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A possibilidade de reconhecimento do status familiae as uniões paralelas e poliafetivas

O presente trabalho tem por objetivo fazer uma breve síntese a respeito do poliamor e das uniões paralelas, e a possibilidade de reconhecimento do status familiae dessas relações sob o prisma do direito de família.

RESUMO

O presente trabalho tem por objetivo fazer uma breve síntese a respeito do poliamor e das uniões paralelas, e a possibilidade de reconhecimento do status familiae dessas relações sob o prisma do direito de família, fazendo uma análise da doutrina existente, mesmo que esta ainda trate muito pouco sobre o tema, utilizando-se também de jurisprudências e artigos como fonte para que com isso possamos analisar os mais diversos posicionamentos e entendimentos acerca do tema. Mas, para isso tivemos de fazer uma remissão ao valor tutelado da fidelidade e trazendo para tanto a discussão sobre o reconhecimento ou não da monogamia como um princípio. Em suma, podemos dizer que o objetivo desse trabalho é mostrar a importância e relevância dessas uniões na sociedade, e com isso demonstrar que ninguém pode ser desamparado pelo direito de família, e que com o aumento das famílias plurais, esta também deve ter o devido amparo e proteção que o instituto da família merece.

Palavras-chave: direito de família, poliamorismo, uniões paralelas.

ABSTRACT

This paper aims to make a brief summary about polyamory and parallel connections, and the possibility of recognizing the familiae status of these relations through the prism of family law, making an analysis of the existing doctrine, even if it still treat very little on the subject, also using up of jurisprudence and articles as a source for that with this we can analyze the various positions and understandings about the issue. But to do this we had to make a reference to the protected value of fidelity and bringing much discussion about the recognition or non-monogamy as a principle. In short, we can say that our aim is to show the importance and relevance of unions in society, and thus demonstrate that no one can be forsaken by family law, and that with the increase of plural families, this should also take due support and protection to the family institution deserves.

Keywords: family law, poliamorismo, parallel unions.

INTRODUÇÃO

O seguinte trabalho propõe-se a fazer uma análise quanto ao reconhecimento do status familiae às uniões paralelas e poliafetivas na sociedade contemporânea, conjuntamente com o posicionamento do ordenamento jurídico brasileiro.

O surgimento de novos tipos de estruturações familiares implicou em grandes divergências acerca da posição de alguns doutrinadores no que diz respeito a proteção dessas novas “ famílias” pelo ordenamento jurídico. A polêmica acerca da monogamia, que como princípio do direito de família, rege essa entidade, mas que atualmente, vem cada vez mais sendo relativizado, devido à simultaneidade de uniões entre pessoas, o que não é algo tão alheio assim a nossa sociedade, aliás, é um fato muito antigo. Aos poucos essas uniões vêm ganhando espaço, e direitos, como se pode observar perante alguns julgados de tribunais do Brasil, deixando de ser vistas apenas como mero concubinato. Seriam essas uniões paralelas inconstitucionais? Ou essa interferência do Estado na vida privada do cidadão, confrontaria o princípio da dignidade humana, e da mínima intervenção do Estatal no direito de família?  

Mesmo que uniões paralelas poliafetivas não sejam vistas com bons olhos pela sociedade brasileira, a sua existência é inegável e de certo modo requer alguma proteção a parte hipossuficiente da relação, que não pode arcar sozinha com as consequências negativas do concubinato, como a perda imediata da qualidade de vida e do bem estar construído durante a constância da união.

Diante da celeuma que se instalou no direito de família acerca do assunto das uniões paralelas e poliafetivas, os doutrinadores e a jurisprudência ainda não firmaram um entendimento, podendo ser encontrados três posicionamentos.

1. A PROTEÇÃO DA FIDELIDADE NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

Para falarmos das uniões paralelas e poliafetivas, faz-se mister trazer uma breve explicação do que seria a fidelidade para o nosso sistema, onde esta se trata de um valor tutelado pelo ordenamento jurídico brasileiro e é trazido como um dos deveres decorrentes da união estável e do casamento, previsto nos arts. 1566, I e 1724 do Código Civil de 2002, mas que não pode ser garantida, até pelo Princípio da Intervenção mínima do Estado nas relações tuteladas pelo direito de família, sendo bem explanado por Pablo Stolze:

[...] embora a fidelidade (e a monogamia, por consequência) seja consagrada como um valor juridicamente tutelado, não se trata de um aspecto comportamental absoluto e inalterável pela vontade das partes (...) preferimos simplesmente encarar a monogamia como uma nota característica do nosso sistema, e não como um princípio, porquanto, dada a forte carga normativa desse último conceito, é preferível evitá-lo, mormente em se considerando as peculiaridades culturais de cada sociedade. (GAGLIANO E PAMPLONA FILHO, 2010, p. 106)

Como trata Stolze, podemos ver que a fidelidade não pode ser um aspecto absoluto e que a monogamia não se trata de um Princípio em si, mas é tutelado pela lei, sendo a fidelidade intimamente ligada a esta, por ser um valor que é um dos deveres que decorrem da união estável e do casamento.

Como conseqüência da fidelidade, temos a monogamia, que para alguns é considerada como um dos princípios norteadores do instituto do casamento, mas partilhamos do entendimento de Maria Berenice Dias, que bem fala:

Ainda que a lei recrimine de diversas formas quem descumpre o dever de fidelidade, não há como considerar a monogamia como princípio constitucional, até porque a Constituição não a contempla. [...] No entanto, pretender elevar a monogamia ao status de princípio constitucional autoriza que se chegue a resultados desastrosos. (DIAS, 2006 apud GOECKS & OLTRAMARI, 2008)

 Como foi dito acima, a bigamia é recriminada no ordenamento jurídico brasileiro, e é crime tipificado no art. 235 do Código Penal, sendo importante ressaltar que tal crime é relacionado com o instituto do casamento, e só se configura quando o indivíduo civilmente casado contrai núpcias novamente, sem ter ocorrido separação de fato ou divórcio.

2. A EVOLUÇÃO DO CONCUBINATO NOS CÓDIGOS, E A SUA RELAÇÃO COM A UNIÃO ESTÁVEL PUTATIVA E OS DIREITOS DA AMANTE

2.1. A evolução do concubinato no Código de 1916 até o Código Civil de 2002

Para melhor entendermos o concubinato e a união estável, devemos fazer uma remissão ao Código Civil de 1916, que trazia duas modalidades de concubinato. O puro, que hoje é a conhecida União Estável, trazida pelo Código Civil de 2002 no seu artigo 1.723, que diz: “É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família”, no qual são garantidos os direitos a herança, sucessão, dentre outros. Já o concubinato impuro, é o que hoje é tido simplesmente como concubinato e vem previsto no Art. 1.727, vide letra da lei: “As relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar, constituem concubinato”, e a concubina só lhe é garantido o direito a divisão do patrimônio adquirido por esforço comum, desde que provado, mas sempre com o fim de evitar o enriquecimento ilícito, ocorrendo tal divisão pelo Direito Obrigacional, via sociedade de fato.

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2.2. Diferenças entre a união estável putativa e concubinato impuro

Como dissemos no tópico anterior, o concubinato impuro é aquele trazido no art. 1727 do Código Civil, e se configura quando um indivíduo que possui algum tipo de impedimento matrimonial passa a constituir um segundo relacionamento não eventual e duradouro, podendo este vir a formar um núcleo familiar paralelo, até mesmo semelhante com o já estabelecido, sendo este segundo não reconhecido pela lei, podendo ser bem definido nas palavras de Silvio Neves Baptista:

 [...] se não há impedimento matrimonial, entende-se estável a união notória, contínua e duradoura; se há impedimento matrimonial (ainda que a união seja notória, contínua e duradoura), a união permanente ou não eventual é considerada concubinato [...]. (grifo do autor) (BAPTISTA, 2005 apud GOECKS & OLTRAMARI, 2008)

Diferentemente das pessoas separadas de fato, o concubinato não gera direito a alimentos, direitos sucessórios ou direito à meação, pois não trata-se de uma entidade familiar e sim de uma sociedade de fato, gerando apenas direito de cunho obrigacional, súmula 380 do STF “ comprovada a existência de sociedade de fato entre os concubinos , é cabível sua dissolução judicial com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum”.

