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A atenuante da confissão espontânea reconhecida frente a alegação de legitima defesa

Agenda 24/11/2015 às 21:16

A jurisprudência que erroneamente deixava de reconhecer a atenuante da confissão espontânea quando o réu arguia ter agido sob a excludente da legitima defesa se firma em sentido oposto reconhecendo que mesmo a confissão parcial é aplicável.

O problema:

O artigo 65 III alínea d do CP prevê como atenuante a confissão da autoria do delito perante autoridade. In verbis:

Art. 65 - São circunstâncias que sempre atenuam a pena:

      III - ter o agente:

              d) confessado espontaneamente, perante a autoridade, a autoria do crime;

Em contrapartida a previsão legal em seu artigo 25 prevê a excludente de ilicitude da legitima defesa:

Art. 25 - Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.

Trata-se a legitima defesa de excludente da ilicitude, ou seja, quando o agente comete um ato expressamente proibido em lei, há a previsão também expressa de situações onde embora o ato seja ilícito a conduta do agente não o será.

A dúvida do julgador surgia quando o réu apesar da alegação de legitima defesa vinha a ser condenado, deve o mesmo ser beneficiado com a atenuante da confissão espontânea diante do fato de ter assumido a autoria do crime ou não poderá ser configurada eis que apesar de admitir o delito o agente alegou agir sob conduta que não poderia ser considerada ilícita??????

Os entendimentos:

A jurisprudência entendia que quando o réu confessava o delito mas alegava ter agido sob a excludente da legitima defesa, este na verdade não admitia o cometimento do crime e portanto seria inaplicável a atenuante da confissão espontânea.

Frise-se os presentes julgados do tribunal de Justiça do Distrito Federal no ano de 2008:

Ementa: APELAÇÃO CRIMINAL - TENTATIVA DE HOMICÍDIO - CONFISSÃOCUMULADA COM INVOCAÇÃO DE LEGÍTIMA DEFESA - REJEIÇÃO DA ATENUANTE - JULGAMENTO NÃO CONTRÁRIO À PROVA DOS AUTOS - ALEGAÇÃO DE PENA-BASE EXACERBADA - 1. APENAS A DECISÃO COMPLETAMENTE DISSOCIADA DAS PROVAS ACOSTADAS AOS AUTOS ENSEJA O NOVO JULGAMENTO PELO TRIBUNAL DO JÚRI. 2. PODEM OS JURADOS NEGAR A ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA QUANDO O RÉU, A PAR DE CONFESSAR A AUTORIA DO CRIME, INVOCA A DIRIMENTE DALEGÍTIMA DEFESA, ESTA SIM, MANIFESTAMENTE CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS E CORRETAMENTE REJEITADA PELOS JUÍZES LEIGOS.3. NÃO OFENDE O PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA CONSIDERAR-SE, PARA FIM DE FIXAÇÃO DA PENA, A EXISTÊNCIA DE INQUÉRITOS POLICIAIS E DE PROCESSOS PENAIS EM ANDAMENTO COMO INDICATIVO DE MAUS ANTECEDENTES. PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.( TJ-DF - APELACAO CRIMINAL APR 20030710084215 DF (TJ-DF) Data de publicação: 19/11/2008)

