Em recente sentença em Embargos de Execução, o Exmo. Juiz da 2ª Vara Cível da Comarca de Ijuí (RS), decidiu que o contribuinte estaria para o Estado, assim como o consumidor estaria para o fornecedor, o que tornaria possível a aplicação do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8078/90), nas relações jurídico-tributárias.
De acordo com a fundamentação de sentença a seguir transcrita:
"Para dar uma hipótese de solução a esta questão grave de inadimplência tributária, minha tese é de que não se pode deixar de analisar a relação contribuinte/Estado-Fisco como uma relação de consumo, já que o contribuinte está para o Estado, assim como os consumidores estão para os fornecedores. O contribuinte é um consumidor daquilo que o Estado-Administração coloca à disposição para sua utilização. Desta forma, o Estado Administração é um FORNECEDOR e o contribuinte é um CONSUMIDOR. Sendo o Estado-Fisco integrante do Estado-Administração, forçosamente o Estado-Fisco é um fornecedor. Assim, entendo estar caracterizada a relação de consumo, devendo incidir o Código de Defesa do Consumidor também nas relações dos contribuintes com o Estado, a fim de garantir a defesa dos interesses dos consumidores, todos eles contribuintes do Estado." (Processo nº 62.935-2000)
Com base nesta fundamentação, o Magistrado determinou a redução da multa de 30% para 2% sobre o saldo devedor atualizado, aplicando a Lei 9.298/97.
Data a máxima vênia, considera-se que a posição do Exmo. Juiz não deveria prevalecer, tendo em vista a grande diferença entre a relação de consumo e a relação tributária.
Conforme o art. 6º, inciso II, do Código de Defesa do Consumidor:
"Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
(...)
II - a educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, asseguradas a liberdade de escolha e a igualdade nas contratações;" (grifo nosso)
A relação de consumo, por ser eminentemente contratual, deve ser caracterizada pela liberdade e pela igualdade (material) entre as partes contratantes.
É garantida ao consumidor a liberdade de contratar ou não com determinado fornecedor, ou seja, de comprar ou não comprar determinado produto ou serviço. O Código de Defesa do Consumidor dispõe, inclusive, em art. 39, inciso I, como conduta abusiva que se condicione o fornecimento de produto ou serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço que não requerido ou desejado pelo consumidor (a chamada "venda casada").
Na relação tributária, ao contrário, não há liberdade do contribuinte em decidir se paga ou não o tributo. A obrigação tributária é caracterizada pela compulsoriedade, isto é pela obrigatoriedade de seu comprimento pelo sujeito passivo, desde que efetivamente verificada a ocorrência do fato imponível.
O art. 3º do Código Tributário Nacional fornece o conceito de tributo:
"Art. 3º Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada." (grifo nosso)
O mestre Geraldo Ataliba, ao doutrinar a respeito deste conceito de tributo previsto no art. 3º do Código Tributário Nacional, explica a diferença entre a obrigação convencional e a obrigação tributária:
"O fulcro do discrímen está primeiramente no modo de nascimento da obrigação. Se se tratar de vínculo nascido da vontade das partes, estar-se-á diante de figura convencional (obligatio ex voluntate), mútuo, aluguel, compra e venda, etc. Isto permite discernir a obrigação tributária das obrigações convencionais.
Se, por contrário, o vínculo obrigacional nascer independentemente da vontade das partes – ou até mesmo contra esta vontade – por força da lei, mediante a ocorrência de fato jurídico lícito, então estar-se-á diante de tributo, que se define como obrigação-jurídico legal, pecuniária, que não se constitui em sanção de ato ilícito, em favor de pessoa pública. Ter-se-á obrigação de indenização por dano, se o fato de que nascer a obrigação for ilícito." (1) (ATALIBA, Geraldo, 1997)
O advogado tributarista Eduardo Diamentino, em texto publicado no site Consultor Jurídico [2] também ressalta a diferença entre a obrigação convencional, no caso da relação de consumo, e a obrigação tributária, no caso a relação formada entre o Estado e o contribuinte:
"Uma vez que os impostos são compulsórios, inexiste a relação de consumo. Salvo raras exceções, ninguém paga tributos por sua vontade própria."
Portanto, não são aplicáveis as normas do Código de Defesa do Consumidor nas relações jurídico-tributárias, tendo em vista esta diferença entre uma e outra relação jurídica: enquanto a obrigação convencional verificada nas relações de consumo é caracterizada pela liberdade e igualdade entre as partes, a obrigação tributária é marcada pelo caráter involuntário da participação de uma das partes da relação jurídico-tributária (o contribuinte).
