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Quem é o criminoso?Como se dá a criminalização de um indivíduo

Agenda 03/07/2015 às 16:33

O assunto do presente artigo jurídico é a criminalização. Tal assunto é abordado para demonstrar quem vem a ser considerado como criminoso, e para tanto, expor como funciona o processo, desde a criação das regras para rotulação até sua imposição por meio

1. APRESENTAÇÃO

O assunto do presente projeto de monografia é a criminalização. Tal assunto é abordado para demonstrar quem vem a ser considerado como criminoso, e para tanto, expor como funciona o processo, desde a criação das regras para rotulação até sua imposição por meio das próprias pessoas, leis e instituições oficiais.

É de suma importância entender como funciona este processo, para melhor eficiência do direito penal e aplicação de políticas públicas, por existir dentro do processo pessoas que são falsamente rotuladas e desviantes secretos que passam despercebidos.

2. DISCUSSÃO TEÓRICA    

Adão e Eva foram o primeiro casal criado e colocado por Deus no Jardim do Éden, colocados no jardim para ali viverem e, também, para povoarem a terra com os seus descendentes. Eva, mulher de Adão “concebeu e deu à luz a Caim, e disse: Alcancei do Senhor um homem. E deu à luz mais a seu irmão Abel; e Abel foi pastor de ovelhas, e Caim foi lavrador da terra” (Gn4,1:2).

Certo dia Abel e Caim, como de costume na época, ofereceram um sacrifício ao Senhor, como uma maneira de adoração ao seu Deus. Os sacrifícios feitos faziam parte de seus produções. Abel sempre oferecia os melhores frutos de sua colheita, que no seu caso eram as melhores ovelhas do rebanho, enquanto Cain sempre oferecia o que restava de sua colheita, que eram frutos da terra, que fez de seu ato um gesto sem importância, apenas de formalidade, diferentemente de Abel que sempre ofertava o que tinha de melhor.

Os atos dos irmãos resultaram em um desagrado de Deus por parte do sacrifício de Cain e agrado pelo de Abel. Como consequência Cain passou a invejar e como modo de ficar com seu irmão num local isolado Cain chamou Abel para passearem juntos pelo campo. Durante o passeio, ao ficarem a sós, Cain fez o que viria a ser conhecido como o primeiro homicídio, matando Abel.

Diante de tal fato Deus o indagou perguntando o “que fizeste? A voz do sangue do teu irmão clama a mim desde a terra. E agora maldito és tu desde a terra, que abriu a sua boca para receber da tua mão o sangue do teu irmão. Quando lavrares a terra, não te dará mais a sua força; fugitivo e vagabundo serás na terra” (Gn4,10:12). Nesta passagem bíblica podemos verificar a ocorrência de um crime, cabe, portanto, a pergunta, qual foi a causa para que Caim tivesse tal conduta?

Noutro ponto da Bíblia podemos encontrar passagens onde verificamos o que ocorria com quem infringia a regras, ou seja, para aqueles que eram criminalizados, tomemos, por exemplo, passagem no livro de Gênesis, cap. 40:1-4: "Depois destas coisas, o copeiro do rei do Egito e o seu padeiro ofenderam o seu senhor, o rei do Egito. Pelo que se indignou Faraó contra o seus dois oficiais, contra o copeiro-mor e contra o padeiro-mor; e mandou detê-los na casa do capitão da guarda, no cárcere onde José estava preso; e o capitão da guarda pô-los a cargo de José, que os servia. Assim, estiveram por algum tempo em detenção". A questão aqui é porque o padeiro e o copeiro foram considerados como desviantes, seria por uma simples violação à lei ou porque sua conduta feriu a moral defendida pela sociedade? Outro ponto importante a se destacar é caso a pessoa viole uma lei, qual a causa para tal conduta e como foi a reação da sociedade?

Com uma simples observação da sociedade verificamos que nem todas as pessoas que são criminalizadas, ou rotuladas, infringiram algum tipo de norma. Em vários casos pessoas cometem crimes e não são consideradas como criminoso, já em outros, indivíduos que nem ao menos violaram algum preceito legal jurídico são classificados, etiquetados, como tal. Portanto, é necessário entender como funciona o processo de criminalização de um indivíduo, o estudo do Direito Penal (conceito de crime) e da criminologia (tradicional e contemporânea) traz a compreensão ao respeito do tema.

A criminologia é uma ciência empírica, “por isso a Criminologia dispõe de um objeto próprio, de um método ou métodos e de um sólido corpo doutrinário sobre o fenômeno delitivo, confirmado, por certo, por mais de um século de investigações”[1], ou seja, se apóia em experiências e na observação do objeto. Interdisciplinar, se utiliza de outras disciplinas em seus métodos e conclusões, como por exemplo, a biologia, psicologia e a sociologia entre outras áreas do saber científicas. O fato de ser uma ciência multidisciplinar fez com que, de início, não fosse reconhecida como ciência, justamente pelo fato de que se entedia que não era dotada de autonomia e métodos próprios.

O estudo do crime foi por muito tempo seu objeto principal, porém, num ponto de vista mais contemporâneo, mais especificamente em meados de 1960, o objeto de estudo foi diversificado, passando a lidar, além da análise do delito e do delinquente (paradigma etiológico), também com a vítima e muito atentamente à reação e ao controle social, próprios do paradigma da reação social com estudo do processo de criminalização e rotulação.

Cabe falar, portanto, numa ampliação do objeto, antes era o delito e o delinquente, agora da vítima, reação e controle social. Deixa, assim, alguns dogmas construídos durante a criminologia clássica, de visão extremamente jurídico-formal do crime, para um novo modelo, paradigma, que foram definidas pelas novas teorias, como as “estruturais-funcionalistas, as subculturais, as da socialização e da aprendizagem, as do conflito, as interacionistas do labelling approach”[2], entre outras.

Em outras palavras, criminologia pode ser considerada uma "ciência do ser, empírica, baseada na análise e na investigação da realidade"[3], enquanto o direito penal como do dever-ser, normativa, com métodos abstratos e dedutivos de natureza dogmática baseada num direito positivo que liga o fato à uma consequência jurídica. A função da criminologia é “explicar e prevenir o crime e intervir na pessoa do infrator e avaliar os diferentes modelos de resposta ao crime”[4], essa é uma definição convencional, numa forma mais moderna a criminologia:

