Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br

Previdência complementar fechada: inaplicabilidade da súmula nº 321 do STJ

Agenda 18/02/2015 às 16:57

O objetivo deste trabalho é mostrar que a Súmula nº 321 do STJ não se aplica às entidades de previdência complementar fechadas pois seu enunciado refere-se tão somente à relação jurídica entre as entidades de previdência privada e seus participantes.

O objetivo deste trabalho é mostrar que a Súmula nº 321 do STJ não se aplica às entidades de previdência complementar fechadas pois seu enunciado refere-se à relação jurídica entre as entidades de previdência privada e seus participantes, de um modo geral, sem fazer qualquer distinção entre as entidades de previdência complementar abertas e fechadas.

Iniciando a explanação, cumpre destacar que o artigo 202 da Constituição Federal, que dispõe sobre o regime de previdência privada, de caráter complementar, estabelece o seguinte: 

“Art. 202. O regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social, será facultativo, baseado na constituição de reservas que garantam o benefício contratado, e regulado por lei complementar.

§ 1° A lei complementar de que trata este artigo assegurará ao participante de planos de benefícios de entidades de previdência privada o pleno acesso às informações relativas à gestão de seus respectivos planos.

§ 2° As contribuições do empregador, os benefícios e as condições contratuais previstas nos estatutos, regulamentos e planos de benefícios das entidades de previdência privada não integram o contrato de trabalho dos participantes, assim como, à exceção dos benefícios concedidos, não integram a remuneração dos participantes, nos termos da lei.

§ 3º É vedado o aporte de recursos a entidade de previdência privada pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios, suas autarquias, fundações, empresas públicas, sociedades de economia mista e outras entidades públicas, salvo na qualidade de patrocinador, situação na qual, em hipótese alguma, sua contribuição normal poderá exceder a do segurado.

§ 4º Lei complementar disciplinará a relação entre a União, Estados, Distrito Federal ou Municípios, inclusive suas autarquias, fundações, sociedades de economia mista e empresas controladas direta ou indiretamente, enquanto patrocinadoras de entidades fechadas de previdência privada, e suas respectivas entidades fechadas de previdência privada.

§ 5º A lei complementar de que trata o parágrafo anterior aplicar-se-á, no que couber, às empresas privadas permissionárias ou concessionárias de prestação de serviços públicos, quando patrocinadoras de entidades fechadas de previdência privada.

§ 6º A lei complementar a que se refere o § 4° deste artigo estabelecerá os requisitos para a designação dos membros das diretorias das entidades fechadas de previdência privada e disciplinará a inserção dos participantes nos colegiados e instâncias de decisão em que seus interesses sejam objeto de discussão e deliberação.” (negritamos)

Conforme se verifica da transcrição do artigo 202, a Constituição Federal ditou as premissas nas quais deveria pautar-se a futura lei complementar que regeria o regime de previdência complementar quanto aos regramentos de instituição, organização e regulação, tanto das entidades públicas como das privadas, que até então eram regidos pela Lei nº 6435/77.

Para concepção deste regime, em 29 de maio de 2001, o Congresso Nacional editou a Lei Complementar nº 109 que passou a dispor sobre o regime de previdência complementar bem como o regramento de seus planos de benefícios.

De início, vale observar que o artigo 1o desta lei estabeleceu que “o regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social, é facultativo, baseado na constituição de reservas que garantam o benefício, nos termos do caput do art. 202 da Constituição Federal, observado o disposto nesta Lei Complementar”.

Importante ressaltar, ainda, que os artigos 4º e 5º da referida lei impuseram a classificação das entidades de previdência complementar em abertas e fechadas, bem como impuseram que a normatização, coordenação, supervisão, fiscalização e controle destas atividades fossem realizados por órgão ou órgãos reguladores e fiscalizadores, conforme disposto na lei, observado o inciso VI do art. 84 da Constituição Federal.

Em relação aos planos de benefícios instituídos por entidades tais, o legislador cuidou para que as entidades de previdência complementar somente pudessem instituir e operar planos para os quais tivessem autorização específica, segundo as normas aprovadas pelo órgão regulador e fiscalizador, conforme preconiza a Lei Complementar.

Como se vê, o legislador não só dispôs sobre a criação das entidades de previdência complementar como delineou todo o regramento de instituição, organização, regulação e fiscalização destas entidades assim como dos planos de benefícios por elas instituídos e operados de forma a estabelecer um rígido sistema de controle sobre este regime.

