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O papel dos Tribunais Superiores e a importância de seus precedentes no processo penal

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Agenda 22/12/2015 às 01:28

Trata-se da importâncias dos precedentes dos Tribunais Superiores, e da necessidade de sua observância pelas instâncias inferiores, como medida de segurança jurídica tão necessário ao Processo Penal.

INTRODUÇÃO

Com o neoconstitucionalismo, quando a letra da lei passa a não ser mais soberana e sua validade e significado, passa a ser determinado a partir de uma interpretação sistêmica que levará em conta princípios e garantias contidas nas normas superiores até chegar a nossa lei máxima a Constituição Federal, o papel dos Tribunais Surperiores, especialmente o do Supremo Tribunal Federal – STF, ganha relevância.

“A lei passa a encontrar limite e contorno nos princípios e nas regras constitucionais, o que significa que deixa de ter apenas legitimação formal, restando substancialmente amarradas aos direitos positivados na Constituição. Se antes era possível dizer que os direitos fundamentais eram circunscritos à lei, torna-se agora exato afirmar que as leis devem estar em conformidade com os direitos fundamentais. O próprio princípio da legalidade passa a ter outro significado, deixando de ter conteúdo apenas formal para adquirir conteúdo substancial. O princípio da legalidade liga-se ao conteúdo da lei, ou melhor, à conformação da lei com os direitos fundamentais.” [1]

Os Tribunais Superiores, principalmente o STJ e o STF, passam a ter uma importância imensa, pois a eles cabe da o significado real e válido das normas legais e da própria constituição federal. Contudo, no nosso sistema legal onde o controle de constitucionalidade pode ser difuso e exercido até mesmo pelos juízes de primeiro grau, teremos sempre um paradoxo entre a vinculação das decisões dos tribunais superiores e a autonomia dos outros tribunais, sem levar em consideração as divergências entre o legalismo e o ativismo judicial.

Passamos então a abordar o papel atual dos Tribunais Superiores, mais especificamente o STJ e o STF, quanto à unificação dos preceitos legais e a importância de suas decisões.                                           

FUNÇÃO DOS TRIBUNAIS SUPERIORES

A função dos Tribunais Superiores é a de dar a palavra final em termos de interpretação das leis, no caso do STJ das leis infraconstitucionais e do STF nos termos da própria Constituição, de maneira que pode se dizer que o STJ é o guardião da legislação federal, excluindo-se de sua competência, somente as leis federais de competência de outras cortes superiores o TST para legislação trabalhista e TSE para a legislação eleitoral, e o STF pode ser nomeado como o guardião da Constituição.

Tanto o STJ quanto o STF são, portanto, órgãos de superposição e suas decisões predominam sobre as dos demais Tribunais.

“Na medida em que não pertencem a qualquer Justiça, podemos classificar o STF e o STJ (Tribunais da União) não só como órgãos de convergência, conforme já visto, mas, também, como órgão de superposição. Isso porque, embora não pertençam a nenhuma Justiça, as suas decisões se sobrepõem às decisões proferidas pelos órgãos inferiores da Justiça, as suas decisões se sobrepõem às decisões proferidas pelos órgãos inferiores da Justiça, comum e especial. As decisões do STJ se sobrepõe àquelas da Justiça Federal comum, da Estadual e daquela do Distrito Federal e Territórios, ao passo que as decisões do STF se sobrepõem a todas as Justiças e Tribunais.” [2]

Sobre a função de cada Tribunal vale citar Grinover, Cintra e Dinamarco:

Quanto ao STF “sua função básica é a de manter o respeito à Constituição e sua unidade substancial em todo o país, o que faz através de uma série de mecanismo diferenciado – além de encabeçar o Poder Judiciário inclusive em certas causas sem conotação constitucional. Como cabeça do Poder Judiciário, compete-lhe  a última palavra na solução das causas que lhe são submetidas.

(...)

Logo abaixo da cúpula de todo o Poder Judiciário, que é o Supremo Tribunal Federal, encontra-se o Superior Tribunal de Justiça, também com sede no Distrito Federal e competência sobre todo o território nacional (Const., art. 92, par. ún.).