Ementa: APELAÇÃO CRIMINAL - HOMICÍDIO QUALIFICADO - CONFISSÃOCUMULADA COM INVOCAÇÃO DE LEGÍTIMA DEFESA - REJEIÇÃO DA ATENUANTE - JULGAMENTO NÃO CONTRÁRIO À PROVA DOS AUTOS - ALEGADO BIS IN IDEM NA APLICAÇÃO DA PENA - NÃO OCORRÊNCIA - PENA-BASE EXACERBADA - REDUÇÃO PROPORCIONAL - PROVIMENTO PARCIAL. 1. APENAS A DECISÃO COMPLETAMENTE DISSOCIADA DAS PROVAS ACOSTADAS AOS AUTOS ENSEJA O NOVO JULGAMENTO PELO TRIBUNAL DO JÚRI. 2. PODEM OS JURADOS NEGAR A ATENUANTE DA CONFISSÃOESPONTÂNEA QUANDO O RÉU, A PAR DE CONFESSAR A AUTORIA DO CRIME, INVOCA A DIRIMENTE DA LEGÍTIMA DEFESA, ESTA SIM, MANIFESTAMENTE CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS E CORRETAMENTE REJEITADA PELOS JUÍZES LEIGOS. 3. NÃO OCORRE BIS IN IDEM NA APLICAÇÃO DA PENA SE O JUIZ SENTENCIANTE DECLARA EXPRESSAMENTE QUE O FATO DE TER O RÉU ATACADO A VÍTIMA QUANDO ESTA SE ENCONTRAVA COMPLETAMENTE EMBRIAGADA CONTARÁ APENAS COMO CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL DESFAVORÁVEL E NÃO COMO QUALIFICADORA PREVISTA NO INCISO IVDO PARÁGRAFO 2º DO ARTIGO 121 DO CÓDIGO PENAL . 4. SE A PENA-BASE FOI ESTABELECIDA EM PATAMAR EXACERBADO, SEM QUE SE LEVASSE EM CONTA A PREPONDERÂNCIA DE CIRCUNSTÂNCIAS FAVORÁVEIS AO RÉU, CUMPRE REDUZI-LA AOS LIMITES DE SUA JUSTA MEDIDA. 5. RECURSO A QUE SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO (TJ-DF - APELACAO CRIMINAL APR 20060150087082 DF (TJ-DF) Data de publicação: 25/03/2008)

O entendimento da jurisprudência se baseava no sentido de que a confissão quando aparada em elementos defensivos como a insurgência da legitima defesa não seria completa razão pela qual o autor não estaria admitindo o cometimento do crime mas defendendo-se razão pela qual seria inaplicável a atenuante da confissão espontânea.

O entendimento majoritário seguia a linha de que a admissão do réu apenas dos elementos objetivos do crime, não ensejaria a confissão espontânea eis que para configurar o crime necessários os elementos subjetivos.

Ou seja, sem a admissão dos elementos subjetivos o crime não estaria configurado e o réu teria admitido apenas meio crime e portanto inaplicável a regra do artigo 65 III alínea d do CPP vigente.

Apesar deste entendimento já haver sido contrariado em decisão no ano de 1992, quando o STF (Supremo Tribunal Federal) ao julgar o HC 69479  acolheu entendimento do relator daquele caso, ministro Marco Aurélio, no sentido de que “a simples postura de reconhecimento da prática do delito, e portanto da responsabilidade, atrai a observância – por sinal obrigatória – da regra insculpida na alínea “d” do inciso III do artigo 65 do CP”, a maioria da jurisprudência seguia a risca de que diante da arguição de legitima defesa seria inviável a aplicação da atenuante da confissão espontânea.

A mudança:

O entendimento jurisprudencial passou a se modificar após o julgamento do HC 99436 em 26/10/2010 quando a primeira Turma do STF concedeu a ordem para que o impetrante Jorge Luiz Portela Costa, condenado a sete anos de reclusão por homicídio tentado, tivesse sua pena recalculada.

Esta foi a jurisprudência:


EMENTA: HABEAS CORPUS. PENAL. TENTATIVA DE HOMICÍDIO. CONFISSÃO ESPONTÂNEA. ALEGAÇÃO DE INCIDÊNCIA DA CIRCUNSTÂNCIA ATENUANTE: POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. HABEAS CORPUS CONCEDIDO. 1. A circunstância atenuante pertinente à confissão espontânea, ainda que parcial, é aplicável àquele que confessa a autoria do crime independentemente da admissão do dolo ou das demais circunstâncias narradas na denúncia. Precedentes. 2. Habeas corpus concedido. (HC 99436 / RS - RIO GRANDE DO SUL HABEAS CORPUS Relator(a):  Min. CÁRMEN LÚCIA Julgamento:  26/10/2010           Órgão Julgador:  Primeira Turma Publicação DJe-235 DIVULG 03-12-2010 PUBLIC 06-12-2010 EMENT VOL-02445-01 PP-00113 Parte(s) PACTE.(S)           : JORGE LUIZ PORTELA COSTA IMPTE.(S)           : DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO COATOR(A/S)(ES)     : SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA)

Naquele processo, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul havia negado o reconhecimento da confissão espontânea por entender que “não opera em favor do réu, como atenuante, a admissão por ele apenas das circunstâncias objetivas do crime”. A defesa recorreu, então, ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), que também negou o pedido, alegando que “a confissão qualificada, na qual o agente agrega à confissão teses de defesa não tem o condão de ensejar o reconhecimento da atenuante prevista no artigo 65, inciso III, alínea “d” do Código Penal (CP)”.