Diante disto, o art. 7º da Lei Complementar 109/01 determinou que:

“Art. 7o Os planos de benefícios atenderão a padrões mínimos fixados pelo órgão regulador e fiscalizador, com o objetivo de assegurar transparência, solvência, liquidez e equilíbrio econômico-financeiro e atuarial.”

Além disso, ante a classificação legal das entidades em abertas e fechadas, de uma análise sistemática do diploma legal em apreço, verifica-se que foram estabelecidas as disposições comuns e também as características próprias de cada tipo de entidade.

Em relação aos planos de benefícios por ela operados, definiu na seção II, dos artigos 12 a 25 as regras de organização das entidades fechadas e na seção III, dos artigos 26 a 30 as regras de organização das entidades abertas.

Destaque-se que, no artigo 12, ao dispor sobre os planos de benefícios das entidades fechadas, o legislador reportou-se ao artigo 31 que possui o seguinte conteúdo:

“Art. 31. As entidades fechadas são aquelas acessíveis, na forma regulamentada pelo órgão regulador e fiscalizador, exclusivamente:

I - aos empregados de uma empresa ou grupo de empresas e aos servidores da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, entes denominados patrocinadores; e

II - aos associados ou membros de pessoas jurídicas de caráter profissional, classista ou setorial, denominadas instituidores.

§ 1o As entidades fechadas organizar-se-ão sob a forma de fundação ou sociedade civil, sem fins lucrativos.

§ 2o As entidades fechadas constituídas por instituidores referidos no inciso II do caput deste artigo deverão, cumulativamente:

I - terceirizar a gestão dos recursos garantidores das reservas técnicas e provisões mediante a contratação de instituição especializada autorizada a funcionar pelo Banco Central do Brasil ou outro órgão competente;

....omissis....

        § 3o Os responsáveis pela gestão dos recursos de que trata o inciso I do parágrafo anterior deverão manter segregados e totalmente isolados o seu patrimônio dos patrimônios do instituidor e da entidade fechada.” (negritamos)

Por outro lado, ao dispor sobre os planos de benefícios instituídos por entidades abertas e sua natureza jurídica dispôs:

“Art. 26. Os planos de benefícios instituídos por entidades abertas poderão ser:

I - individuais, quando acessíveis a quaisquer pessoas físicas; ou

II - coletivos, quando tenham por objetivo garantir benefícios previdenciários a pessoas físicas vinculadas, direta ou indiretamente, a uma pessoa jurídica contratante.” (negritamos)

..................

Art. 36. As entidades abertas são constituídas unicamente sob a forma de sociedades anônimas e têm por objetivo instituir e operar planos de benefícios de caráter previdenciário concedidos em forma de renda continuada ou pagamento único, acessíveis a quaisquer pessoas físicas.” (negritamos)

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

Como se vê, os planos de previdência privada, fechados ou abertos, são baseados na constituição de reservas garantidoras dos benefícios contratados, é garantido o pleno acesso às informações relativas à gestão de seus respectivos planos de forma a assegurar transparência, solvência, liquidez e equilíbrio econômico-financeiro e atuarial.

A previdência privada fechada é operacionalizada pelas entidades fechadas de previdência complementar (EFPC), chamadas de fundos de pensão, que são obrigatoriamente organizadas sob a forma de fundação ou associação civil, sem fins lucrativos, as quais administram planos de benefícios custeados por uma empresa ou grupo de empresas (patrocinadoras) e pelos seus funcionários (participantes).

Portanto, não é aberta à participação de outras pessoas que não aquelas que possuam um vínculo jurídico com o patrocinador do plano de benefícios e tem características diferentes de uma empresa para outra.

Por outro lado, a previdência privada aberta é operacionalizada por bancos, seguradoras e entidades abertas de previdência complementar (EAPC), organizadas unicamente sob a forma de sociedades anônimas.

Assim, verifica-se nítida distinção feita pelo legislador entre a natureza jurídica e forma de instituição dos planos de benefícios operados pelas entidades abertas e fechadas, pois as entidades fechadas devem obrigatoriamente ser organizadas sob a modalidade de fundação ou sociedade civil, sem fins lucrativos, ao passo que as entidades abertas devem ser constituídas unicamente sob a forma de sociedades anônimas, acessíveis a quaisquer pessoa física, indistintamente.