Constitui inovação da Constituição de 1988 sobre a estrutura judiciária brasileira e relaciona-se como os sistemas judiciários das chamadas Justiças comuns (Justiça Federal e Justiças Estaduais); ele próprio é um órgão exercente da chamada jurisdição comum, na media em que somente lhe cabem causas regidas pelo direito substancial comum (direito civil, penal, comercial, tributário, administrativo) e não as regidas por ramos jurídico-substanciais especiais (eleitoral, trabalhista, penal militar)” [3]

Assim cabe à tais tribunais a ultima palavra na interpretação legal, estando, ainda, o STF uma instância acima, posto que a Constituição Federal, deve servir de base para interpretação das  todas as demais leis. Embora existam outras funções relativas aos tribunais superiores, que não vem ao caso serem detalhadas, sua função primordial é a já citada, uniformização do sistema jurídico e da interpretação legal.

Tanto é assim, que os recursos extraordinário e especial visam apenas a interpretação legal não se admitindo a reanálise de provas, não havendo, destarte, análise fática, apenas a questões de direito são analisadas.

“Os recursos especial e extraordinário são meios de impugnação de natureza extraordinária, na medida em que – respectivamente – o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Supremo Tribunal Federal (STF) não reexaminam todo o julgamento, senão que se limitam ao aspecto jurídico da decisão impugnada, ou seja, à discussão de questões de direito expressamente previstas em lei. São, por isso, recursos de fundamentação vinculada, posto que a matéria discutida fica limitada àqueles expressamente previstos na Constituição

Quanto à discussão em torno da prova, ou seja, de questões de fato, em ambos os recursos isso está vedado. Assim dispõem as Súmulas n. 07 do STJ e 279 do STF.” [4]

Conforme ressalta Paula Pessoa Pereira citando Michelle Taruffo as cortes superiores visariam tutelar e promover a legalidade, através de uma tutela reativa à violação e proativa visando evitar uma violação futura. [5]

Assim, a importância dos Tribunais Superiores se dá principalmente pelo papel de unificadores da interpretação legal, sendo que a isonomia perante a lei é princípio constitucional, de maneira que a lei deve ser clara e aplicável igualmente à todos os cidadãos em situação idêntica, sendo fundamental, portanto, para o ordenamento a previsão de mecanismos e meios  para garantir de um jeito rápido e eficaz de correção de julgamentos realizados em desconformidade como os preceitos legais.

“... a função do juiz, no Estado de Direito, é de aplicar a lei, e não criá-la, atividade esta reservada ao legislador. Nesse contexto, a gravidade do julgamento realizado contrariamente à lei rende ensejo, por si só, à necessidade de um mecanismo de correção. Afinal, a não aplicação da lei pelo juiz, ou emissão de decisões judiciais contrárias a ela, afeta irreparavelmente a própria certeza do direito.

(...)

Em outras palavras, se dentre as inúmeras competências que o constituinte reservou ao STJ e ao STF ganha destaque sempre maior, a cada dia (especialmente no últimos tempos), aqueles que os qualificam, grosso modo, como guardiões do direito federal infraconstitucional e do direito constitucional, respectivamente (o papel de conferir inteireza positiva, validade, autoridade e uniformidade de interpretação da Constituição e das leis federais), parece-nos fundamental que o ordenamento estabeleça um mecanismo apto a reforçar o exercício dessas atribuições.” [6]

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As cortes superiores devem realizar o controle das decisões judiciais, primando pela unificação da interpretação do direito e unificando o sistema, dando mínimo de previsibilidade e segurança jurídica aos jurisdicionados. Tratando-se de direito penal onde as liberdades individuais estão em jogos e o bem jurídico a ser tutelado é a própria liberdade, faz necessário um controle rápido e eficaz, para que a lei penal tenha seu alcance perfeitamente delimitado de maneira que se saiba de antemão o que é permitido ou proibido, bem como que o processo seja um instrumento garantidor dos direitos do acusado, evitando-se ou corrigindo-se de maneira rápida e eficaz qualquer violação.

