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A defesa do consumidor em juízo

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Agenda 17/11/2003 às 00:00

CAPÍTULO II

1 AÇÕES COLETIVAS

O presente trabalho trata das ações coletivas, como uma forma de acesso à justiça.

Trar-se-á a lume a questão da participação popular na administração da justiça, representando, no dizer de VITTORIO DENTI, "um instrumento de garantia, de controle e de transformação".

Aliás, essa forma de participação também responde à exigência da legitimação democrática no exercício da jurisdição e às instâncias prementes de educação cívica, conforme bem salienta Mauro Cappelletti.

Como se pode notar, a abertura participativa popular permite que o acesso à ordem jurídica justa, no plano processual, concretize-se pelos novos esquemas da legitimação para agir.

Novos conflitos nascem e não seriam suportados quer pela estrutura formalista do processo clássico, quer pelos tribunais sobrecarregados e burocratizados.

Vê-se nascer os conflitos metaindividuais ou pluriindividuais, em que estão inseridas comunidades de pessoas mais ou menos indeterminadas ou de difícil determinação, tendo por objeto bens ou valores espalhados pela coletividade e de natureza indivisível: trata-se dos interesses ou direitos coletivos ou difusos.

Esses interesses ou direitos podem ser agrupados em pretensões homogêneas por sua origem comum, permitindo que a apreciação do litígio conflituoso possa beneficiar um maior número de pessoas que estejam na mesma situação legitimante.

Nesse plano dos grandes conflitos de índole coletiva, o direito brasileiro debutou com a Lei da Ação Civil Pública (Lei n.º 7.347/85), que tratou dos interesses difusos e coletivos, de natureza indivisível, atinente ao ambiente e aos consumidores.

Posteriormente, já com a boa experiência inicial, veio a Constituição da República de 1988, com os dispositivos relativos ao Mandado de Segurança Coletivo (art. 5.º, LXX) e às Ações Coletivas de Associações (art. 5.º, XXI), de sindicatos (art. 8.º, III), do Ministério Público (art. 129,II) e dos Índios e suas comunidades e organizações (art. 232), sem prejuízo de outras titularidades que possam vir a ser estabelecidas em lei (art. 129, parágrafo 1.º).

Por fim, chega-se ao Código de Defesa do Consumidor (Lei n.º 8.078/90), que ampliou a abrangência da Ação Civil Pública, e a estendeu à tutela de qualquer interesse difuso ou coletivo. Também criou uma nova ação coletiva, pioneira nos sistemas de civil law, para a defesa de direitos subjetivos divisíveis, de ordinário tratados separadamente, mas que podem ser agrupados por sua origem comum.

Em todos esses casos, o direito brasileiro adota a legitimação concorrente e autônoma, permitindo a entes públicos ou organizações associativas a titularidade das ações coletivas, suprindo-se as deficiências organizacionais dos titulares desses interesses, se individualmente considerados, e permitindo um acesso à ordem jurídica justa a diversos níveis da população.

É o Estado assegurando igualdade de oportunidades a seus cidadãos.

2 ASPECTOS HISTÓRICO-EVOLUTIVO DO CONCEITO DE INTERESSE: COLETIVO & INDIVIDUAL

Tratar da questão do coletivo & individual exige uma prévia abordagem sobre a sua evolução conceitual.

Por Ulpiano chegou-se a estabelecer "jus publicum est quod ad statum rei romanae spectat, privatum quod ad singulorum utilitatem: sunt enim quoedam publice utilia, quoedam privatim".

Logo, os pólos de referência eram o indivíduo e o Estado. E foi assim que o Direito Positivo restou organizado em dois ramos: o público e o privado.

Com o surgimento e o crescimento dos chamados corpos intermediários, houve o fracionamento do poder estatal, já que esses corpos intermediários passaram a desempenhar o papel de freio e contra peso na partilha do poder.

Porém, nos idos da Idade Moderna, esse quadro modificou-se, tomando os corpos intermediários novas posições: a igreja estabilizou-se nas atividades de ordem espiritual; o feudalismo declinou e desapareceu; as corporações desapareceram, dragadas pelas revoluções comercial e industrial, substituídas pelos conglomerados econômicos e empresas multinacionais. Mas, ainda que extremamente transformados ou enfraquecidos, os corpos intermediários engendram o espírito corporativo (ou corporativismo), representado pelo anseio dos indivíduos de participar do processo político-econômico.

Nasceu a consciência do coletivo.

Essa consciência representou assim um tertium genus, podendo-se dizer que representou um novo interesse, paralelo ao do público e do privado, o interesse coletivo.

Ainda que muitos movimentos contrários ao florescimento do interesse coletivo tenham surgido, ele se manteve, atravessando o século e fortalecendo-se cada vez mais, cabendo aqui citar : os sindicatos, as associações, os trusts, os cartéis, os conglomerados financeiros, os partidos políticos, os grupos de lobbies.

Para bem retratar esse ponto, Mancuso (1997:80) ressalta que: "É curioso observar que o indivíduo buscou o grupo como forma de melhor assegurar sua realização pessoal, como também para se proteger; renunciou, assim, a certas vantagens pessoais, em nome dos interesses coletivos sustentados pelo grupo ao qual se filiou, é de se interrogar se hoje não é elo nostálgico de uma sociedade inspirada no espírito liberal-individualista do século passado".

Mauro Cappelletti (1975:100) também se refere à insuficiência da tradicional dicotomia público-privado, dizendo-a superada, pois, embora sofisticada, não é suficiente para retratar a realidade, que é complexa, muito articulada para a simplista dicotomia tradicional.

Nos dias de hoje, essa dicotomia entre público e privado é insuficiente. O público, o privado e o coletivo haurem sua significação a partir da síntese dos interesses individuais neles agrupados. Um interesse é metaindividual quando, além de perpassar o círculo de atributividade individual, corresponde à síntese dos valores predominantes num determinado segmento ou categoria social, ou seja, é interesse coletivo de um grupo homogêneo.

Assim, cumpre frisar que a divisão do Direito Positivo em público e privado não mais significa exclusividade, mas sim predominância.

O Direto Penal, por exemplo, integra o ramo dos Direitos Públicos porque a maioria de suas normas são de natureza cogente, imperativas.

O Direito Civil, por sua vez, integra o ramo dos Direitos Privados em razão da predominância das normas de natureza privada, embora nele coexistam normas de ordem pública, como as relativas ao direito de família e sucessões.

3 AÇÃO: CONCEITO E CONDIÇÕES (Requisitos)

Não se pode falar em ações coletivas sem antes falar de ação e seu conceito, bem como das condições (requisitos da ação).

Assim, tem-se que "a ação é o direito subjetivo público, autônomo e abstrato, de provocar o exercício da função jurisdicional sobre determinada lide ou determinada relação ou situação jurídica sujeita pela lei à tutela jurisdicional do Estado", esclarecendo-se que a ação é direito subjetivo porque, mediante determinadas condições, as chamadas condições da ação, o autor tem o poder de exigir do Estado o exercício de determinada atividade, a atividade jurisdicional; é um direito autônomo, porque é um direito diverso do direito subjetivo material que o autor pretende ver reconhecido em juízo; é um outro direito, com outra essência.