Da análise do diploma legal em comento, de se notar, o maior rigor com que são tratadas as entidades fechadas onde os responsáveis pela gestão dos recursos deverão manter segregados e totalmente isolados o seu patrimônio do patrimônio do instituidor e da entidade fechada, conforme § 3º, art. 31, LC 109/01.

Com esta breve exposição buscou-se demonstrar que, embora o legislador tenha criado um regime de previdência complementar, para a operacionalização deste regime criou duas espécies de entidades distintas, com regras de operacionalização e organização próprias.

Por esta razão é que afirmamos que, ao se cogitar da aplicabilidade da Súmula 321 do STJ às entidades fechadas, é necessária uma análise mais detida dos conceitos e características próprias de cada uma destas entidades.

A  Súmula nº 321 do STJ tem o seguinte teor:

“O Código de Defesa do Consumidor é aplicável à relação jurídica entre a entidade de previdência privada e seus participantes”.

Ao se fazer uma interpretação mais atenta aos dispositivos legais acima expostos, verifica-se que o enunciado da Súmula 321 do STJ incorreu em equívoco pois, por serem as entidades de previdência privada divididas em duas categorias distintas, abertas e fechadas, e, inclusive, com regramentos, conceitos e definições próprios para cada um de seus planos de benefícios, essas entidades não podem receber o mesmo tratamento jurídico.

É de se notar que a súmula, ao ser editada no âmbito do Poder Judiciário, deve observar os parâmetros constitucionais e infraconstitucionais estabelecidos pelo Poder Legislativo.

Sobre a possibilidade de atuação da súmula no mundo jurídico, vale destacar trecho de artigo publicado por Rodrigo Paladino Pinheiro[1], que preleciona:

“A súmula é uma construção jurisprudencial, criada a partir do dinamismo das relações de direito.

A palavra súmula tem significação de “sumário” ou “resumo” e origina-se do latim summula, refere-se ao teor reduzido ou abreviado de um julgado ou enunciado jurisprudencial que reflete entendimento pacífico de determinado tribunal.

Desta forma, representam a formalização pelos tribunais de seus entendimentos em consonância quanto à matéria tratada, visto a exigência de que a uniformização ocorra através do voto da maioria absoluta dos membros do colegiado em questão, conforme o artigo 479 do Código de Processo Civil.

“Art. 479. O julgamento, tomado pelo voto da maioria absoluta dos membros que integram o tribunal, será objeto de súmula e constituirá precedente na uniformização da jurisprudência.”

Nesse sentido Streck define a súmula como:

“[...] o resultado da jurisprudência predominante de um tribunal superior brasileiro, autorizado pelo Código de Processo Civil.”

Aqui, segundo Streck, para prever a emissão de súmulas, objetiva o legislador “proporcionar maior estabilidade à jurisprudência e simplificar o julgamento das questões mais frequentes perante o Judiciário”.

Entretanto, segundo Accioly Filho as leis já carecem de flexibilização, de modo que endurecer sua interpretação, através de proposituras dificilmente afastáveis, seria abrir mão do pouco deixado pelo sistema para a modelação do direito positivo de acordo com cada caso concreto.

No mesmo sentido, Carlos Maximiliano:

“Em virtude da lei do menor esforço e também para assegurar os advogados o êxito e aos juízes inferiores a manutenção de suas sentenças, do que muito se vangloriam, preferem, causídicos e magistrados, às exposições sistemáticas da doutrina jurídica os repositórios da jurisprudência.”

Com muita propriedade Alfredo Buzaid oferece uma significativa definição de súmula traçando um paralelo com a lei:

“Uma coisa é a lei; outra, é a súmula. A lei emana do poder legislativo. A súmula é uma apreciação do poder judiciário, que interpreta a lei em sua aplicação aos casos concretos. Por isso a súmula pressupõe sempre a existência da lei e a diversidade de sua exegese. A lei tem caráter obrigatório; a súmula revela-lhe o seu alcance, o sentido e o significado, quando ao seu respeito se manifestam simultaneamente dois ou mais entendimentos. Ambas tem caráter geral. Mas o que distingue a lei da súmula é que esta tem caráter jurisdicional e interpretativo. É jurisdicional, porque emana do Poder Judiciário;é interpretativo, porque revela o sentido da lei; cinge-se a aplicá-la, o que significa que é a própria voz do legislador.