Em contrapartida, temos o que seria um concubinato puro ou de boa-fé, que ocorre no caso de um indivíduo possuir um segundo relacionamento paralelo àquele já reconhecido pelo direito de família, onde esta pessoa estaria envolvida emocionalmente com indivíduo casado ou que mantém união estável, sem saber dessa situação. Exemplifiquemos para melhor esclarecer: Carlos, casado civilmente com Júlia, trabalha em um grande escritório de advocacia, e mesmo possuindo sua residência fixa onde tem seus filhos com Júlia em Sobral, precisa está de uma a duas vezes por mês em São Paulo, onde acabou também estabelecendo um relacionamento paralelo com Luciana, estando esta de boa-fé por não saber do estado civil de seu parceiro. Mas vejamos, seria justo desamparar Luciana por ter se envolvido com um homem casado mesmo sem saber de tal situação? Maria Berenice Dias traz de forma breve como deve se resolver tal situação:

(...) procede-se à identificação de espécies: concubinato adulterino puro ou de boa-fé e concubinato adulterino impuro ou de má-fé. A diferença centra-se exclusivamente no fato de a mulher ter ou não ciência de que o parceiro se mantém no estado de casado ou tem outra relação concomitante (...) somente quando a mulher é inocente, isto é, afirma não ser sabedora de que seu par tem outra, há o reconhecimento de que ela está de boa-fé e se admite o reconhecimento da união estável, com o nome de união estável putativa. (DIAS, 2010a)

Por se tratar de envolvimento pautado na boa-fé, há o entendimento de que deva ser reconhecida a união estável putativa para com a segunda parceira, pois de acordo com GOECKS & OLTRAMARI (2008): “Entende-se, então, que a boa-fé retira a ilicitude de seus atos, uma vez que o sujeito ignora determinada situação”.

Diante da situação dessas uniões, deve ser observada a boa-fé do companheiro da segunda relação, pois se este desconhece a verdadeira situação civil de seu parceiro, o seu vínculo conjugal pré-estabelecido, ou sua união estável, estamos perante a configuração de uma união estável putativa. Em virtude dessa convicção de formação familiar, o princípio da monogamia deixa de ser absoluto e passa a ser relativizado, perante o reconhecimento dessa união putativa, porém se o companheiro não estiver agido com ignorância, ou despido de boa-fé, essa relação será caracterizada pelo o concubinato.

2.3. Direitos da Amante

Não é raro encontrarmos casais que vivem em vida conjugal e um dos cônjuges mantenha vínculo amoroso com outra pessoa. Citemos o caso em que um homem que obtém relação conjugal com sua esposa e viva uma relação paralela com sua amante. Com o passar dos anos o constante vínculo amoroso com sua amante poderá criar certa dependência desta com esse sujeito e daí acabando por se originar uma relação não só de afeto, mas de dependência, onde um dos sujeitos, no caso a mulher, dependa do auxílio do homem para o seu sustento financeiro para obtenção de uma vida digna.

Diante desse exemplo de situação, se originou um interessante debate acerca da possível tutela de ambas as relações, se o Direito deveria proteger a relação construída com a esposa e a relação mantida com a amante. E em caso afirmativo, esta tutela se daria pelas normas do direito de Família ou do Direito Obrigacional, como sendo uma sociedade de fato, a fim de evitar o enriquecimento ilícito?

Para tentarmos esclarecer algumas dessas questões, como já dissemos e não custa relembrar, a fidelidade é um valor protegido pelo nosso ordenamento jurídico. O art. 1556, I, do Código Civil menciona que a fidelidade é um dos deveres de ambos os cônjuges. A violação de tal dever poderá acarretar na possibilidade de dissolução da sociedade conjugal até mesmo com conseqüência para um dos cônjuges, porém acha-se que não seria coerente o Estado intervir na esfera íntima dos casais obrigando-os a ter uma fidelidade recíproca, levando- se em conta o princípio da intervenção mínima do Estado no Direito de Família.

A relação jurídica entre a pessoa casada ou em união estável com sua amante dependerá muito do caso concreto. Vejamos a situação em que o partícipe da segunda relação desconheça a situação jurídica do seu parceiro, nesse caso a aplicação da tutela é bastante viável. Nesse sentido, Rolf Madaleno:

Desconhecendo a deslealdade do parceiro casado, instaura-se uma nítida situação de união estável putativa, devendo ser reconhecidos os direitos do companheiro inocente, o qual ignorava o estado civil de seu companheiro, e tampouco a coexistência fática e jurídica do precedente matrimonio, fazendo jus, salvo contrato escrito, à meação dos bens amealhados onerosamente na constância da união estável putativa em nome do parceiro infiel, sem prejuízo de outras reivindicações judiciais, como, uma pensão alimentícia, se provar a dependência financeira do companheiro casado e, se porventura o seu parceiro vier a falecer na constância da união estável putativa, poderá se habilitar à herança do de cujus, em relação aos bens comuns, se concorrer com filhos próprios ou a toda a herança,se concorrer com outros parentes (MADALENO, 2008 apud STOLZE, 2008)

