Sumário: Introdução – 1. Competência – conceito – 1.1. Competência absoluta e competência relativa – 1.2. Fixação da competência pela prevenção – 2. A prorrogação da competência – 2.1. Da prorrogação voluntária – 2.1.1. Foro de eleição – 2.2. Da prorrogação legal – 2.3. Conflitos de competência – 3. Da conexão – 4. Da continência – 5. O princípio da perpetuatio iurisdictionis – 6. Problemas especiais de competência – 6.1. Reunião de processos – causa já julgada – 6.2. Foro universal - o Juízo Universal e a concordata – 6.3. Reunião das ações: dever ou faculdade do juiz? – 7. Competência para as ações de execução fundadas em título executivo extrajudicial - foro do pagamento – 8. Ação civil pública - local do dano - Justiça Estadual e Federal nos crimes ambientais - Súmula 183-STJ – 9. Criação de nova Comarca – 10. Varas especializadas criadas – 11. Das Modificações da competência no Direito Comparado – 11.1. Direito Espanhol – 11.2. Direito Mexicano – 11.4. Direito Italiano e Alemão – 12. Notas conclusivas – Referências bibliográficas.
Introdução (1)
O presente trabalho tem por escopo analisar o instituto processual da modificação da competência e as hipóteses em que esta pode ocorrer, seja pela conexão, continência ou prorrogação.
Dando ênfase aos aspectos polêmicos e cercados de maior controvérsia doutrinária e jurisprudencial, tentaremos resumir os principais problemas enfrentados em matéria de competência em nossa legislação.
Abordaremos a competência absoluta e a competência relativa, as possibilidades de prorrogação da competência e as hipóteses em que esta se faz improrrogável e inderrogável.
Analisaremos as diferenças entre determinação e fixação da competência, o princípio da perpetuatio iurisdictionis e algumas regras de prevenção.
Procuraremos colocar em evidência, ainda que de forma breve e resumida, as divergências doutrinárias e jurisprudenciais quanto ao foro de eleição contratual, quanto ao foro do domicílio do réu e a competência nas hipóteses de execução de título extrajudicial, falências e concordatas e questões ambientais.
Enfocando a modificação da competência no direito brasileiro, reservaremos um capítulo para tratar, ainda que brevemente, de alguns de seus correspondentes institutos presentes na legislação estrangeira comparada.
1. Competência – conceito
A Competência vem regulada no Direito brasileiro pelos ar
tigos 86 e 87, do Código de Processo Civil. E as modificações da competência possuem previsão nos artigos 102 e seguintes, do mesmo estatuto procedimental.A terminologia utilizada pelo nosso legislador deriva do latim competentia, de competere (estar, no gozo ou no uso de, ser capaz, pertencer ou ser próprio). (2)
Competência é uma parcela da jurisdição. Pode ser entendida como Divisão da Jurisdição. A divisão, ditada por lei, define a competência de cada órgão judicante.
E a jurisdição, consoante assinalam ADA PELEGRINI GRINOVER, CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO E ANTONIO CARLOS DE ARAÚJO CINTRA, "é uma das funções do Estado, mediante a qual este se substitui aos titulares dos interesses em conflito para, imparcialmente, buscar a pacificação do conflito que os envolve, com justiça. Essa pacificação é feita mediante a atuação da vontade do direito objetivo que rege o caso apresentado em concreto para ser solucionado; e o Estado desempenha essa função sempre mediante o processo, seja expressando imperativamente o preceito (através de uma sentença de mérito), seja realizando no mundo das coisas o que o preceito estabelece (através da execução forçada)." (3)
Dessa assertiva podemos depreender a moderna concepção da jurisdição, não mais como a simples tradução da expressão "dizer o direito", mas sim, dar efetividade ao direito; aplicá-lo, segundo os preceitos objetivados no ordenamento jurídico, com justiça, apaziguando o conflito de interesses resistido e restabelecendo o equilíbrio social.