Donde se concluir que o conteúdo do direito de ação é a providência jurisdicional através da qual o juiz compõe a lide ou provê a relação jurídica de direito material que lhe é submetida pelos particulares. O direito de ação é o direito a esta providência jurisdicional.

Acresça-se que a ação não é radicalmente abstrata, no sentido de ser totalmente incondicionada, mas a sua existência depende da verificação de certas condições na relação material tal como apresentada pelo autor ao juiz, pois somente na concorrência destas condições, que são condições da ação, farão jus as partes a um pronunciamento judicial sobre o mérito da causa.

Portanto, como o direito de ação não é condicionado, optou-se por chamar as condições de requisitos da ação, sendo eles: legitimidade, interesse e possibilidade jurídica do pedido.

4 OS INTERESSES E SUAS CATEGORIAS

Nesse ponto, já se pode compreender que dicotomia esmaecida entre o público e o privado, fez florescer a percepção dos interesses em jogo.

Emerge, então, a distinção básica entre interesse público (titular = Estado) e interesse privado (titular = indivíduo).

Entretanto, é importante não criar uma idéia de classes distintas e intocável de interesses.

A uma, porque o interesse público pode alcançar interesses indisponíveis do indivíduo ou da coletividade, interesses sociais e até alguns interesses difusos.

A duas, porque há uma categoria intermediária de interesses, que não constituem nem interesse público, nem tipicamente privado.

O interesse público pode ser conceituado como o interesse geral da coletividade ou o interesse da coletividade como um todo.

Renato Alessi sustenta que o interesse público pode ser primário (= ao interesse social, interesse da sociedade ou da coletividade como um todo) ou secundário (= à vista da administração pública, ela define o que é bom para a coletividade, diz-se, então, que é o interesse público abstrato).

Já o interesse individual é tido como aquele cuja fruição se esgota no círculo de atuação de seu destinatário. Os interesses individuais homogêneos apresentam-se uniformizados pela origem comum, na sua essência remanescem individuais. Compreendem os integrantes determinados ou determináveis de grupo, categoria ou classe de pessoas que compartilhem prejuízos divisíveis, oriundos das mesmas circunstâncias de fato.

Nos interesses individuais homogêneos, os titulares são determinados ou determináveis e o dano ou a responsabilidade se caracteriza por sua extensão divisível ou individualmente variável.

Como exemplo, pode-se trazer a lume a questão dos compradores de veículos produzidos com o mesmo defeito de série.

Há uma relação jurídica comum subjacente entre os consumidores, mas, o que os liga é antes o fato de que compraram carros do mesmo lote produzido com o mesmo defeito.

Tanto os interesses individuais homogêneos como os difusos originam de circunstâncias de fato comum; entretanto, são indeterminados os titulares de interesses difusos, e o objeto de seu interesse é indivisível, enquanto nos interesses individuais homogêneos o dano ou a responsabilidade se caracteriza por sua extensão divisível ou individualmente variável, repita-se.

Quanto aos interesses coletivos, maior habilidade se requer na conceituação, eis que se apresentam em três acepções – 1.ª) interesse pessoal do grupo; 2.ª) interesse coletivo como soma de interesses individuais e 3.ª) interesse coletivo como síntese de interesses individuais -, mas apenas uma delas é efetivamente tida como interesse coletivo.

O interesse pessoal do grupo tem conotação bastante restrita, chegando a não ser considerado interesse propriamente coletivo. Ele se refere a interesse predominentemente ligado à pessoa jurídica que o compõe, isto é, a interesse direto e pessoal da entidade. Como exemplificação pode-se citar o interesse de uma cooperativa de agricultores em elevar o seu capital social.

O interesse coletivo como soma de interesses individuais diz respeito apenas e tão-somente a uma forma, pois pertine a interesses individuais exercidos em coletivo. A essência permanece individual.

O interesse coletivo como síntese de interesses individuais é o que se pode chamar de verdadeiro interesse coletivo, coletivo, pois se trata de interesses que ultrapassam os limites, dos anteriores, é um fenômeno coleitvo, ainda que originário dos interesses individuais, os quais se desvanecem para dar lugar a um veículo verdadeiro interesse coletivo, representando um ideal coletivo, uma alma coletiva.

Porém, o interesse coletivo, em oposição ao interesse público e ao interesse privado (individual), tornou-se, nos dias atuais, gênero, do qual são espécies: o interesse coletivo propriamente dito e o interesse difuso.

O interesse coletivo propriamente dito aparece como uma entidade geral e abstrata que absorve e ultrapassa a soma de interesses individuais de seus membros.

No que diz respeito aos interesses difusos, tem-se que são interesses ou direitos transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato. Compreendem grupo menos determinados de pessoas, entre as quais inexiste vínculo jurídico ou fático preciso. São como um conjunto de interesses individuais, de pessoas indetermináveis, unidas por pontos conexos.

Diversos doutrinadores contribuíram para o estudo do tema, conceituando o interesse coletivo, e alguns, ainda, mais especificamente, o interesse difuso.

Dentre esses, pode-se citar o de Péricles Prade (1987: 57/58), que prega: "interesses difusos são os titularizados por uma cadeia abstrata de pessoas ligadas por vínculos fáticos exsurgidos de alguma circunstancial identidade de situação, passíveis de lesões disseminadas entre todos os titulares".

Na opinião de Ada Pellegrini Grinover (Novas Tendências: 1984:2), "os interesses coletivos são tidos como os interesses comuns a uma coletividade de pessoas e apenas a elas, mas ainda repousando sobre um vínculo jurídico que os congrega".

Vittoria Denti (1978:4) considera coletivos os interesses referíveis a uma comunidade bem definida, ligando-se à idéia de determinação do grupo.

Insta, por fim, trazer à colação a definição de Celso Bastos (1981:40), para o qual "os interesses coletivos dizem respeito ao homem socialmente vinculado, e não ao homem isoladamente considerado" ; "é o homem enquanto membro de grupos autônomos e juridicamente definidos, tais como o associado de um sindicato, o membro de uma família, o profissional vinculado a uma corporação, o acionista de uma grande sociedade anônima, o condômino de um edifício de apartamentos".

5 CARACTERÍSTICAS DOS INTERESSES COLETIVOS E DIFUSOS

As notas caracterizadas dos interesses coletivos são: a) a organização, a fim de que os interesses ganhem a coesão e a identificação necessárias; b) a afetação desses interesses a grupos determinados (ou ao menos determináveis), que serão os seus portadores; c) um vínculo jurídico básico, comum a todos os participantes, conferindo-lhes situação jurídica diferenciada.

Os interesses difusos podem ser : a) tão abrangentes que coincidam com o interesse público (meio ambiente); b) menos abrangentes que o interesse público; c) em conflito com o interesse da coletividade como um todo; d) em conflito com o interesse do Estado, enquanto pessoa jurídica; e) atinentes a grupos que mantêm conflitos entre si.

A diferença entre interesse individual, como por exemplo, a pretensão ao meio ambiente hígido, posto compartilhado por número indeterminável de pessoas, não pode ser quantificada ou dividida entre os membros da coletividades.