Por outro lado, há casos mais complicados a serem debatidos, quando ocorre, por exemplo, o homem casado ou em união estável, mantém relação de concubinato com sua amante e esta sabe perfeitamente a situação jurídica do seu parceiro. Nesses tipos de casos ocorre muitas vezes que a amante pelo seu profundo vínculo com o seu companheiro acaba colaborando para a formação direta ou indireta da formação do patrimônio do mesmo. Em situações como essa seria plena injustiça negar tutela a amante, que de um modo ou de outro influenciou para o aumento do patrimônio do companheiro.

No mais das vezes, para que possa ser admitida a tutela jurídica da amante é importante ser comprovado uma relação afetiva constante, duradoura, como se fosse um núcleo familiar paralelo ao da realidade.

3.    A CONSTITUCIONALIDADE DA UNIÃO POLIAFETIVA

A discussão a respeito do reconhecimento das uniões paralelas ou poliafetivas tem causado grandes divergências de opiniões e posicionamentos. Antes de qualquer coisa é necessário delinear o que são essas uniões. Uniões paralelas ou concomitantes são aquelas onde num mesmo lapso temporal, alguém simultaneamente se coloca como integrante de duas ou mais entidades familiares, podendo ser duas ou mais uniões estáveis, ou um casamento com outra(s) união(s) estável(s). (MELO, 2010, pag. 03)

Existem controvérsias acerca da constitucionalidade da união poliafetiva, também conhecida como poliamor ou poliamorismo, que para Pablo Stolze (2008) pode ser definida como “[...] teoria psicológica que começa a descortinar-se para o Direito, admite a possibilidade de coexistirem duas ou mais relações afetivas paralelas, em que os seus partícipes conhecem e aceitam uns aos outros, em uma relação múltipla e aberta”.

Alguns defendem a ideia de que tal união é inconstitucional, tendo em vista que afronta o artigo 226, parágrafo terceiro da Carta Magna. No referido artigo, tem-se que é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.  Porém, no artigo supracitado, o legislador não deixou claro se a união pode ser entre mais de duas pessoas, fato este que de um lado demonstra a constitucionalidade da união poliafetiva.

 Contudo, vale ressaltar que, o fato de uma pessoa casada contrair casamento com outra é considerado um fenômeno inconstitucional, caracterizando a bigamia, que é o casamento entre mais de duas pessoas, o que no Brasil é tipificado como crime no artigo 235 do Código Penal.

O registro feito em cartório em relação à união entre mais de duas pessoas não pode ser considerado ilegal, desde que fique declarada a vontade das partes de conviverem juntas, valendo ressaltar também, que o reconhecimento da união poliafetiva neste caso não configura o casamento, pois este último, até onde temos conhecimento é realizado entre dois indivíduos.

4. UNIÃO POLIAFETIVA REGISTRADA EM TUPÃ – SP

O primeiro caso de tentativa de reconhecimento de união poliafetiva surpreendeu o ordenamento jurídico em agosto de 2012, com a notícia que acontecia na cidade de Tupã, do interior do Estado de São Paulo, onde um homem e duas mulheres, que já viviam na mesma casa há três anos resolveram regularizar a situação em que estavam vivendo, e para isso dirigiram-se ao Cartório de Registro Civil e lavraram uma escritura de uma união estável entre três pessoas, ou seja, fizeram uma escritura pública de união poliafetiva. Tal fato somente foi publicado no Diário Oficial após três meses e sua escritura, no dia 22 de agosto.

A tabeliã Cláudia do Nascimento Domingues que realizou o registro da união poliafetiva, afirma que: “A declaração é uma forma de garantir os direitos de família entre eles. Como eles não são casados, mas, vivem juntos, portanto, existe uma união estável, onde são estabelecidas regras para estrutura familiar”.

O presidente da Ordem dos Advogados de Marília, Tayon Berlanga, explicou que o documento funciona como uma sociedade patrimonial. “Ele dá direito ao trio no que diz respeito à divisão de bens em caso de separação e morte. No entanto, não garante os mesmo direitos que uma família tem de, por exemplo, receber pensão por morte ou conseguir um financiamento no banco, para a compra da casa própria, outro exemplo é ser dependente em planos de saúde e desconto de dependente na declaração do imposto de renda”.

