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Estudo didático da lei penal em branco e suas polêmicas repercussões práticas na sociedade brasileira

Agenda 18/11/2014 às 20:08

A partir da explicação sobre a lei penal em branco, levanta-se a questão das repercussões na sociedade causadas pela aplicação dessa lei no modo heterogêneo e busca-se a resposta mais adequada para o aumento do reconhecimento e segurança jurídica.

RESUMO

Este artigo apresenta explicações didáticas ou instrutivas sobre os elementos que constituem a lei penal em branco, como o conceito e classificações, as características, os exemplos e as considerações realizadas pela doutrina do Direito penal. Além disso, levanta-se a questão das repercussões na sociedade causadas pela aplicação dessa lei na classificação heterogênea e a incidência em alguns casos concretos de insegurança jurídica. Por fim, busca-se a resposta mais adequada para essa problemática gerada pela referida lei com a finalidade de garantir maior segurança jurídica ao indivíduo que compõe a sociedade brasileira.

Palavras-chave: Lei penal em branco. Conceito. Classificações. Características. Exemplos. Insegurança Jurídica.

1 INTRODUÇÃO

A partir da compreensão da lei penal em branco, questiona-se se existem respostas doutrinárias para atender os problemas práticos de aplicação dessa lei e se estão adequadas para a resolução jurídica dos casos concretos.  Pois, em alguns desses casos o cidadão brasileiro, destinatário da lei penal, pode ser surpreendido com aplicação de sanções criminais a partir das especificações desconhecidas da norma jurídica complementar. Sendo assim, pela existência da lei em questão no ordenamento jurídico brasileiro é possível abordar um grau de desrespeito e não observância do princípio da segurança jurídica.

Em relação à causa desse desrespeito, compreende-se que ocorre pelo caráter específico das normas jurídicas de complementação (caso de complementação em lei penal em branco na modalidade heterogênea). Dessa maneira, realiza-se por meio de pesquisa bibliográfica, a revisão das respostas doutrinárias para essa problemática causada pela aplicação da citada lei. Com isso, possui-se o objetivo, cumprindo previamente o objetivo específico sobre a explicação do conceito e classificações, das características, dos exemplos e das considerações doutrinárias acerca da lei trabalhada neste artigo, de encontrar a mais adequada e razoável resposta para o problema da insegurança jurídica que incide socialmente.

2 A LEI PENAL EM BRANCO

Apresenta-se nessa segunda parte do trabalho o conceito, as características, os exemplos e considerações da doutrina penal.

2.1 Conceito e classificações

A seguir, elucida-se o conceito de lei penal em branco juntamente com o aclaramento da indicação de lei penal em branco e não norma penal em branco.

Considerada um problema particular do direito intertemporal penal, a lei penal em branco é uma lei que necessita para o seu entendimento completo em questão do tipo penal outra norma jurídica de mesmo grau de ato ou grau distinto. Desse modo, quando um termo ou palavra do tipo não ficar esclarecido no próprio enunciado do dispositivo legal, necessário é a utilização de outros atos normativos do ordenamento jurídico para aclarar o significado ou definição do termo ou palavra não especificada.

Além disso, deve ser considerado como em branco a lei penal e não simplesmente a norma. Pois, com base na obra do autor LUIZ FLÁVIO GOMES, na lei penal descreve-se a conduta que se o agente praticar é incriminado e na norma penal é determinado um comando de caráter valorativo e caráter imperativo, ou seja, a lei penal é “veículo” da norma penal. A partir disso, considera-se que a descrição pode ser considerada e incompleta e em sequência complementada, em contrapartida o comando de ação indicado pela norma não é complementado, devido ao fator de estar completo em si quando criado a lei.

Entretanto, quando se especifica o tipo de norma, sendo esta jurídica, pode-se igualar com lei. Justifica essa afirmação, o caráter imperativo e valorativo citados está presente quando a norma é de modalidade jurídica.  Ademais, considerando-se a norma jurídica em branco ou lei penal em branco, importante é saber que ela não é uma lei penal incompleta e sim uma espécie deste gênero. Assim, enquanto a lei penal em branco é incompleta no preceito primário, uma norma jurídica que indica outro ato normativo para identificar sua respectiva sanção criminal não se define como em branco.

Após essa elucidação do aspecto conceitual ou definição da lei em trabalho, questiona-se quais são as suas classificações.

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Em base da doutrina penal encontram-se duas, a lei penal em branco heterogênea, em sentido lato ou imprópria é a primeira enquanto a lei penal em branco homogênea em sentido estrito ou próprias é a segunda. Sendo que esta segunda subdivide-se em homovitelínea e heterovitelínea. De forma sucinta, a distinção está na igualdade ou diferença de fonte de produção legislativa, se diferente a fonte da lei penal em branco e do ato normativo complementar denomina-se heterogênea e se igual à fonte da lei penal em branco e a do ato normativo complementar denomina-se homogênea. Por fim, esta se subdivide quanto à semelhança ou distinção entre o diploma legal da lei, se a origem do ato normativo complementar é igual à origem da lei penal em branco quanto ao diploma legal, considera-se esta homovitelínea e se distinto a origem do ato normativo complementar e a origem da lei penal em branco considera-se esta heterovitelínea.

