Matéria polêmica que vem agitando os corredores dos tribunais faculdades e principalmente os relacionamentos atuais, nos quais as trocas de favores são frequentes entre os diversos tipos de relacionamentos e suas concepções.
O tema voltou ao cenário, após ser apreciado fato específico pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal, em matéria que envolveu a discussão de um relacionamento no qual o companheiro (ex-namorado) subservia-se, locupletando-se financeiramente, de favores financeiros prestados pela companheira sob o argumento de dificuldades e promessa de pagamento futuro.
Decisão proferida pelo juiz da 7ª Vara Cível de Brasília, ganha maior contorno posto a alegação de “uma sequência de pedidos de empréstimos financeiros, empréstimos de carro, pedidos de créditos de celular e compras usando o cartão de crédito da autora - sempre acompanhados da promessa de pagamento futuro.” O montante financeiro neste caso provocou um endividamento a autora da ação de R$ 100.000,00.
Partindo então desta premissa, nasce a indagação: a matéria se trata de delito penal, ou somente mais um caso de reparação de danos civis?
Ressalta-se que a matéria ganha maior contorno por estar voltada ao termo “estelionato sentimental”, ou seja, aqueles casos em que no curso do namoro os envolvidos promovam pagamentos um ao outro, o que é absolutamente normal, e se chama no direito de liberalidade.
Na matéria enfrentada pelo Tribunal Justiça, ocorreu um abuso desenfreado, a quebra da boa fé objetiva, ocorrendo uma exploração econômica.
O direito cível alberga as possibilidades de reparação de danos quando demonstrado o abuso do direito, mediante o desrespeito dos deveres que decorrem da boa-fé objetiva, merece destaque a Sentença agitada ao Tribunal de Justiça de Distrito Federal, posto inclusive o reconhecimento dos requisitos demonstrativos dentre outros da ofensa a lealdade, decorrente da criação por parte do réu da legítima expectativa de compensação a autora dos valores por ela despendidos, quando de uma estabilidade financeira pelo ex-namorado, o que se traduz em ilicitude, e sendo reconhecida emerge o dever de indenizar.
Corre paralelamente à matéria “estelionato sentimental” a possibilidade de reparação de danos morais, o qual emerge quando demonstrado os atos vexatórios aos quais restou exposta e pessoa enganada publicamente.
Os casos enfrentados no judiciário brasileiro, em sua totalidade, reconheceram a possibilidade de preparação de danos morais às pessoas expostas em seu meio social, sendo verificado nos julgados um perfil singular entre as vítimas.
Analisando as ações propostas, tendo como autores mulheres, restou demonstrado que os danos morais foram reconhecidos e fixados pela materialização de atos públicos de traições singulares, como no processo enfrentado no judiciário mineiro em que a amante revela à noiva, na data da cerimônia, as traições praticadas pelo ex-noivo, aquele Tribunal reconheceu os danos materiais decorrentes da cerimônia e fixou indenização por danos morais ao ex-noivo e a amante. O casamento durou 10 dias.
O TJMG, também apresenta julgados de condenação de por danos morais após a demonstração de traição conjugal.
Nos procedimentos propostos por homens também emergem hipóteses de reparação por danos morais. Ainda no TJMG, se verifica autos no qual, o autor foi indenizado após descobrir que filho por ele registrado era na verdade de outro homem, ou seja, a ré foi condenada pela “infração do sagrado dever conjugal da fidelidade”.
Quanto à reparação de danos morais, trata-se de matéria consagrada no direito brasileiro, a dúvida fincava na quantificação dos danos morais. A matéria foi enfrentada pelo Superior Tribunal de Justiça, o qual tem sido chamado analisar a matéria, sob a ótica de atender uma dupla função: reparar o dano para minimizar a dor da vítima e punir o ofensor para que o fato não se repita. O STJ apenas altera os valores de indenizações fixados nas instâncias locais quando se trata de quantia tanto irrisória quanto exagerada. O valor do dano moral tem sido enfrentado sob a ótica de atender uma dupla função: reparar o dano para minimizar a dor da vítima e punir o ofensor para que o fato não se repita.