As notas caracterizadoras dos interesses difusos são: a) a indeterminação dos sujeitos; b) a indivisibilidade do objeto; c) a intensa conflituosidade; d) a duração efêmera, contigencial.

INTERESSES

GRUPO

DIVISIBILIDADE

ORIGEM

DIFUSOS

INDETERMINÁVEL

INDIVISÍVEIS

SITUAÇÃO DE FATO

COLETIVOS

DETERMINÁVEL

INDIVISÍVEIS

RELAÇÃO JURÍDICA

INDIVIDUAIS

HOMOGÊNEOS

DETERMINÁVEL

DIVISÍVEIS

SITUAÇÃO DE FATO

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6 TUTELA JURISDICIONAL DOS INTERESSES COLETIVOS

A questão da tutela jurisdicional dos interesses coletivos é de delicada e extrema importância.

Considerando os interesses coletivos com um caminho a permitir um acesso mais democrático à justiça, é preciso sejam fixados alguns pontos, a fim de permitir a concreta efetivação da tutela jurisdicional coletiva.

Pontos como a legitimação para agir, os limites da coisa julgada nas demandas coletivas, as espécies de sanções, fazem crer que os novos direitos que ora se implementam têm características muito próprias, sendo de se admitir que o velho e tradicional processo já não comporta os contornos que a sociedade pretende dar à função do Estado.

Assim, inicia-se este capítulo com a abordagem das quatro maiores dificuldades (reais) para assegurar o acesso à justiça nos interesses coletivos, na opinião abalizada de Mauro Cappelletti (1976:199/200).

O supramencionado professor destaca dificuldades, a saber:

1.ª) a legitimação. Da legitimação individual à legitimação por classe. Ação pelo grupo e ação de grupo.

2.ª) o direito de defesa e do contraditório de membro da coletividade não presente em juízo. O conceito de adequada representatividade e o superamento de uma garantia meramente individualista.

3.ª) o efeito do pronunciamento da matéria de interesse coletivo.

4.ª) a insuficiência de uma tutela essencialmente repressiva e monetária.

A seguir, cada uma delas, pormenorizadamente:

O PROBLEMA DA LEGITIMAÇÃO. O nascimento do Ideological Plaintiff. DA LEGITIMAÇÃO INDIVIDUAL À LEGITIMAÇÃO POR CLASSE. AÇÃO PELO GRUPO E AÇÃO DO GRUPO (Verbandsklagen).

A dificuldade real é aquela que deve ser enfrentada e resolvida justamente por quem aceita conscientemente a permissa de uma necessária e profunda reforma do processo civil, para adequá-lo às supramencionadas transformações radicais e às novas imensas exigências das sociedades contemporâneas.

O problema da legitimação é de grande importância para a questão que se vai abordar.

O processo não pode, em regra, ser aberto por quem não tenha relação com o objeto deduzido em juízo. O requesito de legitimidade deve existir, porém, as actio popularis (ou coletivas) representam uma exceção.

E bem acentua Cappelletti que se deve superar essa velha conceituação de legitimação para agir, vez que extremamente individualista, para adequá-la às novas necessidades de tutela coletiva, de caráter metaindividual e coletivo.

Entretanto, permanece necessário que se fixe certos requisitos de legitimidade para agir, mesmo que se deva construir um conceito de legitimação totalmente diverso e novo, consistente numa relação ou conexão ideológica, antes que propriamente jurídica, entre a parte e a relação deduzida em juízo.

E tal exigência se faz razão da necessidade de se limitar os abusos que poderiam derivar de uma legitimidade indiscriminada para quem poderá agir para a tutela de relacionamentos não propriamente seus.

A doutrina tradicional reconhece no titular (ou qualquer que se diz titular) da relação jurídica a pessoa legitimada a propor a ação.

O aparecimento das relações essencialmente coletivas ou de grupo, chamadas difusas, torna necessária a superação dessa doutrina por demais individualística

O aparecimento daquelas relações comporta o aparecimento da parte ideológica, do ideologic plaintiff na teoria de Louis Jaffe, que preconizava o autor não só pelo seu interesse jurídico individual, mas no interesse coletivo ou comunitário, de grupo, de classe.

Mas, ainda assim, há de se qualificar o ideologic plaintiff, sob pena de se permitirem abusos.

Não há dúvida de que aquele que vai a juízo, em nome de um grupo para a defesa do interesse coletivo, deve ser um bom representante da classe, uno buon paladino, seja uma associação, ou mesmo um indivíduo que haja não somente para si, como ator ou parte si, como ator ou parte individualística, mas como representante de uma coletividade.

Porém, impõem-se ainda assim uma seleção de requisitos de legitimidade, por exemplo, o reconhecimento da personalidade jurídica da associação.

Mas, se esse interesse que surge, por ser novo, não encontre o respaldo imediato de uma associação? Diga-se, por exemplo, do interesse da coletividade em se opor à construção de uma fábrica poluente em sua cidade? Não há uma associação pré-constituída para tratar desse interesse. Será que não haveria possibilidade de essa coletividade opor-se juridicamente?

Mauro Cappelletti defende que o problema da nova legitimação para agir, essa legitimação para agir por categorias, por classes, deva admitir uma maior margem de discricionariedade jurídica, que é, no momento atual de conhecimento e experiência da matéria, o único modo de dar solução, com respostas suficientemente realísticas, flexíveis, à imprevisível variedade dos casos concretos.

Deve-se permitir ao juiz, ainda segundo o autor, que possa examinar caso por caso, e segundo as circunstâncias concretas, se o champion é o adequado, se as condições são as melhores e se a legitimação é também adequada.

Nesse ponto, estar-se-á inovando e criando um novo acesso à tutela jurisdicional.

Na questão da legitimação para agir, o Direito Brasileiro vem inovando, com consideráveis pontuações feitas por Ministros do Superior Tribunal de Justiça.

Em recente Recurso Especial interposto perante a 3.ª Turma do STJ, o Ministro EDUARDO RIBEIRO proferiu o seguinte voto:

"A Comissão de Representantes dos adquirentes de frações ideais de terreno, vinculados à construção do Edifício "Mansão Portobello", ajuizou ação contra Construtora Rodrigues Sá Ltda., pleiteando a entrega das escrituras definitivas dos imóveis adquiridos. Cumulou pedido de indenização pelo atraso.

Rejeitada a preliminar de ilegitimidade passiva, argüida na defesa, a ré agravou de instrumento.

A Décima Sexta Câmara Civil do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, com base nos artigos. 29, parágrafo único e 50 da Lei n.º 4.591/64, reconhecendo a legitimidade da autora, negou provimento ao agravo.

Rejeitado o pedido de declaração, a ré manifestou recurso especial. Alegou que contrariado o artigo 6.º do CPC, por ter o acórdão recorrido reconhecido a legitimidade da autora, inexistindo previsão legal para tanto. Afirmou, ainda, existir divergência com julgado que arrolou.

Recurso admitido e processado.

É o relatório.