Debatendo a questão da competência e da jurisdição, PIERO CALAMANDREI assevera que a competência é, acima de tudo, uma determinação dos poderes jurisdicionais de cada um dos juízes e que o conceito de competência se desloca, assim, "por um fenômeno de metonímia: de medida subjetiva dos poderes do órgão judicial, passa a ser entendida, praticamente, como medida objetiva da matéria sobre a qual está chamado em concreto a prover o órgão judicial, se entendendo deste modo por competência de um juiz o conjunto de causas sobre as quais ele exercer, segundo lei, sua fração de jurisdição." (4)
E no seu artigo 114, o Código de Processo Civil brasileiro traz previsão acerca da possibilidade de que um juiz originalmente incompetente torne-se competente para apreciar a matéria, "quando o réu não opuser exceção declinatória do foro e do juízo, no caso e prazos legais". Isto se dá, de ordinário, apenas nos casos em que a competência é prorrogável, assim entendida a competência territorial, ressalvadas as exceções, quando se trata de competência territorial referente a foros regionais, quando não se prorroga.
Ao nos depararmos com tal situação, estaremos diante de hipótese de modificação da competência, temática central deste trabalho e cujos meandros passaremos a abordar a seguir.
Já a competência ratione materiae, que se fixa em razão da matéria, é improrrogável e inderrogável, mesmo por convenção das partes, conforme se verá mais adiante.
1.1. Competência absoluta e competência relativa
Segundo JOSÉ FREDERICO MARQUES, o moderno direito processual continua fiel à antiga dicotomia que distinguia a competência em absoluta e relativa. Explanando sobre essa temática, o autor se vale da conceituação de PAULA BATISTA, para quem a competência se considera: "absoluta, quando a matéria, de que se trata, entra nas atribuições do juiz; relativa, quando, dentre muitos juízes com iguais atribuições, um deles é competente para conhecer da causa na hipótese dada. A primeira nasce das leis de organização judiciária; a segunda pertence ao domínio do processo", acrescentando que só a competência relativa pode ser prorrogada, isto é, atribuída a outro juiz, que a princípio não era o competente. (5)
A competência absoluta, como visto, abrange a competência de ordem funcional e a competência em razão da matéria. A justiça federal tem competência de foro absoluta e sempre atrairá a competência, mesmo nos casos de conexão e continência.
Se a competência funcional não for observada, como por exemplo, na apreciação de causa da justiça comum pela justiça do trabalho, todos os atos praticados serão nulos e não admitirão convalidação.
Para GRINOVER, CINTRA e DINAMARCO, trata-se de competência absoluta, isto é, "competência que não pode jamais ser modificada. Iniciado o processo perante o juiz incompetente, este pronunciará a incompetência ainda que nada aleguem as partes (CPC, art. 113; CPP, art. 109), enviando os autos ao juiz competente; e todos os atos decisórios serão nulos pelo vício de incompetência, salvando-se os demais atos do processo, que serão aproveitados pelo juiz competente (CPC, art. 113, § 2º; CPP, art. 567)". (6)
Segundo observa JOSÉ FREDERICO MARQUES, "a competência de juízo é absoluta, quando os diferentes órgãos judiciários têm competência ratione materiae diversa. Isso quer dizer que a discriminação de atribuições contida nas leis de organização judiciária não admite a prorrogação, quer legal, quer voluntária". (7)
O Professor ANTONIO CARLOS MARCATO oferece-nos os contornos legais que impossibilitam a reunião de ações, em se tratando de justiças diversas, quando esclarece: "Considerando, por outro lado, que o vínculo de conexão ou a relação de continência entre ações acarreta a reunião dos respectivos processos perante um só órgão jurisdicional, objetivando o julgamento simultâneo de todos os pedidos deduzidos pelas partes, é fácil concluir-se que, mesmo havendo aquele vínculo e/ou relação entre processos que tramitem perante ‘Justiças’ diferentes, jamais será possível a sua reunião junto a um determinado órgão de qualquer delas, novamente em razão do óbice representado pela competência exclusiva e excludente já referida". (8)
Isto se dá porque as diferentes Justiças não possuem canais de comunicação, ou vasos comunicantes, como preferem alguns doutrinadores, quedando-se isoladas umas das outras. Da incomunicabilidade, resulta o caráter absoluto da incompetência.
Já a competência relativa, exige do réu a alegação expressa de declinação do foro, que se opera através da exceção de incompetência e, não a exercitando no prazo para defesa, ocorre a prorrogação, passando o juiz a ser competente.
A mudança de foro, por eleição pactuada pelas partes também é causa de modificação da competência, admitida, porém somente nas causas de cunho patrimonial. (9)
As exceções a esta regra de alterabilidade do foro, apontadas por JOSÉ FREDERICO MARQUES são: a) as causas de falência; b) das ações imobiliárias previstas no art. 95 do CPC, como insuscetíveis de modificação por vontade das partes; e c) de litígios ou causas em que intervenha a União. (10)
1.2. Fixação da competência por prevenção
A competência jurisdicional, para conhecer de determinado pedido deduzido em juízo, se fixa com a propositura da ação (CPC, art. 263) e com a prevenção (CPC, art. 219).