NECESSIDADE DE SEGURANÇA JURÍDICA NO PROCESSO PENAL

Atualmente, num mundo globalizado onde as informações são transmitidas em segundos, atingindo um número indeterminado de pessoas, havendo grande integração entre todos os países, sendo cada vez mais comuns e maiores os investimentos em outros lugares. Assim, a sociedade atual encontra-se com tamanho desenvolvimento, estando todos à procura de segurança nas relações, devendo haver segurança e previsibilidade na interpretação legal.

 Nas palavras de Barros Leonel: “este dinamismo, velocidade e larga escala em que se dão os fenômenos sociais, culturais, econômicos e políticos exigem, mais do que nunca, o incremento de segurança jurídica.” [7]

E tratando-se de direito penal tanto a lei quanto o processo devem trazer segurança aos jurisdicionado, pois tanto a lei deve ser clara, não restando dúvidas quanto ao que é permitido e o que é proibido, sob pena de ter a liberdade cerceada, quanto o processo deve servir como instrumento garantidor dos direitos individuais do acusado. Anote-se que a razoável previsibilidade e segurança, relacionados à coerência na atuação jurisdicional, com interpretação e aplicação uniformes das leis (lato sensu), são elementos fundamentais para que os indivíduos também se portem com boa-fé. Além disso, tais elementos tornam-se mais relevantes do que nunca em tempos em que o legislador, reconhecendo a impossibilidade de tudo prever e regular, passa a se valer, sempre mais, dos conceitos abertos ou indeterminados, e de cláusulas gerais. [8]

Com efeito, a segurança jurídica também é uma garantia individual prevista Constitucionalmente, contida no art. 5º, II da nossa Magna Carta. Na lição de José Afonso da Silva segurança jurídica “é o conjunto de condições que tornaram possível às pessoas o conhecimento antecipado e reflexivo das consequências diretas de seus atos e fatos à luz da liberdade reconhecida.” [9]

Quanto à necessidade de que a lei penal seja clara e sua interpretação uniforme vale citar a irretocável lição de Ferrjoli:

"O sentido e o alcance garantista do convencionalismo penal reside precisamente nesta concepção, ao mesmo tempo nominalista e empírica do desvio punível, que remete às únicas ações taxativamente indicadas pela lei dela excluindo qualquer configuração ontológica ou, em todo caso, extralegal. Auctoritas, non veritas facit legem é a máxima que expressa este fundamento convencionalista do direito penal moderno e por sua vez do princípio constitutivo do positivismo jurídico: o que confere relevância penal a um fenômeno não é a verdade, a justiça, a moral, nem a natureza, mas somente o que, com autoridade, diz a lei. E a lei não pode qualificar como penalmente relevante qualquer hipóteses indeterminadas de desvios, mas somente comportamentos empíricos determinados, identificados exatamente como tais e, por sua vez, aditados à culpabilidade do sujeito. Com tal concepção podem ser obtidos dois efeitos fundamentais da teoria clássica do direito penal e da civilização jurídica liberal. O primeiro é a garantia para os cidadãos de uma esfera intangível de liberdade, assegurada pelo fato de que, ao ser punível somente o que está proibido na lei nada do que a lei não proíba é punível, senão que é livre ou está permitido (...) o segundo é a igualdade jurídica dos cidadãos perante a lei: as ações ou fatos, por quem quer que os tenha cometido, podem ser realmente descritos pelas normas como “tipos objetivos” de desvio penal  ... " [10]

Ademais, conforme já exposto o processo penal existe para garantir o respeito às garantias individuais, protegendo-se os inocentes e buscando a punição dos culpados, mas não de qualquer forma, senão pelo respeito ás liberdades e garantias individuais.