Para o presidente da 3ª Turma, ministro Sidnei Beneti, essa é uma das questões mais difíceis do Direito brasileiro atual. “Não é cálculo matemático. Impossível afastar um certo subjetivismo”, avalia. De acordo com o ministro Beneti, nos casos mais frequentes, considera-se, quanto à vítima, o tipo de ocorrência (morte, lesão física ou deformidade), o padecimento da própria pessoa e dos familiares, circunstâncias de fato (como a divulgação maior ou menor), e consequências psicológicas de longa duração para a vítima.
Quanto ao ofensor, considera-se a gravidade de sua conduta ofensiva, a desconsideração de sentimentos humanos no agir, suas forças econômicas e a necessidade de maior ou menor valor, para que a punição tenha efeito pedagógico e seja um desestímulo efetivo para não se repetir ofensa.
O STJ reconheceu a necessidade de reparação a uma mulher que teve sua foto ao lado de um noivo publicada em jornal do Rio Grande do Norte, noticiando que se casariam. Na verdade, não era ela a noiva, pelo contrário, ele se casaria com outra pessoa. Em primeiro grau, a indenização foi fixada em R$ 30 mil, mas o Tribunal de Justiça potiguar entendeu que não existiria dano a ser ressarcido, já que uma correção teria sido publicada posteriormente. No STJ, a condenação foi restabelecida (Resp. 1.053.534) a R$ 30 mil, limite então pacificado para casos de fofoca social.
Analisando a matéria sob a ótica do direito penal, temos que voltar ao Capítulo IV, do Estelionato e Outras Fraudes, posto que o tema é eminentemente penal. Trata-se de um tipo que exige a chama de cadeia causal, ou seja, uma sequência ordenada de atos cometidos: fraude, erro, vantagem indevida e prejuízo alheio.
O tipo penal apresenta sua definição e requisitos exigidos, como o artifício, ardil ou outro meio fraudulento, induzindo ou mantendo alguém em erro, e por fim a disposição patrimonial com a obtenção de vantagem ilícita, em prejuízo alheio, sendo certo que todas estas condutas devem esta revestida da vontade e do dolo de enganar, de locupletar-se.
A matéria do “estelionato sentimental” passado recente foi enfrentada sob o crivo do direito penal nos Tribunais do Paraná e Rio Grande do Sul.
Neste último, enfrentando matéria em que o denúnciado se locupletava de vítimas em quadro social de fragilidade no campo sentimental decorrente de separação, viuvez, e outras.
Submetido a julgamento foi condenado tendo sua pena totalizada em 43 anos de condenação. Iniciada a execução penal, não alcançou benefício de progressão de regime em face de interposição de Agravo em Execução ministerial, que pugnava pela aplicação da Súmula 439 do STJ, requerendo realização de exame criminológico do sentenciado, o qual atestou a impossibilidade de reingresso à sociedade e por sua vez restou indeferida sua progressão (TJ-RS – Agravo: AGV70048254155 RS).
O “Estelionato Sentimental” firma-se como matéria de reconhecimento cível e penal, dependendo da análise do caso concreto, a demonstração dos requisitos cíveis e reconhecimento de autoria e materialidade para a fixação de decreto condenatório.
Diante do que intitulou-se “estelionato sentimental”, podem ocorrer indenizações pelos danos materiais e morais sofridos e condenação penal pelo ilícito praticado.
Bibliografia
1. Luciano dos Santos Mendes, juiz da 7ª Vara Cível de Brasília
2. TJDF. Acórdão n.866800, 20130110467950APC, Relator: CARLOS RODRIGUES, Revisor: ANGELO CANDUCCI PASSARELI, 5ª Turma Cível, Data de Julgamento: 08/04/2015, Publicado no DJE: 19/05/2015. Pág.: 317
3. https://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI207743,101048-homem+deve+ressarcir+exnamorada+por+emprestimos+e+gastos+diversos
4. GAGLIANO, Pablo Stolze. PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil. Volume III. São Paulo: Saraiva, 2009. P. 111
5. GONÇALVEZ, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Volume II. São Paulo: Saraiva, 2009. P. 246.
6. BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direto Penal: parte especial, Volume 3, 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008. P. 228.
7. BARROS, Francisco Dirceu, CINTRA, Antônio Fernando, Direito Penal Interpretado pelo STF e STJ e comentado pela doutrina, São Paulo: JH MIZUNO, 2014. P.702.