Apenas após a impetração do remédio processual a confissão qualificada foi reconhecida e passou a ser um marco eis que mudaria o entendimento majoritário dos julgadores.

Ao reconhecer a aplicação da atenuante da confissão espontânea mesmo quando há a existência da alegação de legitima defesa o julgador passa a analisar muito mais do que os elementos objetivos e subjetivos que configuram o crime mas também a própria natureza humana, eis que confessar o delito é de regra contrário a natureza de qualquer um de nós.

Basta se analisar a nossa primeira reação a qualquer ato que consideramos errado desde a nossa infância quando apenas após a insistência da mãe chegaríamos ao ponto de reconhecer o erro.

Longe de mim analisar fatores psicológicos de criação ou certo ou errado pois distanciam em muito do meu mero conhecimento, apenas faço alusão ao fato de que admitir o erro é atitude contrária ao próprio instinto de auto preservação do ser humano.

Os tribunais passaram a entender que em complemento a admissão do cometimento do delito, em razão de nossa natureza, seriam agregados elementos defensivos como forma de racionalização das atitudes do réu, mas que mesmo acompanhados destes elementos cabe a aplicação da diminuição da pena.

Nesse sentido transcrevo uma verdadeira aula sobre o assunto do Exmo Des. João Batista marques Tovo ao julgar o acórdão Nº 70065206021 em recente julgado:

Confessar é admitir a autoria do fato imputado, o que o réu fez. Aos menos avisados, a confissão é um ato contrário à natureza humana, pois vai de encontro ao instinto de preservação.  Mas, paradoxalmente, a confissão pode ser justamente manifestação do instinto de preservação, e normalmente é, aliás.  Posto diante de evidências que impedem a negação da autoria, o indivíduo é naturalmente induzido a admitir o inegável, o mais das vezes agregando elementos defensivos. É o que se convencionou chamar de confissão qualificada, em oposição à confissão simples. No caso dos autos, o que se tem é uma confissão qualificada. SÍLVIO admitiu ter desferido as facadas, mas sem saber que agredia Maria Santina, já que agiu em legítima defesa putativa

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A confissão simples, de todo modo, pode ter o singelo motivo de despertar benevolência do interlocutor, com atenuação da pena, sempre que possível. É essa – segundo observação empírica – a razão da maioria das confissões. Trata-se de expressão de estratégia adaptativa, na medida em que a confissão fruto de imposição moral é absolutamente incomum. Mas é possível que autores de crimes eventuais, educados sob rígidos critérios morais – o que é cada vez mais raro – sintam-se compelidos à confissão, assumindo o castigo como forma de redenção.

    Como regra, portanto, a confissão nada tem de espontânea, sendo quase invariavelmente ditada por fatores externos que a motivam.  Dessa feita, não considero apropriado estabelecer diferença de tratamento entre confissões simples e qualificadas, completas ou incompletas, expressão de arrependimento ou imposição das evidências. O que deve ser considerado é se a confissão auxiliou no estabelecimento da verdade, simplificando o árduo processo crítico da prova. E deve-se atenuar com frequência para estimular as confissões.

Nesse sentido é o entendimento jurisprudencial atual do TJ/RS, mesmo Tribunal de origem do HC 99436 :