Assim, é incito ao Direito Penal e ao processo penal que é instrumento do próprio Direito Penal e protetor das garantias fundamentais e liberdades individuais, ser previsível e trazer segurança jurídica aos jurisdicionados, não se pode pensar num processo penal onde para um juiz uma conduta seja crime e para outro não seja, ou que para um tribunal a violação de uma formalidade processual importantíssima como as que traz o Código de Processo Penal para que o reconhecimento de pessoas nos seus artigo. 226 a 228 seja mera irregularidade, quando para outro tribunal trata-se de vício insanável, tornando a prova ilegal.

Tudo isso gera em torno da segurança jurídica e da própria isonomia entre os jurisdicionados, não se pode tratar desigualmente pessoas em situações idênticas.

Sem olvidar que o próprio direito, é mutável e passível de diversas interpretações, um sistema totalmente previsível seria uma utopia, contudo, ao menos um certo grau de previsibilidade ou pelo menos um meio rápido de controle das decisões judicias ilegais deve haver.

"Em outras palavras, a determinação da linguagem não significa a inteligibilidade, confiabilidade e calculabilidade do direito. Pode-se contar com a linguagem como aliada, mas apenas através dela não se pode acabar com a insegurança, uma vez que o direito como linguagem não é algo acabado: precisa da atividade constitutiva do intérprete.

A contribuição específica dada pela “certeza” do direito – como redução da insegurança diante dos riscos de natureza jurídica – é a possibilidade de que todos os cidadãos se dediquem com confiança aos próprios afazeres e reivindiquem, com uma boa expectativa de sucesso, os próprios direitos. E isso é importante, porque o ponto central do Estado de Direito é o de que, por ser prospectivo, nos permite prever o que acontecerá diante da tomada de determinadas ações e, assim, nos permite planejar adequadamente nossas vidas em sociedade." [11]

Certo grau de previsibilidade é necessário, embora não se queira engessar o juiz, pois afinal o direito como tudo é mutável, mas também não se pode decidir sem levar em consideração os precedentes dos Tribunais Superiores.

“É absolutamente evidente – e não há qualquer pretensão de negá-lo – que, em certa medida, a divergência jurisprudencial apresenta aspectos positivos, ao revelar a influência dos aspectos culturais, econômicos e históricos na aplicação do direito, servindo para seu desenvolvimento, bem como influenciando, naturalmente, a atividade legislativa, a ponto de provocar alterações no direito positivo, pela edição de novas leis. Entretanto, num mesmo contexto histórico, as expectativas relacionadas à segurança jurídica e previsibilidade de aplicação do direito são no sentido de uniformidade, sob pena de tangenciar-se a própria isonomia, que não deve ser apenas uma promessa constitucional, mas parte da realidade.” [12]

Ganham importância, destarte os precedentes dos Tribunais superiores, que devem por óbvio serem respeitados pelos Tribunais e Juízes inferiores, sob pena de gerar grave insegurança jurídica e ferir de morte o princípio da isonomia entre os jurisdicionados.

A IMPORTÂNCIA DOS PRECEDENTES

Os Tribunais Superiores são essenciais para a manutenção da coerência, do sistema jurisdicional, devendo a jurisdição ser exercida de maneira a garantir a aplicação da lei, de forma previsível e com segurança jurídica ao jurisdicionado.

Deve se superar inclusive a posição tradicional de que os recursos especial e extraordinário, dirigidos respectivamente ao STJ e ao STF, apenas decidem o caso concreto, pois tais decisões devem ser tidas como verdadeiros paradigmas, posto que a atual tendência de tais cortes superiores é a de tornarem-se tribunais de precedentes.

“Assim, se ao STJ incumbe a função própria de uma Corte Suprema, que é assegurar a uniformidade da jurisprudência como elemento indispensável para realização do direito fundamental à igualdade perante o direito, o acesso à corte deve se dar por motivos que estejam em conformidade com o valores por ele tutelados.

Explica-se: o STJ deve dedicar-se a resolver apenas recursos especiais interpostos em face de decisões que tenham sido proferidas em sentido contrário à jurisprudência firmada pelo próprio STJ ou quando inexistir uma doutrina jurisprudencial (leia-se um estoque de razões universalizáveis de normas jurídicas) já produzidas pelo próprio STJ sobre leis que ainda não foram objeto de análise.

