constitutivo.

Na hipótese de instalação de projetos novos, o prazo de fruição poderá ser de até 15 anos, desde que atendidos os requisitos entabulados pelo art. 3º do Decreto-Lei nº 1.564, de 29 de julho de 1977.

Historicamente referidas regras foram ao longo do tempo sendo objeto de diversas alterações, como no caso do Decreto-Lei nº 1.564, de 29 de julho de 1977, o qual ampliou a isenção para projetos de modernização, ampliação e diversificação. Posteriormente, a Medida Provisória 1.562 de 19 de dezembro de 1996, prorrogou até 31.12.2010 o prazo para implantação, modernização, ampliação e diversificação de empreendimentos submetidos à isenção de IRPJ. Referido prazo foi ainda, alterado pela Medida Provisória nº 1.614-13, de 11 de dezembro de 1997, mais uma vez o prazo sendo prorrogado para até 31.12.1997.

Com o advento da Lei nº 9.532, de 10 de dezembro de 1977, os benefícios fiscais de isenção instituídos pela Lei nº 4.269/63, passaram a ser na modalidade ‘redução’, com efeito a partir de 1º de janeiro de 1998, prazo este ratificado através da Medida Provisória nº 1.614-14, de 31 de dezembro de 1997.

Através de nova alteração feita pela Medida Provisória nº 2.199-14, de 24 de agosto de 2001, foi criada regra específica possibilitando a aplicação de parcela do Imposto de Renda Incentivado em Fundos de Investimentos Regionais (FINOR, FINAM e FUNRES).

No ano seguinte foi editado o Decreto nº 4.213, de 26 de abril de 2002, vindo a definir os setores da economia considerados como prioritários ao desenvolvimento regional para fins dos benefícios fiscais de redução do Imposto de Renda, inclusive de reinvestimento, contemplando os setores relacionados de: infraestrutura, turismo, agroindústria, agricultura irrigada, fruticultura, indústria extrativa de minerais, indústria de transformação, eletro eletrônica, mecatrônica, informática, biotecnologia, veículos, componentes e autopeças.

Com a edição do Decreto nº 3.000, de 16 de março de 1999 (Regulamento do Imposto de Renda) foram consolidadas as regras atinentes à determinação dos incentivos fiscais mencionados. Através da Instrução Normativa nº 267, de 23 de dezembro de 2002, a Receita Federal do Brasil passou a cuidar da matéria, representando o normativo básico para atendimento às exigências fiscais relacionadas ao mencionado incentivo.

O fato é que todo o arcabouço legal que regula o tema “incentivos fiscais” possibilitou que diversas Empresas, cujos centros de negócios sempre se concentraram nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste do País, passassem a enxergar o Norte e o Nordeste como celeiros de grandes oportunidades de incremento de seus negócios, possibilitando, a reboque, o desenvolvimento econômico daquelas regiões, por meio da geração de emprego e renda para a população, melhoria da infraestrutura de serviços e demais benefícios decorrentes do aquecimento da economia local.

Ocorre que o contexto de desenvolvimento e redução das desigualdades regionais e sociais almejado pelo Constituinte está sendo colocado em xeque, a partir da publicação da Lei nº 12.859, de 10 de setembro de 2013, conforme explanaremos adiante.

Fruto da conversão da Medida Provisória 613, de 7 de maio de 2013, a qual, em princípio, trazia em seu bojo medidas direcionadas à desoneração do etanol, dada sua importância para o setor energético brasileiro, bem como, em relação aos insumos utilizados na indústria química, foi publicada a Lei nº 12.859, de 10 de setembro de 2013, normativo que trouxe ao ordenamento jurídico-tributário brasileiro regra diametralmente oposta à exposição de motivos da referida Medida Provisória,  a qual se fundava no estabelecimento de desonerações necessárias para fomentar o desenvolvimento dos setores econômicos.

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Nos termos do arts. 8º e 9º da referida Lei os benefícios fiscais previstos no art. 1º da Medida Provisória nº 2.199-14/2001, e aqueles previstos pelo art. 77 da Lei nº 9.532/77 serão extintos a partir de 1º de janeiro de 2024. Do ponto de vista prático, a regra entabulada atinge os seguintes incentivos fiscais em vigor:

A partir do execício de 2015 os contribuintes que protocolarem projetos de implantação, modernização ou diversificação nos termos do art. 13 da Lei nº 4.239/63, por força da nova regra, terão o prazo para gozo dos benefícios reduzido de forma gradativa até a sua total extinção em 2024.

A Lei nº 12.859/2013, ao dispor sobre a extinção dos incentivos fiscais mencionados acima, cria cenário de flagrante insegurança jurídica para os contribuintes que possuem empreendimentos localizados nas áreas de atuação da SUDENE e da SUDAM.

A referida regra, se aplicada, reduzirá drasticamente a capacidade de investimento das Empresas instaladas nas regiões Norte e Nordeste, sendo-lhes imposta carga tributária uniforme em relação às demais regiões do País. Num primeiro momento tal uniformidade traduziria erroneamente uma ideia de igualdade, de isonomia, um vez que, colocaria o mesmo peso tributário sobre contribuintes que se acham em situações antagônicas.

A instituição de incentivos fiscais pelo Poder Público é que possibilita a isonomia intentada pela Constituição Federal, do contrário, se os referidos incentivos forem extintos, certamente haverá uma tendência natural de migração dos investimentos para ambientes mais competitivos, sob a perspectiva de evitar prejuízos futuros.