Se não entender assim, se a interpretação refugir ao sentido real da lei, cabe ao legislador dar-lhe interpretação autêntica.

A súmula não comporta interpretação analógica.”

4. Conclusão

Indiferente a divergentes posicionamentos doutrinários, temos que as súmulas, sobre os operadores do direito, possuem forte influência, beirando o próprio poder normativo. Faria cria o termo “controlabilidade difusa” para descrever a característica da atividade Jurisdicional de exercer ascendência aos futuros julgadores, e é essa própria ascendência que motiva a criação e a utilização das súmulas, tanto pelos operadores originários do direito – advogados – quanto pelos magistrados em suas decisões, uma vez que o escopo do instituto, como já salientado, visa a uniformização das decisões, buscando uma prestação jurisdicional mais justa para com os seus jurisdicionados por assim dizer.

Aliás, o tema já foi objeto de trabalho realizado por Ivy Cassa[2] que, do qual destaca-se o trecho abaixo:

“4.4- Principais equívocos cometidos pelos magistrados em matéria de previdência privada

Ilustraremos neste tópico algumas decisões jurisprudenciais equivocadas, que demonstram a necessidade de especialização do julgador em matéria de previdência privada.

A jurisprudência em matéria de previdência privada não é assaz rica – possivelmente pelo fato de legislação ser relativamente jovem e, consequentemente, de ainda não ter havido tempo para grandes reflexões sobre o assunto.

Das decisões jurisprudenciais em matérias de fundos de pensão, são dois os temas de maior relevância: (i) aplicação do Código de Defesa do Consumidor (CDC) e (ii) condenação no pagamento de expurgos inflacionários.

Para que não nos distanciemos do tema objeto deste capítulo, ainda que a matéria seja de suma importância, restringiremo-nos apenas a breves comentários a respeito de cada um.

A respeito da aplicação do CDC, a doutrina é uníssona(45) ao afirmar que não há cabimento no que tange às entidades fechadas, já que, pela sua natureza, não se configura relação de consumo.

Contudo, a jurisprudência não é unânime e o próprio Superior Tribunal de Justiça (STJ), por meio da Súmula n° 321, estabeleceu que “o Código de Defesa do Consumidor é aplicável à relação jurídica entre a entidade de previdência privada e seus participantes” não distinguindo, assim, as entidades fechadas das abertas.

Trata-se de enorme equívoco, pois as reservas dos planos das EFPCs, como vimos, são totalmente comprometidas com as obrigações estabelecidas em Regulamento. Eventual decisão que determine interpretação mais benéfica em favor de um participante, sem que o respectivo valor tenha previsão nas regras regulamentares teria um só efeito: desequilibrar o plano previdenciário, prejudicando, por consequência, toda a massa de participantes em detrimento de uma única pessoa.

“45 pelas características específicas da associatividade, atuação efetiva do participante, ausência de finalidade lucrativa, grupo restrito de beneficiários, etc – não pode tal atividade ser comparada com aquelas prestadas em âmbito no mercado, seguindo a lógica da perseguição do lucro, em que a atividade empresarial em busca da remuneração do capital pode ser proporcional ao risco envolvido na iniciativa.”(MESSINA, Roberto Eiras. Da não submissão da atividade de prestação de serviços assistências de saúde das Entidades Fechadas de Previdência Complementar ao Código de Defesa do Consumidor. In Revista do 22º Congresso dos Fundos de Pensão – ABRAPP. Espírito Santo: 2001. PP. 174-184.)

“o Código de Defesa do Consumidor está intimamente vinculado à comercialização de produtos e serviços, ao seu fornecimento e à sua distribuição no mercado de consumo com finalidade lucrativa, o que definitivamente não ocorre com as entidades fechadas.”( CASSA, Ivy. Op. Cit, p. 240.)

“O Código de Defesa do Consumidor tem suas peculiaridades no tratamento legal entre consumidor e fornecedor de produtos e serviços na cadeia econômica. Tal legislação não se coaduna com as especificidades próprias do ordenamento jurídico específico aplicável às entidades fechadas de previdência complementar, voltado para o equilíbrio dos planos de custeio dos planos de benefícios, calcados em rígidas bases atuariais e considerando a sua adequada operacionalização.” (AVENA, Lygia. As entidades fechadas e o Código de Defesa do Consumidor in REIS, Adacir, Fundos de Pensão – Aspectos Jurídicos Fundamentais, 2ª Ed. São Paulo: ABRAPP/ICSS/SINDAPP, 2009. P. 81)”

Deste modo, se o próprio legislador distinguiu as espécies de entidades de previdência complementar, em abertas e fechadas, certamente é porque a elas não cabe o mesmo tratamento jurídico como pretendeu dar a Súmula 321 do STJ.

