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Os aplicativos eletrônicos e a necessidade de análise do caso concreto sob a ótica das leis trabalhistas

Agenda 10/07/2015 às 15:41

Na era Digital surgem inúmeras perguntas, este artigo vem para esclarecer algum deles, como podem ser vistos os aplicativos e plataformas online a luz do Direito do Trabalho.

O uso de aplicativos e plataformas on-line, é possível que qualquer prestador de serviço se cadastre e, utilizando-se do mesmo, possa ver facilitada a intermediação do serviço com o destinatário final/consumidor, sendo este pessoa física ou jurídica que também se encontra cadastrada na plataforma ou aplicativo.

As empresas de plataforma on-line atuam, como agenciadoras, cedendo o uso de sua plataforma a empresas contratantes de seus serviços ou até mesmo prestando serviço de agenciamento; podendo também, atuar na gestão de recebimentos e cobrança dos pagamentos devidos pelos tomadores aos os usuários cadastrados que realizam os serviços.

Diante deste panorama, podemos fazer uma reflexão sobre a existência ou não de vínculo empregatício entre as empresas que cedem as plataformas e o usuário prestador do serviço, isto em consonância com os artigos 2º e 3º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que aduzem sobre a configuração do vínculo empregatício, que para que este exista deve-se haver no caso concreto a: pessoalidade, habitualidade, onerosidade e subordinação.

Dessas regras legais extrai das lições de Mauricio Godinho Delgado os elementos fáticos-jurídicos componentes da relação de emprego: "trabalho não eventual, prestado intuitu personae (pessoalidade) por pessoa física, em situação de subordinação, com onerosidade"

Assim, a luz das leis Trabalhistas, temos que analisar cada ponto de forma específica a fim esclarecer eventuais dúvidas.

São requisitos da relação de emprego:

1) PESSOALIDADE:

O próprio empregado que deve realizar os serviços, sem poder mandar outro em seu lugar. Em relação a este requisito, trazemos a lição de Amauri Mascaro Nascimento:

Em relação ao requisito da pessoalidade, vejamos como se posiciona o douto Amauri Mascaro Nascimento, no livro Curso de Direito do Trabalho:

“Só será empregado o trabalhador que prestar serviços pessoalmente a terceiro.

A atividade deve ser direta e exercida pelo próprio trabalhador. Fica excluída toda espécie de delegação, o que vale dizer que não é empregado aquele que por sua iniciativa se faz substituir no serviço, circunstância que descaracteriza a relação de emprego. (...) Assim, entende que o trabalhador não pode se fazer substituir por terceira pessoa sem o consentimento do empregador.”

Desta feita, podemos concluir que somente pode ser empregado a pessoa física que exerce suas funções de forma pessoal, ou seja, sem a possibilidade que seja substituído por terceiro sem a anuência do empregador.

2) NÃO EVENTUALIDADE NA PRESTAÇÃO DO TRABALHO:

O Direito do Trabalho preceitua que a relação empregatícia deve ser regida pelo princípio da continuidade, incentivando normativamente a permanência indefinida do vínculo de emprego.

A doutrina entende pelo pensamento de Delgado (2009:273) o que ensina: "... Para que haja relação empregatícia é necessária que o trabalho prestado tenha caráter de permanência (ainda que por um curto período determinado), não se qualificando como trabalho esporádico."

Assim entende-se que deve haver habitualidade na prestação do serviço, através da qual, pela contínua prestação de serviços de um mesmo prestador de serviço/empregado a um mesmo empregador, gerando um elo que, desta maneira, é fator essencial para que seja configurada a relação jurídica empregatícia.

3) ONEROSIDADE:

Na relação de emprego, espécie de relação de trabalho, o empregado realiza os serviços e recebe a contra prestação através de um salário/remuneração. Mais uma vez citando as brilhantes palavras de Mauri Nascimento:

“significa, para o empregado, o dever de exercer uma atividade por conta alheia cedendo antecipadamente ao beneficiário os direitos que eventualmente teria sobre os resultados da produção, em troca de remuneração. (...) Assim, o empregado que originariamente teria como seus os frutos do seu trabalho, pelo contrato de trabalho transfere essa titularidade ao destinatário ou empregador, recebendo uma retribuição, daí o caráter oneroso do trabalho regulamentado pelas normas jurídicas trabalhistas.”

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Este requisito nada mais é do que a retribuição entregue pelo empregador ao empregado em face dos serviços por este último prestados, é a remuneração, o salário percebido pelo trabalhador por ceder os frutos de seu labor ao patrão.

4) SUBORDINAÇÃO:

A subordinação é a relação através da qual o empregado acata ordens, determinações do empregador, significa a direção e a supervisão do trabalho.

Esclarece o Doutrinador Sergio Pinto Martins que a palavra explicitada na regra legal é dependência, mas que se costuma usar o vocábulo subordinação, por ser mais exato no que diz respeito a esse estudo, e conceitua: "Subordinação é o aspecto da relação de emprego visto pelo lado do empregado, enquanto poder de direção é a mesma acepção vista pelo ângulo do empregador".