VOTO

Sustenta-se que violado o disposto no artigo 6.º do Código de Processo Civil, ao admitir-se ser dado à Comissão de Representantes, de que cuida o artigo 50 da Lei n.º 4.591/64, deduzir em juízo pretensão dos adquirentes das unidades, como substituta processual desses. A norma citada veda a defesa de direito alheio, em nome próprio, salvo com autorização legal. E essa inexistiria, não podendo ser encontrada no citado dispositivo da lei de Condomínios e Incorporações. Se invocáveis para regular a espécie apenas o CPC e aquela lei especial, ausentes diplomas que ensejassem, com a integração dos textos, uma outra interpretação, ter-se-ia série dificuldade de escapar às rigorosas conclusões do excelente parecer trazido aos autos, elaborado pelo eminente professor ARRUDA ALVIM. Creio, entretanto, que o tema merece ser analisado, tendo em vista a adoção, em nosso direito, das ações coletivas, buscando-se solução harmônica com a orientação que se recomenda após a introdução desses novos instrumentos de solução dos litígios. Questão análoga à ora em apreciação foi objeto de exame por esta terceira Turma, ao decidir o Resp. n.º 10.417, de que fui relator. Naquele caso discutia-se sobre a ligitimidade do condomínio, representado pelo síndico, para pleitear indenização em virtude de vícios de construção que afetavam, não só as partes comuns, como as unidades autônomas. Concluiu-se por tê-lo como parte legítima. Peço vênia para reproduzir trecho do voto que então deferi:

‘Primeiro fundamento do recurso diz com a ilegitimidade ativa do condomínio, para demandar a propósito de defeitos localizados nas unidades autônomas. Sustenta-se que seus proprietários os únicos legitimados, tendo sido violado, pelo acórdão, o disposto no artigo 6.º do Código de Processo Civil.’

Prende-se a questão ao sentido que se der ao contido no artigo 22, parágrafo 1.º, "a" da Lei n.º 4.591/64, ao estabelecer que cabe ao síndico representar o condomínio em juízo, praticando os atos de defesa dos interesses comuns.

Exegese conservadora da citada norma da lei processual poderia conduzir a que se admitisse houvesse sido contrariada. Inegável a orientação marcadamente individualista do vigente Código, que pouco ou nada levou em conta o fenômeno atual da existência de direitos cuja defesa só é possível ou eficaz quando exercida coletivamente. Poder-se-ia entender que a expressão "interesses comuns’ dissesse tão-só com aqueles que, juridicamente tutelados, tivessem caráter transindividual e fosse indivisíveis. Cuidando-se de questões, como a posta nos autos, haveriam de referir-se apenas aos danos nas partes comuns. Creio recomendar-se, entretanto, outra interpretação, que tenha em vista o estágio atual do pensamento jurídico e de nosso ordenamento positivo.

A necessidade de tornar efetivo acesso à justiça e propiciar eficácia a sua atuação, constitui hoje a grande preocupação dos processualistas e de quantos se dedicam ao direito. Em função dessa tendência atual merece ser entendida a norma citada, contida na Lei de Condomínios. Instrumento adequado a ensejar sejam tais objetivos alcançados encontra-se nas chamadas ações coletivas. Entre elas, além das que alcançam estatura constitucional, as previstas na lei da ação civil pública e no Código de Defesa do Consumidor.

7 O PROBLEMA DA INSUFICIÊNCIA DE UMA TUTELA ESSENCIALMENTE REPRESSIVA E MONETÁRIA

Aqui se fala dos tipos de remédios que se possa pedir, ou seja, do tipo de pronúncia e de sanção que se pode obter do juiz.

Este é um problema enorme, pois que se dá conta de que os velhos remédios de caráter repressivo-ressarcitório e monetário não servem mais, representam uma tutela inadequada, especialmente no campo desses novos direitos e interesses de grupos, coletivos, freqüentemente não monetizáveis.

O melhor, na opinião de Cappelletti, são os pronunciamentos inibitórios e ordenadores, injuctions e mandamus, freqüentemente de caráter preventivo e com fortes e adequadas sanções, mesmo penais, no caso de inobservância.

Aqui deve também surgir um novo juiz, atento ao que se passa, adaptado às novas questões jurídicas e, principalmente, aos novos interesses coletivos, sendo capaz de ultrapassar certos esquemas tradicionais, para aplicar uma gama de poderes ainda desconhecidos, mesmo que discricionariamente. Pensa-se até no juiz participativo, que colhe na opinião pública, ou seja, junto a seus jurisdicionados envolvidos na lide, a melhor solução para o conflito que se lhe põe.

Outro autor que aborda com maestria a questão é o professor português Luís Felipe Colaço Antunes (1989:100).

Passa-se, agora, a considerar, segundo a ótica do supramencionado professor, as hipóteses nas quais os particulares e os grupos agem e intervêm em juízo em defesa dos interesses plurindividuais (difusos).

Dois grandes problemas surgem quando a questão aqui é levantada:

1.º) quanto ao caráter político-constitucional ;

2.º) quanto à natureza técnica.

Quanto ao caráter político-constitucional, basta dizer que a utilização do processo para a defesa deste tipo de interesses (plurindividuais) faz imediatamente surgir a questão dos próprios limites da função jurisdicional e a questão do novo papel do juiz em conflitos deste gênero, conforme já evidenciou, acima, Mauro Cappelletti.

No que tange à natureza técnica, ressalta-se a questão da legitimação para agir, do tipo de provimento jurisdicional a atingir, a eficácia da sentença e da sua coercibilidade.

A análise desses problemas será feita à luz do direito comparado.

8 TUTELA INDIVIDUAL

A facilitação do acesso à justiça e a celeridade na solução dos conflitos de interesses foram, dentre outras, as razões que deram margem à instalação dos Juizados Especiais de Pequenas Causas e, posteriormente, os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, em cumprimento, aliás, ao comando do artigo 81, parágrafo I, da Constituição Federal de 1988.

A tutela individual do consumidor, assim, passa a ser prestada de forma mais efetiva, dando causa, em conseqüência da multiplicação de ações, a uma explosão de demandas judiciais, já que, além de causas de menor complexidade, foram também reveladas as causas que, até então, permaneciam em estado de hibernação.

Percebeu-se, então, a necessidade de garantir-se a efetividade do acesso à Justiça – requisito básico e fundamental dos direitos do cidadão – de forma mais ampla e efetiva, já que as causas coletivas de menor complexidade mantinham-se, em razão dos altos custos e morosidade dos processos, fora do alcance e da paciência dos consumidores lesados.

Com o aparecimento das class actions do direito americanos, os interesses coletivos e difusos a receber um tratamento mais uniforme, com economia de tempo e custo e garantia de acesso a um determinado grupo ou classe de pessoas.

A partir do século XV, observa Aluísio Castro Mendes, "as ações em grupo começam a trilhar o caminho de transição da common law e da manorial law para a equity".

No Brasil, com a edição das Leis n.º 4.717/65 (Lei da Ação Popular), n.º 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública) e n.º 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor) os interesses coletivos passam a ser mais bem resguardados, tornando, assim, efetivo o acesso à Justiça, possibilitando, dessa forma, o exercício pleno da cidadania (artigo 1.º, inciso II, da CF).

Com a edição da Carta Constitucional em 1988, dois novos dispositivos passam também a prever, independentemente da espécie de ação, a tutela coletiva em geral: o artigo 5.º, XXI (que confere legitimação às entidades associativas, quando expressamente autorizadas, para representar seus filiados, judicial ou extrajudiciamente) e o artigo 8.º (que confere aos sindicatos a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas).