Histórico da Súmula 321

Sabe-se que a Súmula 321 do Superior Tribunal de Justiça, foi julgada pela Segunda Seção em 23 de novembro de 2005, publicada do Diário da Justiça em 05 de dezembro de 2005, com os seguintes dizeres:

O Código de Defesa do Consumidor é aplicável à relação jurídica entre a entidade de previdência privada e seus participantes”.

Roberto Eiras Messina, em artigo publicado em 31/07/2013, no site: www.previdenciaemdebate.com.br/artigos/, ensina que para buscar entendimento e o sentido de uma Súmula, conveniente buscar sua origem e como se dá o processamento de uma súmula, perante o Superior Tribunal de Justiça, o que se encontra em seu Regimento Interno.

 É de se observar que a Súmula 321 foi originada de um julgamento da 2ª Seção (envolvendo, pois, a 3ª e 4ª Turmas) do STJ. Em relação às Seções, o referido Regimento Interno dispõe:

“Art. 12. Compete às Seções processar e julgar:

........

Parágrafo único: Compete, ainda, às Seções:

....

III – sumular a jurisprudência uniforme das Turmas da respectiva área de especialização e deliberar sobre a alteração e o cancelamento de súmulas.”

Aceitando-se a competência da 2ª Seção para julgar sobre a expedição da referida Súmula 321, sugere-se que o passo seguinte a ser tomado por aquele Órgão Julgador seria a constatação de efetiva uniformidade de entendimento sobre a matéria, o que claramente deveria restar evidenciado da análise dos casos trazidos à solução judicial.

 Conforme anotado no registro de expedição da Súmula, seu julgamento ancorou-se em 5 (cinco) Recursos Especiais, a saber:

 1.   RESP 591.756-RS –  j. 07/10/2004 – Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito;

2.   RESP 306.155-MG – j. 19/11/2001, Rel. Mina. Fátima Nancy Andrighi;

3.   RESP 119.267-SP -  j. 04/11/1999, Rel. Min. Aldir Passarinho Júnior;

4.   RESP 600.744-DF –  j. 06/05/2004, Rel. Min. Castro Filho;

5.   RESP 567.938-RO – j. 17/06/2004, Rel. Min. Castro Filho.

 Dos precedentes acima, é de se destacar que os julgados nos números 1 e 3 correspondem a feitos promovidos em face de entidades abertas de previdência complementar, sendo os demais 2, 4 e 5 correspondentes a feitos promovidos em face de entidades fechadas de previdência complementar.

 Segundo Roberto Eiras Messina, desejavelmente, já por esta razão inicial caberia considerar uma análise repartida do tema antes da expedição de Súmula eis que apresentados elementos suficientes a demonstrar a distinção existente – e que não é pequena – entre entidades fechadas de previdência complementar e entidades abertas de previdência complementar, o que parece não ter sido previamente feito antes de seu julgamento.

 Há de ser considerado ainda que é exigência do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça que o órgão julgador, no caso a 2ª Seção, expresse posição uniforme das Turmas julgadoras da matéria, no caso a 3ª e 4ª Turmas.

 Daí, conclui-se que dos 5 (cinco) acórdãos, tidos como paradigmas, apenas 1 (um) é egresso da 4ª Turma, coincidentemente um julgado proferido em face de entidade aberta de previdência complementar (RESP 119.267-SP), o que leva a acreditar que não se deu o confronto de situações, na formação da Súmula, uma vez que os precedentes vinculados às entidades fechadas de previdência complementar foram julgados apenas pela 3ª Turma, sendo assim, não há o que se falar em “jurisprudência uniforme das Turmas”.

 De uma análise mais aprofundada dos julgados referido, percebe-se que apenas em um deles – o RESP 306.155-MG – promove-se uma análise mais detida da matéria de previdência complementar.