Já no ponto de vista de Ricardo Marcelo Fonseca, a necessidade de se compreender:

"que não foi o direito que inventou a relação de trabalho subordinado e o requisito da subordinação jurídica, traçando depois a linha divisória do que seria o limite de uma subordinação jurídica e uma subordinação não jurídica. O que de fato ocorreu é que a subordinação do trabalhador pré-existia à regulamentação do contrato de trabalho, e o direito positivo, confrontando-se com uma situação de subordinação já existente, traçou os limites formais para definir até onde essa subordinação poderia ser exercida licitamente (e denominou-a subordinação jurídica)".

Tal requisito, somente existirá quando, para desempenhar seu trabalho, o empregado deverá obedecer a determinadas orientações, normas, determinações que não foram por ele estipuladas, mas sim por seu empregador, podendo inclusive, se não cumprir sofrer determinadas represálias, como advertências, suspensões e, inclusive, podendo ser dispensado por justa causa.

Adequando os requisitos da relação de emprego e ao contexto dos aplicativos e plataformas on-line, nota-se que o termo de adesão da maioria dos aplicativos e plataformas on-line consta as seguintes indicações:

a) O prestador é o proprietário de seus meios de produção, como computador, tablet, celular, veículo de transporte, entre outros;

b) O momento em que o prestador iniciará a utilização da plataforma ou mesmo a hora em que ele deixará de utilizar o aplicativo ou plataforma on-line são de sua escolha;

c) Até mesmo no momento do cadastramento do prestador do serviço para utilização do aplicativo ou plataforma on-line, e o cadastramento do usuário final, deve partir por iniciativa deles próprios, não havendo qualquer “recrutamento” por parte da empresa do aplicativo ou da plataforma on-line;

d) é dada a possibilidade do prestador do serviço aceitar ou declinar eventual trabalho / serviço que não tiver interesse em realizar, podendo também em geral, se desvincular do aplicativo ou plataforma o momento em que bem entender, sem qualquer justificativa, bastas apenas se descadastrar;

e) O usuário cadastrado que faz o serviço por meio dos aplicativos ou plataformas, não possuem a exclusividade na prestação do serviço, podem trabalhar em qualquer lugar prestando o mesmo serviço se bem entenderem;

Assim sendo, por tudo que fora mencionado, não se consegue vislumbrar a cumulação dos requisitos do vínculo empregatício, principalmente no que tange á:

a) Não há habitualidade, vez que não existe qualquer obrigação do prestador se utilizar do aplicativo em jornadas especificadas ou pactuadas junto às empresas de aplicativo;

b) Não há subordinação, pois o prestador pode exercer seus serviços à hora e local que bem for sua vontade, cabendo ressaltar que o prestador pode recusar o serviço que não tem interesse, sem qualquer tipo de penalidade, bem como deixar de se utilizar do aplicativo pelo tempo que quiser.

Embora a utilização de tais plataformas e aplicativos seja uma criação recente, nota-se que seu uso cumpre com sua pertinente função social e em nada viola o ordenamento jurídico, haja vista que:

a) O uso dos aplicativos não impede que o prestador, tenha um labor com efetivo registro em Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS), caso assim escolha, assim sendo não há exclusividade na prestação do serviço, ou seja, o prestador pode fornecer seus serviços para vários usuários finais;

b) os prestadores cadastrados acabam por usufruir de uma melhor renda mensal, não sendo sua fonte de renda para sustento seu e também de sua família, mas sim um complemento;

c) Não há subordinação entre o prestador e a empresa de aplicativo ou plataforma, ou seja, o prestador pode atuar com autonomia, sem a necessidade de fornecer quaisquer perspectivas, obedecer a ordens, de dar retorno a respeito da prestação do serviço, sendo que, por tal liberdade, não precisa se preocupar com punições ou ingerência inerente a um empregador nos termos das leis do trabalho;

Conclui-se, que embora possam existir aplicativos eletrônicos contendo fraude aos direitos trabalhistas, temos que analisar conforme o caso concreto, pois, é possível perceber que inúmeras empresas de aplicativos e plataformas on-line seguem corretamente a legislação em vigor, não havendo vínculo empregatício entre as partes por ausência de todos os requisitos, respeitando o formato regulamentado e aceito no Brasil atualmente.

Referências bibliográficas

NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo, Saraiva: 2008. Fl. 649.

DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2002.

MARTINS, Sergio Pinto. Comentários à CLT. 6. Ed. São Paulo: Atlas, 2003.

FONSECA, Ricardo Marcelo. Modernidade e contrato de trabalho. São Paulo: LTr, 2001.

Sobre o autor
Frederico Hoffmann

Advogado Sócio do escritório CESTARI - Sociedade de Advogados - Especialista em Direito do Trabalho - com ênfase em Prevenção de ações em face do Empregador.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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