Por fim, a Lei n.º 9.870. de 23 de novembro de 1999, ao dispor sobre o estabelecimento dos valores das anuidades escolares, legítima as associações de alunos, de pais de alunos e responsáveis para a defesa dos direitos que lhes são assegurados.

9 TUTELA COLETIVA

A tutela coletiva, segundo Kazuo Watanabe, abrange dois tipos de interesses ou direitos: a) os essencialmente coletivos, que são os ‘difusos’, definidos no inciso I do parágrafo único do artigo 18, e os ‘coletivos’ propriamente ditos, conceituados no inciso II do parágrafo único do artigo 18; b) os de natureza coletiva apenas na forma em que são tutelados, que são os ‘individuais homogêneos, definidos no inciso III do parágrafo único do artigo 18".

Aduz, ainda, que "os termos ‘interesses’ e ‘direitos’ foram utilizados como sinônimos, certo é que, a partir do momento em passam a ser amparados pelo direito, os ‘interesses’ assumem o mesmo status de ‘direitos’, desaparecendo qualquer razão prática, e mesmo teórica, para a busca de uma diferenciação ontológica entre eles".

Com efeito, "passageiros do mesmo barco, os habitantes deste irrequieto planeta vão progressivamente tomando consciência clara da alternativa essencial com que se defrontam: salvar-se juntos ou juntos naufragar".

O princípio da dimensão coletiva confere nova regra de interpretação aos contratos consumeristas. Surge, como esclarece Jorge de Miranda Magalhães, "a legitimação da coletividade, nas ações correspondentes à defesa do consumidor, não só quanto aos interesses difusos e coletivos stricto sensu, mas ainda nas chamadas individuais homogêneas, como as do mercado de valores mobiliários, antes regulados pela Lei n.º 7.913/89, que não previa expressamente a tutela dos direitos individuais homogêneos afirmando alguns que o Codecon criou a clars action brasileira.

10 A TUTELA ESPECÍFICA DAS OBRIGAÇÕES DE FAZER E NÃO FAZER (ART. 461 DO CPC)

O processo, como instrumento que é para a obtenção da prestação jurisdicional correspondente à realização do direito, somente obtém êxito integral em seu mister quando for capaz de gerar, na prática, resultados idênticos aos que decorreriam do cumprimento natural e espontâneo das normas jurídicas. Daí dizer-se que, proibida a autotutela, o processo ideal é o que dispõe de mecanismos aptos a produzir ou a induzir a concretização do direito mediante a entrega da prestação in natura. E quando isso ocorre, ou seja, quando se proporciona, judicialmente, ao titular do direito, a obtenção de tudo aquilo e exatamente daquilo que pretenda, há prestação de tutela jurisdicional específica. Nesse ponto, assume particular relevância essa espécie de tutela – entendida como o conjunto de remédios e providências tendente a proporcionar, àquele em cujo benefício se estabeleceu a obrigação, o preciso resultado prático que seria atingido pelo adimplemento. Assim, como afirma Flávio Luiz Yarshell, "o próprio conceito de tutela específica é praticamente coincidente com a idéia da efetividade do processo e da utilidade das decisões, pois nela, por definição, a atividade jurisdicional tende a proporcionar ao credor o exato resultado prático atingível pelo adimplemento".

No que se refere à tutela das obrigações de fazer ou não fazer, previstas nos arts. 878 a 883 do Código Civil, que consistem em comportamento omissivo ou comissivo do obrigado, o Código de Processo, em sua versão primeira, apresentava-se longe do modelo ideal, eis que notoriamente destituído, em grande numero de situações, de meios eficientes para prestar a tutela específica. Os instrumentos disponíveis eram, ou limitados quanto à eficácia, ou restritos a apenas algumas daquelas obrigações. Como exemplo: em se tratando de obrigação cujo objeto pode ser atendido não somente pelo obrigado, mas também por terceiro (obrigação de fazer fungível), o Código regulou a forma para que a prestação específica fosse atendida pelo terceiro (art. 634), ou mesmo pelo próprio credor (art. 637), à custa do devedor, apenas operacionalizando os preceitos contidos na norma material civil. Igualmente, em se tratando de obrigação de concluir um contrato ou de prestar declaração de vontade (obrigação de fazer infungível), o legislador processual substituiu o ato do devedor relutante pela ação estatal, para suprir a abstenção daquele, dispondo que a própria sentença de procedência produziria "o mesmo efeito do contrato a ser firmado" (art. 639) ou da "declaração não emitida" (art. 641), mecanismo que encerrava nítida tutela específica. Quanto às demais situações, a obtenção da tutela específica não era escorada por meios coercitivos eficientes, resolvendo-se o inadimplemento sempre pelo sucedâneo pecuniário.

Assim, permaneciam ao desabrigo de qualquer forma eficaz de proteção do direito à prestação específica um grande número de obrigações de fazer e, de um modo geral, de não fazer. No tocante a estas últimas – que são, por natureza, infungíveis, já que a prestação específica consiste exatamente no comportamento omissivo a ser tomado pelo próprio obrigado – não havia em nosso ordenamento jurídico, mormente na seara processual, um mecanismo que inibisse, satisfatoriamente, o evento lesivo. Ao credor ameaçado apresentava-se, como alternativa heróica, buscar uma sentença condenatória, prolatada em processo de conhecimento, já inútil a coibir a anterior consumação da ofensa.

Neste aspecto, o Código de Processo Civil de 1973 apresentou, como afirma Barbosa Moreira, um retrocesso em relação à codificação anterior, pois:

(...) conhecendo o expediente adequado, furtou-se curiosamente a fazer dele o uso amplo que lhe sugeriam a política jurídica e a própria tradição do direito brasileiro, já chegada no Código de 1939 a grau de aprimoramento bastante para produzir uma figura genérica de tutela do credor, em matéria de obrigação de fazer e de não fazer, construída sobre o esquema de preceito initio litis, com aplicação imediata da sanção cominada, no caso de descumprimento: a ação cominatória do art. 302, XII. Restringiu-se de modo notável, na reforma processual, à simples proteção da posse e da propriedade; fora desse âmbito privilegiado, o processo de conhecimento disciplinado no vigente estatuto afigura-se impotente para tutelar em forma preventiva, e portanto específica, com eficácia prática, as posições jurídicas de vantagem a que correspondam obrigações negativas no sentido lato posto no início (...) e a carência é tanto mais séria quanto menos satisfatória, em inúmeras situações excluídas (basta pensar nas de conteúdo não patrimonial), a tutela meramente sancionatória ou repressiva.

Ausente, pois, um mecanismo adequado para a obtenção da tutela específica nos casos aludidos, um seguimento expressivo da doutrina do processo civil recomendava, a despeito de sua natureza técnica, o uso da ação cautelar inominada, com supedâneo nos arts. 798 e 799 do Código de Processo Civil. Esta recomendação, pelo que demonstrou a experiência forense, foi adotada em parte, com um aspecto adicional: ante a ameaça de inadimplemento de obrigações de não fazer, utilizou-se, com freqüência, a via da ação declaratória (para aparentemente obter a certificação da existência da obrigação) acompanhada ou precedida da ação cautelar inominada, esta fadada a antecipar efeitos da tutela de conhecimento, notadamente, a expedição de ordem de abstenção.