A jurisprudência majoritária acompanha tal raciocínio, dispondo pela inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor às obrigações tributárias:
"TRIBUTÁRIO - CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - LEI Nº 9.296/96 - REDUÇÃO - MULTA - INAPLICAÇÃO EM VIRTUDE DA NORMA SE ESTENDER APENAS ÀS RELAÇÕES DE NATUREZA CONTRATUAL. - O preceito acrescentado ao artigo 52 do Código de Defesa do Consumidor, se estende, apenas, às relações de natureza contratual, vale dizer, às relações atinentes ao direito privado. Não alcança as multas tributárias. - Recurso não conhecido."
Origem: STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Classe: RESP - RECURSO ESPECIAL – 261367
Processo: 200000538116 UF: RS Órgão Julgador: PRIMEIRA TURMA
Data da decisão: 01/03/2001 Documento: STJ000387055
"TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. MINISTÉRIO PÚBLICO. INTERVENÇÃO. DESNECESSIDADE. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. 1. É desnecessária a intervenção do Ministério Público nas execuções fiscais (Súmula 189 - STJ). 2. Inexistência de prescrição, vez que o ajuizamento da ação ocorreu dentro do prazo do art. 174 do CTN. 3. Não tem caráter confiscatório a multa de 20% porque fixada em patamar inferior do considerado razoável pelo STF no RE 81.550-MG (RTJ 74/319), sendo inaplicável às multas fiscais o Código de Defesa do Consumidor. Precedentes. 4. Apelação improvida."
Origem: TRF - PRIMEIRA REGIÃO
Classe: AC - APELAÇÃO CIVEL – 01000738286
Processo: 199901000738286 UF: MG Órgão Julgador: SEGUNDA TURMA SUPLEMENTAR
Data da decisão: 26/02/2002 Documento: TRF100128233
"TRIBUTÁRIO. AÇÃO DE DEPÓSITO. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL. MULTA DE 60%. LEI Nº 8.620/93, ART. 4º, IV. CARÁTER CONFISCATÓRIO AFASTADO. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. INAPLICABILIDADE. I. Multa fixada em 60% do valor da contribuição não tem caráter confiscatório, atendendo às suas finalidades educativas e de repressão da conduta infratora. O confisco só se afigura quando há desproporcionalidade entre a punição e os referidos fins. II. Não incide, in casu, as disposições do Código de Defesa do Consumidor, já que a relação que originou o débito em questão não se confunde com as de consumo, sendo de natureza tributária, descabendo, em conseqüência, a observância do limite estabelecido pela Lei 8.078/90. III. Apelação improvida."
Origem: TRF - PRIMEIRA REGIÃO
Classe: AC - APELAÇÃO CIVEL – 01000190618
Processo: 199901000190618 UF: MT Órgão Julgador: SEGUNDA TURMA SUPLEMENTAR
Data da decisão: 19/02/2002 Documento: TRF100127238
"TRIBUTÁRIO. AÇÃO DE DEPÓSITO. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. ENTREGA. MULTA DE 60% (ART. 61, IV, LEI 8.383/91). REDUÇÃO PARA 10% (CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR). DIRETOR FINANCEIRO. DEPOSITÁRIO INFIEL. PRISÃO CIVIL. 1. É incabível a utilização do processo analógico, que tem como pressuposto a existência de lacuna na lei, para reduzir a multa de 60% (sessenta por cento) não-relevável, prevista no artigo 61, inciso IV, da Lei nº 8.383/91, pra 10%(dez por cento), com base na Lei nº 8.078/90, que "estabelece normas de proteção e defesa do consumidor". 2. Considera-se depositário infiel, passível de decretação de prisão civil, os diretores, administradores, gerentes ou empregados que movimentem recursos financeiros isolada ou conjuntamente da pessoa jurídica devedora de contribuições previdenciárias (Lei 8.866/94). 3. Provimento do recurso, tão-somente, com relação ao pedido de revogação da prisão de PEDRO HENRY NETO. 4. Recurso do INSS provido. Recurso da SANEMAT, parcialmente provido."