Ementa: APELAÇÃO CRIMINAL. RECURSOS DEFENSIVO E MINISTERIAL. TRIBUNAL DO JÚRI. TENTATIVA DE HOMICÍDIO TRIPLAMENTE QUALIFICADO E AMEAÇA. ARTIGO 121, § 2°, INCISOS I, III E IV, NA FORMA DO ARTIGO 14, INCISO II E 147, COMBINADO COM O ARTIGO 61, INCISO II, ALÍNEA "F", DO CÓDIGO PENAL. ARGUIÇÃO DE NULIDADE POSTERIOR À PRONÚNCIA POR AUSÊNCIA DE QUESITAÇÃO QUANTO À TESE DE LEGÍTIMA DEFESA PUTATIVA E À ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA. DECISÃO MANIFESTAMENTE CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS. PEDIDO DE ATENUAÇÃO DA PENA EM RAZÃO DA CONFISSÃO E DE APLICAÇÃO DA MINORANTE DA TENTATIVA EM GRAU MÁXIMO. PLEITO MINISTERIAL DE EXASPERAÇÃO DA PENA-BASE, COM CONSIDERAÇÃO DAS QUALIFICADORAS COMO AGRAVANTES. Com a alteração promovida pela Lei n. 11.689/08, todas as teses defensivas absolutórias passaram a ser representadas pelo quesito único do inciso III do artigo 483 do Código de Processo Penal. Ausência de quesitação específica da tese de legítima defesa putativa que não constitui irregularidade. Precedentes do STJ. Não carece submeter atenuantes ou agravantes ao crivo do Conselho de Sentença, já que se trata de questões objetivas, sobre as quais pode dispor o magistrado. Veredicto que constitui uma interpretação razoável da prova. Tese de que o réu não agiu com animus necandi, ou desistiu voluntariamente da execução do homicídio que encontram resistência na narrativa da ofendida. Embora SÍLVIO pudesse ter agredido-a mais gravemente, deixou o local do fato após desferir diversos cortes na face e no corpo da ofendida, deixando-a desacordada e sem ajuda. Plausível concluir que acreditava que ela estava morta, ou morreria inevitavelmente, a afastar as teses desclassificatórias. A versão de legítima defesa putativa constante da defesa pessoal também é incompatível com o relato da ofendida e da testemunha presencial. Soberania do Júri. Decisão mantida.  Melhor consideração das circunstâncias judiciais, que leva à exasperação da pena-base. Irreparável a consideração das qualificadoras na primeira fase, sendo que o reconhecimento como agravantes traria idêntico resultado punitivo, sendo indiferente o momento do seu proveito. Redução da pena diante do reconhecimento da atenuante da confissão espontânea, a qual não precisa ser completa para que seja aplicada. Maior diminuição da pena pela tentativa, diante do iter criminis percorrido. Fixação de regime semiaberto. Prisão preventiva revogada, vencido o relator no ponto. RECURSOS PARCIALMENTE PROVIDOS. PRISÃO PREVENTIVA REVOGADA, POR MAIORIA. (Apelação Crime Nº 70065206021, Terceira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: João Batista Marques Tovo, Julgado em 29/10/2015) (grfei)

Ementa: CRIMES DOLOSOS E CULPOSOS CONTRA A PESSOA. HOMICÍDIOS QUALIFICADOS (ARTIGO 121, § 2º, INCISOS II, III E IV, E ARTIGO 121, § 2º, INCISO V, AMBOS DO CP). INCONFORMISMO DEFENSIVO. PROVA. PENA. MANUTENÇÃO DA CONDENAÇÃO. A defesa constituída pelo réu interpôs seu apelo com base no artigo 593, do CPP, de forma genérica, ou seja, sem especificar em qual ou quais das alíneas do inciso III do referido dispositivo se embasava seu inconformismo. Após, em sede de razões recursais, o defensor restringe sua inconformidade às alíneas "c" e "d", do referido artigo legal. Conhecimento do seu recurso na amplitude do termo de interposição, com fulcro na Súmula nº 713, do STF. Assim, não se constata nulidade posterior à pronúncia, nem a sentença contrariou à lei expressa ou à decisão dos Jurados, afastando-se as alíneas "a" e "b" do dispositivo em comento. Outrossim, a decisão dos Jurados não pode ser considerada como manifestamente contrária à prova dos autos, encontrando amparo em segmento do conjunto probatório, tornando inviável a determinação de novo julgamento, afastando-se, igualmente, a alínea "d" do artigo supra. Nesse sentido, os Jurados decidiram em conformidade com a tese acusatória, que encontra respaldo nas provas material e testemunhal colhidas, inclusive no que diz com o reconhecimento das diversas qualificadoras imputadas contra o réu. Quanto ao apenamento imposto ao acusado - alínea "c" do inciso III do artigo 593 do CPP -, foi fixado de forma necessária e suficiente aos fins de reprovação e prevenção dos crimes perpetrados, não havendo motivos para reduzi-lo, eis que devidamente sopesadas as circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal, as quais restaram, em parte, desfavoráveis ao réu, motivo pelo qual suas penas-base foram dosadas acima do mínimo legal previsto para a espécie, de forma justa e proporcional, incluindo-se aí as qualificadoras reconhecidas pelo Júri. Salienta-se que, em relação ao primeiro fato, tendo em vista a existência das três circunstâncias qualificadoras reconhecidas pelo Júri, correta a utilização de uma delas para qualificar o delito, e as demais na segunda fase de dosimetria da pena. Ainda nesse ponto, não vinga o pedido subsidiário da defesa, de reconhecimento das atenuantes previstas nas alíneas "a", "b" e "d" do inciso III do artigo 65 do Código Penal, pois, nos termos do artigo 492, do CPP, apesar de não haver proibição expressa da quesitação de tais circunstâncias, verifica-se que as mesmas devem ser direcionadas diretamente ao Juiz Presidente do Júri, o qual analisará, no caso concreto, se devem incidir. Contudo, no caso concreto, não houve qualquer solicitação da defesa em Plenário. Quanto à atenuante da confissão espontânea, tendo o réu admitido a autoria delituosa, ainda que sob o abrigo da tese da legítima defesa, tal afasta a possibilidade de reconhecimento de tal circunstância, devendo esta ser reconhecida, com a conseqüente redução da pena do réu. Voto vencido. Por derradeiro, quanto ao regime carcerário imposto ao réu, como o inicial fechado, também nada a reparar, eis que de acordo com o artigo 33, § 2º, alínea "a", do Código Penal. APELO PROVIDO EM PARTE, POR MAIORIA. (Apelação Crime Nº 70062834601, Segunda Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Antônio Cidade Pitrez, Julgado em 24/09/2015)

