Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br

A família dos tempos remotos aos dias atuais

Agenda 28/12/2015 às 07:44

A história da civilização humana sempre esteve e assim prosseguirá atrelada à história da família, célula mater de toda e qualquer sociedade, pois esta é fundamental para a manutenção da própria espécie humana e organização da sociedade.

1  A família dos tempos remotos aos dias atuais

1.1  Breve histórico da noção de família

A família existe desde tempos imemoriais, constituída sob as mais variadas formas, segundo os costumes de cada povo, e influenciada pelos valores socioculturais, políticos e religiosos de cada época. Em algumas sociedades não ocidentais os parceiros conjugais são escolhidos pelos pais, só vindo a conhecer-se no momento da celebração das núpcias. No Egito antigo, como exceção à regra universalizada que veda o casamento entre membros da mesma família, o casamento entre irmãos era admitido, para assegurar a manutenção da pureza do sangue da família do Faraó. [1]

Na China tradicional, ao contrário, a proibição do casamento no meio familiar estende-se a vários graus de parentesco. [2]  Algumas culturas, como a brasileira e praticamente todo o resto do ocidente, só aceitam um casamento (monogamia); outras permitem vários casamentos concomitantes (poligamia). No Islã, os muçulmanos têm o direito de possuir até quatro esposas ao mesmo tempo. Trata-se da forma de poligamia conhecida como poliginia, onde há duas ou mais mulheres. [3] 

Em Roma, as pessoas componentes da família encontravam-se sob o patria potestas do ascendente masculino mais velho. Assim, se um casal só tivesse filhas mulheres adultas e um menino, de qualquer idade, este seria o pater famílias, caso o pai viesse a faltar. [4]

Na antiguidade, em quase todos os povos, a união se dava geralmente por uma cerimônia de cunho religioso, celebrada pelo pater e sem qualquer participação do Estado. Aos olhos da sociedade, esta união de um homem e uma mulher atendia aos imperativos culturais e a família era reconhecida como tal. Com esse breve passeio pela história, percebe-se que houve uma grande transformação no conceito de família em todo o mundo, até chegarmos à Família contemporânea, especialmente aquela que se encontra disciplinada nos moldes do Direito Brasileiro, com uma amplitude nunca antes reconhecida pela lei. Com o disciplinamento da "União Estável", como forma de constituição familiar, nosso ordenamento abriu ensejo a uma nova era de direitos da personalidade, reafirmando a dignidade da pessoa humana como valor fonte. Tudo passa a convergir para a pessoa, que é a razão de ser do próprio Direito.

1.2 A evolução da família no direito brasileiro

As principais fontes do Direito de Família brasileiro são o Direito canônico e o Direito português que, por sua vez, sempre tiveram suas arestas direcionadas para o casamento como formação legítima de família. A Igreja Católica sempre teve influência na família brasileira. Como exemplo para essa assertiva, citamos a presença ainda marcante dos impedimentos matrimoniais na nossa legislação civil e que já eram previstos pelo Direito canônico.

Entretanto, não há dúvidas de que, com as transformações sociais, a família brasileira acabou se moldando às novas realidades, contribuindo para o alargamento do conceito de família, chegando a ponto de não mais restringi-lo ao casamento. Na esfera constitucional, o texto de 1824 nada mencionou sobre a família ou mesmo o casamento, já a Constituição Federal de 1891, apesar de não dedicar capítulo especial à família, reconheceu efeitos apenas ao casamento civil. Por outro lado, a Carta de 1934, dedicando capítulo próprio ao instituto, estabeleceu a constituição da família brasileira pelo casamento civil indissolúvel. Portanto, o casamento, por muito tempo, era a única forma legítima para a constituição de família. Esse princípio foi mantido nos textos constitucionais de 1937 (art. 124); 1946 (art. 163); 1967 (art. 167); 1969 (art. 175).

Para o Código Civil Brasileiro, de 1916, a família é aquela assentada no Direito Napoleônico, ou seja, hierarquizada e matrimonializada, calcada na procriação, na formação de mão-de-obra, na obtenção e transmissão de patrimônio, além de fonte de aprendizado individual. Assim, o texto do Código Civil demonstra a preferência pela família com valores tradicionais, com o homem exercendo a chefia da sociedade conjugal. Com a Lei n º 883, de 21 de outubro de 1949, o filho tido fora do casamento, pôde ser reconhecido por qualquer dos pais. Por outro lado, em 1962, o Estatuto da Mulher Casada, Lei n.º 4121, consolidou o início da emancipação da mulher dentro do casamento, passando do status de relativamente incapaz para absolutamente capaz para os atos da vida matrimonial, passando a ser considerada colaboradora do marido na sociedade conjugal.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

Ainda nesse sentido, em 1977, com a Lei n.º 6515, denominada Lei do Divórcio, finalmente traçaram-se normas referentes à dissolução do casamento, ocorrendo a principal quebra dos valores religiosos embutidos nesse instituto. Ressalta-se que a indissolubilidade do casamento foi, sem dúvida nenhuma, uma das principais causas pelo elevado número de relações sem a presença de um casamento civil, consideradas amorais e reprováveis, posto que concubinárias.

Por outro lado, depois da Constituição Federal de 1988, o casamento passou a ser algo dissociado do legítimo, ou seja, a legitimidade da família não se relaciona mais com o casamento. Nesse sentido, a família continua a ser a base absoluta da sociedade, contando com a especial proteção do Estado, que deve defendê-la, já que também se molda na organização familiar.

A grande modificação foi à dissociação do casamento como única forma de constituição de família legítima, passando-se a considerar também como entidade familiar à relação extramatrimonial estável, entre um homem e uma mulher, que antes era tida como amoral e pecaminosa, além daquela formada por qualquer dos genitores e seus descendentes, a família monoparental.

Essas mudanças constitucionais, sem dúvida, alteraram substancialmente a história traçada pelo Código Civil para a família brasileira, e a Constituição de 1988 só veio, na verdade, abraçar uma situação de fato já existente e que não era, todavia, reconhecida juridicamente. Nesse sentido, a família moderna além de ser mais liberal é também mais justa, contudo essas modificações ainda geram dúvidas, ocasionando discussões doutrinárias e jurisprudenciais.

REFERÊNCIAS

[1] GOMES, Orlando. Direito de Família. 10. ed., e atual. por Humberto Theodoro Junior. Rio de Janeiro: Forense, 1998.

[2]  VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. São Paulo: Atlas, 2001.

[3] [4]  VIANA, Marco Aurélio S. Da união estável. São Paulo: Saraiva, 2000.

Sobre o autor
Cleber Augusto de Matos

Advogado e Doutorando em Direito Público

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!