“a) Parte da caracterização do crime como “problema”, ressaltando assim sua base conflitual e enigmática e sua face humana e dolorosa, com as transcendentais implicações de toda ordem que derivam de tal análise;

b) Amplia o âmbito tradicional da Criminologia, incorporando em seu objetivo as investigações sobre a “vítima” do delito e o denominado “controle social”, que deram à noção clássica da Criminologia um moderado giro sociológico, que compensa o desmedido biologismo positivista sob cujos auspícios ela nasceu;

c) Acentua a orientação ”prevencionista” do saber criminológico, frente a obsessão repressiva explícita em outras definições convencionais. Porque interessa prevenir eficazmente o delito, não castigá-lo cada vez mais ou melhor;

d) Substitui o conceito de “tratamento”, que tem inequívocas conotações clínicas e individualistas, pelo de “intervenção”, que possui uma noção mais dinâmica, complexa e pluridimensional, em consonância com o substrato real, individual e comunitário do fenômeno delitivo;

e) Destaca a análise e avaliação dos modelos de reação ao delito como um dos objetos da criminologia;

f) Não renuncia, porém, a uma análise “etiológica” do delito (da “desviação primária”) no marco do ordenamento jurídico como referência última. Com isso se distancia das conhecidas orientações radicais, fortemente ideologizada, que concebem a Criminologia como mera teoria da desviação e do controle social, isto é, como                                  apêndice da Sociologia (teorias da criminalização). A definição sugerida atende, assim, tanto à gênese e etiologia do crime (teorias da criminalidade) como o exame dos processos de criminalização. ”[5]

A compreensão dos ramos (penal e criminológico) desenvolve uma melhor aplicação de políticas criminais, que constituem "a sistematização das estratégias, táticas e meios de controle social da criminalidade penais e não penais, diz respeito, enfim, à gestão política dos conflitos humanos por parte do Estado"[6]. E por ser uma estratégia que vai de encontro ao crime deve observar o que a criminologia disponibiliza para um concreto controle da criminalidade.

Para entrar no estudo do processo de criminalização será realizada uma análise do conceito de crime pelo direito penal, verificando quais são os conceitos existentes de crime - material, formal, analítico e definitorial. Passando, também, por uma abordagem histórica da criminologia clássica, cujo precursor foi Cesare Beccaria (Escola clássica), com a obra Dei delitti e delle penne, sob influência do iluminismo, também analisando a Escola positivista, que surge sob forte influência do desenvolvimento das ciências naturais[7], e tem como principal autor Cesare Lombroso, um médico italiano.

Ademais, serão apresentadas as teorias mais importantes da sociologia criminal juntamente com uma análise do paradigma da reação social, com obra Outsiders do autor Becker. Por fim, a conclusão de quais são as teorias para as causas do crime e como funciona o processo de criminalização e rotulação.

2.1. O desvio na perspectiva do Direito Penal.

A definição do que vem a ser considerado crime[8] é um dos pontos mais importantes do estudo do Direito Penal, e esta definição constitui uma parte do processo de criminalização para se entender quem vem a ser rotulado como criminoso.

 O código penal de 1940, que se encontra em vigor, não traz o conceito de crime consigo. A sua definição está na Lei de introdução do código penal (Decreto 3.914/41), no artigo 1º cujo texto considera crime “a infração penal que a lei comina pena de reclusão ou de detenção”. Já o código criminal de 1830 definia crime como toda ação ou omissão voluntária às leis penais, sendo tido como criminoso aquele que cometia, constrangia ou mandava alguém cometer crime, sendo necessário ao autor do delito má-fé, ou seja, conhecimento do mal.

Já o código penal do ano de 1890, em seu artigo 7º, considera crime como sendo qualquer violação imputável e culposa da lei penal, possuindo como agente do crime quem executa diretamente, presta auxílio, provoca e determina outro a executá-lo, ou ainda, manda alguém cometer. Também são considerados agentes do crime os cúmplices que fornecem instrução para cometê-lo, ou auxilia, ajuda o criminoso a se evadir, recebe, compra ou oculta objeto de crime e dão asilo ou deixam assassinos e ladrões fazerem reuniões em sua casa.

Na legislação atual não há conceituação completa de crime, este conceito foi produzido pela doutrina. Dentre os vários conceitos, quatro são considerados mais importantes para o estudo, qual seja o conceito formal, material, analítico e definitorial.

Define-se crime, segundo o conceito formal, sob uma análise estritamente legal, de acordo com a lei, por ser fruto do positivismo que retira a aplicação de valores, buscando uma maior segurança jurídica. Doutrinadores clássicos, como Carmignani, definem crime como fato humano contrário à lei. Giusppe Maggiore o conceitua como qualquer ação legalmente punível. Portanto, para a corrente formal, a definição de crime depende exclusivamente do imperativo legal, ou seja, da própria lei.

O conceito material faz, de início, uma análise puramente sociológica do crime, tendo-o como fato social. Para Raffaele Garófalo, o crime era uma "violação dos sentimentos de bondade, caridade estruturais de piedade e probidade" [9], "uma conduta gravemente lesiva de bem jurídico" [10]. Atualmente é definido como ato que viola algum bem jurídico tutelado pela lei, fazendo uma junção do que é valioso para a sociedade, com a proteção do bem jurídico. Entende-se, portanto, como ação ou omissão que vai contra os interesses da sociedade ou de grupos dentro desta, definidos pela pessoa do legislador.

No Brasil foi adotado o conceito analítico de crime na forma tripartida, conforme a doutrina majoritária, visto que a minoritária adota a definição bipartida.  Aqui se considera crime como fato típico, antijurídico e culpável. Portanto, seria uma conduta de ação ou omissão concreta que se amolda ao caso hipotético previsto na legislação, sendo proibido por esta por caracterizar a ilicitude do ato reprovado socialmente. "O conceito analítico é, pois, um desdobramento do conceito formal de crime, isto é, crime como infração à lei penal".[11]

2.2. O desvio na perspectiva da Criminologia.

O conceito definitorial, dado pelo Direito Penal, que surge com a teoria do etiquetamento, também conhecida como labeling approach. Para esta corrente, delito faz parte da reação social, que define o que é uma conduta de desvio. O crime é "uma construção social arbitrária resultante dos processos de criminalização primária (a lei etc.) e secundária, a cargo do sistema de justiça criminal (Polícia, Ministério Público etc.)." [12]. Desviante é aquele quem foi rotulado como criminoso por um determinado grupo social.

Dentro do próprio conceito de crime, segundo o Direito Penal, tem-se primeiramente, como uma violação à lei, como consequência, criminoso é aquele que viola as leis. Por outro lado, dentro do conceito definitorial, criminoso é aquele a quem foi atribuído o rótulo, pela criminalização primária e secundária, com sucesso. A compreensão da discussão em criminologia ajuda a entender melhor o processo de criminalização.

Depreende-se das várias formas de conceituação do crime, que este depende do que a lei caracteriza como crime, uma visão claramente legal. Com isso criminoso é aquele que viola as regras jurídicas impostas. Porém, essa conceituação é muito mais complexa e vai além da simples colocação feita pelo Direito Penal, tal conceituação é fácil de desfazer com uma simples questão; alguém se torna criminoso apenas por que infringiu uma lei?

2.2.  A Criminologia Tradicional e o Paradigma etiológico.

A criminologia é uma ciência que estuda o crime, criminoso, reação e controle social. Além disso, investiga o que ocorre na realidade, por ser uma ciência do mundo do "ser" e não do “dever ser", como o direito penal. Pode ser separada em dois momentos, a criminologia tradicional e a moderna, esta tem por objeto o processo de criminalização, rotulação com olhar voltado para as instituições, já aquela tem como objeto as causas do crime, com um olhar para o comportamento.

