4. Do cabimento de habeas corpus na hipótese do não reconhecimento pelo juízo da falência da prescrição da pretensão punitiva
Consoante o art. 61 do Código de Processo Penal, em qualquer fase do processo penal, o juiz deve reconhecer extinta a punibilidade do réu, pela prescrição ou por qualquer das outras causas elencadas no art. 107 do Código Penal.
Assim, no caso específico dos crimes falimentares, o juízo universal da falência (que no caso do Estado de São Paulo, é o competente para a apuração dos crimes falimentares) ou o juízo criminal, se diante da hipótese de ocorrência da prescrição da pretensão punitiva, devem declarar extinta a punibilidade do denunciado logo que notem a ocorrência da prescrição no caso concreto.
Porém, como deve proceder aquele que foi denunciado por crime falimentar prescrito?
Primeiramente, deve ingressar com um pedido de extinção de punibilidade na primeira instância.
Caso não seja reconhecida pelo juízo de primeiro grau a ocorrência da prescrição, há duas vias a tomar: a interposição de recurso em sentido estrito, com fulcro no art. 581, IX, do diploma processual penal, ou a impetração do remédio constitucional do habeas corpus no juízo ad quem.
A segunda via, indubitavelmente, se mostra a mais eficaz, haja vista que o writ constitucional será julgado com maior celeridade, já que segue rito sumaríssimo.
Estando o crime prescrito, é imperiosa a necessidade de trancamento da ação penal, por esta representar um constrangimento ilegal e uma ameaça indireta à liberdade do réu.
Heráclito Mossin é bastante incisivo ao defender a impetração de habeas corpus nesta hipótese:
"... se não obstante a causa extintiva da punibilidade, o juiz, através de decisão interlocutória, receber a denúncia ou queixa, permitindo o ajuizamento da ação penal, evidente será a coação ilegal, permitindo que a ação penal seja trancada por intermédio do writ of mandamus. Cumpre notar que o processo como forma de composição de litígio, sempre proporciona coação indireta, virtual perigo à liberdade física do acusado" (9).
No mesmo sentido, assevera Hélio Tornaghi:
"... as causas de extinção de punibilidade são as previstas no art. 107 do Código Penal. Se, em virtude de qualquer delas, desaparece a punibilidade antes de instaurado o processo, esse perde a razão de existir e a eventual incoação dele enseja o habeas corpus para trancá-lo. Se a extinção se dá no curso do processo, o juiz deve declará-la de ofício (art. 61)" (10).
E nesse sentido também tem se inclinado a Jurisprudência pátria, valendo transcrever ementa de brilhante acórdão proferido pelo TJSP, cujo relator foi o Des. Ary Belfort:
"Inadmissível o recebimento da denúncia por crime falimentar se ultrapassado o prazo de quatro anos: dois desde a data em que deveria estar encerrada a falência, e mais dois específicos prescricionais. Manifesto o constrangimento ilegal derivado da movimentação da ação relativamente a crime prescrito, impõe-se a concessão de habeas corpus para sua anulação" (TJSP - HC - Rel. Des. Ary Belfort – RT 639/283). (11)
5. Considerações finais
Diante de todas as considerações expendidas, conclui-se que outro não pode ser o entendimento, senão o de que a prescrição da pretensão punitiva nos crimes falimentares se dá quatro anos após a declaração da falência, quando não encerrado o processo falimentar no prazo legal de dois anos.
Tal prazo é resultado de interpretação sistemática dos dispositivos que tratam da prescrição de tais crimes, contidos na própria Lei de Falências (Decreto-Lei 7.661/45), quais sejam, o artigo 199 e o par. primeiro do art. 132.
A prescrição da pretensão punitiva, por ser matéria de ordem pública, deve ser declarada logo que constatada pelo magistrado, e em qualquer fase do processo, e, se eventualmente o mesmo, após instado a declará-la, não o fizer, deve-se impetrar o remédio constitucional do habeas corpus, para que cesse incontinenti a coação ilegal que tal situação representa.
NOTAS
Referências bibliográficas
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