A extinção prevista na Lei nº 12.859/2013 afronta, as disposições dos incisos II e III do art. 3º, da Constituição Federal de 1988, quanto à garantia do desenvolvimento nacional, a erradicação da pobreza, a marginalização e a redução das desigualdades sociais e regionais.

Ademais, o art. 5º, em seu inciso XXXVI, estabelece que a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada, desta forma, os atos concessivos dos incentivos em vigência não podem ter seus efeitos mitigados por lei que venham a tratar de forma diversa, principalmente em flagrante prejuízo ao contribuinte.

Acerca da garantia de defesa do direito adquirido, o entendimento do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que a lei não poderá prejudicar “os direitos que já tiverem sido adquiridos, àquela data, em relação a incentivos concedidos sob condição e com prazo certo” (RE 218160 / SP, Primeira Turma, DOU 06/03/1998)[1].

Ainda no plano Constitucional, o inciso I do art. 151 da Constituição estabelece que a concessão de incentivos fiscais tem por destinação precípua a promoção do equilíbrio do desenvolvimento sócio econômico entre as diferentes regiões do País, interpretação que entendemos estar em perfeita consonância com o inciso VII do art. 170, o qual estabelece a redução das desigualdades regionais e sociais como Princípio Geral da Atividade Econômica.

Portanto, frente aos fundamentos expostos, temos que a Lei nº 12.859, de 10 de setembro de 2013, atenta contra diversos dispositivos constitucionais, em prejuízo aos contribuintes e acentuando, cada vez mais, as diferenças econômicas regionais e sociais do País.

Neste sentido, os contribuintes que possuem empreendimentos localizados nas regiões de atuação da SUDENE e da SUDAM, com incentivo de redução de Imposto de Renda, e/ou que tenham operações realizadas com a Zona Franca de Manaus e a Amazônia Ocidental, devem submeter a matéria ao Judiciário para que este profira a decisão final sobre as inconstitucionalidades suscitadas.


Nota

[1] RE 218160 / SP - SÃO PAULO

Relator(a):  Min. MOREIRA ALVES

Julgamento:  02/12/1997, Órgão Julgador:  Primeira Turma

Publicação: DJ 06-03-1998 PP-00028  EMENT VOL-01901-15 PP-03118

EMENTA: ICMS. Befiex. Isenção, a prazo certo e em função de determinadas condições, concedida pela União anteriormente à atual Constituição. Direito adquirido. Incidência do § 2º do artigo 41 do ADCT. - É certo que a atual Constituição, no artigo 151, III, vedou à União instituir isenções de tributos da competência dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios. No artigo 41 do ADCT, porém, estabeleceu, em seu "caput", que os Poderes Executivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios reavaliariam todos os incentivos fiscais de natureza setorial em vigor, propondo aos Poderes Legislativos respectivos as medidas cabíveis, e, complementando essa disposição, declarou que se considerariam revogados após dois anos, a partir da data da promulgação da Constituição, os incentivos que não fossem confirmados por lei (§ 1º), estabelecendo, entretanto, no 2º, que essa revogação não prejudicaria os direitos que já tiverem sido adquiridos, àquela data, em relação a incentivos concedidos sob condição e com prazo certo. - Por outro lado, se havia legislação federal e a matéria passou pela nova Constituição ao âmbito de competência estadual ou municipal, a legislação federal é recebida como estadual ou municipal. Recurso extraordinário conhecido e provido.

Sobre os autores
João Paulo Maia de Alencar Tavares

Graduado em Ciências Contábeis (2004). Especialista em Contabilidade e Planejamento Tributário (2006) pela Universidade Federal do Ceará – UFC, pós-graduado do curso de MBA em Direito Tributário pela Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas-RJ e Graduando de Direito pela UniChristus. Possui 10 (dez) anos de experiência dedicados às atividades de assessoria contábil e fiscal de empresas industriais, comerciais e de prestação de serviços. Atualmente Consultor na área tributária com ênfase em tributos diretos (IRPJ/CSLL) e Planejamento Tributário na MARTINS & LEMOS ADVOGADOS ASSOCIADOS.

Alexandre Brenand da Silva

Graduado em Ciências Jurídicas (Direito) pela Universidade de Mogi das Cruzes/SP – UMC/SP (1999). Pós-graduado em Direito e Processo Tributários pela Universidade de Fortaleza/CE – UNIFOR (2004). Curso de Extensão em Tributação no Comércio Internacional pela Universidade de Fortaleza/CE – UNIFOR (2007) Curso Extra Curricular em Processo Administrativo Tributário e Procedimento Especial de Restituição ICMS/CE pelo Sindicato dos Contabilistas no Estado do Ceará (2002). Advogado do Escritório Martins & Lemos Advogados Associados Membro Colaborador da Comissão de Estudos Tributários da OAB/CE (2014/2015). Experiência na Área Tributária, com ênfase no Contencioso Judicial e Administrativo, bem como no contencioso Cível, pró-seguimento Bancário e Securitário.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

TAVARES, João Paulo Maia Alencar; ALEXANDRE BRENAND DA SILVA, . A concessão de incentivos fiscais e o limite temporal estabelecido pela Lei nº 12.859, de 10 de setembro de 2013. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4096, 18 set. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/29537. Acesso em: 22 dez. 2024.

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