Com o advento da Lei nº 8.952, de 13 de dezembro de 1994, o panorama foi substancialmente alterado: sem eliminar as técnicas de tutela jurisdicional até então existentes, deu-se nova redação ao art. 461 do Código de Processo Civil, em cujo caput ficou estabelecido que "na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará as providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento". E, nos termos do § 1º, "a obrigação somente se converterá em perdas e danos se o autor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obtenção do resultado prático correspondente". Para tornar possível a prestação da tutela específica, o legislador conferiu ao juiz poderes para "impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando-lhe prazo razoável para o cumprimento do preceito" (§ 4º). Estabeleceu, ainda, que "para a efetivação da tutela específica ou para a obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas necessárias, tais como a busca e apreensão, remoção de pessoas ou coisas, desfazimento de obras, impedimento de atividade nociva, além de requisição de força policial" (§ 5º).

A novel redação do art. 461 do CPC, transladado, praticamente na íntegra, do art. 84 da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 (Código de Defesa do Consumidor), trouxe, como se percebe, inovações expressivas, todas fundadas no princípio da maior coincidência possível entre a prestação devida e a tutela jurisdicional entregue. No sistema anterior, a alternativa oferecida ao credor para a impossibilidade de obter a tutela específica era a de converter tal prestação em indenização por perdas e danos. Agora, nova alternativa se apresenta: a de substituir a prestação específica por outra que diz: caput, "Na ação que tenha por objeto o cumprimento da obrigação de fazer ou não fazer, o juiz considerará a tutela específica da obrigação ou determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento".

Ao se propor ação com o objetivo de obter o cumprimento de obrigação de fazer ou de não fazer há nela embutido, como pedido implícito, o da designação de outras providências que assegurem referido resultado prático, de modo que a compensação pecuniária somente se dará se assim expressamente requerer o autor, ou se "impossível a tutela específica ou a obtenção do resultado prático correspondente" (§ 1º).

Esta recente sistemática adotada pelo legislador, integrando ao ordenamento processual novas espécies de direito material – que não se coadunam com a prática meramente ressarcitória –, privilegiando a máxima chiovendiana de efetividade da função jurisdicional, estabeleceu uma nova ordem de prioridades, onde a tutela jurisdicional busca em primeiro plano a tutela específica da prestação devida; na impossibilidade da prestação in natura, o resultado prático equivalente e, em último caso, a reparação por perdas e danos.

A relevante valorização que se deu à busca da tutela específica está acentuada nos dispositivos que conferem ao juiz uma espécie de "poder executório discricionário", habilitando-o a utilizar, inclusive de ofício, além dos mecanismos nominados nos §§ 4º e 5º, outros mecanismos de coerção ou de sub-rogação inominados, aptos a produzir a entrega específica da prestação devida ou o resultado prático equivalente, desde que, por óbvio, juridicamente legítimos.

Outra questão de suma importância, é o caráter emergencial que impregna a tutela específica das obrigações de fazer ou não fazer e que a coloca pari passu com as demais tutelas provisórias de urgência.

Esta característica inerente à tutela específica das obrigações de fazer ou não fazer, como se observará, está calcada na assertiva de que a demanda pela tutela específica possui um conteúdo de satisfatividade tal, que sua concessão in limine litis confunde-se com a própria tutela de mérito.

Com efeito, a compreensão pacífica dos estudiosos do direito processual civil brasileiro identifica, na própria demanda pela tutela específica, um conteúdo eminentemente emergencial na busca pela prestação in natura da obrigação, sob pena de ineficácia da tutela jurisdicional postulada, pois, não raro, o requerimento deduzido em juízo sugere uma resposta imediata do juiz para que ordene o cumprimento de obrigação ou a abstenção específica, em caráter provisório e sem que haja uma cognição exauriente. Assim, determina o legislador pelo § 3º: "sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente, ou mediante justificação prévia, citado o réu" e, da mesma forma que na antecipação de tutela do art. 273 do CPC, indica que "a medida poderá ser revogada ou modificada, a qualquer tempo, em decisão fundamentada".

Eis aí o elemento de convergência entre a antecipação dos efeitos da tutela de mérito, instituída como tutela provisória pelo art. 273 do CPC, e a tutela específica do art. 461 do mesmo diploma processual.

Ambas estas técnicas de tutela, como afirma J. E. Carreira Alvim, "são modalidades de tutela diferenciada, cujo objetivo é satisfazer uma pretensão material que, de outro modo, estaria comprometida pela natural demora na conclusão do processo".

Na prática, entretanto, não se tem feito a devida distinção entre essas espécies de tutela jurisdicional, tratando-se a tutela antecipatória como tutela específica e vice-versa. Não obstante as distorções na aplicação destes institutos processuais, esta diferenciação é de suma importância, porquanto dela dependerá a incidência ou do art. 273 (tutela antecipada) ou do art. 461 (tutela específica) do CPC, cada qual com seu âmbito de aplicação rigorosamente definido.

O melhor critério para se delimitar uma e outra forma de tutela é proceder por exclusão: aquilo que, em tese, não se comportar no âmbito da tutela específica das obrigações de fazer e não fazer (art. 461), comportar-se-á no da tutela antecipada (art. 273). Assim, qualquer pretensão envolvendo obrigação de dar lato sensu (entregar, restituir) cabe no âmbito desta(6), ou seja, as pretensões embasadas na obrigação de dar coisa certa (arts. 863 a 873 do Código Civil) ou incerta (arts. 874 a 877 do Código Civil) estão sob o alcance do art. 273 do Código de Processo Civil, já as pretensões embasadas nas obrigações de fazer (arts. 878 a 881 do Código Civil) e de não fazer (arts. 882 e 883 do Código Civil) restam sob o alcance do art. 461 do Código de Processo Civil, nada obstando, contudo, que haja uma aplicação sistemática e integrada dos dois institutos.

As dificuldades de estabelecer-se, em certos casos, os exatos limites entre as pretensões embasadas nos arts. 273 e 461 determinam, muitas vezes, o ajuizamento de uma ação por outra, pedindo o autor a tutela antecipada quando se trata, na verdade, de tutela específica, ou vice-versa. Constituindo técnicas de tutela de mesma natureza (urgência quanto à pretensão material), destinadas à satisfação do direito num momento diverso daquele considerado adequado, que seria o da sentença (cognição exauriente), a doutrina assevera a possibilidade de conversão de uma espécie de tutela em outra, sem a necessidade de emenda da inicial. Esta conversão, aliás, não afronta o princípio da demanda, mesmo porque o que caracteriza a pretensão material e lhe dá conteúdo é o pedido, na sua substância, e não o modus postulandi, segundo o melhor entendimento doutrinário na seara processual.

De modo contrário, todavia, não poderá haver esta conversão se a hipótese for de medida cautelar (daquelas não deferíveis de ofício) em vez da tutela antecipada ou específica, devendo o juiz, neste caso, facultar ao autor a emenda da inicial, pois, se assim não fizer estará decidindo extra petita.