2.2 Características e exemplos

Importante para os estudos acerca da lei penal em branco as características, com a finalidade de não realizar confusões pratico-teóricas. Desse modo, como levantado pelo autor DAMÁSIO DE JESUS, uma característica dessa lei e ausência de descrição completa típica que é realizada somente a partir de outro dispositivo legal, o que é diferente de abertura no tipo, neste caso ocorre atividade de caráter valorativo pelo intérprete da lei.  Então, a lei penal em branco é complementada por outro dispositivo, ou seja, relação entre lei-dispositivo e o tipo aberto é adequado legal ou socialmente pelo agente do juízo que busca o sentido de termos além da conceituação da figura legal, ou seja, ocorre neste caso relação lei-interprete.

Ademais, questiona-se sobre a característica da constitucionalidade da lei penal em branco e se esta deve ser considerada não como caráter constitucional e sim como caráter inconstitucional. Esse embate sobre tal característica ocorre na doutrina penal, em qual se predomina o entendimento sobre a constitucionalidade da lei penal em branco, uma vez que esta é uma técnica de “flexibilização” para proporcionar capacidade adaptativa do dispositivo legal de natureza penal. Entretanto, parâmetros devem ser observados para que esta denominada “flexibilização” não resulte em desrespeito à Carta Magna de 1988, como a limitação da complementação, que é referente a caracterizações e não a essência do tipo penal que é de competência do legislador. Sendo assim, deve ser considerado para a determinação da constitucionalidade esse medidor de delegação, como é escrito na obra do autor LUIZ FLÁVIO GOMES.

Outra característica é referente à retroatividade dessa lei a partir da mudança da norma jurídica complementar. A partir da doutrina penal consultada, pode ser considerado ou não a possibilidade do ocorrer o fenômeno do percurso da lei no tempo de forma que retorne aos fatos ocorridos anteriormente. Para isso, verifica-se no caso concreto se a lei penal em branco retroage em relação à alteração do ato normativo complementar, que se retirar o caráter ilícito do tipo penal faz com que a lei penal em branco volte no tempo para favorecer o réu. Entretanto, se o complemento não suprir a antijuridicidade ou se é considerado exceção ao primeiro critério apresentado, a lei penal em branco não retorna no tempo e por efeito resultante não beneficia o réu.

A seguir apresenta exemplos doutrinários, partindo do autor DAMÁSIO DE JESUS.

Um exemplo é a apropriação indébita previdenciária, nos termos do artigo 168-A do Código Penal brasileiro constitui crime o fato de “deixar de repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes, no prazo e na forma legal”. Em seguida pergunta-se qual é o prazo em questão nesse tipo penal. No dispositivo legal não é mencionado qual é o prazo, determinando encontrá-lo na Lei de Custeio da Previdência Social (artigos 30, I, “b”, V e artigo 31). A definição legal do crime é incompleta ou indeterminada de forma a ficar condicionada a dispositivos que estão além da esfera penal.

Outro exemplo é o crime do artigo 237 do Código Penal brasileiro em qual é descrito: “Contrair casamento, conhecendo a existência de impedimento que lhe cause nulidade”. Além de se identificar que se trata de lei penal em branco, uma vez que o legislador penal não descreveu de maneira clara quais os impedimentos do casamento que causam nulidades, determina sua classificação como homogênea. Pois, o complemento está no Código Civil brasileiro, artigos 1522, 1523 e 1530, igual fonte legislativa em relação ao Código Penal brasileiro. Sendo que a fonte legislativa do Código Penal é o Congresso Nacional assim como a fonte legislativa do Código Civil, que é o ato normativo complementar.

Um último exemplo é o artigo 33 da Lei n. 11.343/06, em qual é consolidado como típico o tráfico de drogas, que trata de lei penal em branco heterogênea. Pois, enquanto a fonte legislativa da lei de antidrogas é o Congresso Nacional, no ato normativo complementar, em qual é elencado quais são as substâncias entorpecentes, a Portaria n. 344/98 da ANVISA a fonte não é o Congresso Nacional.

3 O PROBLEMA DA INSEGURANÇA JURÍDICA CAUSADA PELA LEI PENAL EM BRANCO HETEROGÊNEA

A partir dos estudos realizados sobre o tema, observa-se que a doutrina penal não trabalha e não apresenta de forma aclarada a questão da insegurança jurídica que lei penal em branco causa na sociedade civil. Pois, preocupa-se somente com a questão da consideração ou não da característica constitucional dessa lei, classificação, conceito, isto é, os preceitos básicos sobre esse tema. Entretanto, a abordagem das repercussões se faz necessária para a resolução dos casos concretos em que se aprecia a configuração de surpresa do cidadão destinatário da lei penal em questão.