A prevenção, em primeiro grau de jurisdição, nos dizeres de ARRUDA ALVIM, "significa a fixação da competência, num dado juízo, através de ato concreto. A lei contém critérios para a fixação do momento da ocorrência da prevenção, nos arts. 219 e 106. Tem-se entendido que, se os juízos, que sejam considerados, na hipótese de discussão, não tiverem a mesma competência territorial, dá-se a prevenção pelo ato da citação (âmbito de abrangência do art. 219, à luz do art. 106); se tiverem, todavia, a mesma competência territorial – o que depende de exame da hipótese concreta – a prevenção ocorrerá no juízo em que se tenha verificado o despacho, na inicial, em primeiro lugar." (11)
Dessa ilação resulta a regra de que, proposta a inicial perante dois ou mais juízos com a mesma competência territorial, fixa-se a competência por prevenção daquele que primeiro despachou ordenando a citação. (12)
Mas não é qualquer despacho que previne a competência nas ações conexas. Somente o despacho positivo, determinando a citação, após efetuado o prévio juízo de admissibilidade quanto aos pressupostos processuais de validade e existência, que propiciarão o desenvolvimento válido e regular da ação (13).
Na inteligência da regra inscrita no art. 106 do CPC (14), doutrina e jurisprudência orientam-se no sentido de que a expressão despachar em primeiro lugar deve ser entendida como significando o despacho que ordenou a citação, porque contém manifestação positiva da regularidade inicial da demanda. (15)
Tal situação, deve-se observar, só terá lugar quando os juízes possuírem idêntica competência territorial e tendo em vista a junção de causas conexas.
Pode-se, então, indagar: como ficaria estabelecida a prevenção se ambos os juízes, na hipótese anterior, despacharem no mesmo dia? Neste caso, competente é o juízo onde se fez a primeira citação. (16)
A prevenção, portanto, "não se afigura como um critério de determinação da competência, porém, de fixação da competência, dentre órgãos cuja competência já estava determinada e era a mesma". (17)
Endossam este entendimento os professores GRINOVER, CINTRA e DINAMARCO, quando elucidam: "Por outro lado, a prevenção, de que fala freqüentemente a lei (CPC, arts. 106, 107 e 219; CPP, arts. 70, § 3º, 75, par. ún., e 83), não é fator de determinação nem de modificação da competência. Por força da prevenção permanece apenas a competência de um entre vários juízes competentes, excluindo-se os demais. Prae-venire significa chegar primeiro; juiz prevento é o que em primeiro lugar tomou contato com a causa." (18)
Em segundo grau de jurisdição, a prevenção se dá pelo conhecimento do recurso. ARRUDA ALVIM explicita que a Câmara que conhecer de um recurso acerca de determinada causa fica preventa para conhecer todos os outros recursos que venham a ser interpostos na mesma causa. (19)
2. A prorrogação da competência
Consoante se observou acima, ao tratarmos da competência relativa, por prorrogação da competência pode-se entender o deslocamento da competência de um para outro juízo, que passa a ser o competente para processar e julgar uma causa que, a princípio, não lhe era atribuída. Essa prorrogação pode ter duas naturezas distintas: a) decorrente da convenção das partes; b) decorrente de determinação de lei. (20)
As hipóteses de prorrogação nada têm a ver com os fatores que determinam a competência dos juízes.
Segundo o magistério de GRINOVER, CINTRA e DINAMARCO, "Competência é a ‘quantidade de jurisdição cujo exercício é atribuído a cada órgão ou grupo de órgãos’, ou seja: a esfera dentro da qual todos os processos lhe pertencem. Essa esfera é determinada por outras regras, não pelas que acabamos de ver. A prorrogação, ao contrário, determina a modificação, em concreto, na esfera de competência de um órgão (isto é, com referência a determinado processo): trata-se, assim, de uma modificação da competência já determinada segundo outros critérios."(grifos no original). (21)
Logo, quando se fala em prorrogação da competência, não se deve pensar em critérios de determinação da competência, visto que esta já foi determinada pelo ordenamento positivo, mas em simples problema de fixação da competência, que se desloca e se fixa em juízo diverso do que lhe estava determinado, em causas que envolvem matérias passíveis de conhecimento por mais de um juiz.
