Kelsen, afirma que a teoria das lacunas do direito é totalmente errônea com base na ideia de que a falta de norma no ordenamento jurídico é na verdade uma imprevisão legislativa, uma vez que não é possível prever as ações humanas futuras. Ou seja, é plenamente possível e lógico o legislador não normatizar determinada consequência para um determinado fato se esse não ocorreu, e tão pouco foi previsto pelo legislador. Dessa maneira, cabe aos tribunais, aos juízes o poder de legislar.
Frisa-se que diante do principio da principio da inafastabilidade da jurisdição, o poder judiciário é obrigado a efetivar o pedido de prestação judicial formulado pela parte quando houver plausibilidade de ameaça de direito. Assim, toda a violação de um direito deve ter uma ação correlativa, independentemente de lei especial outorgada. Daí surge a permissibilidade do juiz legislar a norma, essa possibilidade é devido ao fato de existir uma norma prevista para isso.
Se a lei permite ao juiz, como diz o artigo 1°, acima mencionado, no caso de uma “lacuna”, tomar uma decisão como o faria se fosse legislador, isso significa uma autorização, ao juiz, se considerar a aplicação da lei intolerável, de julgar por seu próprio arbítrio em lugar da lei. (KELSEN, p.123, 2003).
Kelsen cita como exemplo o artigo 6° do código civil austríaco e o art. 1° código civil suíço, de igual sentido é a lei de introdução ao código civil brasileiro onde em seu artigo 4° permite ao juiz decidir de acordo a analogia, costumes e os princípios gerais do direito quando se tratar de lei omissa. Dessa forma, o juiz jamais pode alegar obscuridade da lei e deixar de apreciar um caso concreto.
Não obstante, a decisão jurisdicional interpretada como norma jurídica eficaz a ser aplicada naquele caso concreto, a qual servirá de precedente para casos análogos, para Kelsen não pode ser interpretada como consequência da falta de uma norma (lacuna jurídica), diante da ideia de que se não há uma norma proibindo determinada conduta é porque o ordenamento jurídico presumidamente permite tal conduta, o que não foi proibido é porque até aquele momento o legislador o permitiu. Sentido esse da escola da exegese, o direito está isento de lacunas.
O ordenamento jurídico não contém apenas a preposição de que se está obrigado a determinada conduta (enquanto a negação dessa conduta for estabelecida como condição da especifica consequência antijurídica), mas também a preposição: (a pessoa) está livre e fazer ou não fazer aquilo a que não está obrigada. Esta norma negativa é a que se aplica numa decisão, na qual se nega se nega uma pretensão, dirigida a uma conduta não convertida em dever. (KELSEN, p.120, 2003).
Logo, para Hans Kelsen, as lacunas que são vistas como falha do ordenamento jurídico pela maioria dos juristas, em verdade são permissibilidades implícitas no mesmo, ele denomina essa situação de norma negativa, nenhuma pessoa poderá ser forçada a observar a conduta à qual não está obrigada pelo Direito. Portanto, é dever do interprete (juiz) tornar explicito aquilo que já está implícito na mente do legislador.
REFERÊNCIAS
KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito: introdução à problemática do direito; tradução de J. Cretella Jr.., Agnes Cretella. 3° Ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003.