Primeiro, questiona-se o porquê que ocorre o fenômeno da insegurança jurídica pela lei penal em branco na classificação heterogênea. A justificativa para ocorrer esse fenômeno está no grau de especificidade e flexibilidade do ato normativo complementar que possui fonte legislativa distinta da lei penal em branco. Pois, uma vez que no tipo penal não está claro a definição dos termos, no ato complementar se encontra detalhes sobre esses termos não conceituados no próprio tipo penal que resulta na modificação com o passar do tempo. Assim, existe a facilidade do acontecimento supressa aos indivíduos que não possui contato e informação acerca dessas mudanças normativas.

No caso da aplicação da lei, com surgimento do problema em relação ao elemento surpresa do indivíduo percebe-se que existe resposta doutrinária. Desse modo, se o indivíduo pratica um fato descrito que se tornou ilícito pelo ato normativo complementar de diferente fonte legislativa é possível encaixá-lo em erro quanto à ilicitude deste fato. Porque, esse indivíduo não pode assim como ninguém se escusar de cumprir a lei, alegando que não a conhece (artigo 3º da Lei de Introdução às normas do Direito brasileiro). Então, analisa-se se é justificável ou se não é justificável o erro desse indivíduo.

 Após uma primeira reflexão sobre esse problema e essa resposta apresentada, questiona-se se o Estado pode impor e incriminar condutas sem avisar seus cidadãos. Porque, não se observa um período vacatio legis em seguida da modificação realiza pelo ato normativo complementar e sim a cobrança imediata de respeito do destinatário da lei penal. Com isso, a repercussão prática sendo direta não observa o indivíduo, que por consequência não se reconhece na norma jurídica vigente no ordenamento jurídico. O resultado, embasando-se no autor AXEL HONNETH, é o abalo ao auto-respeito da relação intersubjetiva entre o cidadão e o Estado.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este artigo, ao longo do conteúdo apresentado, possui como propósito oferecer, de forma clara, sintética e objetiva, uma compreensão dos principais pontos acerca da lei penal no tempo, matéria importante para discussões jurídicas. Além disso, uma primeira abordagem acerca do problema da insegurança jurídica causado pela aplicação da lei penal em branco na classificação heterogênea.

Para consecução deste objetivo, optou-se por uma elucidação em sequência dos conhecimentos básicos para a compreensão de uma lei desta natureza “em branco”, termo criado por Karl Binding. Espera-se que as informações aqui expostas possam contribuir para a elaboração de resolução adequada para a problemática que o cidadão encontra em face da aplicação da lei trabalhada ao longo deste artigo científico.

Diante disso, encontra-se o embate entre a instabilidade da lei em questão causada na relação estatal com o indivíduo que compõe a sociedade brasileira. Desse modo, é preciso seguir essa pesquisa em outros trabalhos científicos com a finalidade de fomentar maior harmonia dessa relação abordada. Como resultado, tem-se além da segurança jurídica e o reconhecimento do cidadão na legislação penal, a contribuição para maior eficácia e aplicabilidade razoável da lei penal em branco.

REFERÊNCIAS

BITENCOURT, César Roberto.  Tratado de Direito penal: parte geral – 17. ed. – SP: Saraiva, 2012. p. 199-201.

GOMES, Luiz Flávio; MOLINA, Antonio García-Pablos de. Direito penal: parte geral: volume 2 – 1. ed. – São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 67-74.

HONNETH, Axel. Luta por reconhecimento: a gramática moral dos conflitos sociais. – São Paulo: Editora 34, 2009. 291 p..

JESUS, Damásio E. de. Normas penais em branco, tipos abertos e elementos normativos. Jus Navigandi, Teresina, ano 6, n. 51, 1 out. 2001. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/2286>. Acesso em: 7 nov. 2014.

PIERANGELI, José Henrique. Escritos jurídico-penais. – 3. ed. – São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 127-130.

QUEIROZ, Paulo.  Curso de Direito penal: parte geral: volume 1 – 8. ed. – Salvador: JusPodivm, 2012. p. 144-145.

TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios de Direito penal – 5. ed. – SP: Saraiva, 1994. p.  42-45.

Sobre o autor
Ottoniel

Graduando em Direito na Escola Superior Dom Hélder Câmara (ESDHC)

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

O motivo para a criação do artigo é referente ao trabalho estimulado e requisitado pelo professor de Estudos Avançados de Direito Penal, sendo que resultou na criação do meu primeiro artigo científico e trabalho acadêmico jurídico individual.

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