5. POSICIONAMENTOS DOUTRINÁRIOS

Atualmente existe um intenso conflito com relação às uniões poliafetivas ou paralelas, aonde vem gerando muitos questionamentos e dúvidas sobre a possibilidade do seu reconhecimento, dentro da jurisprudência com nas doutrinas, já são três posicionamentos levantados a respeito do presente tema.

A primeira corrente é minoritária, derivada de opiniões de doutrinadores mais críticos sobre o assunto que acreditam ser uma afronta a Constituição Federal, pois é dever do cônjuge ser fiel e garantir plena lealdade dentro do matrimônio, sendo apontado ainda, que no momento que se permite essas uniões, estar-se-á infringindo o principio da monogamia, pois não poderia existir o affectio maritalis sem o rompimento da relação anteriormente estabelecida, resumindo, esta corrente não está a favor do reconhecimento de uniões concomitantes, onde acreditam que acabaria por aceitar a bigamia e a poligamia dos casamentos.

Esse posicionamento é adotado por Maria Helena Diniz, onde afirma haver problema no fato de garantir os direitos e obrigações a uma relação continua e duradoura, pelo motivo de ser uma união entre três pessoas.

Já com relação à segunda corrente doutrinária, a qual é a majoritária, é afirmado que essas uniões paralelas só deveram ser reconhecidas em casos de direito obrigacional, quando tiverem o fim de não gerar um enriquecimento ilícito do cônjuge infiel, porém são admitidas as uniões estáveis, desde que motivadas pelo principio da boa-fé. Como uma forma de solucionar o problema, tal teoria aponta que devem ser aplicadas as regras geradas por uma união estável, ignorando os vícios apresentados. Lembrando de que cabe perfeitamente uma indenização por danos morais para aqueles que sofreram com as atitudes geradas de má-fé pelo parceiro. Autores como Flavio Tartuce, José Fernando Simão e Álvaro Villaça Azevedo adotam este posicionamento.

Por ultimo o terceiro e mais novo posicionamento, adotado por Maria Berenice Dias, afirma que as uniões paralelas poderiam ser reconhecidas como uniões estáveis sem nenhum problema e cabendo ainda a elas serem amparadas pelo Direito de Família. Apontando que o direito deve se atualizar de acordo com os acontecimentos correspondentes a realidade social enfrentada nas famílias brasileiras de hoje, já que esse tipo de união poliafetiva sempre existiu e continuará a estar presente, portanto, diante destes fatos não deve ficar de fora da legislação.

Claro que justificativas não faltam a quem quer negar efeitos jurídicos à escritura levada a efeito. A alegação primeira é afronta ao princípio da monogamia, desrespeito ao dever de fidelidade. Com certeza rejeição que decorre muito mais do medo das próprias fantasias. O fato é que descabe realizar um juízo prévio e geral de reprovabilidade frente a formações conjugais plurais e muito menos subtrair qualquer sequela à manifestação de vontade firmada livremente pelos seus integrantes. (DIAS, 2013)

Para Maria Berenice Dias, não há que se tolher direitos, nem realizar prévio julgamento discriminatório frente às novas constituições conjugais, sejam elas plurais ou não, mas sim aceita-las, pois  é preciso reconhecer os diversos tipos de relacionamentos que fazem parte da nossa sociedade atual.  Temos que respeitar a natureza privada dos relacionamentos e aprender a viver nessa sociedade plural reconhecendo os diferentes desejos.” (IBDFAM, 2012)

6. O RECONHECIMENTO DO STATUS FAMILIAE AS UNIÕES PARALELAS E POLIAFETIVAS

Até hoje, no que se tem de doutrina e jurisprudência, não houve o reconhecimento do status familiae a nenhuma união poliafetiva, ou seja, o direito de família ainda não tutelou nenhuma união entre mais de dois indivíduos, o que ocorreu foi a realização de escritura de união estável, mas só com fins patrimoniais, sendo tutelada pelo Direito Obrigacional, visando a divisão de bens e despesas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como podemos ver, o direito de família vive em constante mudança e não devemos ser inflexíveis e insensíveis a evolução da sociedade, não podendo o direito ficar a parte dessa constante mutação.

