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As lacunas da lei e as formas de aplicação do Direito

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Agenda 01/02/2001 às 00:00

Sumário: 1. Introdução. 2. Aplicação do direito. Noções gerais. 2.1. Conceito. 2.2. Incidência e aplicação do direito. 2.3. A forma pela qual a norma jurídica é aplicada – a questão do silogismo e da subsunção. 3. Questão das lacunas. 3.1. Conceito. 3.1.1. Existência ou inexistência de lacunas. Auto-integração e heterointegração. 3.1.2. Espécies de lacunas. 3.1.3. Suprimento das lacunas. Métodos de integração da norma jurídica. 4. Analogia. 4.1. Considerações gerais. 4.2. Conceito. 4.3. Fundamentos. 4.4. Distinções. Analogia, indução e interpretação extensiva. 4.5. Espécies. 4.6. Requisitos. 4.7. Limites. 4.8. Outros métodos de integração. 5. Costume. 5.1. Considerações gerais. 5.2. Conceito. 5.3. Espécies. 5.4. Outros meios de integração da norma. 6. Princípios gerais de direito. 6.1. Considerações gerais. 6.2. Conceito. 6.3. Outros métodos de integração da norma. 7. Eqüidade. 7.1. Considerações gerais. 7.2. Conceito. 8. Conclusão. Notas. Bibliografia.


1. Introdução

Partindo-se de um conceito não muito burilado, porém de grande alcance, aceitação e utilização pelos juristas, que estabelece o direito como sendo um ordenamento que visa regular a conduta humana de forma externa, bilateral e coercitiva, subsume-se que, nos dizeres de KARL ENGISH, o direito se ocupa da vida 1.

Na conformidade do tridimensionalismo do direito, preconizado aqui entre nós por MIGUEL REALE, toda norma jurídica pressupõe um fato e um valor antecedentes à sua elaboração. Que fatos seriam estes então? Obviamente os fatos da vida humana, relevantes para o direito.

Tem-se, pois, que o objetivo do direito, como ordenamento, é regular a vida e a conduta de todo e qualquer indivíduo, através de um complexo de normas jurídicas gerais e abstratas, pela sua própria natureza.

Então, em decorrência das colocações acima, percebe-se que não há norma jurídica sem finalidade. Toda norma foi editada, assim, para incidir e ser aplicada, tendo em vista a valoração de fatos prévia e genericamente considerados. Sobre a incidência e aplicação das normas jurídicas tratar-se-á oportunamente.

Há que se considerar, mais uma vez, que não somente da vida e conduta das pessoas se preocupa o direito, mas também com a atividade do Estado.

Considere-se, ainda, em caráter propedêutico, que as normas jurídicas são elaborações, partindo-se de situações genéricas e abstratas, a incidirem-se a casos específicos e concretos. Por isso mesmo, do conceito de norma jurídica, pode-se extrair que a lei é geral e abstrata.

Obviamente, antes de aplicar a lei ao caso concreto que se lhe apresenta, cabe ao julgador observar a hipótese de incidência, ou seja, analisar o sentido e o alcance das expressões do direito 2 contidas na norma (Hermenêutica Jurídica), e, após conhecidos e identificados tais termos e expressões, proceder à interpretação jurídica, ou seja, revelar o sentido da norma.

Muito embora não se trate do objeto deste estudo, mas pela sua íntima relação, transcrever-se-á abaixo três conceitos, o primeiro acerca da hermenêutica jurídica e outros dois acerca da interpretação jurídica, a saber:

Entende CARLOS MAXIMILIANO que a hermenêutica jurídica tem por objeto o estudo e a sistematização dos processos aplicáveis para determinar o sentido e o alcance das expressões do direito 3 .

Para CLÓVIS BEVILÁQUA interpretar a lei é revelar o pensamento que anima as suas palavras 4, e, nos dizeres de ESPÍNOLA, interpretação é a declaração precisa do conteúdo e do verdadeiro sentido das normas jurídicas 5.