Outro aspecto de suma relevância para o presente estudo encontra-se na atuação volitiva do homem como óbice ao alcance da tutela específica.

Durante longo tempo estabeleceu-se a vontade humana como limite intransponível ao cumprimento das obrigações de fazer ou não fazer. Assim, historicamente, a vontade do homem, mesmo que reconhecidamente devedor de uma prestação in natura, era intangível. Decorrente dessa premissa, ficou consagrado o princípio insculpido no art. 1.142 do Código Civil Francês, de que toda obrigação de fazer ou não fazer inadimplida, resolve-se em perdas e danos. Contudo, a equivalência entre a prestação específica e sua substituição pelo dinheiro, não raro, deixa ao desabrigo o conteúdo daqueles direitos que efetivamente não possuem valor econômico ou patrimonial, como os de cunho personalíssimo (direito à saúde, à imagem, à intimidade, etc.). "Do que adianta", afirma Thereza Alvim, "para alguém que tem a saúde de sua família e a sua abalada por poluentes de indústria, que está vizinha de sua moradia, não pare esta de poluir o ambiente mas o indenize em pecúnia?".

Mesmo antes de qualquer alteração no Código de Processo Civil, entendendo não ser atentatório à dignidade humana fazer cumprir sua manifesta vontade, a lei processual já encampava dispositivos, consubstanciados nos arts. 639 e 641, através dos quais a decisão judicial supria a vontade do contratante, produzindo os efeitos da declaração não emitida.

Nessas hipóteses, a legislação processual fornecia a tutela específica, em casos que a certificação do direito, realizada no processo de conhecimento, e sua execução forçada mantinham a efetividade da prestação mesmo depois de passado o lapso temporal compreendido entre a demanda e a prestação jurisdicional. Nos demais casos, ainda que infungível a obrigação, restava ao credor da obrigação de fazer ou não fazer a resignação pelo sucedâneo pecuniário.

Hoje, no entanto, superado em parte o mito da nulla executio sine titulo, está definitivamente integrada a nossa cultura a idéia de que a tutela específica não fere a dignidade da pessoa humana, mas, ao contrário, vai ao seu encontro, prevalecendo o entendimento de que a alteração prática ilegítima dessa vontade é que não merece a proteção do direito. Assim, o legislador fez incluir meios de coerção (multa cominatória) e meios de sub-rogação (parágrafo 5º, art. 461, CPC) para privilegiar a efetividade da tutela específica.

Antolhe-se, pois, do exposto, a elevada relevância da tutela específica das obrigações de fazer ou não fazer, do art. 461 do CPC, verdadeiro primor da efetividade do processo, da superação dos óbices conservadores de ordem processual e da garantia de obtenção de tudo aquilo que o titular de um direito deve, pelo exercício pleno da justiça, obter.

11 NATUREZA DA AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER OU NÃO FAZER NÃO CUMPRIDA

As inovações trazidas pela atual redação do art. 461 do Código de Processo Civil, recebeu, com entusiasmo, o apoio de inúmeros autores renomados, que a este instituto agregaram valorosos comentários.

Entre as inovações extraídas do dispositivo está a de permitir medidas executivas imediatas sem necessidade de processo de execução ex intervallo. A quebra do mito nulla executio sine titulo, na ação de cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, é objeto de exame de Ada Pellegrini nas invulgares considerações que se seguem:

(...) descumprido o preceito da sentença ou de sua antecipação, passa-se às medidas executivas lato sensu, no mesmo processo de conhecimento já instaurado: se se tratar de obrigação de prestar declaração de vontade, aplica-se o sistema dos artigos 639 e 641, ambos do CPC, pois a sentença constitutiva já produz resultado equivalente ao da declaração; se se tratar de prestação fungível, que possa ser prestada por terceiro, a hipótese subsume-se ao disposto no art. 634 CPC - inalterado -, que não deixa de configurar medida sub-rogatória enquadrável no § 5º do art. 461, independente de processo separado de execução; nas demais hipóteses, a multa se torna exigível e, sempre que possível, o juiz procederá de imediato à tomada de providências sub-rogatórias exemplificadas no § 5º do art. 461, para atingir o resultado equivalente ao adimplemento, sem necessidade de execução.

Sendo assim, conclui a autora, está-se diante de sentença cuja natureza não encontra identificação "na visão tradicional, que classifica o processo de conhecimento, e as sentenças nele proferidas em meramente declaratórias, condenatórias e constitutivas".

E postula, ainda:

(...) a sentença do art. 461, quando aplicadas as medidas sub-rogatórias previstas em seu § 5º, é de natureza condenatória, mas atípica, pois os atos executórios são praticados no próprio processo de conhecimento. O que nada mais é do que reconhecer a existência de sentenças condenatórias imediatamente executivas, ou, em outras palavras, de sentenças executivas lato sensu.

Observa, mais adiante, lembrando as críticas da doutrina ao reconhecimento da categoria das sentenças mandamentais, que:

(...) hoje as coisas mudaram: a prestação jurisdicional invocada pelo credor da obrigação de fazer ou não fazer deve ser a expedição de ordem judicial, a fim de que a tutela se efetue em sua forma específica. Bem o demonstra o teor do § 4º do art. 461, que permite ao juiz impor ao obrigado multa diária (desde que suficiente ou compatível com a obrigação), independentemente de pedido do autor: o pedido deste, portanto, terá sido de expedição de uma ordem para que, por meios sub-rogatórios, se chegue ao resultado prático equivalente ao adimplemento.

Por outro lado, o destinatário da sentença não é mais exclusivamente a autoridade pública ou o agente de pessoa jurídica no exercício das atribuições do Poder Público (segundo o art. 5º, inc. LXIX, da Constituição vigente), como ocorre no mandado de segurança, mas sim qualquer demandado, titular de uma obrigação de fazer ou não fazer.

E arremata, afirmando que "o art. 84 do CDC e, agora, o art. 461 CPC demandam uma profunda revisão da crítica à existência da sentença mandamental, hoje realidade incorporada ao processo civil comum".

Em outras palavras, essa insigne doutrinadora reconhece, na ação de cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, traços característicos de ação executiva lato sensu e de ação mandamental, porém, expõe claramente não se tratar ela de ação puramente condenatória.

Nesta mesma diapasão, entoa Ovídio Baptista: "parece-nos indiscutível", afirma, "que a ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, do art. 461, pode ser tudo, menos uma ação condenatória, com execução diferida". E mais adiante: "...as ações do art. 461 ou serão executivas (...); ou serão mandamentais", tudo dependendo da natureza das providências ordenadas pelo juiz, com base nos poderes que lhe conferem os §§ 4º e 5º, do art. 461.

No entender de Kazuo Watanabe:

(...) valeu-se o legislador, no art. 461, da conjugação de vários tipos de provimento, especialmente do mandamental e do executivo lato sensu, para conferir a maior efetividade possível à tutela das obrigações da fazer ou não fazer, de modo que a execução específica ou a obtenção do resultado prático correspondente à obrigação pode ser alcançado através do provimento mandamental ou do provimento executivo lato sensu, ou da conjugação dos dois. Através do provimento mandamental é imposta uma ordem ao demandado, que deve ser cumprida sob pena de configuração de crime de desobediência, portanto mediante imposição de medida coercitiva indireta.