Dentro do estudo da criminologia tradicional existem diversas correntes e escolas que definem as causas do crime, por tal motivo é chamada de ciência etiológica. São elas Escola Clássica, Positivista Italiana, Francesa e de Chicago. Cada uma possui uma linha de pensamento diferente acerca do delito, indo desde causas biológicas até causas sociais.

As ideias pré-clássicas, que possuíam princípios taliônicos[13], religiosos e retributivos, sedimentaram as bases da Escola Clássica, que teve fundamento no livre arbitrismo dos indivíduos, adotava o método apriorístico, metafísico e dedutivo[14].

2.2.1. Escola Clássica.

A criminologia clássica possui um viés racional e humanista do iluminismo, com orientações jusnaturalista[15], concebe-se o crime como fato isolado e individual. O mais importante aqui é analisar o fato, se este constituí violação à alguma norma ou não, o sujeito pouco importa, pois age dotado de decisões livres.

Segundo a Escola Clássica, o delito é resultado do livre arbítrio, ou seja, da própria vontade da pessoa, aqui não se diferencia o delinquente do indivíduo normal, pois entende-se que ambos possuem a mesma responsabilidade e liberdade moral de suas próprias condutas, o fato de ser uma Escola ligada ao Jusnaturalismo faz com que seja inconciliáveis a diferença entre homem honesto e delinquente, todos tem o mesmo valor em potencial. A pena era usada como meio de defesa social, baseada no contrato social e na sua máxima utilidade, “o critério da medida da pena é o mínimo sacrifício necessário da liberdade individual”[16].

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Possuía como pilares o direito natural, considerado imutável e divino. Dentro desta temática jusnaturalista, Carrara descreve o delito não como ente fático, mas sim como ente jurídico, “porque sua essência deve consistir, indeclinavelmente, na violação de um direito" [17], direito este que advém de uma lei absoluta, conforme as vontades do criador. Para ele “o homem é submetido às leis criminais por causa de sua natureza moral; por conseguinte ninguém pode ser socialmente responsável por seu ato se não moralmente responsável" [18].

A função da pena, como já colocado, era a defesa social, mas sua finalidade, diferentemente das já apresentadas, era a eliminação do perigo social. As outras funções da pena como reeducação do delinquente, por exemplo, seriam apenas uma finalidade acessória à eliminação social.

A Escola Clássica representa a mudança de pensamento, que parte de um “pensamento mágico, sobrenatural, ao pensamento abstrato, do mesmo modo que o positivismo representará a passagem ulterior para o mundo naturalístico e concreto" [19]. O ponto fraco dessa teoria se dá por não abordar a pessoa delinquente, o meio em que vive e seus relacionamento sociais, pode se dizer, também, que foi incapaz de contribuir com informações suficientes para uma boa política criminal de prevenção e combate ao crime.

A obra Dos Delitos e das Penas, de Beccaria, é considera como precursora da Escola Clássica. Trazia consigo um teor de protesto contra a arbitrariedade e a crueldade existentes no procedimento criminal da época, visando uma reforma penal, que foi concretizada no século XVIII ao XIX, pode-se dizer que foi influenciado pela:

“1) A Legalidade dos Crimes e das Penas, ou princípio da reserva legal. A lei penal deveria prever os crimes e as penas;

2) A Indistinção das Pessoas perante a Lei Penal;

3) A Lei Penal deveria ser tão completa a minuciosa que ao Juiz não restasse lugar para Interpretações ou criações de tipos incriminadores ou de penas não cominadas. Não poderia haver lacunar

4) Proporcionalidade das Penas aos Delitos. A justiça tinha que ser retributiva e comutativa. Esses foram os princípios que mais influenciaram a Escola Clássica, mas BECCARIA defendia ainda outras ideias que inspiraram a reforma processada naquela época, tais como: a pena deveria ser prontamente imposta para que o castigo pudesse relacionar-se com o crime, do contrário perderia a ligação Crime-Castigo; combateu com veemência a pena de morte, o confisco de bens do condenado, o abuso e a frequência das penas infamantes dizendo que “não é pelo rigor dos suplícios que se previnem mais seguramente os crimes, porém pela certeza das punições”; era contra a retroatividade da lei penal. ”[20].

Para Cessare Beccaria o indivíduo coloca apenas uma parte mínima de sua liberdade no contrato social e dessa parte mínima surge o direito do Estado punir o delinquente, observando-se sempre que o que foi depositado é apenas a menor parte consagrada, pois o avanço desta passa a ser considerado injusto.

Romagnosi, também autor da Escola Clássica, parte do princípio da conservação da espécie humana e da máxima utilidade. A pena tem finalidade de contraestimulo para o desejo de delinquir, porém não o coloca como único meio de defesa social, por entender que também deve ser feita a prevenção do delito por meio da melhoria da vida social.

Com o avanço do tempo, as ideologias da Escola clássica perderam força, o homem passou a ser resultado de uma série de determinações e não mais do livre arbítrio. O delito, portanto, deixou de ter uma lógica de causação espontânea, surgindo, então, a Escola Positivista.

2.2.2. Escola Positivista.

A Escola Positiva partia de indagação diferente da Escola Clássica, os homens honestos eram diferenciados daqueles considerados criminosos. O determinismo do comportamento delinquente é o centro desta corrente doutrinária, colocava-se em questão o “por que o homem é criminoso? Quais os fatores que o levam a ser criminoso? Como se pode desvendar esses fatores? Só a partir da obra de Lombroso, em 1876, sob o título O Homem Delinquente, é que as respostas passaram a ser dadas, e só a partir dessa obra é que podemos considerar a existência tanto da Criminologia[21] como da Escola Positivista.”[22].

Esta Escola foi antecedida pelo período pré-positivista, que operava no método empírico-indutivo. Antes mesmo das ideias propostas por Lombroso, já existiam estudos nos mais diversos campos, exemplo disso são os autores Della Porta (1535-1616) e Lavater (1741-1801), fisionomistas que por meio de necropsias, visitas a presidiários e outros meios de observação para fazer uma relação entre as qualidades do indivíduo e as partes de seu corpo. Lavater afirmava que o homem delinquente possuía disposições físicas diferentes do não delinquente, pois tinha “o nariz oblíquo em relação ao rosto, que é disforme, pequeno e amarelado; não tem a barba pontiaguda; tem a palavra negligente; os ombros cansados e pontiagudos; olhos grandes e ferozes, brilhantes, sempre iracundos”[23].

A Frenologia também teve sua contribuição, explicava o comportamento criminoso através de análises das funções psíquicas. Gall considerava que o comportamento criminoso era ocasionado por um desenvolvimento parcial do cérebro. Cubí Y Soler, concluiu de forma parecida com Lombroso, afirmava que o homem delinquente era na verdade um enfermo, por tal motivo era necessária intervenção médica, associava a delinquência do indivíduo com sua hipoevolutividade.

Os antropólogos também se encontram nesse período, seu principal expoente era Darwin, que muito contribuiu na formação da Escola Positivista. O homem delinquente nada mais era do que a pessoa que não evoluiu, possuidora de traços de atavismo.