O leitor já deve ter percebido, e há que ficar consignado, que este trabalho preocupa-se com a aplicação do direito feita pelo juiz de direito, não como um homem comum, mas como membro do Poder Judiciário 6 . Diz-se isto, eis que já se deve ter percebido, pela própria conceituação do tema – Aplicação do Direito –, que todos durante a vida aplicam o direito, até mesmo nos mais pequenos e singelos atos da vida, ou como diz MARIA HELENA DINIZ, o juiz aplica as normas gerais ao sentenciar; o legislador, ao editar leis, aplica a Constituição; o Poder Executivo, ao emitir decretos, aplica norma constitucional; o administrador ou funcionário público aplica sempre normas gerais ao ditar atos administrativos; simples particulares aplicam norma geral ao fazer seus contratos e testamentos 7 .

Assim é que, como dito acima, neste estudo dar-se-á ênfase à aplicação do direito feita pelo juiz de direito, ao ter de aplicar uma norma jurídica a um caso concreto, a um fato da vida, sobre o qual a mesma incidiu, o que faz por meio da subsunção desse fato à norma.


2. Aplicação do direito. Noções gerais

2.1. Conceito

Para CARLOS MAXIMILIANO, a aplicação do direito consiste no enquadrar um caso concreto em a norma jurídica adequada. Submete às prescrições da lei uma relação da vida real; procura e indica o dispositivo adaptável a um fato determinado. Por outras palavras: tem por objeto descobrir o modo e os meios de amparar juridicamente um interesse humano 8 .

Já para KARL ENGISH, a aplicação do direito é a determinação in concreto daquilo que é realmente devido ou permitido, o que é feito de um modo autoritário pelos órgãos aplicadores do direito, pelo direito mesmo instituídos, isto é, através dos tribunais e das autoridades administrativas, sob a forma de decisões jurisdicionais e actos de administração 9.

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Entende MIGUEL REALE que o termo aplicação do direito reserva-se, entretanto, à forma de aplicação feita por força da competência de que se acha investido um órgão, ou autoridade. Afirma, ainda, que a aplicação do direito é a imposição de uma diretriz como decorrência da competência legal 10 .

Segundo VICENTE RÁO, a aplicação das normas jurídicas consiste na técnica de adaptação dos preceitos nelas contidos e assim interpretados, às situações de fato que se lhes subordinam 11 .

Por sua vez, em sua obra Tratado de Direito Privado, PONTES DE MIRANDA conceitua o tema como sendo a aplicação do direito aos fatos sobre os quais a regra jurídica incidiu, traçando um paralelo ou uma distinção entre os vocábulos aplicação e incidência12. Em sua obra Comentários à Constituição de 1946, o autor chega a mencionar que a aplicação nada mais é do que a declaração de uma incidência.13

2.2. Incidência e Aplicação do Direito

Pela própria característica de generalidade e abstração da norma jurídica, tem-se a incidência como característica marcante dela decorrente, uma vez considerada esta como a atuação da norma aos casos e fatos específicos e concretos da vida. Na diretriz dos dizeres de PONTES DE MIRANDA, a eficácia da norma é mesmo incidir, e justamente sobre fatos específicos e concretos é que ela incide; e seguindo a comparação do ilustre jurista, o contato da lei com os fatos seria como o da prancha da máquina de impressão com o papel, deixando sua imagem colorida em cada folha14.

Vale, aqui, destacar que incidência independe da vontade dos indivíduos; a estes cabe respeitá-la, e assim, aplicá-la.

Assim, tem-se que a incidência começa antes da aplicação, sendo a aplicação nada mais do que a declaração de uma incidência. Então, somente depois da incidência é que se pode cogitar da aplicabilidade da lei.

2.3. A forma pela qual a norma jurídica é aplicada – a questão do silogismo e da subsunção

Quando se fala em aplicação do direito, no caso a aplicação feita pelo Estado-Juiz, surge um delicado problema, qual seja, o confronto entre uma norma geral e abstrata e um fato específico e concreto.

Ao sentenciar, cabe ao juiz de direito adequar uma ou mais normas jurídicas a um ou mais fatos particulares, observando a situação de incidência, interpretando e, posteriormente, aplicando o direito.

Diante disso é que surge a questão do silogismo e da subsunção. Para tanto, necessário transcrever, ao menos singelamente, uma conceituação de silogismo e uma de subsunção.

Para GERALDO ATALIBA, a subsunção é o fenômeno de um fato configurar rigorosamente a previsão hipotética da lei. Diz-se que um fato se subsume à hipótese legal quando corresponde completa e rigorosamente à descrição que dele faz a lei 15.