Em igual raciocínio o Exmo Des. LUIZ MELLO GUIMARÃES, ao discordar do relator no processo Nº 70062834601, teve maioria por entender a aplicação da atenuante mesmo sob a alegação da legitima defesa:

Finalmente, não compartilho do entendimento esposado pelo Relator no tocante à “confissão qualificada”.

Isso porque o art. 65, III, d, do CP determina que a pena deve ser atenuada sempre que o réu confessar espontaneamente a autoria do crime, não havendo, no dispositivo, a exigência de que confesse o cometimento de crime propriamente dito, com todos os elementos que envolvem sua caracterização.

E, embora não desconheça o posicionamento jurisprudencial em contrário, inclusive deste Tribunal, entendo que seria imprescindível a expressa exigência de que o cometimento do crime fosse plenamente confesso para se poder exigi-lo como condição à atenuação da pena, pois o dispositivo legal permite interpretação que é, claramente, mais favorável ao acusado.

Ademais, o próprio legislador, na Exposição de Motivos à Parte Geral do Código Penal, não faz a exigência referida, limitando-se a afirmar que “Beneficia-se, como estímulo à verdade processual, o agente que confessa espontaneamente, perante a autoridade, a autoria do crime”.

Assim, tenho que, ao instituir-se tal atenuante como forma de estímulo à verdade processual (sem exigir-se, repito, que a confissão seja do “cometimento de fato ilícito, antijurídico e culpável”), a intenção é apenas de que a admissão da autoria seja apta a auxiliar no convencimento do julgador, e nada mais – justamente por isso, diga-se, a necessidade de ser espontânea.

Desse modo, o réu deve ser beneficiado sempre que a admissão da autoria for utilizada como um dos fundamentos de sua condenação; ou, em outras palavras, em todos os casos nos quais se puder deduzir que a ausência da confissão dificultaria consideravelmente o decreto condenatório.

E note-se que isso faz muito mais sentido, uma vez que a prova da autoria é ônus que incumbe ao Estado (Ministério Público), enquanto qualquer excludente, para ser admitida, deve ser (ainda que minimamente) comprovada pela defesa; portanto, não seria lógico deixar de beneficiar um réu que, contribuindo para a própria condenação ao admitir a autoria, suprindo eventuais falhas do Estado neste aspecto, alegasse uma excludente que sua defesa não conseguisse comprovar.

Enfim, a atenuante da confissão está intimamente ligada à sua contribuição para a verdade dos fatos, de modo que a chamada “confissão qualificada”, no meu entendimento, não tem necessária ligação com excludentes, dando-se quando, embora o réu admita a autoria, tal de nada sirva para auxiliar o Juízo na formação de seu convencimento.