Por último, A Escola Cartográfica, considerada por alguns a ligação a travessia entre a Criminologia Clássica e a Positivista. Utilizavam-se do método estatístico chegando a conclusão do delito como fenômeno social coletivo, natural, assim como os fatos humanos. Para a análise estatística eram observados não só as causas da delinquência, mas também, sua frequência média, distribuições e variáveis. O Crime é um ente normal, que não pode ser evitado, cedo ou tarde qualquer sociedade “deve pagar esse tributo, inseparável de sua organização, fatal." [24].

O positivismo criminológico tem início no final do século XX, ascende com métodos diferentes, com modelo crítico e alternativo à Escola Clássica. A Escola Positivista possuí dois caminhos, o da antropologia (Lombroso) e da sociologia (Ferri), ambos utilizam o método empírico para a explicação da delinquência. Não se fala mais em igualdade entre delinquente e não delinquente, mas sim de uma diversidade, que é a própria explicação para o delito, nesta Escola o crime passou a ter "todo o complexo de causas na totalidade social que determina a vida do indivíduo" [25].

Lombroso, principal expoente desta Escola, era médico, antropólogo, político e psiquiatra, sua grande contribuição foi a aplicação do método empírico para explicação das causas do crime (etiologia). Considerava o delito como ente natural, não mais como ente jurídico como outrora, que possuía como causa características biológicas hereditárias.

Para ele os delinquentes poderiam ser distinguidos em seis grupos: os natos, loucos morais, epiléticos, loucos, passionais e ocasionais. O mais importante das tipologias era o nato, este era um ser não evoluído, resultado de uma regressão de uma espécie (atávico) e possuidor de características próprias. Suas conclusões derivam de autópsias e análises em delinquentes vivos, inclusive reclusos em prisões.

Como exemplo da rotulação pela aparência física do delinquente temos a colocação feita por Lombroso, onde afirma que “delinquente padece uma série de estigmas degenerativos comportamentais, psicológicos e sociais (fronte esquiva baixa, grande desenvolvimento dos arcos supraciliais, assimetrias cranianas, fusão dos ossos atlas e occipital, grande desenvolvimento das maças do rosto, orelhas em forma de asa, tubérculo de Darwin, uso frequente de tatuagens, notável insensibilidade à dor, instabilidade afetiva, uso frequente de um determinado jargão, atos índices de reincidência etc.)”[26].

A teoria feita por Lombroso sofreu fortes críticas, nem todos os indivíduos criminosos apresentam tais anomalias, o que resulta em uma conclusão de que nem todos os delinquentes são iguais, também há o erro de se examinar apenas o autor não incluindo os fatos sociais. Outro problema em sua afirmação é fato de ter utilizado pessoa reclusas e prisões, o sistema penal é extremamente seletivo, e uma análise restrita a esse ambiente gera resultados viciados. Um exemplo claro desta afirmação pode ser visto através do seguinte gráfico, de distribuição de etnias no sistema prisional e na população brasileira no ano de 2015:

Tempos depois Enrico Ferri, criador da sociologia criminal, advogado, professor e político, em sua teoria sobre as causas da criminalidade considerava o livre arbítrio como ficção, ampliou o que foi demonstrado por Lombroso, adicionando ao determinismo biológico fatores antropológicos, físicos e sociais. O crime passou a depender, também, do contexto onde o homem encontrava-se introduzido, seu comportamento era pura expressão de seu contexto social, portanto, crime era considerado como um fenômeno social.

O sistema penal se fundava, além da classificação do delito, nas tipologias dos autores, que poderiam ser delinquentes:

  1. Natos, possuíam aspectos cognitivos, mais biológicos, possuidor de degeneração e atrofia do senso moral;
  2. Loucos, aqueles que possuem pensamentos anormais por disfunções mentais, não físicas;
  3. Habituais, reincidente nas ações delituosas, que faz da prática do crime um modo de vida;
  4. Ocasionais, que cometem crimes eventualmente, está associados às oportunidades que existem no “mercado”;
  5. Passionais, aqueles que cometem por impulso, não controlam suas ações.

Portanto, para Ferri as causas do crime não se pautavam apenas no delinquente (suas anomalias, como proposto por Lombroso), mas também nos fatores sócias. O delinquente é resultado de vários fatores, os fatores sociais mais comuns são constituídos pela desestrutura familiar; econômicos, a pobreza o desemprego e na outra linha a riqueza e a ganância com tendências à exploração e à atos sórdidos e torpes para lubridiar; ético-pedagógicos, a ausência de educação e formação moral do indivíduo faz com que tenha uma falsa percepção da realidade; e por último, os sócio-ambientais, que derivam das más companhias e influências ambientais, tais como exposição à corrupção, carência e abandono. Os fatores sociais se transmitem para as pessoas por contágio, imitação e indução entre outros modos.

R. Garófalo[27], outro autor positivista, entendia que o ato de cometer um crime causava a violação de determinados sentimentos de bondade e caridade fundamentais da piedade e probidade, estes delitos "são aqueles contra os quais toda a sociedade civilizada se defende, porque exprimem um notável egoísmo, e atentam contra valores e interesses percebidos como universais na consciência de todos os cidadãos normais" [28].

A ideia de delito natural foi proposta por R. Garófalo, bem como a de periculosidade, que possuía cunho de prevenção contra o cometimento de delito e reincidência. O criminoso, fonte de perigo, deveria ser inocuizado pela prisão perpétua ou até mesmo a pena de morte. Também classificou os criminosos em três tipologias, assassinos (obedecem apenas o próprio egoísmo), violentos (não possuem o sentido de compaixão) e ladrões (sem instinto de probidade).

Ao final, a Escola Positiva, por intermédio de Grispigni, chegou ao sistema pela responsabilidade social do autor, no qual imputa-se o delito pelo modo de se comportar do sujeito, por isso a sociedade deve intervir conforme as ações do delinquente. Necessário, então, a reafirmação da pena como meio de defesa social, porém, esta não possui somente o viés correcionalista de reprimir o delinquente e o retirar do convívio social, mas, também, possui caráter reeducativo tendo a diferenciação tipológica dada por Ferri como meio de contribuir para maior alcance desse caráter substitutivo.

A Ideologia da defesa social foi um pensamento comum à Escola Clássica e à Escola Positivista, nasceu juntamente com a revolução burguesa, assumindo papel ideológico no setor penal. Possuía seis princípios fundamentais à sua existência. No Princípio da legitimidade, o direito de punir do Estado é resultado de um contrato social, o Estado "esta legitimado para reprimir a criminalidade, da qual são responsáveis determinados indivíduos, por meio de instâncias oficiais de controle" [29].

O Princípio do bem e do mal afirma que o bem ou mal não está no livre arbítrio, mas sim no determinismo biológico. "O delinquente é um elemento negativo e disfuncional do sistema social. O desvio criminal é, pois, o mal; a sociedade constituída, o bem." [30].

Princípio de culpabilidade traz a ideia de culpa e responsabilidade subjetiva do agente. "O delito é expressão de uma atitude interior reprovável, porque contrária aos valores e as normas" [31].