Com referência ao silogismo, tem-se este como um raciocínio lógico composto de três proposições lógicas dispostas de tal maneira que a terceira, denominada conclusão, é uma decorrência necessária das duas precedentes, chamadas premissas.

Daí uma corrente formalística do direito entender ser o ato da aplicação do direito semelhante à estrutura de um silogismo, ou seja, o método seguido pelo juiz ao sentenciar nada mais é do que o processo do silogismo, onde a norma jurídica geral e abstrata seria a premissa maior, enquanto que o fato ou caso específico e concreto a premissa menor, e a decisão da sentença a conclusão.

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Neste sentido, SERPA LOPES entende que o método pelo qual o juiz torna efetivo a aplicação do direito é o lógico, pelo processo do silogismo. A esse respeito são unânimes os juristas. Utilizando-se dessa operação lógica, o juiz procede à subsunção da norma jurídica exata aos fatos que lhe são presentes, conhecido previamente o sentido da primeira 16.

A utilização deste esquema lógico, em si mesmo considerado, é bastante simples e prático. No entanto, deve-se considerar que mesmo dentro da lógica a fragilidade deste método dedutivo é bastante ressaltada, inclusive sendo ele de pouca aplicabilidade, ou mesmo desaconselhável, para métodos científicos e pesquisa de um modo geral.

A fragilidade ou problemática desse procedimento dedutivo de silogismo, segundo KARL ENGISH, reside justamente na correta constituição das premissas, especialmente da premissa menor, uma vez que nela se acha sobretudo a já muitas vezes mencionada subsunção 17.

Significa dizer, sob pena de redundância, que a correta constituição das premissas é fundamental para uma decisão justa, e ainda, que necessariamente, ocorrendo premissa incorreta, incorreta seria a sentença.

Ocorre ainda que, muitas vezes, o mesmo fato pode acarretar a incidência de várias regras jurídicas, que devem ser aplicadas conjuntamente, o que por si já poderia levar à confusão mental do julgador, acarretando a elaboração de premissa incorreta. Neste sentido, deve-se também considerar que, não se aplicam normas jurídicas isoladas, mas sim uma regulação global.

Assim sendo, extrai-se que aplicação do direito não se reduz somente a uma questão de lógica formal, implicando uma série de atos complexos e axiológicos. Percebe-se, então, que antes de se chegar a fase de utilização do silogismo, necessita o julgador proceder a análise preliminar do fato a fim de que possa escolher a norma aplicável.

A escolha da norma jurídica aplicável por si só já demanda uma análise cuidadosa do sistema jurídico, do qual o aplicador do direito deve ter uma visão ampla, além de buscar o apoio dos princípios gerais do direito, sem se falar na questão da hermenêutica e da interpretação, já mencionadas anteriormente.

Então, segundo CARLOS MAXIMILIANO, para se aplicar o direito é preciso examinar:

a) a norma em sua essência, conteúdo e alcance; passando pela análise do sistema jurídico ao qual está inserida, e também pela hermenêutica e pela interpretação; b) o caso concreto e suas circunstâncias; c) a adaptação do preceito à hipótese em apreço18.

Para VICENTE RÁO, o juiz deve em primeiro lugar considerar a situação de fato em sua individualidade completa, segundo o seu conteúdo de espírito e pensamento, e de conformidade com o sentido que recebe no ambiente social em que se verifica, despindo-a de qualquer definição jurídica19.

Após esta análise prévia, indaga o juiz se o fato, anteriormente examinado em si, incide ou não na disciplina ou tutela do direito normativo e, incidindo, qual é, ou quais são, a(s) norma(s) que lhe diz(em) respeito, à partir do que se estará qualificando juridicamente o fato, uma vez que não mais o examina isoladamente, mas em confronto com o direito. Procedendo desta forma, como diz VICENTE RÁO, o juiz realiza, em primeiro lugar, o que denomina de diagnóstico do fato e, em segundo lugar, o diagnóstico jurídico 20.