Com essa percepção da finalidade púbica, pretende-se superar, portanto, a visão tradicionalmente compreendida à generalidade da doutrina processual civil brasileira de que a norma constitucional que prevê as hipóteses específicas de cabimento do recurso especial tutela apenas as partes litigantes, como resposta a um suposto direito subjetivo de acesso à Corte por motivo de revisão e correção do caso concreto.” [13]

“Esse movimento foi coroado recentemente com a positivação da sistemática de edição de verbetes vinculantes na súmula de jurisprudência do STF, bem como com a adoção do requisito de admissibilidade atinente à repercussão geral do recurso extraordinário e ao julgamento de ´casos-modelos´, com eficácia abrangente, tanto no recurso especial (STJ) como no recurso extraordinário (STF).” [14]

As cortes supremas têm a tendência de tornarem-se cortes de precedentes, onde não julgam apenas casos concretos e sim verdadeiros paradigmas, que devem ser levados em consideração em todos os outros casos semelhantes, havendo uma clara influência do commom law a respeito do papel tanto das cortes superiores quanto de seus precedentes, até pela próprio estágio atual da globalização.

“O aspecto talvez mais recente relacionado a esse movimento de aproximação de sistêmica diz respeito ao fortalecimento dos precedentes judiciais. Além do progressivo reconhecimento da eficácia vinculante das decisões do STF em sede de controle concentrado de constitucionalidade (inicialmente no plano jurisprudencial e, posteriormente, no plano constitucional e legislativo), sucessivamente foram introduzidos dispositivos em nosso direito positivo constitucional e infraconstitucional atribuindo maior eficácia às posições sumuladas, ou simplesmente predominantes (ainda que não sumuladas) dos tribunais superiores.” [15]

Assim, hoje com a possibilidade de edição de Súmulas Vinculantes do STF (Art. 103, CF), a jurisprudência contida em tais súmulas possui inclusive ação própria, que chega inclusive a pular graus de jurisdição para que haja respeito à competência dos órgãos superiores (STF e STJ) além de respeito à tais súmulas vinculantes, é o caso da Reclamação Constitucional, contida no art. 102, I, “i” da nossa Magna Carta Federal, contudo, ainda existem súmulas meramente persuasivas, que não tem aplicação obrigatória à outros tribunais, sem falar nos meros precedentes, que demonstram uma posição majoritária ou pacificada.

A Reclamação Constitucional, de fato concretiza todos os preceitos defendidos aqui como a prestação adequada de jurisdição e regular duração do processo, ademais unifica a interpretação legal, quanto ao já pacificado no Supremo Tribunal Federal, contudo, isso não nos parece o bastante, pois ainda existem poucas súmulas vinculantes, e ao nosso ver qualquer precedente majoritário, como verdadeira jurisprudência deveria vincular os tribunais inferiores.

“Por todos esses aspectos é que se pode afirmar, em síntese, que a previsão de um mecanismo diretamente voltado à preservação das competências do STF e do STJ significa, em perspectiva funcional, assegurar o correto desempenho, em última análise, da própria missão de guardião do direito constitucional e do direito federal, respectivamente, das cortes.” [16]

Apenas a proteção pela Reclamação Constitucional às súmulas vinculantes não parece o suficiente, também existem súmulas persuasivas que não tem sua observância legalmente impostas para os Tribunais inferiores, sendo apenas uma tendência que deveria nortear as decisões dos juízos a quo, com efeito, a tendência é de se valorizar cada vez mais e mais os precedentes das cortes superiores diminuindo a autonomia dos tribunais e juízes inferiores.

 O respeito aos precedentes parece até uma questão cultural, deve o juiz respeitar os precedentes, também na esperança de que um dia seus próprios precedentes sejam respeitados, sabendo que desrespeitar um precedente no fundo é desrespeitar o próprio ordenamento jurídico, havendo grande probabilidade, senão, quase uma certeza de que haverá a reforma da decisão pelos órgãos superiores.