Cabendo sempre a lei o dever de tutelar as mais diversas situações e relações inclusive aquelas pautadas pelo direito de família, já que esta é tutelada constitucionalmente, e merece todo o amparo estatal.

A partir da perspectiva da pluralidade de arranjos familiares existentes, nos deparamos com o poliamor, que como toda celeuma do direito familiar causou e ainda causa grande divergência doutrinaria e jurisprudencial, não existindo ainda posicionamento do que seria certo ou errado, mas sim a certeza de que não podemos desamparar ninguém, seja esta pessoa concubina ou esposa, os juristas tem o papel de dirimir tais conflitos e dentro das possibilidades resolver da forma mais sensata e que cause menos danos a ambos na relação.

Por se tratar de tema novíssimo na área jurídica, só nos resta acreditar no bom senso de nossos juízes e tribunais, e terminar com a sábia frase de Maria Berenice Dias: “Está na hora de buscar a felicidade e usufruir exclusivamente das alegrias que o comprometimento afetivo enseja, isto é, o direito de ter alguém em quem confiar, com quem dividir tristezas e multiplicar bons momentos”. (DIAS, 2013b)

REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm > Acesso em 19 de setembro de 2015.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Disponível em < http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=jurisprudenciaSumula&pagina=sumula_301_400 > Acesso em 19 de setembro de 2015.

DIAS, Maria Berenice. Adultério, bigamia e união estável: realidade e responsabilidade. Publicado em 30 de agosto de 2010a. Disponível em: < http://www.mariaberenice.com.br/uploads/4_-_adult%E9rio%2C_bigamia_e_uni%E3o_est%E1vel_-_realidade_e_responsabilidade.pdf >. Acesso em: 23 de novembro de 2013.

DIAS, Maria Berenice. Amor Proibido. Publicado em 31 de agosto de 2010. Disponível em: <http://www.mariaberenice.com.br/uploads/5_-_amor_proibido.pdf>. Acesso em: 23 de novembro de 2013.

DIAS, Maria Berenice. Escritura de União Poliafetiva- possibilidade. Ano 2013. Disponível em: <http://arpen-sp.jusbrasil.com.br/noticias/100173615/artigo-escritura-de-uniao-poliafetiva-possibilidade-por-maria-berenice-dias>. Acesso em: 24 de novembro de 2013.

GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo Curso de Direito Civil, volume VI: As Famílias em Perspectiva Constitucional. São Paulo: Saraiva 2010.

GOECKS, Renata Miranda, OLTRAMARI, Vitor Hugo. A possibilidade do reconhecimento da união estável putativa e paralela como entidade familiar. Disponível em: < http://www.lfg.com.br> 30 junho. 2008. Acesso em: 26 de novembro 13.

IBDFAM, Assessoria de Comunicação do. Escritura reconhece união afetiva a três. Notícia de 21 de agosto de 2012. Disponível em: < http://www.ibdfam.org.br/noticias/4862/novosite > Acesso em 20 de setembro de 2015.

MELO, Giovana Pelágio. Uniões Concomitantes. Publicado em 2010. Disponível em: < http://www3.pucrs.br/pucrs/files/uni/poa/direito/graduacao/tcc/tcc2/trabalhos2010_2/giovana_melo.pdf > Acesso em 20 de setembro de 2015.

Site G1. União estável entre três pessoas é oficializada em cartório de Tupã, SP. Reportagem de 28 de agosto de 2012.< http://g1.globo.com/sp/bauru-marilia/noticia/2012/08/uniao-estavel-entre-tres-pessoas-e-oficializada-em-cartorio-de-tupa-sp.html > Acesso em: 25 de novembro de 2013.

STOLZE, Pablo. Direitos da (o) amante. Na teoria e na prática (dos tribunais). Jus Navigandi, Teresina, ano 13, n. 1841, 16 jul. 2008. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/11500>. Acesso em: 22 de novembro de 2013.

TARTUCE, Flávio. Escritura pública de Tupã reconhece poliamorismo. 24 de agosto de 2012 <http://professorflaviotartuce.blogspot.com.br/2012/08/escritura-publica-de-tupa-reconhece.html>. Acesso em 26 de novembro de 2013.

Sobre os autores
Beatriz Aguiar Cardoso

Estudante de Direito do 10º semestre da Faculdade Luciano Feijão - FLF.

Yan Paula Pessoa Dias Andrade

Eestudante do 10º semestre de Direito da Faculdade Luciano Feijão

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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