2.1. Da prorrogação voluntária
A doutrina situa no campo da prorrogação voluntária os casos de competência relativa, onde a prorrogação se opera pela ausência de argüição de incompetência por parte do réu. (22)
Provavelmente o faz calcada no entendimento de que, ao ajuizar a ação o autor escolhe um foro territorial diferenciado daquele no qual deveria ter proposto a demanda e o réu, ao não manifestar oposição a tal escolha, a aceita tacitamente, o que caracterizaria uma forma de manifestação de vontade, apesar de não expressa.
A jurisprudência, de ordinário, também atesta o mesmo posicionamento, conforme se infere do acórdão a seguir transcrito:
A norma no Art. 100, n. I, do Código de Processo Civil não é absoluta. Se a mulher não oferecer exceção de incompetência do juízo, em tempo hábil, a competência territorial estará prorrogada por vontade das partes. (AI 248.966, 25.2.76, 6ª CC TJSP, Rel. Des. Tomaz Rodrigues, in RT 492/107) - grifamos.
A nosso ver, entretanto, tal espécie de prorrogação da competência tem natureza mais punitiva, ou legal, do que convencional. Afigura-se mais como sanção à inércia do réu, que não a alegou no prazo para defesa, do que manifestação tácita de vontade, permitindo o processamento da causa em juízo diverso daquele que, originariamente, seria competente para apreciá-la.
Tanto é assim que, acaso lhe tenha passado desapercebida a incompetência relativa, deixando de deduzi-la como matéria de defesa em sede de exceção, ou pelo simples fato de não fazê-lo no prazo assinalado para a defesa, ou nas hipóteses de ter sido declarado revel, quando não apresentou qualquer defesa nos autos (hipóteses estas que poderiam, inclusive, ocorrer por falha de seu advogado), não poderá mais fazê-lo em nenhuma outra oportunidade, visto que se operará a preclusão temporal, convalidando a competência em relação ao juiz originalmente incompetente, a despeito dos prejuízos que tal prorrogação venham a lhe importar. Tal situação decorre da lei processual e não da vontade das partes. (23)
A convenção das partes, propriamente dita, só se faz possível em casos de competência relativa e em lides que apresentam cunho patrimonial e que não envolvam direitos indisponíveis. Sua principal modalidade é a eleição de foro em contrato, sendo lícito que as partes escolham o foro em que devam ser dirimidos os conflitos decorrentes do negócio ajustado, especialmente considerando-se a natureza relativa dessa competência. (24)
Alerta JOSÉ FREDERICO MARQUES, que quando se trata de competência em razão do valor, as partes podem eleger o foro competente, mas não a vara onde deva correr a ação, visto que certas varas ou juízos que detenham competência para julgar causas de até determinado valor, não poderão julgar as que o extrapolam. Só a situação inversa poderia ser admitida, segundo o autor. (25)
2.1.1. Foro de eleição
Em regra, a competência é preestabelecida pelo Código de Processo Civil, leis de divisão e organização judiciárias e pelos regimentos internos dos tribunais. A Constituição Federal, por sua vez, determina a jurisdição e não a competência.
Nas causas de cunho não-patrimonial, é vedada a eleição de foro, reputando-se a cláusula como não escrita.
Nas ações que envolvem direitos subjetivos de caráter patrimonial e disponível, onde impera a liberdade contratual privada, as partes contratantes podem fixar diversas regras jurídicas para reger a relação contratual, inclusive alterando as disposições ordinárias da legislação. O contrato, nesse âmbito, faz lei entre as partes e permite a modificação de alguns critérios processuais, dentre eles, a competência relativa, concernente à territorialidade.
Neste sentido, gizou o Tribunal de Justiça do Paraná:
Em se tratando de inadimplência contratual da qual resultara a perda da posse, cuja restituição ao possuidor indireto só poderá ocorrer após decretada a rescisão contratual, pois que tudo se assenta na verificação da existência, ou não, de ato ou omissão que tenha violado o contrato - permuta de imóveis - inexiste motivo de interesse de ordem pública, para impor-se a norma ínsita no Art. 95 do CPC, segundo a qual "nas ações fundadas em direito real sobre imóveis é competente o foro da situação da coisa", com sacrifício do foro convencionado entre as partes, vez que este é que deve preponderar e prevalecer, considerando-se que não se vai pesquisar sobre a prática de atos de posse e detenção sobre o bem imóvel de que se pretende a instituição, e sim, quanto à obrigação de restituir de quem violou o contrato em que se pretenda a respectiva posse. (AI 478/88, 21.2.89, 3ª CC TJPR, Rel. Des. Silva Wolff,. in ADV JUR 1989, p. 494, v. 45218).