Já o Princípio da finalidade dispõe que a pena possui duas finalidades, segundo a prevenção especial positiva, a ressocialização do delinquente, e de acordo com a negativa a inocuização como contramotivação ao comportamento criminoso.

Com o Princípio de igualdade tem-se que o Direito Penal é igual para todos, pois o tipo penal é infinitivo e impessoal. E por último, não menos importante, o Princípio do interesse social e do delito natural, no qual o Direito Penal protege o interesse e o direito de todos. "O núcleo central dos delitos definidos nos códigos penais nas nações civilizadas representa ofensa de interesses fundamentais, de condições essenciais à existência de toda sociedade" [32].

2.2.3. Escola Francesa.

A nova visão criminológica proposta por Ferri (sociologia criminal) teve sua continuidade na Escola Francesa, que recebeu for influência de Pasteur[33]. Partia-se da concepção de que o meio produzia o criminoso e que suas características biológicas não eram mais determinantes, trabalhavam muito com linhas estatísticas. O olhar social desta Escola pode ser visto através do pensamento de Lacassagne, que afirmava que cada sociedade possuía os criminosos que mereciam.

Lacassagne não afasta as anomalias biológicas apresentadas por Lombroso, mas afirma que aparição de tais condições físicas são consequência de fatores sociais, como, miséria e pobreza entre outras. As anomalias presentes no meio social são como um micróbio, assim podemos dizer, e o micróbio é um “criminoso, um ser que permanece sem importância até o dia em que encontra o caldo de cultivo que lhe permite brotar[34]" [35], assim deixam o campo social e passam a fazer parte do indivíduo.

Gabriel Tarde, jurista francês, analisava o criminoso como um profissional, para tanto, era necessário um tempo de aprendizagem, assim como nas demais profissões existentes. Para Tarde, a imitação tinha papel importantíssimo no processo de aprendizagem criminosa, determinados modos de se comportar iniciam-se como moda, passando a se tornar prática cotidiana e imitada por outras pessoas[36]. Antecipou, ainda, a teoria da associação diferencial (Sutherland), que afirma que o comportamento criminoso pode ser aprendido pela interação com grupos íntimos através de técnicas e orientações, complexas ou simples.

Segundo Gabriel Tarde o delinquente é um profissional, por esse motivo, assim como os médicos, advogados, engenheiros e outros profissionais, precisam de tempo para aprender seu ofício, no seu caso a aprendizagem criminal.

Da soma de teorias das Escolas apresentadas, percebe-se que o crime é resultado de uma soma de fatores, é um fato biológico, psicológico e social. Porém essa associação não é suficiente para explicar o comportamento criminoso. Como se verifica aqui, o crime pode ser relacionado aos estratos inferiores presentes na sociedade, esse fato não responde o porquê do crime ser cometido fora dos estratos inferiores.

2.2.4. Escola de Chicago.

O início da sociologia criminal moderna como disciplina se deu com a Escola de Chicago, caracterizada pelo método empírico, observação da vida na cidade e investigação dos problemas sociais norte-americanos. Os pioneiros na da Escola de Chicago, ao contrário do que muitos pensam, foram os jornalistas e não sociólogos propriamente ditos, os estudos eram realizados com base na grande metrópole e suas características.

A primeira teoria apresentada foi a Ecológica, a cidade não é apenas um local onde as pessoas convivem, a cidade é um corpo, possuidor de costumes e tradições, um organismo próprio. O modo de se comportar das pessoas é diretamente influenciado por vetores sociais ambientais presentes na cidade, quanto maior a desorganização social maior o índice de criminalidade local, os locais de desorganização são caracterizados pela degradação física da cidade, segregações de diversos tipos e pobreza entre outros.

Portanto, a criminalidade surge a partir da desorganização social, ausência do poder Público, e da existência de áreas de pobreza, os locais degradados enfraquecem as instituições sociais, tais como escolas, família, creche, delegacias e hospitais. Além disso, deriva, também, das relações interpessoais superficiais, superpopulação, e falta de valores tradicionais.

Esse distanciamento do Estado perante a cidade faz com que exista uma sensação de ausência de regras, condição esta que contribui para o surgimento de gangues, grupos armados e justiceiros, e como consequência, tornando propício o surgimento de atos de desvio. Como resposta à criminalidade propõe o fortalecimento do controle social, a prevenção como meio de intervenção e alteração do meio ambiente.

Em 1940, a teoria ecológica perdeu espaço e na década de 50 foi substituída pela teoria espacial, de métodos estatísticos e estudos realizados na área social, que relação entre a estrutura urbana e as mudanças da sociedade. Os estudos revelaram como os locais onde ocorriam crimes estavam distribuídos dentro da cidade, com estatísticas de maiores e menores taxas de concentração delitiva, contribuíram, ainda, expressivamente na aplicação de políticas públicas de prevenção, feita através da arquitetura urbana.

Portando, dentro do estudo da criminologia tradicional, criminoso é aquele que simplesmente, conforme os fatores sociais, biológicos ou psicológicos, contrariam uma perspectiva legal, ou seja, viola uma norma jurídica específica.

3. A Teoria estrutural-funcionalista de Durkheim e Merton (novo capítulo).

Os principais autores da teoria estrutural-funcionalista são Durkeim, e Merton. A sociedade para essa teoria é um organismo próprio que possuí valores morais de solidariedade, solidariedade esta que é o cimento que permite a união entre os indivíduos e a ordem social. O crime não é causado por patologias biológicas, nem mesmo social, constitui o outro lado da moeda da conduta social, um fator de funcionalidade que ocorre em todas as sociedades.

Para Durkheim[37] a delinquência é uma constante em qualquer sociedade e em qualquer momento da história, por isso é considerado um comportamento de normalidade, presente em todos os estratos sociais. Com o crescimento da sociedade é comum o aumento na taxa de criminalidade, portanto, “uma determinada quantidade de crimes forma parte integrante de toda sociedade sã, e uma sociedade sem condutas irregulares seria uma sociedade pouco desenvolvida, monolítica, imóvel e primitiva" [38].

O crime faz parte do funcionamento da estrutura social, é condição da vida em coletividade, os atos de desvio somente deixam de ser normais apenas quando ultrapassam determinados níveis. O criminoso, que feriu os sentimentos da coletividade (o que a sociedade coloca como bom e correto), é um fator de funcionamento da vida social, coletiva, que permite a manutenção do sentimento coletivo e antecipa o conteúdo da futura transformação. A pena é uma reação que reforça os laços sociais de solidariedade que foram fragilizados pelo delinquente, e restabelece as regras do jogo que foram quebras.

Merton, em sua teoria funcionalista, também se opõe, a exemplo de Durkheim, à ligação entre desvio de patologia. O modelo de Merton se resume em uma contradição entre a estrutura social e a cultura, que "em um determinado momento do desenvolvimento de uma sociedade, propõe ao indivíduo determinadas metas, as quais constituem motivações fundamentais do seu comportamento, como por exemplo, a meta de ser bem sucedido, com dinheiro e status.