E, trazendo o raciocínio para o caso concreto, a atenuante deve ser reconhecida em favor do réu.

É que se está a tratar de processo de competência do Tribunal do Júri, em que o veredicto, não fundamentado, é baseado na íntima convicção dos Jurados; portanto, em casos como o presente, invariavelmente se impõe considerar que a confissão da autoria auxiliou na decisão dos Julgadores de fato – pois a dúvida sempre milita em favor do réu.

Frise-se que a jurisprudência do STJ se firmou no sentido de que a admissão da autoria pelo agente, mesmo em caso de alegação de legitima defesa deve ser reconhecida causando a diminuição da pena.

Nesse sentido o Superior Tribunal de Justiça se manifestou:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL. NÃO CONHECIMENTO DO WRIT. CRIME DE HOMICÍDIO QUALIFICADO. TESE DE JULGAMENTO CONTRÁRIO À PROVA DOS AUTOS. QUESTÃO NÃO DEDUZIDA EM APELAÇÃO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. TRIBUNAL DO JÚRI. EFEITO DEVOLUTIVO RESTRITO DA APELAÇÃO. PLEITO DE APLICAÇÃO DA ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA. AFASTAMENTO PELO TRIBUNAL A QUO POR SE TRATAR DE CONFISSÃO QUALIFICADA. ADMISSÃO DA AUTORIA DO FATO PORÉM SOB O PÁLIO DE EXCLUDENTE DE ILICITUDE (LEGÍTIMA DEFESA). RECONHECIMENTO DEVIDO. PLEITO DE DECLARAÇÃO DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. IMPOSSIBILIDADE. DECURSO DE LAPSO TEMPORAL NECESSÁRIO ENTRE OS MARCOS INTERRUPTIVOS NÃO EVIDENCIADO. DECRETAÇÃO DA REVELIA. SUSPENSÃO DO PROCESSO E DO PRAZO PRESCRICIONAL (ART. 366 DO CPP). HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO.

1. Ressalvada pessoal compreensão diversa, uniformizou o Superior Tribunal de Justiça ser inadequado o writ em substituição a recursos especial e ordinário, ou de revisão criminal, admitindo-se, de ofício, a concessão da ordem ante a constatação de ilegalidade flagrante, abuso de poder ou teratologia.

2. O pleito de nulidade da decisão dos jurados por contrariedade à prova dos autos não pode ser conhecida por esta Corte Superior sob pena de indevida supressão de instância, porquanto não foi objeto deanálise perante o Tribunal de origem, já que o recurso de apelação foi interposto com fundamento na alínea "c" do inciso III do art.593 do CPP, com o fim exclusivo de redução da pena.

3. Tratando-se de apelação interposta contra decisões do Tribunal doJúri, dotada de efeito devolutivo restritivo, o conhecimento do recurso limita-se às questões efetivamente arguidas nas razões recursais, não sendo devolvido ao Tribunal de 2º Grau o conhecimento amplo da matéria. Inteligência da Súmula 713/STF. Precedentes.

4. A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que a confissão, ainda que parcial, ou mesmo qualificada - em que o agente admite a autoria dos fatos, alegando, porém, ter agido sob o pálio de excludentes de ilicitude ou de culpabilidade -, deve ser reconhecida e considerada para fins de atenuar a pena. Precedentes.

5. Não há falar em prescrição da pretensão punitiva, porquanto não decorrido prazo superior a 16 anos (art. 109, II, do CP), entre os marcos interruptivos, necessários à sua configuração, tendo em vista a decretação da revelia do réu, ensejando a suspensão do processo e do prazo prescricional, nos termos do art. 366 do CPP.

6. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício apenas para reduzir as penas a 12 anos de reclusão. (HC 87337 / SP

HABEAS CORPUS 2007/016 9521-1Relator(a) Ministro NEFI CORDEIRO (1159) Órgão Julgador T6 - SEXTA TURMA Data do Julgamento 16/06/2015 Data da Publicação/Fonte DJe 25/06/2015) (grifo meu)

PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL.DOSIMETRIA. CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL. PERSONALIDADE. RAZÕES DISSOCIADAS. FUNDAMENTAÇÃO OBJETIVA. AUSÊNCIA. AGRAVANTE. CONFISSÃO ESPONTÂNEA QUALIFICADA. INCIDÊNCIA. PRESCRIÇÃO.I - A apresentação de razões recursais dissociadas da motivação utilizada pela decisão recorrida configura deficiência na fundamentação, atraindo a incidência da Súmula 284/STF. Precedentes.