“Esse panorama guarda relação com a própria origem e evolução histórica dos sistemas contrapostos (common law e civil law), especialmente da Inglaterra e na França. Considere-se que, naquela, os juízes exercem papel histórico de limitação ao poder do monarca e fortalecimento dos direitos civis; enquanto na França, a reação materializada na Revolução de 1789 foi justamente no sentido de que a atividade legislativa contivesse e limitasse a atividade judicial. Daí a utopia francesa da criação de um direito absolutamente novo, cuja aplicação, pelos juízes, deveria ser precisa, sem margem para dúvidas ou desenvolvimento de atividade criativa.

Entretanto, essa ideologia de que no sistema de civil law a completude da lei praticamente eliminaria qualquer possibilidade de mutação judicial do direito não correspondeu à realidade, é impossível prever todas as situações que se concretizam na vida e nas relações humanas. Isso torna imprescindível a doção de certa generalidade, própria dos atos normativos, bem como a utilização de conceitos abertos ou indeterminados, que rendem ensejo ao desenvolvimento judicial ou concretização do direito, cujo sentido exato vai depender da atividade judicial quando da aplicação dos preceitos legais.

(...)

Dessa forma, talvez a principal característica apta a diferenciar o sistema anglo-saxônico do romano-germânico resida mesmo, no fato de que, naquele, a cultura jurídica desenvolveu paulatinamente, mesmo sem expressa disposição legal, a tradição de respeito e permanência dos precedentes, ou seja, o sistema stare decisis, de modo que a regra de direito fixada em julgamento anterior (ratio decidendi) deva ser, ao menos em princípio, observada em casos futuros, assegurando a todos previsibilidade, igualdade de tratamento, segurança jurídica e, ainda, conferindo às instituições judiciais credibilidade, que se estende ao próprio sistema jurídico.” [17]

Como bem observa Guilherme Marinoni a partir da clássica obra de Max Webber – A gênese do Capitalismo Moderno -, o common low se desenvolveu a partir de uma ótica protestantista, onde o êxito a partir do trabalho seria uma prova de que a pessoa era escolhida por Deus, havendo destarte uma exigência muito forte quanto à segurança jurídica principalmente nos negócios, forçando à adoção do sistema de precedentes stare decisis:

“Em suma: a ascese intramundana, ou mais especificamente o exercício do trabalho como meio de comprovação da salvação, nada mais é do que uma clara expressão do ´desencantamento com o mundo´, decorrente do rompimento com a magia dos sacramentos salvíficos, uma ascese que consistia numa ação racional impulsionada por valores e dirigida a fins. Exatamente por isso, essa ascese não podia prescindir de um mecanismo – o direito – que, com clareza e lógica, fosse apto a garantir o resultado da energia e do valor depositado nos atos da vida.”[18]

E continua fazendo uma análise baseada em outra obra clássica sobre as raízes culturais brasileiras de Sérgio Buarque de Holanda – Raízes do Brasil, para concluir que na sociedade brasileira de cultura hierarquizada, patrimonialista e personalista desde a colonização portuguesa, nunca houve qualquer interesse em racionalizar o sistema jurídico ou dar previsibilidade à jurisdição:

“Daí resulta importante ideia de que os colonizadores, vistos dentro do tipo ideal `aventureiro`, desprezavam o trabalho e o esforço pessoa sem perspectiva de rápida obtenção de resultado e, por consequência, a estabilidade e a previsibilidade das relações sociais e comercias. Ora, se o objetivo é o lucro imediato e fácil, e há na sociedade uma acentuação singularmente enérgica do afetivo, do irracional, do passional, e uma estagnação ou antes uma atrofia correspondente das qualidades ordenadoras, disciplinadoras, recionalizadoras, não só não há motivo para preocupação com a calculabilidade em torno das ações sociais, como não há qualquer estímulo para um direito dotado de racionalidade e previsibilidade.” [19]

Destaca ainda, que num sistema irracional, onde os precedentes no são respeitados, incentivam-se lobistas e o chamado jeitinho jurídico, através de advogados influentes e como as possibilidade de haver maior simpatia dos juízes em relação às classes dominantes, cultivando um tratamento desigual entre as classes dominantes e menos abastadas, como se aqueles estivessem acima da lei, ou fossem “mais iguais” que outros cidadãos.