Além de propor metas, também propõe modos de comportamento institucionalizados, que mostram quais são os meios legítimos que a sociedade aprova para o alcance das metas culturais. Da contradição também surge respostas e adequações de casa indivíduo, classificados em cinco modelos.

"1. Conformidade - corresponde à resposta positiva, tanto aos fins como aos meios institucionalizados e, portanto, ao típico comportamento conformista. Uma massa de indivíduos constitui uma sociedade somente se a conformidade é a atitude típica que nela encontra.

2. Inovação - corresponde à adesão aos fins culturais, sem o respeito aos meios institucionais.

3. Ritualismo - corresponde ao respeito somente formal aos meios institucionais, sem persecução dos fins culturais.

4. Apatia - corresponde à negação tanto dos fins culturais como dos meios institucionais.

5. Rebelião - corresponde, não à simples negação dos fins e dos meios institucionais, mas à afirmação substitutiva de fins alternativos, mediante meios alternativos."[39]

O comportamento desviante surge quando há desproporção entre os meios legítimos e os fins culturais, que se dá pela ausência ou escassez de acesso aos meios legítimos. Dai por si só não surge, ainda, um estado de anomia, que ocorre apenas quando uma forte discrepância entre essa desproporção.

O criminoso típico se encontra no comportamento da inovação, pois deseja o sucesso, conhecido na sociedade norte americana como american dream, mas não segue os meios legais para alcançar as metas, inova, cria novos meios para alcançá-lo. Esse fato se dá muito pela escassez, principalmente nos estratos inferiores, a esses meios, pois a própria cultura trata de negar o acesso.

4. Teoria da associação diferencial, Sutherland.

A teoria da associação diferencial, criada por Sutherland na década de 1930, aduz que o comportamento criminoso é aprendido, o crime é uma função das interações psicossociais. Essa teoria foi formulada durante as investigações sobre a delinquência econômica e dos crimes de colarinho branco, quando concluiu-se que, diferentemente do que a Escola positivista propôs, as condutas desviantes de nada tem a ver com patologias físicas ou sociais, atavismo e fatores sociais que se incorporam no indivíduo, nem mesmo pode ser relacionado às camadas mais pobres da sociedade, os chamados estratos inferiores, como achavam alguns sociólogos criminais e estrutural-funcionalistas, aqui o crime “não procede da desorganização social, senão da organização diferencial e da aprendizagem”[40].

A pessoa que vive em coletividade, sociedade, tem contato cotidiano com outros indivíduos, e é durante esses processos normais de contatos que ocorre a aprendizagem de valores, atitudes e condutas. Segundo o pressuposto lógico da teoria da associação diferencial, a da organização social diferenciada, dispõe que entre as pessoas existem diversos interesses e metas, pessoas com o mesmo interesse tendem a se relacionarem e formarem grupos e os que divergem foram outros.

Nesses grupos são criados modelos de condutas próprias que, conforme os interesses do grupo, podem ser modelos de condutas criminosas, neutras ou que se respaldam em valores tidos como positivo (contra criminoso) pela sociedade, estes fazem parte do código legal, enquanto aqueles do modelo paralelo. A conduta criminosa é aprendida assim como toda e qualquer conduta, e a pessoa só tende a se tornar criminosa quando “as definições favoráveis à violação da lei, superam as desfavoráveis, isto é, quando por seus contatos diferencias aprendeu mais modelos criminais que modelos respeitosos ao direito" [41].

O contato de uma pessoa com o grupo criminoso por si só não garante a influência pedagógica, é necessário ser ativo. A interação com o grupo íntimo faz com que o indivíduo aprenda técnicas de cometimento o delito complexas ou simples, e também justificação[42] do seu comportamento, porém precisam ser interações freqüentes e duradouras, pois diante dessa intensidade é que se dá maior influência pedagógica, é como um processo de aprendizado de uma criança, quanto maior ela fica exposta a algo, mais rápido ela aprende.

Essa teoria consegue explicar a criminalidade em todas as classes sociais, explicação que não foi apresentada em quase nenhuma Escola Tradicional, por outro lado relaciona-se, de certo modo, com o livre arbítrio do seu humano proposto na Escola Clássica, pois a pessoa tem liberdade em escolher em quais grupos quer ter interações.

5. Paradigma da Reação social

5.1. Labeling approach segundo o interacionismo e fenomenólogos.

Na década de 1960 surgiu nos Estados Unidos uma nova corrente dentro do estudo criminológico, o labeling approach, ou teoria do etiquetamento. Essa teoria mudou o ponto de referência acerca do crime, antes de sua criação, dentro da criminologia tradicional, o objeto de estudo era voltado para causas, para o comportamento criminoso, passando a ser, na nova criminologia, o processo de criminalização, olhar voltado para as instituições oficiais.

O sistema penal recebeu uma série de valores, que definem qual o comportamento social adequado e qual será considerado reprovado, com isso discrimina o que é desvio. Essa distinção de conduta “depende menos de uma de uma atitude reprovável interior intrinsecamente boa ou má, social ou antissocial, valorável positiva ou negativamente pelos indivíduos, do que da definição legal que em dado momento distingue, em determinada sociedade, o comportamento criminoso do comportamento lícito." [43]. A nova discussão criminológica atenta que é impossível de se entender a criminalidade, como feito na criminologia tradicional, sem compreender as ações do próprio sistema penal, juntamente com as instituições oficiais de controle, tais como penitenciárias, juízes e a polícia, pois são as instituições que definem o que é ou não considerado como criminoso.

O fato de as instituições definirem à uma pessoa o status de criminoso faz com que se fale em criminalização e não mais em criminalidade. O status de criminoso é aplicado pelas instituições e não pela lei, como forma de demonstrar tal ocorrência tomemos, por exemplo, duas pessoas, uma efetivamente atuou de forma contra a lei e foi condenada por um juiz à pena de prisão, nesta pessoa foi aplicado o rótulo de delinquente com sucesso, a segunda pessoa também praticou a mesma conduta, porém não foi alcançado por nenhuma das instituições oficiais (polícia, juiz, penitenciária e etc.), nesse indivíduo não foi aplicada nenhuma rotulação, não sendo considerado, portanto, como um criminoso. Com isso percebe-se que há um certo processo de seleção, por parte das instituições oficiais.

A teoria do labeling approach foi influenciada pelo interacionismo simbólico, de George Mead, e a etnometodologia de Alfred Schutz. Conforme a linha de pensamento do interacionismo simbólico "a sociedade - ou seja, a realidade social - é constituída por uma finalidade de interpretações concretas entre indivíduos, aos quais um processo de tipificação confere um significado que se afasta das situações concretas e continua a estender-se através da linguagem"[44]. Noutras palavras, as pessoas atuam a partir de significados, estes são produto da interação social dos indivíduos. Para a etnometodologia a sociedade é produto de uma determinada construção social. O labeling approach trabalha dentro dessas teorias tendo a ação como modo de se agir resultado de um significado. Vale ressaltar, também, que se trabalha com um second code, não positivado, que são normas práticas que influenciam o modo de se interpretar as normas gerais (éticas e jurídicas) ou código oficial. No curso dessas interações é que são aplicadas as rotulações.