A determinação da competência para julgamento das questões advindas do contrato, recebe a denominação de "eleição de foro" e é admitida pelo ordenamento jurídico pátrio.
A dúvida, no entanto, está em definir se, eleita a competência relativa para determinado foro, através de cláusula contratual, admitir-se-á ou não a propositura da ação em foro diverso e mais, se proposta a ação em foro diferente do eleito e não excepcionado o juízo, haverá ou não prorrogação da competência.
Vejamos o tratamento dado à matéria pelo Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul:
Tendo as partes, em escritura pública, escolhido foro especial para nele dirimirem as dúvidas e moverem ações resultantes do contrato, o foro eleito prepondera sobre o foro de residência e de domicílio do réu. Aplica-se no caso o disposto no art. 111 do CPC. As cláusulas contratuais devem ser interpretadas, visando atender a intenção das partes. em detrimento do sentido literal da linguagem, em obediência ao art. 85 do CC. (AI 1.822/88, "t", 1ª TC TJMS, Rel. Des. Alécio Antonio Tamiozzo, in DJ-MS n.º 2396, 15.9.88, p. 4).
A decisão em tela é apropriada às considerações que desejamos tecer acerca do assunto.
O foro de eleição, em princípio, vincula as partes e determina a competência, mas a fixação da competência não passa a ter uma regra diferenciada. Ocorre, como em todos os demais casos, nos moldes delineados pelo CPC, nos artigos 102 e seguintes.
Vale dizer que, para fazer valer o foro de eleição, a parte autora deverá propor a ação perante o mesmo e a parte ré, caso isso não ocorra, deverá excepcionar o juízo no prazo de lei, que é o prazo assinalado para a defesa ou resposta (CPC, art. 297).
A fixação da competência pende em sentido contrário, se isto não ocorrer, conforme se vê da decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo, que assinalou:
Prevenção. Ação cautelar proposta em comarca distinta da eleita no contrato questionado. Ausência de alegação oportuna. Prorrogação. Prevenção do juiz que conheceu a acessória para a apreciação da ação principal. (AI 69.871-2, 13.12.84, 11ª CC TJSP, Rel. Des. Odyr Porto, in JTJ 92/253). (26)
O foro de eleição, ou foro do contrato, possui força para deslocar a competência originalmente prevista para a ação, quando se trata de competência territorial e versa sobre direitos patrimoniais disponíveis.
Não exclui, porém, a possibilidade de opção do autor pelo foro do domicílio do réu, já que, em regra, nenhum prejuízo traz para este ser demandado em seu próprio domicílio. O foro de eleição é obrigatório para as partes que a ele devem sujeitar-se.
Quando, porém, a cláusula de eleição do foro estiver contida em contrato de adesão, sua validade torna-se controversa. A jurisprudência tem reputado válida a eleição de foro por intermédio de cláusula inserta em contrato de adesão, desde que esta não se mostre abusiva, ou seja, que não constitua qualquer espécie de obstáculo para a parte, especialmente quando se trata da parte hipossuficiente no contrato.
O autor também pode eleger unilateralmente o foro, quando a lei facultar-lhe a opção por mais de um foro para a propositura da ação. É por tal razão que, mesmo ante a existência de foro de eleição, se o autor escolher demandar no foro do réu, este será o competente. (27)
Aliás, a jurisprudência tem por pacificada a possibilidade de o autor optar pelo foro do réu, privilegiando este em detrimento do foro de eleição contratual, senão vejamos:
O foro de eleição por cláusula contratual não obsta a propositura da ação no foro do domicílio do réu, não cabendo a este excepcionar o juízo. (AI 239.555, 22.11.77, 6ª C 1º TACSP, Rel. Juiz Paula Bueno, in RT 508/151).
Mesmo havendo eleição de foro, não fica a parte inibida de propor a ação no domicílio da outra, desde que não demonstrado prejuízo. A pessoa jurídica de direito privado pode ser demandada no domicílio da agência ou estabelecimento em que praticou o ato - Súmula 363-STF. O processo constitui instrumento à disposição das partes para o debate e solução de seus conflitos. Razões de conveniência e comodidade recomendam o desprezo do foro eleito em favor de outro, em certas circunstâncias. com apoio na regra do Art. 100, IV, "b", CPC. (AI 107.210-6, 27.3.92, 2ª CC TAMG, Rel. Juiz João Quintino, in ADV JUR, 1992, p. 286, v. 58316).