Origem: TRF - PRIMEIRA REGIÃO
Classe: AC - APELAÇÃO CIVEL – 01000594542
Processo: 199701000594542 UF: MT Órgão Julgador: QUARTA TURMA
Data da decisão: 03/08/1999 Documento: TRF100088442
"PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. INICIAL DA EXECUÇÃO FISCAL E MEMÓRIA DISCRIMINADA DE CÁLCULO. DESNECESSIDADE. MULTA MORATÓRIA. REDUÇÃO AOS TERMOS DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. DESCABIMENTO. JUROS MORATÓRIOS E LIMITE DE 12% DO ARTIGO 192, § 3º, CF. INAPLICABILIDADE. 1. O processo de execução fiscal á regido por normas próprias, que afastam a aplicação das normas do CPC, razão pela qual não se exige a juntada de memória discriminada de cálculo, substituída que se encontra pela CDA. 2. O percentual da multa, fixada no Código de Defesa do Consumidor, não incide em se tratando de crédito tributário, de natureza evidentemente distinta e sujeito à legislação específica. 3. O limite de 12%, referido no § 3º do artigo 192 da Constituição Federal, tem aplicação destinada a regular os juros relativos a crédito concedido no âmbito do sistema financeiro nacional, estando, ademais, a norma a depender de regulamentação legal para produzir eficácia plena, conforme jurisprudência do Supremo Tribunal Federal."
Origem: TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Classe: AC - APELAÇÃO CIVEL – 555766
Processo: 199903991134958 UF: SP Órgão Julgador: TERCEIRA TURMA
Data da decisão: 14/02/2001 Documento: TRF300054030
"PROCESSUAL CIVIL - JULGAMENTO ANTECIPADO - CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CARACTERIZADO - TRIBUTÁRIO - EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL - MULTA - CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - INAPLICABILIDADE - JUROS. - Regular o julgamento antecipado da lide, porquanto o embargante impugnou valores por ele mesmo confessados, nada justificando a produção de provas. - A inicial da execução fiscal deve estar instruída com a Certidão da Dívida Ativa, documento suficiente para comprovar o título executivo fiscal. - Inaplicável a Lei 9.288/96, pois refere-se especificamente às relações de consumo. - A pretendida limitação dos juros a 0,5% ao mês não encontra previsão legal. O crédito tributário não pago no vencimento é acrescido dos juros de mora, devidos no percentual mensal de 1% se a legislação ordinária não dispuser de modo diverso, "ex-vi'' do art. 161 do Código Tributário Nacional."
Origem: TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Classe: AC - APELAÇÃO CIVEL – 467810
Processo: 199903990205106 UF: SP Órgão Julgador: SEXTA TURMA
Data da decisão: 06/09/2000 Documento: TRF300052527
Como conseqüência da inaplicabilidade das normas referentes ao consumidor às questões envolvendo o contribuinte, configura-se a ilegitimidade do Ministério Público para propor Ações Civis Públicas como forma de discutir tributos ou mesmo as multas a estes aplicadas:
"PROCESSUAL CIVIL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - ILEGITIMIDADE ATIVA - INEXISTÊNCIA DE DIREITO COLETIVO - DIREITO INDIVIDUAL HOMOGÊNEO DISPONÍVEL - INAPLICABILIDADE DO CÓDIGO DO CONSUMIDOR AO DIREITO TRIBUTÁRIO. 1. A relação jurídico-tributária não constitui relação de consumo, de modo a permitir a utilização dos mecanismos de defesa do consumidor para se questionar a constitucionalidade de tributo, ao argumento de que se trata de direito individuais homogêneos. 2. Ainda que possível a ação civil pública para discussão de matéria tributária, não teria o Ministério Público legitimidade para figurar no pólo ativo da relação processual, já que se trataria de direito individual indisponível. 3. Criando o Direito Tributário obrigação essencialmente individual, não pode ele ser considerado direito coletivo, definido pela Lei 8.079/90 como aquele transindividual, de natureza indivisível, que tem como titular grupo, categoria ou classe de pessoas. Em conseqüência, também sob o enfoque do direito coletivo incabível a ação civil pública para a discussão, em juízo, de matéria tributária. 4. Por último, mesmo que se tratasse de direito coletivo, não teria ele conteúdo, social, indispensável para tomar legítima a atuação do Ministério Público, nos termos do art. 127 da Constituição. 5. Apelação e remessa providas."