Outrossim, como acentuou FERRARA, a actividade judiciária, porém, não se reduz ao trabalho de subsunção dos factos à norma de direito 21, e, conclusivamente, pode-se dizer, então, que aplicação do direito não se resume a uma questão de lógica formal. E, na trilha e nos dizeres de MIGUEL REALE, aplicação do direito é antes uma questão complexa na qual fatores lógicos, axiológicos e fáticos se correlacionam, segundo exigência de uma unidade dialética, desenvolvida ao nível da experiência, à luz dos fatos e de sua prova, e continua o jurista, donde podemos concluir que o ato de subordinação ou subsunção do fato à norma não é um ato reflexo e passivo, mas antes um ato de participação criadora do juiz, com a sua sensibilidade e tato, sua intuição e prudência, operando a norma como substrato condicionador de suas indagações teóricas e técnicas 22 .


3. Questão das lacunas

3.1. Conceito

A lacuna da lei é um vazio existente no ordenamento legislativo, caracterizando-se assim, a inexistência de uma norma jurídica aplicada in concreto.

Afirma KARL ENGISH que a lacuna é uma incompletude insatisfatória no seio do todo jurídico 23 .

Para LUIZ REGIS PRADO, a lacuna caracteriza-se quando a lei é omissa ou falha em relação a determinado caso. Em uma palavra, há uma incompleição do sistema normativo 24.

3.1.1. Existência ou inexistência de lacunas. Auto-integração e heterointegração

Grande número de autores não acreditam na existência de lacunas no direito, sendo que outros já a admitem.

Sustentou ZITELMANN que o ordenamento jurídico não tem lacunas, porque existe uma norma complementar negativa que declara lícitas todas as ações condenadas expressamente pelo direito25.

Também DONATI, nega a existência de lacunas no ordenamento jurídico, face à existência de uma norma fundamental, derivada de disposições particulares, que permite tudo o que não é proibido ou limitado por norma expressa ou por princípio implícito no sistema jurídico positivo26.

De igual forma, KELSEN entende que o sistema é, em si mesmo, bastante, pois as normas que o compõem, contém em si, a possibilidade de solucionar todos os conflitos levados à apreciação dos magistrados ou órgãos jurisdicionais competentes. Neste sentido, o autor afasta a idéia de existência de lacuna do direito, fundando-se na premissa de que tudo aquilo que não está proibido, está permitido, descrevendo isso como a liberdade jurídica negativa27.

KARL BERJBOHM, BRINZ e SANTI ROMANO defenderam a tese da inexistência de lacunas no ordenamento jurídico, porque onde o referido ordenamento falta, falta o próprio direito28.

Segundo CARLOS COSSIO, o ordenamento jurídico é pleno e completo, não contendo espaços vazios de juridicidade. Ainda, segundo este jurista, o juiz é um elemento integrante do ordenamento jurídico, por ser o órgão investido pelo Estado para declarar a juridicidade – não há lacunas porque há juiz 29 .

Os autores retro mencionados, sustentando a tese de inexistência de lacunas, servem-se do método de auto-integração do ordenamento jurídico.

A auto-integração consiste na integração da norma feita por meio do próprio ordenamento jurídico, dentro dos limites da mesma fonte dominante, sem precisar recorrer a outros ordenamentos e com mínimo recurso a fontes diversas da dominante30.

O método de auto-integração apoia-se em nos procedimentos da analogia e dos princípios gerais do direito.

Ainda, segundo BOBBIO, em contraposição, tem-se o método da heterointegração, este que consiste no recurso a ordenamentos diversos, recorrendo a fontes diferentes daquelas dominantes.

Também em contraste ao método da auto-integração, o procedimento do costume, e, tendo ainda, como principal procedimento, o poder criativo do juiz ou o chamado Direito Judiciário.

De outro lado, os autores que negam a existência de lacunas, admitem que a lacuna é da lei (lacuna formal) e não do direito (lacuna material), já que neste sempre haverá uma solução para o caso concreto.

Afirma BRUNETTI que a lacuna existente é na lei, nos códigos, enfim, o que existe é lacuna formal, jamais material 31.

Todavia, o próprio legislador não foi capaz de prever tudo, exemplo disso é o Código Civil Suíço de 1912, quando dispõe que:

nos casos não previstos, o juiz decidirá segundo o costume e, na falta deste, conforme as normas que estabeleceria que o legislador fosse, inspirado na doutrina e na jurisprudência dominante.

Note-se que o próprio legislador prevê o fato de que a lei não poderá conter disposições que regulem todas as situações in concreto.