Outro ponto importante a se verificar é que a partir do momento em que se aplica uma sanção, por decorrência de uma delinquência primária, ocorre uma mudança no individuo de identidade social, fazendo com que, provavelmente, continue dentro dessa nova identidade adquirida, repetindo sucessivamente a delinquência, sendo este efeito psicológico do ocorrido. "a intervenção do sistema penal, especialmente as penas detentivas, antes de terem um efeito reeducativo sobre o delinquente determinam, na maioria dos casos, uma consolidação da identidade desviante do condenado e o seu ingresso em uma verdadeira e própria carreira criminosa." [45].

A definição de desviante, segundo os interacionistas e fenomenólogos, não se restringe apenas àquelas qualificadas pelas instâncias oficiais, mas também, pelo próprio senso comum da sociedade, que é feito antes mesmo da intervenção das instituições. Para Kitsuse, fenomenólogo, o ato de desvio é formado a partir de um processo dentro de determinado grupo, que define tal ação como desvio, a partir não do próprio comportamento, mas sim da interpretação dada ao comportamento. Portanto, "a maneira segundo a qual os membros da sociedade definem um certo comportamento como comportamento de tipo criminoso faz parte, por isso, do quadro de definição sociológica do comportamento de desviante, e o seu estudo deve, precisamente por esta razão, preceder o exame da reação social diante do comportamento desviante."[46].

Com isso, percebe-se que o comportamento desviante vai de encontro, de forma negativa, ao comportamento normal, cotidiano das pessoas, que é um comportamento social estrutural, causando perturbação e indignação. "O simples desvio objetivo em relação a um modelo, ou a uma norma, não é suficiente." [47].

Isto posto, há de se concluir que a criminalização de determinado individuo dentro da sociedade não é feita apenas pela aplicação da lei, mas também pela empreendimento realizado pelas instâncias oficiais e pela própria sociedade, anteriormente, que a partir de suas interações com seus grupos optam se a aplicam o rótulo de criminoso ou não. A partir do momento em que se aplica tal rótulo o indivíduo passa a assumir a identidade criminosa, adentrando, inclusive em uma carreira.

5.2. Desvio, desviante e a criação de regras.

A sociedade é composta por um conjunto de seres que convivem em certo ponto, de forma organizada. Uma sociedade é composta por grupos sociais, esses grupos produzem suas próprias regras, que podem ser promulgadas na forma da lei ou podem ser informais, aquelas que vêm com o tempo, são força da tradição. Como consequência, tentam impô-las aos demais presentes na sociedade. A criação destas regras faz com que se criem condutas definidas como corretas e outras como erradas.

A forma de se definir o que é desvio é bastante aberta. Numa concepção estatística desvio é aquilo que foge a linha do comum, como por exemplo, a média de tempo de duração de um inquérito é de 03 anos, porém existem alguns que duram 01 dia, como nos casos de flagrante, e outros que duram 05 anos. Portanto, "basta-nos calcular a distância entre o comportamento envolvido e a média" [48], entretanto, essa visão não está preocupada com os atos de desvio, violação de regras.

Em outro tipo de definição de desvio temos a médica (que remota à criminologia etiológica), que identifica como sendo uma patologia, algo que não está saudável. Considera os atos de desvio como um comportamento não saudável, logo produto de uma doença, que pode ser não só no próprio corpo humano, mas também, na própria cidade, na forma de desorganização social. Assim como a estatística, também é limitada.

Temos, também, a visão sociológica, que "identifica o desvio como a falha em obedecer as regras do grupo" [49]. Essa se aproxima mais da ideia de violação de regras e criminalização, tem o desvio como algo criado pelas pessoas (grupos) da sociedade. Em vista disso, o desvio é consequência da reação de uma pessoa de determinado grupo à uma ação reprovável de outro e desviante aquele que infringiu "as regras do jogo" e foi rotulado pelos integrantes do grupo como infrator. Contudo, deve-se observar que esse processo de rotulação nem sempre é correto, pois alguns são rotulados sem ter infringido a regra e outros infringem a regras, mas não são percebidos logo não rotulados, por isso temos a figura do falsamente acusado, desviante puro, secreto e o comportamento apropriado.

Não é só a reação das pessoas ao ato que importa, mas também, o sujeito que incorreu na ação e a pessoa ou grupo que se sente lesado ou prejudicado pelo ato. Alguns fatos tornam isso bem claro, "meninos de áreas de classe média tem menos possibilidade, quando apanhado pela polícia, de ser levado à delegacia; menos probabilidade, quando levado à delegacia, de ser autuado; é extremamente improvável que seja condenado ou sentenciado." [50], tal fato pode ser observado, ainda, mesmo que duas pessoas tenham cometido o mesmo ato, como no caso acima, basta pensar no que ocorreria com o menino de classe baixa na mesma situação.

Portanto, temos que comportamentos iguais podem ser ou não um desvio, infração, depende da pessoa que infringe, de quem analisa a conduta e em que contexto estão inseridos os sujeitos da questão.

A pessoa intitulada como desviante é um outsider, termo utilizado, em geral, para descrever uma pessoa que não se enquadrou em um determinado grupo da sociedade, e por tal motivo tem suas próprias tem suas próprias crenças, valores e normas. Porém, do ponto de vista da pessoa etiquetada como desviante, outsider poder ser aquele que criou a regra que fez com que ele fosse rotulado como desviante.

Como vimos anteriormente, cada grupo possui suas próprias regras, de maneira geral não compartilham das mesmas regras e do modo de vê-las, o decorrer histórico desses grupos faz com que pensem e ajam de modo diferente, isto é normal dentro de uma sociedade, por ser esta uma estrutura complexa. Vejamos como exemplo dessa diversificação social um grupo indígena que aborta crianças com má formação e outro grupo que é contra o aborto em qualquer circunstância, considerando inclusive como crime.

Neste prisma, temos que "as perspectivas das pessoas que se envolvem são provavelmente muito diferentes das visões daquelas que o condenam. Nesta última situação, uma pessoa pode sentir que está sendo julgada segundo normas para cuja criação não contribui e que não aceita, normas que lhe são impostas por outsiders"[51]. Essa imposição de regras (legais ou extralegais) se dá, em muitas das vezes, pelo fato de que tal imposição à outros grupo resguarda o bem-estar do grupo impositor.

Outro aspecto importante acerca da criminalização está na situação do falsamente acusado, aquele visto como se realmente tivesse incorrido em conduta imprópria sem ter feito nada e o desviante secreto, este é tido como um dos mais interessantes a se estudar, pois realmente infringiu as regras, porém ninguém percebeu tal fato, e se percebeu não reagiu a ele.

Entender esse quadro nos leva a compreender que o desvio surge em um modelo sequencial, que faz com que a pessoa se torne desviante ao longo do tempo. Para melhor compreensão temos como exemplo o usuário de maconha, a droga deve ser disponibilizada, a inclinação para experimentá-la e tendo-a experimentada usar novamente, que resulta em um usuário. O decorrer deste processo pode fazer com que a pessoa tenha uma carreira desviante bem-sucedida ou mal-sucedida, se bem-sucedida, pode levar o indivíduo a desvios ainda maiores, fazendo com que assuma uma identidade desviante com uma carreira.