Origem: TRF - PRIMEIRA REGIÃO
Classe: AC - APELAÇÃO CIVEL – 01000103125
Processo: 199901000103125 UF: BA Órgão Julgador: TERCEIRA TURMA
Data da decisão: 19/10/1999 Documento: TRF100089125
Portanto, diante do exposto, conclui-se que não é justificável a aplicação do Código de Defesa do Consumidor às relações tributárias, seja administrativamente ou judicialmente, devido às já explicadas diferenças essenciais entre as relações entre consumidor-fornecedor e contribuinte-Estado-Fisco.
Do Código de Defesa do Contribuinte – Esferas Federal e Estadual
A solução para melhorar as relações entre os contribuintes e o Estado-Fisco não estaria na aplicação do Código de Defesa do Consumidor (que, conforme demonstrado, é inaplicável); a resposta estaria, no que diz respeito aos tributos federais, na aprovação do Código de Defesa do Contribuinte – Projeto de Lei Complementar do Senado nº 646 de 1999 do Senador Jorge Bonhausen do PFL de Santa Catarina.
O Professor Rafael Peixoto Abal explica alguns aspectos deste Projeto:
"O projeto que prevê a instituição do Código de Defesa do Contribuinte se reveste de cidadania em proporções não vistas desde o Código de Defesa do Consumidor e do Estatuto da Criança e do Adolescente, ambos em vigor desde 1990.
É inegável que o referido diploma legal positiva garantias constitucionais dos cidadãos em matéria tributária e reduz o abismo existente entre fisco e contribuinte, mas não fica apenas nisso, lança o Brasil na vanguarda mundial no que tange a legislação tributária, na esteira da defesa dos direitos fundamentais do contribuinte e a busca da justiça fiscal.O nosso país passa, portanto, a figurar no grupo em que, por exemplo, já se encontram Estados Unidos com a sua Declaração de Direitos do Contribuinte II (Taxpayer Bill of Rights II) que data de 30 de julho de 1996, e a Espanha através da "Ley de Derechos y Garantias de los Contribuyentes", que foi publicada em de 26 de fevereiro de 1998." (3) (ABAL, Rafael Peixoto, 2000)
Em seu excelente texto, o referido Professor, explana a respeito dos pontos essenciais do PL 646/99, do qual extraem-se os seguintes trechos:
"Inicialmente não poderá o fisco proceder à interdição de estabelecimentos, proibir o contribuinte de transacionar com repartições públicas; proíbe ainda, a instituição de barreiras fiscais e outros meios coercitivos para a cobrança extrajudicial de tributos, previstos nos arts. 13 e 14 do referido projeto.
(...)
Já o art. 37, I e III veda à Administração Fazendária recusar, em razão de débitos tributários pendentes, autorização para o contribuinte imprimir os documentos necessários ao desempenho de suas atividades; ou bloquear, suspender ou cancelar inscrição do contribuinte sem a observância dos princípios do contraditório e da prévia e ampla defesa. Não menos importante, é a vedação do inciso V do mesmo artigo, que acaba com a possibilidade do uso de força policial nas diligências ao estabelecimento do contribuinte, salvo se com autorização judicial na hipótese de justo receio de resistência.
(...)
Talvez a maior evolução encontra-se no art. 18, que assegura explicitamente o direito de defesa ou de recurso, administrativo ou judicial, sem condicionamento a depósito, fiança, caução, aval ou outro ônus qualquer, exceto na execução fiscal, nos termos da lei processual aplicável. Como é sabido, atualmente o conhecimento de recurso administrativo em sede tributária é vinculado ao depósito prévio de 30% do valor em discussão, o que violenta o art. 5º, XXXIV, "a", da Constituição Federal, mas que é pratica comum em várias instâncias administrativas." (4)(ABAL, Rafael Peixoto, 2000)
Conforme se depreende da leitura do Projeto de Lei Complementar do Senador Bonhausen, se procura garantir ao contribuinte, na esfera administrativa tributária, um tratamento correto e seguro, livre de qualquer atitude arbitrária da autoridade fiscal.
Se na esfera federal o Código de Defesa do Contribuinte ainda não foi aprovado, o Governo de São Paulo, em atitude exemplar, tratou de sancionar, em 3 de abril de 2003, a Lei Complementar nº 939/03, que instituiu o Código de Direitos, Garantias e Obrigações do Contribuinte do Estado de São Paulo.