3.1.2. Espécies de lacunas

Os autores que admitem a existência de lacunas, costumam fazer a sua classificação em lacunas formais e materiais.

BRUNETTI faz clara distinção entre ordenamento jurídico e ordenamento legislativo. Menciona que o primeiro é expressão do direito vivo, não possuindo lacunas e com a finalidade de corrigir as imperfeições do segundo. De outro lado, o ordenamento legislativo é expressão da vontade do Estado, possuindo lacunas que são supridas pelo ordenamento jurídico32.

Sustenta-se a tese de que existem tão somente lacunas formais, face à possibilidade, pela analogia, costume, eqüidade e princípios gerais de direito, regular o caso concreto não previsto expressamente, evitando assim, que o juiz se transforme em legislador.

Em menção à impossibilidade da previsão de todos os fatos concretos da vida, conclui SERPA LOPES pela existência das lacunas na legislação. Porém, não significando com isso, a existência de lacunas no Direito33.

De outro lado, no entender de KARL ENGISH, a lacuna do direito é uma imperfeição insatisfatória dentro da totalidade jurídica. Menciona ainda, que a lacuna do direito é uma deficiência do sistema jurídico34.

As lacunas do direito são deficiências do direito positivo, ou seja, as falhas de conteúdo de regulamentação jurídica para determinadas situações de fato em que é de se esperar essa regulamentação, sendo que tais falhas, postulam e admitem, a sua remoção através de uma decisão judicial que integre a norma jurídica35.

Outros autores, ainda, entendem que o direito positivo tem lacunas materiais, as quais somente podem ser preenchidas pela livre investigação científica do direito, como GÉNY, ou pela livre interpretação do direito, como ERHLICH, KANTOROWICZ e FUNK36.

Diante disso, é possível notar que existem duas correntes doutrinárias no sentido de admitir, ou não, a existência de lacunas no direito, sendo que aqueles que as admitem, subdividem-se naqueles que crêem em lacuna na lei (lacuna formal) e lacuna no direito (lacuna material).

3.1.3. Suprimento das lacunas. Métodos de integração da norma jurídica

A constatação da existência da lacuna, ocorre no momento em que o aplicador do direito vai exercer a sua atividade e, não encontra no corpo das leis, um preceito que solucione o caso concreto. Neste instante, estar-se-á constatando a existência de uma lacuna.

Assim, quando o juiz não consegue, pelos meios tradicionais de interpretação da lei, descobrir um princípio aplicável ao caso não previsto, ou então, dentre as fontes formais não possui uma ao caso a decidir, deve servir-se de outros meios para a solução do caso concreto posto à apreciação do Judiciário, pois não pode deixar de sentenciar pela inexistência de direito37.

Porém, a própria lei põe à disposição do aplicador do direito, os meios dos quais pode se utilizar para o preenchimento da lacuna existente.

Confira-se a disposição constante do artigo 4º da Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro que quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.

Somados aos meios apontados acima como formas preenchimento das lacunas, a lei admite ainda, outra forma, qual seja, a eqüidade38.

O Código de Processo Civil Brasileiro de 1939, em seu artigo 114, dispunha que quando autorizado a decidir por eqüidade, o juiz aplicará a norma que estabeleceria se fosse legislador.

Neste mesmo sentido, dispõe o Código Civil Suíço que o juiz aplica as regras do direito e da eqüidade, quando a lei se reporta ao seu poder de apreciação ou o incumbe de pronunciar tendo em conta as circunstâncias, ou os justos motivos.

Diante do exposto, pode-se dizer que a própria lei admite a existência das lacunas, trazendo em si, os meios próprios para o preenchimento destas, quais sejam, a analogia, os costumes, os princípios gerais de direito e a eqüidade.

A doutrina dominante entende que os meios de preenchimento das lacunas são apresentados de forma hierárquica, não podendo o aplicador do direito utilizar-se de forma indiscriminada de um dos meios, mas devendo-se valer deles na ordem descrita pela lei.

Sobre o autor
Júlio Ricardo de Paula Amaral

juiz do trabalho em Londrina e doutorando em Direito Social pela Universidad de Castilla-La Mancha (Espanha).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

AMARAL, Júlio Ricardo Paula. As lacunas da lei e as formas de aplicação do Direito. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 6, n. -881, 1 fev. 2001. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/30. Acesso em: 23 nov. 2024.

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