Isto, evidentemente, sem prejuízo da execução específica, que pode ser alcançada através de meios de atuação que sejam adequados e juridicamente possíveis, e que não se limitam ao pobre elenco que tem sido admitido pela doutrina dominante. E aqui entra a conjugação do provimento mandamental com o provimento executivo lato sensu, permitindo este último que os atos de execução do comando judicial sejam postos em prática no próprio processo de conhecimento, sem necessidade de ação autônoma de execução.

O problema de se reconhecer sempre, na ação do art. 461, uma ação executiva lato sensu, ou seja, que permite desde logo, na mesma relação processual, as providências executivas decorrentes da sentença (que é mandamental ou executiva, ou conjugadas), está no reformado art. 644 do Código de Processo Civil, que, como visto em tópico anterior, prevê ação autônoma de execução de obrigações de fazer ou não fazer determinada em título judicial. Afirma a autorizada doutrina que, se a sentença está sujeita a ação de execução autônoma, ex intervallo, como prevê o dispositivo, é porque o art. 461 produz, pelo menos em certos casos, sentença condenatória, e não executiva lato sensu.

A elucidação da questão tem relevante importância prática, pelas conseqüências de ordem processual daí decorrentes, entre elas, (v.g.), a relativa à defesa do devedor e à competência para promover os atos de execução.

Com efeito, se se considerar a sentença como condenatória, a defesa do executado será promovida por via de embargos, ou seja, por uma nova ação autônoma e incidental (de conhecimento), caso houver execução; todavia, caso se considere a sentença como de natureza executiva ou mandamental, toda a matéria de defesa, inclusive no que se refere às providências executórias, se dará por petição e, se for o caso, por recurso de agravo, na própria ação de conhecimento original. Por outro lado, no que tange à competência, sendo considerada condenatória a sentença, será competente para a ação de execução o juízo originariamente competente para decidir a ação de conhecimento (CPC, art. 575, I e II).

O mesmo não ocorreria em se tratando de sentença executiva lato sensu. Vislumbre-se a hipótese em que, estando o processo em fase recursal, haja antecipação da tutela, com base no art. 461, § 3º, deferida pelo relator. Aqui, se considerada de natureza condenatória, a decisão antecipatória servirá como título executivo para a instauração de ação executiva perante o juízo a quo. Contudo, se tratada como executiva lato sensu, o cumprimento da medida antecipatória será promovido, desde logo, perante o próprio órgão que a deferiu, isto é, o Tribunal.

Ovídio Baptista, aliás, nega a natureza condenatória da ação do art. 461, em qualquer caso, quando assevera:

Parece-nos fora de dúvida que o modo como está concebido o art. 461 afasta a conclusão de que as ações aí indicadas pudessem ter por objetivo apenas a condenação do demandado, a fim de que a execução da sentença se processasse, com fundamento no art. 644, numa segunda demanda.

Na verdade, esta norma limita-se a autorizar o juiz, a quem caiba ordenar a execução, a fixar multa a ser suportada pelo demandado, quando omissa a sentença. Não seria lícito extrair dela a conclusão de que esteja prevista aí uma ação de execução complementar à pretensa sentença condenatória do art. 461.

Convém, para a maior clareza do exposto, que ora se faça uma breve consideração de ordem conceitual.

Costuma-se, para efeito de distinção entre as ações executivas lato sensu e as condenatórias, definir as primeiras como sendo as que comportam, em si mesmas, também os atos de execução e as segundas, aquelas cuja a execução é deslocada para ação autônoma. Com base nesta distinção, pode-se considerar como pertencente à classe das ações executivas lato sensu aquela de que resulta sentença mandamental, isto é, sentença em que o juiz emite uma ordem de execução imediata.

Destarte, quando se faz alusão à "ação executiva lato sensu" quer-se referir à ação em que os provimentos judiciais ali emitidos, sejam específicos ou sub-rogatórios, são cumpridos na própria relação processual de conhecimento.

O cotejo do art. 461 do CPC não deixa dúvida de que a ação de cumprimento das obrigações de fazer ou não fazer contém uma executividade lato sensu, ou melhor, comportam em si mesmas a execução em função da configuração da obrigação a ser cumprida, o que a torna incompatível com uma posterior ação executiva autônoma.

Dentre as possibilidades do art. 461, é passível de ser identificada com legitimamente executiva lato sensu a ação em que se postula a tutela específica de obrigação de não fazer (obrigação omissiva), posto que eminentemente preventiva, sendo tutela consistente, necessariamente, numa ordem para que o réu se abstenha, tolere ou permita algum ato ou fato. A sentença, portanto, tem caráter mandamental e poderá vir acompanhada de multa cominatória, com valor fixo (e não diário), para o caso de descumprimento da ordem.

Analisando-se pelos critérios da finalidade e da efetividade, visados pelo legislador da reforma processual, há que se entender, também, como de natureza executiva lato sensu a ação para o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer nas hipóteses em que deferida a antecipação da tutela com base no art. 461, parágrafo 3º.

Neste particular, comenta Teori A. Zavascki:

Ora, se a lei prevê a antecipação de efeitos executivos como meio para superar a ameaça de ‘ineficácia do provimento final’, e assim garantir a prestação da tutela específica, parece certo que não haveria sentido lógico em diferir a efetivação dos correspondentes atos executivos para uma outra ação, com nova citação, com fixação de prazo para cumprimento, sujeita a embargos etc. Só há sentido no § 3º do art. 461 quando, não apenas a decisão antecipatória, mas também a sua execução, sejam procedidas de imediato e afastando, com isso, o iminente risco de ineficácia. (...) inclinamo-nos em considerar que as ações previstas no art. 461 serão executivas lato sensu quando isso decorra da natureza própria da obrigação a ser cumprida (obrigação de concluir contrato, obrigação de declarar vontade, obrigação específica de não fazer) ou quando, para resguardo da efetividade da tutela específica ou da medida de resultado prático equivalente, houver urgência na concretização dos atos executórios (antecipação da tutela com fundamento no § 3º do art. 461). Nos demais casos, havendo compatibilidade e não se fazendo presente qualquer risco de ineficácia, a sentença terá natureza condenatória, sujeita, portanto, à execução ex intervallo e em ação autônoma.

Pelo exposto, nota-se que a característica da executividade lato sensu impregna a ação de cumprimento do art. 461 do CPC, mormente nos casos de tutela de obrigação de não fazer e naqueles em a urgência requer a antecipação prevista no § 3º. Nas demais hipóteses, divergem os doutrinadores pátrios, alguns entendendo a ação de cumprimento manter a natureza executiva lato sensu e mandamental, devendo as medidas práticas da tutela serem tomadas na própria ação de conhecimento, outros a entender que, inexistindo o risco de ineficácia, deverão as medidas executivas ser tomadas em ação autônoma.

Sobre o autor
Antônio Carlos Tadeu Borges dos Reis

advogado processualista, pós-graduado em Direito do Consumidor pela EMERJ/UNESA

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

REIS, Antônio Carlos Tadeu Borges. A defesa do consumidor em juízo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 134, 17 nov. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4489. Acesso em: 18 nov. 2024.

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