Há de considerar ainda que o RESP 306.155-MG, foi julgado poucos meses após a entrada em vigor da LC 109/01, o que percebe-se, que não houve um amadurecimento do tema, ou seja, uma consolidação jurisprudencial, o que nas palavras de Carlos Maximiliano, denomina-se jurisprudência “a decisão constante e uniforme dos tribunais sobre determinado ponto de Direito”.

 Carlos Maximiliano, citando Geinrich Gerland, diz que “os julgados constituem bons auxiliares de exegese, quando manuseados criteriosamente, criticados, comparados, examinados à luz dos princípios, com os livros de doutrina, com as exposições sistemáticas do Direito em punho. A jurisprudência, só por si, isolada, não tem valor decisivo, absoluto. Basta lembrar que a formam tanto os arestos brilhantes, como as sentenças de colégios judiciários onde reinam a incompetência e a preguiça”.

Daí há de se destacar que não havia ao tempo da edição da Súmula decisões constantes e uniformes dos tribunais sobre a questão de Direito que deu origem a formação do sumulado, salientando que a jurisprudência, nas lições de Carlos Maximiliano “é a fonte mais geral e extensa de exegese, indica soluções adequadas às necessidades sociais, evita que uma questão doutrinária fique eternamente aberta e dê margem a novas demandas: portanto diminui os litígios, reduz ao mínimo os inconvenientes da incerteza do Direito, porque de antemão faz saber qual será o resultado das controvérsias”.

Conforme visto percebe-se, as disposições do Código de Defesa do Consumidor não podem ser aplicadas às entidades fechadas de previdência complementar até pelo fato de não existir relação de consumo entre os participantes e a entidade operadora dos planos de benefícios.

Destaque-se, inclusive, conforme anteriormente exposto, segundo sua lei regedora, as entidades fechadas de previdência complementar devem, necessariamente, ser instituídas sob a forma de fundação ou associação civil, sem fins lucrativos e elas só podem oferecer os planos de benefícios que operam às pessoas que possuam uma relação de emprego com o patrocinador do plano.

Assim, vale mencionar que os planos de benefícios operados pelas entidades de previdência privada fechada são restritos aos empregados de uma empresa ou grupo de empresas que possuam uma relação jurídica com o patrocinador da entidade, de forma isolado do contrato de trabalho, e não ao mercado em geral.

Demais disto, conforme acima exposto, os planos de benefícios operados pelas entidades fechadas não podem ser considerados uma relação de consumo porque as reservas dos planos das EFPCs, são totalmente comprometidas com as obrigações estabelecidas em Regulamento e, eventual interpretação mais benéfica em favor de um participante, sem que o respectivo valor tenha previsão nas regras regulamentares teria o efeito de minar o equilíbrio econômico-financeiro e atuarial do plano previdenciário, prejudicando, por consequência, toda a massa de participantes em detrimento de uma única pessoa.

Além disso, destaque-se também que a lei complementar prevê a inserção dos participantes nos colegiados e instâncias de decisão em que seus interesses sejam objeto de discussão e deliberação o que descaracteriza, por completo, a relação de consumo.

Tanto é assim que, visando preservar a solvência dos planos de benefícios, o CGPC – Conselho de Gestão da Previdência Complementar, pela Resolução nº 26, estipulou a adoção de várias medidas previamente não só quanto à destinação do superávit, como também ao déficit apurado nos planos.

A Resolução determina que, quando há déficit apurado nos planos, participantes, assistidos e patrocinadores serão chamados a arcar com o equacionamento do déficit, segundo a Resolução, a qual estipulou, de forma análoga ao superávit, aumento de contribuição, redução do benefício a conceder e a cobrança de contribuição adicional, como formas de reequilíbrio do plano previdenciário.

Por tais razões, entendo que a Súmula 321 do STJ não se aplica às entidades de previdência complementar fechadas.


BIBLIOGRAFIA

[2] CASSA, Ivy, in, 4º Prêmio PREVIC (PREVIC – Superintendência Nacional de Previdência Complementar) de Monografias: Previdência Complementar Fechada, Brasília : MPS, Previc, 2011

Sobre o autor
Sérgio Reis Gusmão Rocha

Advogado mestre em Direito Previdenciário pela PUC/SP, especialista em Direito Previdenciário pela Escola Paulista de Direito, especialista em Direito Processual Civil pela Universidade Braz Cubas, Diretor da Comissão de Direito Previdenciário da 103ª Subseção da Ordem dos Advogados do Brasil - Vila Prudente São Paulo - Capital.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!