Conclui-se que o conceito de desvio tem diferentes formas, seja a estatística que examina o ponto fora da curva, seja a médica que lida como sendo patologia e a sociológica que define como atuação contra as regras de um grupo. O criminalizado é, dependendo de quem foi, infringiu ou não a regra e foi rotulado pela sociedade como infringente, que pode, dependendo das circunstâncias, se apropriar de uma identidade e construir uma carreira.

2.5. Conclusão

Depreende-se do que foi demonstrado que para o direito penal criminoso é aquele que violou a lei, um conceito estritamente legal. Na criminologia tradicional temos uma visão próxima do direito penal, pois aqui, é rotulado como tal aquele que por fatores biológicos, sociais ou psicológicos violam uma norma jurídica penal que tutela um bem.

Dentro das várias conceituais de crime vimos a definitorial que expõe que o delito faz parte da reação social, essa conceituação vem da teoria do etiquetamento (labeling approach). Essa nova conceituação afastou a forma etiológica e deu um olhar sociológico ao crime, fazendo com que se observasse que a rotulação surge de uma reação da sociedade, mas não só dela, também, das instituições oficiais (polícia, judiciário, penitenciária e outros).

Portanto, a criminalização é um processo complexo, não é feito exclusivamente pela lei, mas também pela sociedade, através de empreendedores que fazem a imposição de regras. O processo de rotulação nem sempre afeta somente aquele que realmente deveria ser rotulado, pois por trás do processo existe a atuação dos empreendedores que agem a partir de interesses, fazendo com que o processo de rotulação não seja infalível.

O rótulo de criminoso depois de bem etiquetado é algo difícil de desconstituir, a probabilidade da pessoa criminalizada se tornar realmente um criminoso é maior do que a chance de voltar a ser considerada "uma pessoa comum" para sociedade, pois o rótulo faz com que a pessoa crie uma nova identidade e se adeque à um novo grupo.

3. PROBLEMATIZAÇÃO

3.1. Os conceitos dado pelas Escolas da Criminologia tradicional estão muito sintetizados, não estão completos.

3.2. Observar o que os outros autores dizem a respeito do labeling approach, pois a maneira que foi colocada no texto não explica de forma profunda a ação das instituições oficiais.

3.3. O texto não menciona com clareza o processo de imposição de regras feita pelos empreendedores que desencadeia na criminalização, por não destrinchar mais o assunto o texto carece de uma seqüência lógica de como os atos começam até o fim, a criminalização.

4. PASSOS DE PESQUISA

4.1. (3.1.) Fazer cerca de um fichamento para cada autor citado dentro da Criminologia Tradicional.

4.2. (3.2.) Utilizar o livro do autor Anitua, Gabriel Ignácio para melhor compreensão do labeling approach.

4.3.  (3.3.) Pesquisar no livro Outsiders (H. S. Becker) como funciona o processo de imposição de regras feita pelos empreendedores, que se encontra no capítulo 7 e 8 do livro e a situação do desviante secreto e falsamente acusado.

5. REFERÊNCIAS

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MANZANERA, Luís Rodriguez. Criminologia. México: Porruá, 1982.


[1]. (Molina, et al., 2002 p. 41)

[2] (Molina, et al., 2002 p. 64)

[3] (Queiroz, 2011 p. 23)

[4] (Molina, et al., 2002 p. 39)

[5] (Molina, et al., 2002 p. 40)

[6] (Queiroz, 2011 p. 23)

[7] Principalmente com a Teoria da evolução proposta por Darwin.

[8] Usado aqui como sinônimo de desvio.

[9] (citado por García-Pablos, Criminologia, cit., p.124)

[10] (Queiroz, 2011 p. 150)

[11] (Queiroz, 2011 p. 152)

[12] (Queiroz, 2011 p. 151)

[13] Falar da lei de talião – olho por olho dente por dente

[14] Explicar o que é o método apriorístico, metafisico e dedutivo.

[15] Jusnaturalismo explicar um pouco

[16] (Baratta, 2011 p. 34)

[17] (F. Carrara, 1889, p 37-28),

[18] (Júnior, 2002 p. 28)

[19] (Molina, et al., 2002 p. 177)

[20] (Júnior, 2002 p. 27)

[21]  A Escola Clássica, por falta de um método empírico, não é considerada por alguns autores como o início da Criminologia, pois aqui ainda não se falava dela como ciência.

[22] (Júnior, 2002 p. 28)

[23] Cf. Rodríguez Manzanera, L., Criminologia, México, Porrua, 1982, p. 180; García-Pablos, A. Tratado de Criminologia, cit. P 328 e ss.

[24] (Molina, et al., 2002 p. 185)

[25] (Baratta, 2011 p. 38)

[26] (Molina, et al., 2002 p. 193)

[27]  R. Garófalo é considerado o criador do termo Criminologia.

[28] (Baratta, 2011 p. 117)

[29] (Baratta, 2011 p. 42)

[30] (Baratta, 2011 p. 42)

[31] (Baratta, 2011 p. 42)

[32] (Baratta, 2011 p. 42)

[33] Cientista francês com grandes descobertas na área química e médica e um dos principais fundadores da microbiologia.

[34] Lacassagne, A., Actesdu Premier CongrèsInternational d’ AntropologieCriminelle, p. 166.

[35] (Molina, et al., 2002 p. 203)

[36] Tais passos caracterizam as Leis da Imitação, proposta por Tarde.

[37]Durkeim (1858-1917) foi o primeiro a apresentar o conceito de anomia, que significa a ausência de regras, “a parda de efetividade ou desmoronamento das normas e valores vigentes em uma sociedade, precisamente como consequência do rápido e acelerado desenvolvimento econômico da mesma e de suas profundas alterações sociais que debilitam a consciência coletiva” (Molina, et al., 2002 p. 350 351).

[38] (Molina, et al., 2002 p. 350)

[39] (Baratta, 2011 p. 64)

[40] (Molina, et al., 2002 p. 377)

[41] (Molina, et al., 2002 p. 376)

[42]As formas de justificação, proposta por Skyes e Matza (1957) pelas técnicas de neutralização, são a negação da responsabilidade; da ilicitude do ato (vê como proibido, mas não como imoral e danoso), da vítima (que merecia tal tratamento), condenar os que o acusaram e fazer referências à instâncias superiores.

[43] (Baratta, 2011 pp. 85-86)

[44] (Baratta, 2011 p. 87)

[45] (Baratta, 2011 p. 90)

[46] (Baratta, 2011 p. 95)

[47] (Baratta, 2011 p. 96)

[48] (Becker, 2008 p. 18)

[49] (Becker, 2008 p. 20)

[50] (Becker, 2008 p. 25)

[51] (Becker, 2008 p. 28)

Sobre o autor
Winston Prado

Estudante de graduação Direito - UNICEUB.

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