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Da função social e boa-fé objetiva nos contratos

Agenda 03/11/2015 às 20:41

Este trabalho tem por objeto o aprofundamendo do estudo sobre a relação da função social do contratos com o princípio da boa-fé objetiva, sob a ótica do Codigo Civil de 2002.

Introdução

Contrato é uma espécie de negócio jurídico que depende, para sua formação, de duas partes. Portanto, pode ser um negócio jurídico bilateral ou plurilateral. Para se celebrar um contrato deve haver vontade humana aliada com a devida conformidade para com a ordem jurídica. Como efeito da referida celebração, obtém-se a criação de direitos e obrigações.

O doutrinador Clóvis Bevilaqua definia desde há muito tempo que o contrato é um acordo de vontades para o fim de adquirir, resguardar, modificar ou extinguir direitos.

O código Civil Brasileiro de 2002 disciplina três espécies de contratos nominados. Contudo, o objetivo desse trabalho não é concernente à especificação dos diversos contratos existentes e sim abordar princípios que são inerentes e fundamentais a todos eles, sem exceção. Nesse trabalho, no que tange à função social dos contratos, abordarei sua definição no Código Civil, suas características e a relação da função social dos contratos com os demais princípios do Direito. No que concerne ao príncipio da boa-fé, abordarei sua definição no Código Civil, deveres anexos à boa-fé e os demais Institutos relacionados. 

1 Da função social do contrato

O principal objetivo do principio da função social dos contratos é a tentativa de promover a realização de uma justiça comutativa, diminuindo as desigualdades entre os contratantes. A função social do contrato determina que os interesses individuais das partes do contrato sejam exercidos em conformidade com os interesses sociais.           

1.1 A função social do contrato no código civil

A função social do contrato mostra plena conformidade com o ordenamento, uma vez que encontra-se disposta no artigo 421 do Código Civil. Senão vejamos:

 (...)

 Art. 421. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato.

(...)

                                           De acordo com o conteúdo disposto no artigo, é possível observar que, embora a atividade econômica seja livre no Brasil, deve haver, obrigatoriamente, o devido respeito ao norteamento limitado pela justiça social.

1.2 Características da função social do contrato

A função social do contrato determina que os interesses individuais das partes do contrato sejam exercidos em conformidade com os interesses sociais. Segundo o autor Paulo Lobo, não pode haver conflitos entre os interesses sociais e particulares, uma vez que interesses sociais sempre prevalecem. Ademais, qualquer contrato repercute no ambiente social, ao promover peculiar e determinado ordenamento de conduta e ao ampliar o tráfico jurídico.

A função social deve ser atingida sob dois aspectos e interesses: o primeiro é o individual, que concerne aos contratantes que se utilizam do contrato para realizar interesses próprios, e o segundo, por sua vez, é o interesse público, que pode ser traduzido como aquele que se refere ao interesse da sociedade sobre o contrato.

A função exclusivamente individual de contrato é incompatível com o Estado Social, caracterizado, sob o ponto de vista do direito, pela tutela da ordem econômica e social, na Constituição Federal. Portanto, enquanto houver ordem econômica e social haverá função social do contrato.

1.3 Relação da função social do contrato com demais princípios do direito

Importante destacar que função social dos contratos não é um princípio autônomo. Existe a ligação com diversos outros princípios do direito como o da autonomia da vontade, obrigatoriedade etc.

O princípio da função social dos contratos pode ser considerado uma “adaptação” para o âmbito das relações contratuais do princípio constitucional da justiça social, uma vez que um contrato pode representar a justiça e, consequentemente, uma relação de igualdade e lealdade entre contratantes ou, por outro lado, a exploração da parte mais vulnerável.

Não se deve confundir função econômica do contrato com função social. A primeira diz repeito aos interesses particulares das partes contratantes. Já a segunda, por sua vez, pode ser traduzida por algo exterior ao contrato que a ele se integra, independente da vontade das partes.

2: Da boa-fé objetiva

A boa-fé objetiva diz respeito à norma de comportamento ideal a ser seguido em uma relação contratual, ou seja, define os princípios básicos para uma relação contratual horizontal e justa, tais como: honestidade, lealdade, consideração para com os interesses do outro etc. A boa fé objetiva pode ser considerada como um modelo de conduta a ser seguido, de modo a obter-se uma relação jurídica justa.

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 2.2: Boa fé objetiva no Código Civil

 No Código Civil existem três artigos que fazem referência direta à boa fé objetiva. Primeiramente, o artigo 113 expõe, de maneira clara e objetiva, que todos os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa fé. Desse modo, resta clara a abrangência do princípio da boa fé no tocante aos contratos. Senão vejamos:

(...)