Sobre esta iniciativa escreveu o Mestre Ives Gandra Martins:
"Não teve, S. Exa., o Governador, receio de apoiar a iniciativa do PFL paulista, no projeto de lei complementar apresentado pelo Deputado Rodrigo Garcia, pois entendeu que os governos vivem em função daquele que o sustenta, ou seja, o contribuinte, que não pode ser tratado de forma indiferente, quase sempre com preconceitos visíveis por parte das autoridades, que conseguem inocular suas desconfianças na mídia, estigamatizando-o quase sempre como sonegador." (5) (MARTINS, Ives Gandra, 2003).
Esta nova Lei Complementar procura proteger o contribuinte no processo administrativo tributário, de qualquer espécie de arbitrariedade ou procedimento irregular da autoridade fiscal, como se verifica no disposto em seu art. 2º:
"artigo 2º. São objetivos do Código:
(...)
II – proteger o contribuinte contra o exercício abusivo do poder de fiscalizar, de lançar e de cobrar tributo instituído em lei;
III – assegurar a ampla defesa dos direitos do contribuinte no âmbito do processo administrativo-fiscal em que tiver legítimo interesse. (...)"
Durante o processo de fiscalização são garantidos ao contribuinte o direito de requerer a ordem de fiscalização ou outro ato administrativo autorizando a execução de auditorias fiscais ou coleta de dados, salvo nos casos de extrema urgência, bem como o direito de se recusar a prestar informações por requisição verbal da autoridade fiscalizadora, se preferir por escrito (art. 4º, incisos IX e XI)
A referida Lei Complementar também dispõe sobre o processo administrativo da consulta, explicitando seus efeitos (art. 13).
E finalmente, dentre outras disposições, o Código de Defesa do Contribuinte do Estado de São Paulo prevê a criação de um órgão de proteção do contribuinte (uma espécie de PROCON) – o Conselho Estadual de Defesa do Contribuinte, o CODECON, que deverá atuar na defesa dos interesses dos contribuintes, assim como julgar as reclamações dos contribuintes sobre quaisquer infrações ao disposto no Código (arts. 22 a 24).
Iniciativa como esta do Estado de São Paulo (e de Minas Gerais, que também dispõe de um Código de Defesa do Contribuinte), demonstra que o Estado-Fisco está se conscientizando da importância do contribuinte para sua própria sobrevivência. O contribuinte, como peça essencial para o funcionamento do Estado, deve ser respeitado, especialmente durante o processo administrativo fiscalizatório, o que, muitas vezes, devido a ânsia arrecadatória, não acontece.
O Mestre Ives Gandra Martins ilustra bem esta situação:
"É de se lembrar a sábia história árabe – povo admirável -, mas pouco admirado pelo presente americano – em que um beduíno ensinava a seu filho que, se no deserto houver água apenas para o camelo ou para o beduíno, deve o beduíno dar a água ao camelo, para que possa levá-lo a um oásis, o que não aconteceria, se ele próprio bebesse, morrendo o animal primeiro, e ele depois.
Que o "camelo" da sociedade geradora de empregos e desenvolvimento possa beber a água necessária para que o "beduíno" do governo, que muitas vezes mais atrapalha que auxilia, possa continuar vivendo – se possível, sem os privilégios que desfruta atualmente." [6](MARTINS, Ives Gandra, 2003)
NOTAS
01. ATALIBA, Geraldo; Hipótese de Incidência Tributária, Ed. Malheiros, 1997, p.p 34 e 35.
02. Consultor Jurídico - www.conjur.com.br
03. ABAL, Rafael Peixoto. Código de Defesa do Contribuinte . Jus Navigandi, Teresina, a. 4, n. 42, jun. 2000.
04. Obra citada.
05. MARTINS, Ives Grandra, "A iniciativa do governo de São Paulo deve ser seguida", artigo publicado no Jornal Valor Econômico de 29.05.03.
06. Obra citada.
BIBLIOGRAFIA
ABAL, Rafael Peixoto. Código de Defesa do Contribuinte . Jus Navigandi, Teresina, 2000. Disponível em:<http://jus.com.br/revista/doutrina/texto.asp?id=1312>.
ATALIBA, Geraldo; Hipótese de Incidência Tributária, Ed. Malheiros, São Paulo, 1997.
MARTINS, Ives Grandra, "A iniciativa do governo de São Paulo deve ser seguida", artigo publicado no Jornal Valor Econômico de 29.05.03
MORAIS, Maxwell Medeiros de. Defesa da concorrência e do consumidor enquanto princípios da ordem econômica no Estado Democrático de Direito. Considerações gerais. Jus Navigandi, Teresina, 2002. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/doutrina/texto.asp?id=3430>.