II - Ademais, a exasperação da pena-base lastreada em circunstâncias judiciais desfavoráveis deve se fundar em elementos concretos deduzidos por meio de fundamentação objetiva. Precedentes. Documento: 48637035 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 7 de 9 Superior Tribunal de Justiça

III - A jurisprudência recente desta eg. Corte Superior firmou o entendimento de que a confissão qualificada, pela qual são suscitadas outras teses defensivas, descriminantes ou exculpantes, enseja a incidência da circunstância atenuante do art. 65, inciso III, alínea d, do Código Penal, devendo ser considerada na segunda fase da dosimetria da pena. Precedentes.

Agravo regimental desprovido (AgRg no REsp 1336976/RJ, Rel.Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 03/03/2015, DJe 12/03/2015).(grifei)

HABEAS CORPUS IMPETRADO EM SUBSTITUIÇÃO AOINSTRUMENTO PROCESSUAL PREVISTO NO ORDENAMENTO JURÍDICO.1. NÃO CABIMENTO. MODIFICAÇÃO DE ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL. RESTRIÇÃO DO REMÉDIO CONSTITUCIONAL. EXAME EXCEPCIONAL QUE VISA PRIVILEGIAR A AMPLA DEFESA E O DEVIDO PROCESSO LEGAL. 2. HOMICÍDIO QUALIFICADO. ATENUANTE. CONFISSÃO ESPONTÂNEA QUALIFICADA. POSSIBILIDADE. 3. ORDEM NÃO CONHECIDA. CONCESSÃO DE HABEAS CORPUS DE OFÍCIO.

1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, buscando aracionalidade do ordenamento jurídico e a funcionalidade do sistema recursal,vinha se firmando, mais recentemente, no sentido de ser imperiosa a restrição do cabimento do remédio constitucional às hipóteses previstas na Constituição Federal e no Código de Processo Penal. Nessa linha de evolução hermenêutica, o Supremo Tribunal Federal passou a não mais admitir habeas corpus que tenha por objetivo substituir o recurso ordinariamente cabível para a espécie. Precedentes. Contudo, devem ser analisadas as questões suscitadas na inicial no afã de verificar a existência de constrangimento ilegal evidente, a ser sanado mediante a concessão de habeas corpus de ofício, evitando-se prejuízos à ampla defesa e ao devido processo legal.

2. A invocação de causa excludente de ilicitude ou de culpabilidade não obsta reconhecimento da incidência da atenuante da confissão espontânea de que cuida o art. 65, inciso III, alínea d, do Código

Penal. Precedentes.

3. Habeas corpus não conhecido. Concessão da ordem de ofíciopara reduzir a pena do paciente para 12 (doze) anos de reclusão, mantendo-se, no mais, os termos da condenação (HC 283.620/RS, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, QUINTA TURMA, julgado em 20/02/2014, DJe 27/02/2014).

Ademais, há de se ressaltar que em muitas situações a admissão do réu é essencial para o próprio esclarecimento dos fatos narrados na denúncia e não apenas em situações onde o réu não possua outra alternativa a não ser confessar o delito.

Concluo então que tendo em virtude os benefícios que a confissão da autoria trazem até mesmo para a celeridade do processo tais como a certeza do autor do fato obtida através do reconhecimento do agente pode se dizer que vem a premiar a decisão o reconhecimento de tal atenuante nestas circunstâncias quando poderia o réu simplesmente nada declarar em nenhuma fase do processo.

Friso também que a interpretação da lei que deve por regra ser favorável ao réu, na falta de elementos complementares a atenuante do artigo 65 Inciso III alínea d tais como a autoria total ou parcial do delito, torna-se constitucional o entendimento majoritário da jurisprudência eis que aplica o provento por ser mais benéfico ao réu.

Sobre o autor
Renan Kramer Boeira

Advogado Criminalista, pós graduado em Criminologia, Politicas Criminais e Segurança Pública<br><br>

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