Art. 113. Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração.

(...)

Já o artigo 187, por sua vez, demonstra a ilicitude daquele que excede os limites da boa fé, uma vez que já foi citada a necessidade da obrigatória observância do princípio da boa fé nos negócios jurídicos. Senão vejamos:

 (...) 

Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

(...)

Por fim, a redação do artigo 422 sugere que deve haver a efetiva observância do princípio da boa fé desde a fase que antecede a celebração do contrato, também denominada de tratativas, até o cumprimento do contrato. Portanto, deve ocorrer desde o início até o fim da relação contratual. Senão vejamos:

(...)

Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.

(...)

Já o Código de Defesa do Consumidor adotou a boa fé como cláusula geral de abertura.

2.3: Deveres anexos à boa fé

Os deveres anexos à boa fé derivam do princípio da boa fé. São eles:

2.3.1: deveres laterais têm por objetivo o esclarecimento concernente ao uso do bem alienado;

2.3.2: deveres de proteção visam evitar perigos que coloquem o bem em risco;

2.3.3: deveres de conservação procuram conservar coisa recebida para experiência;

2.3.4: lealdade: motivam-se na preservação da lealdade contratual.

2.4: Institutos relacionados à boa fé objetiva

A boa-fé pode atingir diretamente o componente obrigacional, seja para lhe ampliar o conteúdo ou para diminuí-lo. Nesse contexto, temos quatro institutos: venire contra factum proprium, supressio, surrectio e tu quoque.

2.4.1: Venire contra factum proprium

Tem por objetivo vedar a execução do direito subjetivo quando se caracteriza abuso da posição. Desse modo, pode ser exemplificado como a proteção de um contratante contra um excesso ou comportamento diferente daquele proposto anteriormente no contrato. Diante disso, passa a haver a perda de confiança de uma das partes, visto que a confiança foi quebrada de maneira abrupta e inesperada.

2.4.2: Supressio

Pode ser considerada a supressão de uma obrigação contratual motivada pela hipótese em que não há a observância do exercício do direito correspondente pelo credor. Como consequência desse fato, é gerada no devedor, de maneira justa, a expectativa de que esse exercício não se prorrogará no tempo.

2.4.3: Surrectio

surrectio, ao contrário da supressio, representa a ampliação do conteúdo obrigacional. Na prática, ocorre quando uma atitude de uma das partes gera na outra a expectativa de direito ou faculdade não pactuada.

2.4.4: Tu quoque

No tocante à tu quoque, o artigo 50 do Código Civil exemplifica de maneira clara e objetiva esse princípio limitador. Senão vejamos:

(...)

Art. 150. Se ambas as partes procederem com dolo, nenhuma pode alegá-lo para anular o negócio, ou reclamar indenização.

(...)

De maneira resumida, uma parte não pode exigir um comportamento da outra parte se ele mesmo não o observou.

Conclusão

Após a análise da função social dos contratos e da boa fé objetiva, percebe-se que houve uma preocupação do legislador, no sentido de proteger aquele que pode ser o lado mais frágil da relação contratual. Sem essa tutela, certamente ocorreriam relações contratuais verticais, contrariando complemente qualquer ideia que se assemelhe ao conceito da justiça.

Todavia, é deveras importante destacar que, embora as leis que concernem à função social e à boa fé sejam bem elaboradas, claras e objetivas, é a aplicabilidade por meio dos operadores que garantirá o efetivo cumprimento. Portanto, para o efetivo alcance da justiça, estes princípios devem ser usados por todos os aplicadores do direito.

Foi possível perceber uma íntima ligação entre a boa fé e a função social dos contratos, uma vez que ambos buscam uma relação contratual leal, justa e correta. Por fim, conclui-se que a função social dos contratos diz respeito aos interesses individuais das partes do contrato sejam exercidos em conformidade com os interesses sociais. Já a boa fé objetiva diz respeito à norma de comportamento ideal a ser seguido em uma relação contratual, ou seja, define os princípios básicos para uma relação contratual horizontal e justa.

Referências

. Gomes, Orlando,  Teoria Geral dos Contratos, São Paulo, Editora Forense, 17ª edição, 2007.

. Gonçalves, Carlos Roberto, Direito Civil Brasileiro: Contratos, São Paulo, Editora Saraiva, 5ª edição, 2002.

. Lobo, Paulo, Direito Civil: Contratos, São Paulo, Editora Saraiva, 2011.

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