Foros concorrentes. Foro de eleição e especial. Escolha a cargo do autor da ação, por ocasião de sua propositura, firmada, então, a competência territorial, que não mais poderá ser modificada. Aplicação dos arts. 42 e 111 do CPC e da Súmula 335 do STF. (Ap. 428.928-9, 28.3.90, 2ª C 1º TACSP, Rel. Juiz Rodrigues de Carvalho, in RT 659/112).
Vê-se, portanto, que a eleição de foro tem o condão de transferir, validamente, a competência territorial, nas causas de natureza patrimonial, para o foro de livre escolha das partes, que passa a valer em detrimento do foro previsto em lei, não obstante possa o autor optar, na existência de mais de um foro, por demandar no foro do domicílio do réu, hipótese que, a rigor, não comporta exceção declinatória, por ser mais vantajosa para o demandado.
2.2. Da prorrogação legal
A prorrogação legal constitui espécie em que a modificação da competência decorre da lei, nos casos que o Código expressamente estabelece, como na hipótese de verificar-se conexão ou continência, nas quais ocorre um desvio de competência, obrigando uma ação sobre a qual o juiz não tem competência, a se juntar a outra de sua competência, para propiciar o julgamento simultâneo e harmônico dos processos.
Entendemos, no entanto, que o conceito de prorrogação legal pode ser mais amplo, alcançando, também, as hipóteses de prorrogação dita convencional, decorrentes da ausência de excepcionamento tempestivo do juízo territorialmente incompetente (que preferimos denominar de prorrogação preclusiva).
O artigo 102 do CPC assevera que a competência poderá ser modificada em razão da conexão ou da continência, quando prorrogável, ou seja, em se tratando de competência relativa.
As hipóteses de conexão e continência serão estudadas individual e detalhadamente mais a seguir.
2.3. Conflitos de competência
Não se faz incomum, na prática, que dois ou mais juízes se dêem por competentes para um mesmo processo, ou, ao contrário, se entendam incompetentes para apreciar a causa.
Para disciplinar essa ocorrência possível e corriqueira, o Código de Processo Civil cuidou de regular a matéria nos art. 115 a 124, através do incidente denominado "conflito de competência".
O conflito de competência, portanto, pode ser positivo ou negativo. Será positivo quando ambos os juízes assinalarem sua competência para o feito e, negativo, quando a controvérsia versar sobre a afirmação de incompetência por parte de ambos.
Vejamos a jurisprudência:
33151776 – PROCESSUAL CIVIL CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA – JUIZ DA MESMA BASE TERRITORIAL DE JURISDIÇÃO – EXECUÇÃO E ANULATÓRIA DE DÉBITOS FISCAIS, PREJUDICIALIDADE – VARA ESPECIALIZADA EM EXECUÇÕES FISCAIS – 1. A competência em razão da matéria não se modifica pela conexão ou continência. 2. Ação Anulatória de débito fiscal deve ser processada na Vara Cível, não especializada, para onde foi distribuída, ainda que na Vara de Execuções esteja em trâmite o respectivo processo executivo" (CC 93.01.3703-3/DF; Rel. Juiz Eustáquio Silveira, DJ de 17.02.94, un., Plenário TRF/1ª Região). 3. No caso, a relação entre as demandas é de prejudicialidade. 4. Conhecimento do conflito. (TRF 1ª R. – CC 01000666862 – DF – 2ª S. – Rel. Juiz Hilton Queiroz – DJU 14.08.2000 – p. 08 - in Juris Síntese Millenium, n.º 31/2001)
A regra insculpida no artigo 116, do CPC, permite que os conflitos de competência possam ser suscitados por qualquer das partes envolvidas na ação original, pelo Ministério Público ou pelos juízes, cuja competência ou incompetência queiram ver declarada.
O conflito de competência será encaminhado ao Presidente do Tribunal hierarquicamente superior aos magistrados conflitantes, que julgará o conflito, decidindo qual o juiz competente para a causa e pronunciar-se-á, igualmente, sobre a validade dos atos até então praticados pelo juiz incompetente, conforme estabelece o CPC em seu art.122.