"Isso não quer dizer que não existam posições sociais interessadas na falta de previsibilidade, ou melhor, na irracionalidade da distribuição da justiça. É certo que determinados litigantes não têm qualquer preocupação com a previsibilidade. Preferem acreditar nas relações de simpatia, estima e influência pessoais, reproduzindo a `mentalidade cordial` que marcou o sujeito que, provindo da família patriarcal, passou a ocupar o espaço público sem abandonar os seus hábitos.

(...)

Precisamente, o homem cordial é a antítese da ideia de que a lei é igual para todos e, por mera consequência, o patrimonialismo que se incorporou à cultura brasileira é completamente avesso a uma ordem jurídica coerente e a um sistema racional de distribuição de justiça. Os governos autoritários, as posições sociais que sempre foram privilegiadas, os ambientes deformados da magistratura e advocacia, não só não necessitam de previsibilidade, mas não querem igualdade nem muito menos coerência e racionalidade. Por isso fingem não ver a imprescindibilidade de uma teoria que privilegie a autoridade da função desempenhada pelas Cortes Supremas." [20]

Marinoni conclui justificando o sistema de precedentes pelo fortalecimento da responsabilidade pessoal com tratamento equânime e isonômico, promovendo a igualdade, uma maior coerência do sistema jurídico e da interpretação do direito, com clareza no real significado da lei o que inviabilizaria o chamado “jeitinho jurídico” ou do advogado travestido de lobista, havendo fortalecimento das instituições, especialmente do Poder Judiciário, com uma maior limitação do Poder Estatal que tende a ser autoritário, havendo previsibilidade e maior confiança no direito, além de maior racionalidade econômica, respeito ao direito e fortalecimento da responsabilidade pessoal. [21]

Assim, um Estado democrático clama pelo tratamento igualitário com responsabilidade pessoal garantida, pela segurança e previsibilidade da jurisdição, especialmente da jurisdição penal cujo exercício pode levar ao cerceamento de locomoção do cidadão. De maneira que o respeito aos precedentes deve ser realizado para viabilizar uma maior previsibilidade da interpretação legal, gerando segurança jurídica e uma distribuição igualitária e imparcial da Justiça.

CONCLUSÃO

Os Tribunais Superiores, especialmente o STJ e o STF têm funções primordiais no nosso Sistema Jurídico, sendo respectivamente guardiões da lei federal e da própria constituição, dando o real significado da legislação.

Tal função somada à necessidade atual da sociedade quanto à segurança jurídica em todas as relações, o que ganha ainda mais relevância tratando-se de matéria penal, tanto no real significado das condutas proibidas, quanto no respeito processual à garantias individuais do acusado, faz como que haja a exigência de segurança, eficácia e rapidez na prestação jurisdicional.

Neste cenário atual ganham importância os precedentes dos Tribunais Superiores, que tendem a tornarem-se cada vez mais cortes de precedentes decidindo não apenas o caso concreto que chega ao seu conhecimento, mas fazendo com que a decisão daquele caso valha para os demais casos parecidos.

Assim, ganham importância os precedentes do STF e do STJ, os quais viabilizam a segurança jurídica na prestação jurisdicional, fazendo com que a aplicação da lei seja mais isonômica, evitando que se tratem casos semelhantes de forma diferente ao humor do julgador, que pode simpatizar por essa ou por aquela parte, com decisões arbitrárias.

Sobre o autor
Diego dos Santos Zuza

#Fique em casa! Faça sua consulta por Whatsapp (11) 97188-1220 Advogado e sócio de Zoboli & Zuza Advogados Associados. Formado pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo; Especialista de Direito Penal e Direito Processual Penal pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo; Especialista em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP. Advogado atuante nas áreas de Direito Penal, Direito Civil, Direito do Consumidor, Direito de Família e Direito do Trabalho.

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Texto elaborado durante a especialização em Direito Penal e Processo Penal

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